A Filosofia de Sócrates

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Moisés do Vale dos Santos
A Filosofia de
Sócrates
Rio de Janeiro
Barra Livros
2014
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Sumário
APRESENTAÇÃO.............................................................5
INTRODUÇÃO..................................................................7
1 - O objeto material da filosofia socrática e o rompimento
com os físicos...................................................................11
2 - A concepção de Aristóteles sobre o método socrático 21
2.1 O raciocínio indutivo e o conceito universal..............21
2.2 Sócrates e a paternidade da ciência............................24
2.3 A definição universal e a invenção das Ideias............27
..........................................................................................31
3– O método socrático e seus pressupostos históricos,
éticos e psicológicos.........................................................31
4 - Os elementos do método socrático..............................37
4.1 O elemento de exortação à pesquisa pelas essências: o
tí esti.................................................................................37
4.2 O elemento irônico no método socrático e sua
declaração de ignorância..................................................41
4.2.1 Sobre a veracidade da declaração de ignorância
proferida por Sócrates......................................................42
4.2.2 O objetivo da ironia socrática..................................44
4.2.3 O duplo ardil da ironia socrática.............................45
4.2.4 O aspecto zombeteiro da ironia socrática................49
4.2.5 A concepção romântica da ironia socrática na
perspectiva de Kierkegaard..............................................50
4.3 O elemento da refutação no método socrático: o
élenchos............................................................................54
5 - O método de Sócrates.................................................69
5.1 A indução como a essência do método socrático e sua
importância ética..............................................................69
5.2 A solução socrática para o impasse epistemológico
entre o ceticismo e o dogmatismo pelo critério do
conhecimento universal e necessário...............................73
5.3 A busca pela unicidade do conceito............................80
5.4 Breve análise do método socrático no diálogo
Platônico Laques..............................................................83
CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................95
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................99
APRESENTAÇÃO
O Sócrates histórico é, como evidencia o presente livro,
a mais emblemática personagem da História da Filosofia.
Ainda que não tenha sido pioneiro no enfrentamento das
questões que integram o corpus da Filosofia, é não raro
propalado como o pai dessa disciplina. Talvez porque Sócrates foi o primeiro a abordar aquelas questões sob um
prisma específico, que está na origem e delimita o próprio
método de investigação filosófica. De fato, se podemos
concordar com Kant em que os filósofos se definem como
investigadores de conceitos (Kritik der reinen Vernunft
A510-511-B538-539), o título de pai da filosofia é com
justiça reservado ao mestre de Platão. Afinal, como sublinha Aristóteles, Sócrates fora o primeiro a situar a investigação sob o prisma da pergunta pelo “τί ἐστιν” – o o que é
(Metafísica XIII 4, 1078b17-23) – prisma que, não por
acaso, é comumente designado como o “momento exortativo” do método socrático. Como amiúde descrito nos diálogos platônicos, àqueles que, amparados em suas certezas, se punham a tecer discursos inflamados sobre a natureza da justiça, da virtude, do prazer, dentre outras noções
fundamentais à vida humana, Sócrates principiava por
exortar a precisar os significados dos nomes com que
compunham seus discursos. Ao embaraço que a exortação
provocava seguia-se naturalmente o segundo momento, o
“ἔλεγχος” – a refutação – e a “εἰρωνεία” – ironia – que lhe
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é constitutiva. Esse segundo momento conduzia ao desfecho inevitável dos diálogos: a confissão de que as certezas
de que os discursos se revestiam não resistiam à investigação acurada e se dissolviam na imprecisão e na equivocidade das palavras que os compunham. Os diálogos platônicos conhecidos como socráticos comungam essa estrutura, que, em um único movimento, evidencia a importância
da filosofia e realça o lugar eminente de Sócrates na história dessa disciplina.
O presente livro explora e articula essas diferentes dimensões do método socrático, tão basilares quanto inaugurais para a Filosofia. Em uma linguagem a um tempo acessível e rigorosa, Moisés do Vale mantém-se fiel à lição de
Sócrates, que exorta a preferir a precisão das definições ao
ornamento dos discursos.
Ter acompanhado a investigação da qual este livro é resultado foi enriquecedor não apenas pela ocasião de assistir o percurso de uma mente seduzida pelo desafio socrático, mas sobretudo pelo aprendizado que essa experiência
proporcionou. A honra com que agora o apresento é um
coroamento desse aprendizado.
Prof.ª Dra. Vivianne de Castilho Moreira1
Curitiba, 04 de maio de 2014
1- Coordenadora do departamento de Filosofia da UFPR.
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INTRODUÇÃO
Este livro tenciona oferecer (a partir do conjunto dos
textos que se reportam a Sócrates e sua filosofia, não
obstante as abundantes perspectivas que emanam dos
diferentes relatos) um núcleo geral de conceitos que
seguramente podem ser atribuídos à filosofia e ao método
empregado pelo Sócrates histórico. Não obstante as
aparentes incongruências entre os diversos relatos a
respeito de Sócrates, principalmente entre Platão e
Xenofonte, não é possível negar que Sócrates buscava a
essência das virtudes, que primeiramente dedicara-se às
questões físicas para depois abandoná-las, que instigava
seus contemporâneos a darem primazia ao cuidado da
alma, que afirmava possuir uma divindade pessoal que o
orientava2, ou que se opunha veementemente tanto aos
físicos quanto aos sofistas. No capítulo 1 procuro
evidenciar de forma sintética o núcleo geral de conceitos
2- Tanto Platão como Xenofonte mencionam o fenômeno chamado
“demônio socrático”. Pode-se ver na Defesa de Sócrates 31 d, no
Fedro 242 b c; e nos Ditos e feitos memoráveis de Sócrates (de
Xenofonte) Livro I capítulo 1:4 e no Livro IV capítulo 8:1. A
diferença dos dois relatos reside no fato de que segundo Platão o
demônio de Sócrates o proibia de fazer algo, era uma voz negativa,
enquanto o demônio do relato xenofôntico, ora proibia Sócrates de
fazer determinadas coisas, ora lhe dava instruções.
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do socratismo arrolado precedentemente, a partir dos
relatos exarados por Platão e Xenofonte, e das doxografias
de Aristóteles, Cícero e Diógenes Laércio (considerado o
primeiro grande historiador e doxógrafo da filosofia
grega).
O que me propus fazer a partir dos textos da juventude
de Platão, dos textos de Xenofonte, e das poucas e sucintas
41 passagens de Aristóteles referentes a Sócrates e a seu
método, como também me apoiando nos comentadores
mais aquilatados, foi realizar um trabalho de historiador da
filosofia, e abstrair à maneira socrática, um conteúdo
universal das mais diversas e seguras fontes históricas que
chegaram até nós. Por esta razão, ver-se-á uma abundância
de passagens e referências, exaradas no corpo do texto, e
nas 118 notas de rodapé.
Com efeito, optei principalmente pelos diálogos da
juventude de Platão, considerados pela maioria dos
eruditos como muito próximos da real obra e filosofia de
Sócrates. Todavia, não utilizo neste livro todos os textos
estimados a pertencer à juventude de Platão 3, que
totalizam 10 obras, mas as necessárias para o
entendimento do método socrático: Apologia de Sócrates,
os diálogos Críton, Eutífron, Fédon, Laques e a A
República I. Convém destacar que Xenofonte também é
uma importante fonte histórica para a compreensão da
filosofia de Sócrates, e neste livro há abundante referência
de passagens dos Ditos e feitos memoráveis de Sócrates
deste autor.
No capítulo 2 deste livro a concepção de Aristóteles
sobre o método socrático terá um papel norteador para o
3- Ver nota 69.
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desenvolvimento de minha hipótese, porquanto,
Aristóteles foi o primeiro a apontar para o método de
Sócrates e classificá-lo como indutivo. Além disso,
Aristóteles ao atribuir a Sócrates a descoberta do
raciocínio indutivo e do conceito universal, e ao asseverar
que a ciência se caracteriza pela universalidade, honra
Sócrates como o pai da filosofia e da ciência, tema que
será explorado em 2.2. Ver-se-á também a importantíssima
distinção que Aristóteles estabelece entre a concepção de
Platão sobre a definição universal (em conexão com o
mundo das Ideias), e a de Sócrates, a qual é baseada
somente na abstração teórica dos traços comuns
pertencentes à multiplicidade dos casos particulares.
No que tange aos elementos que compõem o método
socrático, segundo a estrutura que apresento no capítulo 4
– o ti estí, ou momento exortativo, caracterizado pela
suspensão temporária das certezas; a ironia e a refutação
ou élenchos, como elementos responsáveis pela
purificação da alma da presunção do saber – deixo de lado
deliberadamente a tão conhecida maiêutica socrática4, por
considerá-la não pertencente ao método do Sócrates
histórico. A maiêutica socrática, como processo de fazer o
interlocutor “parir”, a partir de sua própria alma, o
conhecimento instigado pelas perspicazes perguntas de
Sócrates, é a atividade descrita no diálogo Teeteto de
Platão. E como o diálogo Teeteto não pertence ao grupo
dos primeiros diálogos de Platão, optei por excluir a
4- Para aprofundar a tese sobre a maiêutica não pertencer ao
método do Sócrates histórico ver tópico específico dedicado a este
tema por Louis-André Dorion, na sua obra Compreender Sócrates,
p. 54.
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maiêutica da estrutura do método de Sócrates, e em
nenhum momento a menciono no corpo do trabalho.
Enfim, o capítulo 5 é o cerne deste livro por mostrar
que o caminho através do qual Sócrates buscava o
conhecimento verdadeiro é a indução, consistente na
passagem das representações particulares para o conceito
universal e necessário. Nesse capítulo pretendo mostrar
também que pela indução são pautadas as ações humanas
a partir do paradigma imutável do conceito universal e, a
partir daí, é solucionado o impasse epistemológico
presente no seu tempo, entre o dogmatismo dos físicos e o
ceticismo dos sofistas.
Quanto aos comentadores, apoiei-me, como base para a
defesa do método socrático como indutivo, principalmente
nos que compartilham da concepção de que o método de
Sócrates é essencialmente indutivo, dispondo os demais
fenômenos da dialética socrática, (explicita ou
implicitamente) como a exortação, a ironia e a refutação,
como partes constituintes da indução. Estes comentadores
são: Francis Wolff, o qual lança uma crítica aos que
reduzem o método de Sócrates à ironia, ou à refutação;
Antonio Labriola o qual dedica grande parte de sua obra
sobre Sócrates a este tema; e Eduard Zeller. Ao me apoiar,
em alguns momentos do trabalho, em passagens de outros
relevantes autores, como Gregory Vlastos, Rodolfo
Mondolfo, Pierre Hadot, Werner Jaeger, Kierkegaard,
entre outros, tenciono reforçar a minha interpretação sobre
a estrutura do método de Sócrates, sem descartar como de
pouca monta as pesquisas específicas destes autores que
assumem hipóteses que destoam da estrutura defendida
neste livro.
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