Os mecanismos que mantêm a autotolerância podem ser afetados

Propaganda
Os mecanismos que mantêm a autotolerância podem ser afetados pelas
anormalidades nos linfócitos, resultando, dessa forma, em auto-imunidade, que pode ser
sistêmica ou localizada em um órgão específico.
Falha na Tolerância Central
Uma das hipóteses explicativas para a autoimunidade resulta da falha nos
processos de seleção que deveriam eliminar linfócitos imaturos específicos a antígenos
inócuos. Todavia, não existe evidência que apóia esta hipótese, já que não é sabido a
ocorrência deste mecanismo, e mesmo com a falha da tolerância central, os mecanismos
periféricos são suficientes para manter a incapacidade de responder a muitos antígenos
próprios.
Falha da Tolerância Periférica
Modelos experimentais e anormalidades genéticas apóiam a idéia de que a falha
da tolerância periférica resulta em autoimunidade, por anergia ou deleção de linfócitos
T maduros específicos de antígenos próprios. Entretanto, ainda não se sabe se as células
B podem participar da autoimunidade.
Quebra da anergia das células T
Células apresentadoras de antígenos(APCs) que estão em repouso e são
deficientes em co-estimuladores podem apresentar antígenos autólogos e induzir a
anergia das células T auto-reativas. Contudo, condições que ativam as APCs podem
suspender a anergia das células T induzindo a produção de citocinas e a expressão dos
co-estimuladores. Isto pode estimular a produção de células T e também a diferenciação
destas em pró-inflamatórios nocivos, resultando em reações auto imunes contra o
tecido. A ativação das APCs pode ser devida a infecções, necrose tecidual e inflamação
local. O papel da inflamação na indução da auto-imunidade foi relacionada a doenças
experimentais como encefalomielite e tireoidite, que são mediadas pelas células T,e só
irão se desenvolver se houver administração junto aos antígenos próprios de adjuvantes
fortes, que poderão ativar os macrófagos a expressarem B7-1 e B7-2 quebrando a
anergia e desenvolvendo células T efetoras, reativas aos antígenos próprios.
A diabete mellitus dependente de insulina é a demonstração mais formal da
lesão tecidual auto-imune resultando na quebra da anergia das células T.
Os promotores da insulina nas células beta das ilhotas pancreáticas controlam a
expressão seletiva de genes. A insulite não é produzida através da expressão do coestimulador B7-1, porém sua suscetibilidade de ocorrência é aumentada quando
relacionada a outras anormalidades locais. Em experimentos é expresso
transgenicamente um antígeno estranho nas células beta das ilhotas tal como proteína
viral. Somente o antígeno próprio não desencadeia uma reação auto-imune, todavia, a
co-expressão do antígeno viral com B7-1 nas ilhotas elimina a tolerância das células T,
provocando uma resposta ao antígeno, ocasionando a insulite. Portanto, a lesão tecidual
auto-imune pode Sr ocasionada pela expressão aberrante dos co-estimuladores,
suspendendo a anergia das células T auto-reativas.
A anergia das células T pode também falhar devido a anormalidades na própria
célula. Em camundongos, mudanças nos receptores das células T para os co-
estimuladores resultam em auto-imunidade fatal, com infiltrados nas células T,
destruição dos tecidos do coração, pâncreas e outros órgãos.
Isso de deve há inibição das células T pelo reconhecimento dos co-estimuladores
pelos receptores, que induz a anergia das células T. Na ausência destes receptores
ocorre a resistência à anergia, desenvolvendo a auto-imunidade.
Falha da Morte Celular Induzida por ativação
A primeira evidência da auto-imunidade resultante da falha da morte celular
induzida por ativação proveio de estudos em linhagens de camundongos co-sanguíneos.
Em humanos a doença lúpus eritematoso sistêmico assemelha-se a esta autoimunização. As linhagens dos camundongos foram designadas lpr/lpr (proliferação
linfocitária) e gld/gld (doença proliferativa generalizada). Apresentavam uma doença
doença auto-imune sistêmica severa letal com múltiplos auto-anticorpos. O defeito lpr é
uma anormalidade do gene codificante da molécula Fas,responsável pela expressão da
proteína indutora da morte celular. Já o defeito gld é um mutação pontual no ligante de
Fas, anulando a capacidade de sinalização desta molécula. Estes defeitos anulam a
morte celular induzida por ativação de células T CD4+. Este fato resulta na
sobrevivência e persistência das células T específicas a antígenos próprios. Assim, as
doenças destes camundongos são devidas a uma falha do mecanismo de tolerância
periférica. Em camundongos homozigotos lpr e gld a via de deleção de células B
também é defeituosa, contribuindo, assim, para a produção de auto-anticorpos.
Camundongos com anormalidades na IL-2 apresentam diversos sintomas, tais como
esplenomegalia e linfodenopatia severas, bem como anemia auto-imune, e ás vezes
auto-anticorpos anti-DNA; alguns ainda desenvolvem doença inflamatória intestinal.
Porém, a patogenia ainda é desconhecida. Contudo, acredita-se estar ligada a falha da
morte celular dependente do Fas, uma vez que a IL-2 potencializa os sinais desta
molécula.
Falha da supressão mediada pelas células T
O declínio de células T reguladoras capazes de manter a autotolerância através
da liberação de citocinas imunossupressoras para antígenos próprios resulta na autoimunidade. Entretanto, não é conhecida nenhuma doença humana ou animal derivada da
diminuição das células T reguladoras.
Ativação Linfocitária Policlonal
Os ativadores policlonais estimulam a produção múltipla de clones das células T
e B independente da especificidade antigênica, ou por interações com moléculas afora
os antígenos receptores.
Um exemplo é a estimulação, em camundongos, da produção clonal de células B
auto-reativas anérgicas, quando expostos ao LPS. Estas células B anérgicas são
incapazes de responder a antígenos próprios específicos, porem mantêm a capacidade de
responder a antígenos independentes do receptor, através da produção de autoanticorpos.
Em animais, múltiplos fenômenos auto-imunes associam-se a doença enxerto
versus hospedeiro. A doença se desenvolve após o transplante de medula óssea
contendo células T em um receptor imunodeficiente. Estas células enxertadas podem
reconhecer os antígenos B do hospedeiro como estranho, induzindo em relações células
T-B, ocasionando a produção de vários clones de células B, com produção de autoanticorpos na ausência específica de antígenos.
Reações Imunológicas Cruzadas entre Antígenos
Próprios e Estranhos.
Proteínas próprias semelhantes a antígenos estranhos podem ser reconhecidos
por células T ou anticorpos que iniciaram uma resposta imune normal, isto é conhecido
como reação cruzada. Um exemplo é a febre reumática causada por antiestreptocócicos
que fazem reação cruzada com proteínas do miocárdio, resultando em miocardite após
infecção estreptocócica. Dessa forma, estas doenças são apenas seqüelas de uma
resposta imune normal. Outras vezes, devido a ausência de células T auxiliares, as
células B deixam de produzir auto-anticorpos. A exposição a um antígeno estranho com
epítopo de célula B em comum com antígeno próprio estimula as células T auxiliares,
podendo induzir as células B e a produção de auto-anticorpos. A homologia entre
antígenos próprios e microbianos é chamada mímica molecular, e postula-se que esta
seja uma das razões das respostas imunes normais induzirem a auto-reatividade.
Fatores genéticos na auto-imunidade
Um forte componente genético está associado as doenças auto-imunes, sendo
que a maior probabilidade de contrair uma doença em particular se deve aos genes mais
suscetíveis, porém por si mesmos não determinam se um indivíduo irá ou não
desenvolver uma doença auto-imune. Dentre os genes os mais associados são os genes
do MHC de classe dois.
A suscetibilidade às doenças auto-imunes é controlada por fatores ambientais e
genéticos, especialmente os genes MHC. Uma evidência da suscetibilidade genética às
doenças auto-imunes foi feita a partir de estudos de famílias e gêmeos principalmente.
Por exemplo, uma maneira de quantificação da probabilidade a adquirir uma doença
particular é comparar a incidência da doença em gêmeos homozigóticos e dizigóticos.
Se os gêmeos apresentam similaridade na incidência, uma provável explicação seria o
compartilhamento de fatores genéticos e ambientais, porém, se a incidência for maior
em monozigóticos os fatores genéticos superam os ambientais.
Até o momento, o genótipo MHC é a única associação mais consistente para a
suscetabilidade a doenças auto-imunes. Muitas doenças auto-imunes humanas estão
associadas com doenças ligadas ao HLA, conhecidas pela tipagem genotípica do HLA.
Por exemplo, a associação entre diabete mellito insulino-dependente e os alelos DR3 e
DR4, agora se sabe existir entre a doença e o genótipo DQbeta, intimamente ligado ao
DR3 e DR4. Há uma mudança de aminoácidos na posição 57 no genótipo DQbeta. Na
maioria das doenças auto-imunes está mais intimamente ligada aos alelos do MHC de
classe dois.
Não é surpreendente a associação do MHC com as doenças auto-imunes, já que
estas envolvem as células T, que possuem a capacidade determinada pelo genótipo do
MHC e doenças auto-imunes enfatiza o papel dos alelos do MHC em formatar o
repertório do receptor de células T. As estruturas da molécula de MHC determinam a
seleção negativa dos linfócitos T durante sua maturação. Se as moléculas do MHC no
timo não se ligam com alta afinidade aos antígenos próprios, as células T imaturas
reativas a este antígeno podem tornarem-se funcionais.
As moléculas da classe dois do MHC podem influenciar a ativação das
células T que devem impedir a auto-imunidade. Exemplo: No diabete mellito
independente de insulina, a carência de um aminoácido em moléculas HLA-DQ que se
associam aos peptídeos próprios ativam células T causadoras da doença.
Entretanto, o gene pode não estar associado a um alelo do HLA. Além disso, não
há dados suficientes que permitem concluir que os genes MHC contribuem para a autoimunidade, uma vez que a expressão de um gene particular do HLA não é por si só a
causa de uma doença auto-imune, apesar de ser um grande fator contribuinte.
Existem evidências de que várias outras famílias de genes estão envolvidos na
suscetibilidade a geração de doenças auto-imunes. Em seres humanos, por exemplo, a
deficiência hereditária homozigota das proteínas iniciais da via clássica do
complemento está associada ao desenvolvimento do lúpus eritematoso sistêmico. Em
camundongos e seres humanos genes anormais codificantes de proteínas envolvidas na
regulação da apoptose dos linfócitos (Fas e ligante do Fas) estão associados com o
desenvolvimento do lúpus. Além disso, evidências de que a variação hereditária no
nível de expressão de citocinas pode aumentar a suscetibilidade à doença auto-imune.
Além das anormalidades imunológicas primária e à suscetibilidade dos genes
outros fatores estão relacionados.
1. Os micróbios podem desencadear a desregular as respostas imunes do
hospedeiro gerando lesões no próprio hospedeiro. As infecções variam
seus efeitos em ativação policlonal linfocitária, inflamação local do
tecido com maior expressão de co-estimuladores; alterações de antígenos
próprios; reações cruzadas, e lesão tecidual liberando antígenos
seqüestrados anatomicamente.
2. Alterações anatômicas nos tecidos, tais como inflamação, lesão ou
trauma induzem a exposição de antígenos próprios que antes estavam
seqüestrados, ou seja, despercebidos do sistema imune. A inflamação
pode causar alterações estruturais nos antígenos próprios ocasionando
reações auto-imunes. As citocinas ativam macrófagos devidos a uma
inflamação. Porém, pode ocorrer perda da tolerância periférica caso as
citocinas aumentem a expressão de co-estimuladores.
3. O estado hormonal é também um fator de suscetibilidade a doença.
Muitas doenças auto-imunes apresentam diferença entre os sexos, sendo
que a doença lúpus eritematoso sistêmico ocorre em maior freqüência
nas mulheres, assim como outras doenças. Entretanto, não é conhecida se
a predominância resulta realmente de hormônios sexuais ou outros
fatores.
Exemplo de doenças auto-imunes
Diabete mellitus
Doença que envolve o metabolismo da glicose devido à falta absoluta ou relativa
de insulina, que leva a hiperglicemia. Existem dois tipos da doença: diabetes do tipo
um, depende de insulina exógena para manter o metabolismo normal de glicose; e o
diabetes tipo dois, que se deve a uma complexa perturbação bioquímica dos receptores
para insulina, neste caso, o tratamento com insulina é desnecessário.
A lesão específica do diabetes tipo um é denominada insulite e é causada pela
infiltração de células T CD8+ e CD4+ nas ilhotas pancreáticas. Os auto-anticorpos são
característicos da doença, ligando-se tanto a constituintes citoplasmáticos quanto as
proteínas da membrana da célula beta. O diabetes do tipo um é geneticamente
influenciado e aparentemente múltiplos genes estão envolvidos.
Lúpus Eritematoso Sistêmico(LES)
Les é o protótipo das doenças auto-imunes sistêmicas. A maioria dos pacientes
é do sexo feminino com aproximadamente 30 anos de idade e de cor negra. O
prognóstico depende da presença ou ausência de lesões renais, sendo que a causa á a
disposição de complexos imunes no glomérulo. Estes complexos são constituídos de
auto-anticorpos anti-DNA, que geram peptídeos quimiotáticos que atraem granulócitos
e outras células inflamatórias, as quais liberam enzimas proteolíticas e agentes oxidantes
causadores dos danos ao glomérulo.
Referências bibliográficas:
A.
B.
Walter Ferreira e Sandra L.M. Ávila, Diagnóstico laboratorial das
Principais Doenças Infecciosas e Auto-Imunes- segunda edição, 2001,
413-429.
Charles A. Janeway, Paul Travers, Mark Walport e J. Donald Capra,
Imunobiologia, O sistema imunológico na saúde e na doença,2000,
quarta edição, p.490-518.
Download