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Propaganda
Lukasiewicz, Bivalência e
Verofuncionalidade
Samir Bezerra Gorsky
CLE-UNICAMP
Orientador: Prof. Dr. Walter Carnielli
Resumo:
É bem conhecida a questão da valoração de proposições sobre
futuros contingentes tais como descreve Aristóteles no De
Interpretatione IX, assim como também são bem conhecidas as
lógicas n-valoradas de Lukasiewicz criadas para solucionar tal
questão. Lukasiewicz trata dos futuros contingentes aristotélicos
aplicando a noção de valores intermediários de verdade, tratamento
este criticado por alguns autores. Contudo, um ponto falho em tais
críticas é que o tratamento com valores intermediários devido a
Lukasiewicz permite salvar a verofuncionalidade, perdida quando
reduzimos tais lógicas a sistemas bivalorados.
A Batalha Naval






Aristóteles. De Interpretatione IX (uma lógica com um
terceiro valor).
Uma tentativa de solucionar um problema relacionado aos
futuros contingentes.
Proposições devem corresponder a fatos.
Eventos situados no futuro possuem uma alternativa real e
uma potencial em direções contrárias.
A afirmação e a negação correspondentes a essa
proposição terão o mesmo caráter.
Ambas poderão ser verdadeiras ou ambas poderão ser
falsas, porém atualmente não podem possuir nenhum valor
de verdade (verdadeiro ou falso).
A Batalha Naval

Aristóteles Argumenta que não podem
valer, ao mesmo tempo, os seguintes casos:
a) “Haverá ou não haverá uma batalha
naval amanhã” é, agora, indeterminado.
b) Já é definitivamente verdadeiro ou
definitivamente falso que haverá uma
batalha naval amanhã.
A Batalha Naval

Embora nenhuma das partes da disjunção
seja, agora, verdadeira ou falsa, o conjunto
inteiro desta disjunção (haverá ou não
haverá uma batalha naval amanhã) é desde
já definitivamente verdadeiro.
A Batalha Naval




Tratamento desta questão entre os pensadores
medievais.
Okham introduz um valor “neutro” que coexiste
com proposições que possuem valor de verdade
determinado (verdadeiro ou falso).
Relação desta lógica tri-valorada e a omnisciência
divina.
Exitem proposições indeterminadas 
Existem questões para as quais Deus não
pode,desde já, conhecer a sua resposta.
A Batalha Naval

Considere as seguintes proposições:
1) “X acontecerá”
2) “Deus sabe que X acontecerá” (Deus
sabe que 1))
A Batalha Naval






2)  1) ?
Okham pensava que sim.
O antecedente é falso quando o conseqüente é
“neutro”.
(Usando a notação encontrada em [3])
C0½ = 1, assim como C01 = 1
‘2)  1)’ é verdadeira não importando que tipo
de evento X possa ser.
C00 = 1; C11 = 1 [Pois se 1) é V. Deus (sendo
Deus) saberá que 1) ].
A Batalha Naval






1)  2)?
Se 1) é falso então 2) é falso
Se 1) é verdadeiro então 2) é verdadeiro
E se 1) é “neutro”?
Daí 2) é falso e, portanto, 1)  2) é falso.
“não vale ambos p e não-q” não implica, em todos
os casos, “se p então q”
Lukasiewicz
O problema de se construir uma lógica
verofuncional que nos permita trabalhar
com proposições “neutras” como as que
encontramos nos trabalhos aristotélicos foi
atacado, de forma sistemática, em 1920 por
Lukasiewicz.
 Ele sugeriu que deveríamos considerar as
seguintes matrizes:

Lukasiewicz
~
&
1
½
0
1
0
1
1
½
0
½
½
½
½
½
0
0
1
0
0
0
0
Lukasiewicz

1
½
0
V
1
½
0
1
1
½
0
1
1
1
1
½
1
1
½
½
1
½
½
0
1
1
1
0
1
½
0
Lukasiewicz
A partir dessas matrizes (p & q) é equivalente a:
~ (~p v ~q)
 Podemos ainda definir (p  q):
(p  q) & (q  p)
 p v q não é, entretanto, definido como:
~p  q
(no cálculo implicacional porém é definido como:
(p  q)  p)

Lukasiewicz
~p é definido como: p  
 Muitas leis do cálculo proposicional deixam de
valer de acordo com os significados dos
conectivos dados pelas matrizes acima.
 Por exemplo: (~p  p)  p
 A lei do terceiro excluído: p v ~p
(suponha que p = ½)
Daí temos uma divergência entre a lógica L3 de
Lukasiewicz e o que é sugerido no De
Interpretatione.

Lukasiewicz



A verdade do terceiro excluído é devido ao fato de
seus componentes serem contraditórios e não por
causa dos seus valores de verdade.
Existe portanto um elemento não-verofuncional no
tratamento destas proposições.
Prior [3] considera que o aparecimento da nãoverofuncionalidade em tais proposições é devido
a uma confusão com relação à diferenciação das
duas seguintes sentenças:
Lukasiewicz
i) “Haverá ou não haverá uma batalha naval
amanhã” é verdadeira de acordo com regras
verofuncionais, somente quando pelo menos
uma das duas componentes for verdadeira.
ii) “Amanhã será o caso da seguinte
sentença: há ou não há uma batalha naval”
Lukasiewicz

A sentença i), apesar de salvar a
verofuncionalidade, não possui validade para
todos os casos. (considerando o sistema trivalorado de Lukasiewicz

A sentença ii) não é verofuncional dado que o
conectivo de disjunção é governado pelo operador
não-verofuncional ‘amanhã será o caso...’ (tal
operador não aparece no sistema tri-valorado de
Lukasiewicz)
Problema!

Como tratar as proposições futuras em
matéria contingente a partir de seus valores
de verdade (inclusive o “neutro”: ½ ) e
ainda manter as características lógicas
básicas como por exemplo a
verofuncionalidade?
Propostas:



Para responder a essa questão analisaremos duas
propostas diferentes:
A proposta B
Critica os sistemas tri-valorados de Lukasiewicz e
tenta uma solução a partir da temporalização da
lógica.
A proposta C
Defende que os sistemas tri-valorados de
Lukasiewicz não são supérfluos e que portanto
não devem ser descartados ao se tratar de lógicas
contendo proposições futuras em matéria
contingente.
A proposta B

Bivalência:
“só o discurso no qual reside o verdadeiro e
o falso é um discurso veritativo.”
(De Interpretatione, IV 16b33-17a7)

O Princípio da bivalência desempenha um
papel fundamental na tentativa de se refutar
o determinismo lógico
A proposta B

Diodoro Vs Aristóteles

Diodoro aceita o determinismo.

Aristóteles não aceita o determinismo.
A proposta B
Se atribuirmos à frase “haverá uma batalha
naval amanhã” o valor 1, então certamente a
batalha vai acontecer. Se atribuirmos 0,
então certamente a batalha não vai
acontecer.
 Qualquer que seja o seu valor de verdade
(0 ou 1), o futuro estará fadado a acontecer
em conformidade com este valor.

A proposta B
Muitos interpretes consideram que
Aristóteles não pode refutar o determinismo
lógico sem limitar a validade irrestrita do
princípio de bivalência.
 A proposta B é uma tentativa de resolver o
impasse causado pela ameaça do
determinismo, porém sem abrir mão do
princípio de bivalência irrestrito.

A proposta B
Crisipo e Epicuro admitiam aimplicação do
princípio de bivalência irrestrito ao
necessitarismo universal.
 Crisipo aceita o princípio sem restrição e
portanto o necessitarismo.
 Epicuro recusa o determinismo e daí nega a
universalidade irrestrita do princípio.
(cf. [1] p 173)

A proposta B

Podemos considerar duas etapas ordenadas
das posições citadas acima.
Primeiro: Vale a implicação do princípio de
bivalência irrestrito ao necessitarismo
lógico?
Segundo: Vale o princípio de bivalência
irrestrita?
A proposta B

A maioria dos autores considerados neste
trabalho estão de acordo com a resposta
afirmativa à primeira questão, ou seja:
Princípio de bivalência irrestrito  Necessitarismo lógico
A proposta B
Questão: É possível refutar o argumento
necessitarista contido no capítulo IX do
De Interpretatione sem restringir o princípio
de bivalência?
 Deve-se compreender corretamente os
princípios lógicos ontológicos e a
concepção aristotélica de valor-de-verdade.
(cf. [1] p. 175)

A proposta B
Veritas sequitur esse rerum
 A mudança é logicamente possível
(contrapondo os argumentos eleáticos)
 Conclusão: é preciso introduzir o tempo na
formulação dos primeiros princípios
 Sem tempo não há mudança

A proposta B
O verbo ser, flexionado como por exemplo
na expressão “X é verdadeiro ou falso”,
pode significar o tempo presente ou o
presente omnitemporal.
 Para os defensores da proposta B, o
princípio de bivalência deve ser tomado
como irrestrito e portanto necessário.

A proposta B

A formulação exata do princípio de bivalência
torna-se, por conseguinte, algo como:
“um enunciado é veritativo se, e somente se, ele é,
foi ou/e será verdadeiro ou bem ele é, foi ou/e será
falso”.
(A conjunção “e” se aplica aos enunciados
necessários e a disjunção “ou” aos contingentes e
ambos, a conjunção e a disjunção, não serão aqui
vero-funcionais) (cf. [1] p. 177)
Comentários




Se tomarmos a disjunção “ou’ para os enunciados
contingentes estes passarão a ser necessários.
O problema não se define apenas sobre
enunciados futuros mas sobre sua contingência
(nem sempre temporalizada). Por exemplo: Qual o
valor de verdade da sentença “a camisa é verde”?
As sentenças continuam sem referência mesmo
com a passagem do tempo (o que muda é o
significado da sentença em uma certa data
determinada)
Se temporalizarmos os enunciados perderemos a
verofuncionalidade.
A proposta C




Roman Suszko (1970’s) “there are but two logical
values, true and false”.
Wójcicki-Lindembaum: Mostra que qualquer
lógica tarskiana tem uma semântica multivalorada.
Suszko-daCosta-Scott: mostra que qualquer
semântica multivalorada pode ser reduzida a uma
semântica bi-valorada.
Por que trabalhar com lógicas multivaloradas?
A proposta C




Porque precisamos de uma ponte (algumas vezes)
entre a bi-valoração e a verofuncionalidade. (de um
ponto de vista pragmático).
Os resultados redutivos de Suszko são não
construtivos.
Existe uma maneira de se construir semânticas bivaloradas para qualquer lógica que tenha uma
semântica verofuncional finito-valorada e uma
linguagem suficientemente expressiva.
É indicada ainda uma maneira de se construir um
sistema canônico adequado de seqüentes ou
tableaux.
Bibliografia
[1] Balthazar Barbosa Filho (UFRGS/CNPq). Aristóteles e
o princípio da Bivalência. Analytica, Vol. 9 n 1, 2005.
[2] J.-Y. Beziau (ed.). Carlos Caleiro, Walter Carnielli,
Marcelo Coniglio e João Marcos. Two's Company: “The
Humbug of Many Logical Values” In Logica Universalis
pp 169-189. Birkhäuser Verlag Basel/Switzerland 2005.
[3] Arthur Prior. Three-valued and Intuitionist Logic in
Formal Logic. Claredon Press, Oxford 2a ed. 1962.
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