História da Educação - Período Colonial A ESCOLA DOS COLONIZADORES O COLÉGIO DOS JESUÍTAS Antes de ser uma cidade, São Paulo foi uma escola. No atual Pátio do Colégio, junto à encosta do Tamanduateí, o Colégio dos Jesuítas foi o começo da nossa cidade. A colonização do território, naquela época, teve como ponta de lança uma escola. O processo de colonização tinha nas ordens religiosas, principalmente na Companhia de Jesus, um de seus principais instrumentos. Essa intenção de ocupação se tornava real, palpável e concreta a partir da construção de escolas. O edifício da escola materializava a nova doutrina difundida entre as crianças índias e os filhos dos colonizadores, e o papel de instrumento da colonização refletia-se no edifício. Os assentamentos de frente da ação colonizadora tinham, quase sempre, um colégio, uma escola, uma missão ou um seminário. O edifício do colégio, local da fundação da cidade de São Paulo, abriga o que restou da primeira construção da cidade, de 1554. Foi ali que o padre jesuíta Manuel da Nóbrega celebrou a primeira missa no dia 25 de janeiro, num altar improvisado em uma cabana de madeira, de 14 passos de comprimento por 10 passos de largura. O Pátio do Colégio, na época Largo do Palácio, c. 1862 Crédito: Militão Augusto de Azevedo A reação dos índios à doutrina dos jesuítas não foi tranqüila. Ninguém passa a acreditar em um Deus de um dia para o outro. Houve resistência da cultura indígena, ao mesmo tempo que os bandeirantes paulistas, interessados em aprisionar os índios, entravam em conflito com os catequizadores. Os jesuítas foram expulsos; mais tarde voltaram e retomaram a catequese. O colégio, erguido em uma encosta, funcionava como uma fortificação: os jesuítas pensavam em se proteger tanto dos bandeirantes quanto dos próprios índios. Pátio do Colégio. Crédito: Juca Martins Sob a responsabilidade das ordens religiosas, as construções escolares, como o Colégio de São Paulo de Piratininga, começaram a configurar um padrão de escola religiosa, que abrigava a moradia dos religiosos, as salas de aula, a igreja e demais instalações. As construções tinham características de conventos e seminários. Hoje em dia, da antiga construção do Pátio do Colégio só resta um segmento de parede em taipa de pilão e as catacumbas sob a igreja. Planta da cidade de São Paulo de 1841 Crédito: Rufino Felizardo e Costa Em 1653, os jesuítas conseguiram dominar os índios e começaram a impor sua doutrina novamente. Foi construído um anexo ao colégio, onde foram instalados paulatinamente os primeiros cursos de filosofia, teologia, artes, biblioteca e capela, ocupando uma área de mais de mil metros quadrados. Para essa construção foi utilizada a técnica da taipa de pilão, em que as paredes são feitas de barro comprimido em formas de madeira. Em 1745, houve outra ampliação, e em 1759 a ordem jesuíta foi expulsa por decreto do Marquês de Pombal, responsável pela Secretaria de Negócios Estrangeiros durante o reinado de d. José em Portugal. O governo apropriouse dos bens da Companhia de Jesus, e o antigo casarão colonial foi completamente descaracterizado por profundas reformas. Entre 1765 e 1908, funcionou como Palácio dos Governadores. Nesse período, um desmoronamento resultou na perda do precioso patrimônio da igreja. Em 1932, o Palácio do Governo foi transferido e o velho colégio passou a abrigar a Secretaria da Educação, que lá permaneceu até 1953. O edifício assumia uma função mais próxima de sua vocação original. O ano de 1954 marca a retomada do projeto original. A Companhia de Jesus recebe de volta as instalações e dá-se início à reconstituição do conjunto, nos moldes da terceira construção, quando o prédio ainda era colégio e não edifício público, e permanecem, remanescentes, a cripta, parte de uma parede em taipa de pilão e o antigo torreão. Atualmente o conjunto abriga o Museu de Anchieta, com peças da ordem religiosa do período da colonização do Brasil. Escola, seminário, Palácio do Governo, Secretaria de Estado e museu. Por todas essas transformações passou o sítio onde se originou a cidade de São Paulo. É importante lembrar que a urbanização da nossa cidade teve na escola a referência para sua definição original. A história do Pátio do Colégio se confunde com a da cidade de São Paulo. A execução pioneira da construção original, suas reformas, sua destruição, a construção para abrigar outro uso, de novo a destruição e finalmente a construção de uma réplica (o que conhecemos hoje como o Pátio do Colégio é uma reconstituição quase caricata do edifício original) são etapas reveladoras de um processo pelo qual passou e passa a nossa cidade. ESCOLA OU FORTALEZA? A escolha do local de uma construção é sempre uma decisão estratégica. A localização de uma escola não foge à regra. Foi assim na decisão dos jesuítas quanto à localização do Colégio e é assim até hoje. A escolha foi estudada e pensada levando em consideração a permanente necessidade de defesa dos catequizadores europeus. São Paulo vista da Estrada do Rio; no primeiro plano, proximidades do atual Largo do Brás e, ao fundo, da esquerda para a direita, a Igreja da Boa Morte, Convento e Ladeira do Carmo, a Torre do Recolhimento de Santa Teresa e as Igrejas da Sé e do Colégio, 1827 (lápis e aquarela). Crédito: William John Burchell O colégio foi construído em uma escarpa que permitia acesso praticamente por apenas um lado. Assim, o edifício era também uma fortaleza: o desenho da edificação mostra o conflito cultural entre colonizados e colonizadores. A estreita ligação entre a escola dos jesuítas e a origem da cidade nos leva a refletir sobre o papel atual das escolas na construção da cidade. A escolha do local, o entendimento das orientações pedagógicas e suas configurações espaciais parecem exigir que se pense sobre a escola do presente, uma rede de ensino público com papel tão determinante para a cidade como o Colégio de São Paulo de Piratininga. Pátio do Colégio e entorno, entre 1925 e 1930; no centro, o monumento à fundação de São Paulo Crédito: Anônimo Se em 1554 o receio dos jesuítas era a reação dos nativos e dos bandeirantes contra a sua ação, temos de definir o que levamos em consideração hoje para determinar a localização e o desenho de uma escola. O discurso dos jesuítas era muito claro: eles objetivavam a catequese e a propagação da ideologia cristã. A configuração de uma escola com características de fortaleza, com implantação no terreno como uma fortificação, revela claramente os objetivos de seus construtores. Dessa forma, se hoje falamos também através dos nossos prédios, temos de ouvir o que nossas escolas estão dizendo, ou entender o que dizemos através de nossas escolas. Fonte: São Paulo 450 anos – BEI