Cemitério da Memoria - Diálogos

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Cemitério da Memoria - Diálogos
“Porque escrever memórias é um ajuste de contas do eu com o eu…”
ontem
hoje
amanhã
apresentam
cemitério da memória
fragmentos da vida cotidiana
sábado
1930
Há cidades que não vem à tona
ficam entre nós, eternamente submersas
domingo 1940
Herói de batalhas de confete
e lança-perfume,
as únicas batalhas que admiro
segunda-feira 1950
Já não és a cidade confidencial
e borralheira de outrora…
terça-feira
1960
Inverte-se enfim a arquitetura,
onde havia pedra
resta agora outra figura:
Ruina em que o oceano
se ajoelha e bate, eternamente bate,mas onde jamais se apura
quarta-feira
1970
É preciso para os ponteiros
no fim do sonho, enquanto é tempo
quinta-feira
1980
Pedro Nava
Locução:
Amigos, nada mudou em essência.
Os salários mal dão para os gastos,
As guerras não terminaram
E há vírus novos e terríveis,
Embora o avanço da medicina.
Volta e meia um vizinho
Tomba morto por questões de amor.
Há filmes interessantes, é verdade,
E como sempre, mulheres portentosas
Nos seduzem com suas bocas e pernas,
Mas em matéria de amor
Não inventamos nenhuma posição nova.
Alguns cosmonautas ficam no espaço
Seis meses ou mais, testando a engrenagem
E a solidão.
Em olimpíada há recordes previstos
E nos países, avanços e recuos sociais.
Mas nenhum pássaro mudou seu canto
Com a modernidade.
Reencenamos as mesmas tragédias gregas,
Relemos o Quixote, e a primavera
Chega pontualmente cada ano.
Alguns hábitos, rios e florestas
Se perderam.
Ninguém mais coloca cadeiras na calçada
Ou toma a fresca da tarde,
Mas temos máquinas velocíssimas
Que nos dispensam de pensar.
Sobre o desaparecimento dos dinossauros
E a formação das galáxias
Não avançamos nada.
Roupas vão e voltam com as modas.
Governos fortes caem, outros se levantam,
Países se dividem
E as formigas e abelhas continuam
Fiéis ao seu trabalho.
Nada mudou em essência.
Cantamos parabéns nas festas,
Discutimos futebol na esquina
Morremos em estúpidos desastres
E volta e meia
Um de nós olha o céu quando estrelado
Com o mesmo pasmo das cavernas.
E cada geração, insolente,
Continua a achar
Que vive no ápice da história.
Lettering:
Quem não encontrar poesia no infinitamente pequeño jamais a encontrará no
infinitamente grande sexta-feira hoje
A memória é uma construção do futuro
mais que do passado
Aqui jaz um século que se chamou moderno e olhando presunçoso o passado e o
futuro julgou-se eterno; século que de si fez tanto alarde e, no entanto, já vai
tarde um século filmado que o vento levou…
“O memorialista é a forma anfíbia de historiador e ficcionista…”
Pedro Nava
O documentarista é, invariavelmente, um curioso.
Para Rachel Jardim e Dziga Vertov
e todos aqueles que admiram o século em que a lua deixou de ser dos
namorados...
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