MORIN, EDGAR. Os setes saberes necessários à Educação do futuro.

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MORIN, EDGAR. Os setes saberes necessários à Educação do futuro.
São Paulo: Cortez, 2000.
As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão
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É impressionante que a educação que visa a transmitir conhecimentos seja
cega quanto ao que é o conhecimento humano, seus dispositivos,
enfermidades, dificuldades, tendências ao erro e à ilusão, e não se
preocupe em fazer conhecer o que é conhecer.
De fato, o conhecimento não pode ser considerado uma ferramenta ready
made, que pode ser utilizada sem que sua natureza seja examinada. Da
mesma forma, o conhecimento do conhecimento deve aparecer com
necessidade primeira, que serviria de preparação para enfrentar os riscos
permanentes de erro e de ilusão, que não cessam de parasitar a mente
humana. Trata-se de armar cada mente no combate vital rumo à lucidez.
È necessário introduzir e desenvolver na educação o estudo das
características cerebrais, mentais, culturais dos conhecimentos humanos,
de seus progressos e modalidades, das disposições tanto psíquicas quanto
culturais que o conduzem ao erro ou à ilusão.
Os princípios do conhecimento pertinente
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Existe um problema capital, sempre ignorado, que é o da necessidade de
promover o conhecimento capaz de apreender problemas globais e
fundamentais para neles inserir os conhecimentos parciais e locais.
A supremacia do conhecimento fragmentado de acordo com as disciplinas
impede freqüentemente de operar o vínculo entre as partes e a totalidade, e
deve ser substituída por um modo de conhecimento capaz de apreender
objetos em seu contexto, sua complexidade, seu conjunto.
È necessário desenvolver a aptidão natural do espírito humano para situar
todas essas informações em um contexto e um conjunto. É preciso ensinar
os métodos que permitam estabelecer as relações mútuas e as influências
recíprocas entre as partes e o todo em um mundo complexo.
Ensinar a condição humana
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O ser humano é a um só tempo físico, biológico, psíquico, cultural, social,
histórico. Esta unidade complexa da natureza humana é totalmente
desintegrada na educação por meio das disciplinas, tendo-se tornado
impossível aprender o que significa o ser humano. É preciso restaurá-la, de
modo que cada um, onde quer que se encontre, tome conhecimento e
consciência, ao mesmo tempo, de sua identidade complexa e de sua
identidade comum a todos os outros humanos.
Desse modo, a condição humana deveria ser o objeto essencial de todo o
ensino.
Este capítulo mostra como é possível, com base nas disciplinas atuais,
reconhecer a unidade e a complexidade humanas, reunindo e organizando
conhecimentos dispersos nas ciências da natureza, nas ciências humanas,
na literatura e na filosofia, e põe em evidência o elo indissolúvel entre a
unidade e a diversidade de tudo que é humano.
Ensinar a identidade terrena
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O destino planetário do gênero humano é outra realidade chave até agora
ignorada pela educação. O conhecimento dos desenvolvimentos da era
planetária, que tendem a crescer no século XXI, e o reconhecimento da
identidade terrena, que se tornará cada vez mais indispensável a cada um e
a todos, devem converter-se em um dos principais objetos da educação.
Convém ensinar a história da era planetária, que se inicia com o
estabelecimento da comunicação entre todos os continentes no século XVI,
e mostrar como todas as partes do mundo se tornaram solidárias, sem,
contudo, ocultar as opressões e a dominação que devastaram a
humanidade e que ainda não desapareceram.
Será preciso indicar o complexo de crise planetária que marca o século XX,
mostrando que todos os seres humanos, confrontados de agora em diante
aos mesmos problemas de vida e de morte, partilham um destino comum.
Enfrentar as incertezas
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As ciências permitiram que adquiríssemos muitas certezas, mas igualmente
revelaram, ao longo do século XX, inúmeras zonas de incerteza. A
educação deveria incluir o ensino das incertezas que surgiram nas ciências
físicas (microfísicas, termodinâmica, cosmologia), nas ciências da evolução
biológica e nas ciências históricas.
Seria preciso ensinar princípios de estratégia que permitiriam enfrentar os
imprevistos, o inesperado e a incerteza, e modificar seu desenvolvimento,
em virtude das informações adquiridas ao longo do tempo. É preciso
aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos
de certeza.
O abandono das concepções deterministas da história humana que
acreditavam poder predizer nosso futuro, o estudo dos grandes
acontecimentos e desastres do nosso século, todos inesperados, o caráter
doravante desconhecido da aventura humana devem-nos incitar a preparar
as mentes para esperar o inesperado, para enfrentá-lo. É necessário que
todos os que se ocupam da educação constituam a vanguarda ante a
incerteza de nossos tempos.
Ensinar a compreensão
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A compreensão é a um só tempo meio e fim da comunicação humana.
Entretanto, a educação para a compreensão está ausente no ensino. O
planeta necessita, em todos os sentidos, de compreensão mútua.
Considerando a importância da educação para a compreensão, em todos
os níveis educativos e em todas as idades, o desenvolvimento da
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compreensão pede a reforma das mentalidades. Esta deve ser a obra para
a educação do futuro.
A compreensão mútua entre os seres humanos, quer próximos, quer
estranhos, é daqui para frente vital para que as relações humanas saiam de
seu estado bárbaro de incompreensão.
Daí decorre a necessidade de estudar a incompreensão a partir de suas
raízes, suas modalidades e seus efeitos. Este estudo é tanto mais
necessário porque enfocaria não os sintomas, mas as causas do racismo,
da xenofobia, do desprezo. Constituiria, ao mesmo tempo, uma das bases
mais seguras da educação para a paz, à qual estamos ligados por essência
e vocação.
A ética do gênero humano
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A educação deve conduzir à “antropo-ética”, levando em conta o caráter
ternário da condição humana, que é ser ao mesmo tempo
indivíduo/sociedade/espécie. Nesse sentido, a ética indivíduo/espécie
necessita do controle mútuo da sociedade pelo indivíduo e do indivíduo pela
sociedade, ou seja, a democracia; a ética indivíduo/espécie convoca, ao
século XXI, a cidadania terrestre.
A ética não poderia ser ensinada por meio de lições de moral. Deve formarse nas mentes com base na consciência de que o humano é, ao mesmo
tempo, indivíduo, parte da sociedade, parte da espécie. Carregamos em
nós essa tripla realidade. Desse modo, todo desenvolvimento
verdadeiramente humano deve compreender o desenvolvimento conjunto
das autonomias individuais, das participações comunitárias e da
consciência de pertencer à espécie humana.
Partindo disso, esboçam-se duas grandes finalidades ético-políticas do
novo milênio: estabelecer uma relação de controle mútuo entre a sociedade
e os indivíduos pela democracia e conceber a Humanidade como
comunidade planetária. A educação deve contribuir não somente para a
tomada de consciência de nossa Terra-Pátria, mas também permitir que
esta consciência se traduza em vontade de realizar a cidadania terrena.
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