SUS oferece tratamento para mães e filhos portadores do HIV O acompanhamento pré-natal é fundamental para evitar que mães infectadas transmitam vírus da aids aos filhos. O HIV faz parte da vida de Fátima (nome fictício) desde o nascimento. Quando tinha dois anos, vivia doente. Foi então que os médicos descobriram que a menina tinha sido infectada pelo vírus ainda durante o parto. Aos 6, Fátima viu a mãe morrer de aids. Hoje, aos 18 e moradora da periferia de São Paulo, a jovem diz não ter medo de nada, nem mesmo que Mateus, seu filho de sete meses, carregue o HIV no sangue. Afinal, Fátima fez o pré-natal corretamente e começou o tratamento preventivo com anti-retrovirais antes do nascimento do filho e, com isso, reduziu para 1% as chances de o bebê ter o vírus. Fátima faz parte da primeira geração de crianças que herdaram o HIV de suas mães e sobreviveu à aids. Hoje muitos levam, como ela, uma vida normal. Sonham, fazem planos, trabalham, namoram, casam, têm filhos. Nada disso seria sequer imaginável, há quase duas décadas, quando o Sistema Único de Saúde (SUS) começou a oferecer atendimento no prénatal e parto às gestantes soropositivas e a seus recém-nascidos, evitando a chamada “transmissão vertical”, ou seja, a transmissão do HIV de mãe para filho. Todos os anos, casos como o de Fátima e Mateus se repetem. O grande desafio do Ministério da Saúde é reduzir a menos de 1% o número de recém-nascidos portadores do vírus da aids até 2007. O compromisso foi firmado junto ao Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). A taxa de transmissão vertical do HIV no País é de aproximadamente 3,7%. No caso das crianças abaixo de cinco anos, em ambos os sexos, uma queda pequena, porém constante, no número de ocorrências tem sido verificada, desde 1998. Naquele ano, registraram-se 943 casos. Em 2004, foram 703. Até junho de 2005, notificaram-se 221. "Esses números refletem as ações de prevenção e de controle da transmissão vertical do HIV, que começaram a ser implementadas de forma mais efetiva a partir da segunda metade da década passada. Entretanto, ainda temos muito a avançar para atingir a meta até 2007", afirma o ministro da Saúde, Saraiva Felipe. Pré-natal – O número de infecções de mãe para filho durante o parto ou amamentação se relaciona diretamente à qualidade do pré-natal. O Sistema Nacional de Nascidos Vivos de 2002 mostra que cerca de 93% das mulheres têm acesso ao serviço. Mas não basta fazer um número mínimo de consultas. Os profissionais de saúde devem orientar as mulheres grávidas sobre a importância de conhecer sua condição sorológica com antecedência, pois o teste não é obrigatório no país. Saber que é soropositiva justamente na hora do parto representa um trauma para a mulher e diminui as chances de que a criança não adquira o HIV. Não à toa a transmissão vertical tem índices maiores justamente nas regiões em que o acompanhamento das mulheres grávidas é mais deficitário. Norte e Nordeste são os principais focos de atenção do governo federal, que trabalha junto com governos estaduais e municipais intensivamente na capacitação dos profissionais de saúde, estimulando-os para que sempre ofereçam o teste do HIV às gestantes. Como muitas mulheres vivem em regiões isoladas e têm dificuldade de chegar aos serviços de saúde, uma das principais estratégias usadas pelo Programa Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde, com o apoio do Unicef, é a ampliação do acesso das gestantes e adolescentes ao diagnóstico do HIV. A ação vai priorizar regiões de difícil acesso e oferecer testes rápidos de HIV e sífilis para 25 mil gestantes de seis cidades do semi-árido nordestino, além de reforçar a testagem na região Norte. Também terão acesso aos testes mulheres que vivem na periferia de uma capital nordestina, que ainda será definida. No ano passado, 75% das gestantes fizeram o teste do HIV no Brasil e 63% conheceram o resultado antes do parto. Estima-se que existam cerca de 13 mil gestantes infectadas – cerca de 50% delas recebem o tratamento preventivo porque souberam da sua sorologia. A terapia prevê a administração do medicamento AZT na forma oral, a partir da décima quarta semana de gestação, e em forma intravenosa na hora do parto. O bebê nascido de mãe portadora começa a tomar AZT até oito horas depois do nascimento, ao longo de seis semanas e não é amamentado pela mãe. Essas medidas reduzem de 30% para menos de 1% a possibilidade de as crianças serem contaminadas pela mãe ao nascer. O Ministério da Saúde recomenda a substituição do aleitamento materno pelo leite artificial ou por leite humano pasteurizado, disponível nos bancos de leite. O SUS garante a fórmula infantil gratuitamente em substituição ao leite materno. Experiência – Faz 20 anos que a médica infectologista Marinella Della Negra recebeu o primeiro paciente recém-nascido com HIV, atendendo ao pedido de uma residente da pediatria do Emílio Ribas, em São Paulo, onde já trabalhava. Prestou assistência a uma menina, cuja mãe estava em estado terminal, na maternidade do hospital. Na época, não se falava ainda em anti-retrovirais e ter o vírus HIV equivalia a uma sentença de morte. Os bebês eram tratados com imunoglobulina intravenosa. Com os casos e o tempo, dra. Marinella e equipe acabaram se tornando uma espécie de referência para médicos e pacientes. Ela avalia que, a partir de 1996, o uso do AZT nos tratamentos preventivos foi fundamental para reduzir a transmissão vertical. Outra mudança importante foi a inclusão da testagem para o HIV no protocolo do pré-natal. “Em 1996, recebíamos em torno de cinco a seis crianças por dia para testagem. Hoje, recebemos esse mesmo número, em média, por mês, grraças aos testes feitos no pré-natal”, comemora a médica.