rede protegerá a biodiversidade e o conhecimento

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Rede protegerá a biodiversidade e o
conhecimento tradicional da Amazônia
Data: 10/11/03
Órgãos públicos e organizações não-governamentais deram início a
uma
iniciativa inédita na Amazônia com a articulação de uma rede
para a proteção
dos direitos intelectuais do conhecimento tradicional
sobre a Biodiversidade
da região. É a Rede Norte de Propriedade
Intelectual, Biodiversidade e Conhecimento Tradicional.
A Carta de Intenções, assinada por 23 entidades em Belém (PA), foi
lançada
durante o seminário "Saber Local/Interesse Global:
Propriedade Intelectual, Biodiversidade e Conhecimento Tradicional na
Amazônia", realizado em
setembro. Ela defende o incentivo à reflexão
ética nas pesquisas que
envolvam povos indígenas e comunidades
tradicionais. Propõe também a criação
de estratégias regionais de
abordagem do Sistema Internacional de
Propriedade Intelectual para
a articulação interinstitucional e disseminação
de informações,
promovendo ações locais de implementação de políticas
públicas de
desenvolvimento em bases justas e sustentáveis.
Coordenadora do Núcleo de Propriedade Intelectual e Pesquisa de
Patentes
Biotecnológicas do Centro Universitário do Pará (Cesupa), a
advogada Eliane
Moreira vê a Rede Norte como um espaço de
articulação para a geração de
ações estratégicas de desenvolvimento
sustentável na Amazônia. "Queremos a
participação de instituições
públicas e privadas, sociedade civil organizada
e representações de
povos e comunidades tradicionais para
desenvolvermos
ações
cooperativas de compreensão da propriedade intelectual e suas
interações com a biodiversidade, além da valorização do conhecimento
tradicional", destaca. A Cesupa realizou com o Museu Emílio Goeldi o
seminário que foi o ponto de partida da iniciativa. "A Rede está na etapa
de formação e articulação, demandando uma participação efetiva das
Organizações da sociedade civil", observa.
Atualmente, estão sendo implantadas comissões estaduais e a
secretaria
executiva da Rede. "Só depois desta etapa é que
delinearemos o plano de
ações para 2004, que contará com a
realização do 1º Encontro da Rede e de
pelo menos um curso de
capacitação na área de propriedade intelectual",
esclarece a
professora de Direito Ambiental. Para ela, é um desafio que as
entidades da região e de outros partes do país que tenham interesse no
tema
têm que enfrentar, pois uma das premissas da Convenção da
Biodiversidade
[documento que atesta o compromisso assumido pelos
participantes da
conferência Rio-92] é a soberania dos países sobre
seus recursos, incluindo
sua biodiversidade", afirma. Segundo a
advogada, a internacionalização
defendida por muitos feriria de morte
esse direito soberano do país. "Mas
não podemos ser ingênuos:
existem formas indiretas de internacionalização
acontecendo hoje,
como a privatização de recursos e conhecimentos sem a
devida
repartição de benefícios ou ainda o pedido de patentes do todo ou de
parte dos seres vivos da região", observa.
O mesmo defende o cientista social José Arnaldo de Oliveira,
representante
na Rede Norte do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA),
afirmando que a
preocupação fundamental tem de ser a proteção do
conhecimento tradicional e
da biodiversidade da Amazônia. "Um dos
lemas do GTA, que congrega
entidades de nove estados, é: em vez
de internacionalizar a região, vamos
'amazonizar' o mundo,
potencializando o desenvolvimento sustentável local
por meio da
cooperação entre os países pan-amazônicos, não apenas entre
governos, mas principalmente entre os movimentos sociais da região".
Um
desafio, segundo ele, é combater o sucateamento do Estado ao
longo da última década, prejudicando órgãos como o Instituo Nacional
de Propriedade
Industrial (INPI) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos
Naturais Renováveis (Ibama). "Mas temos uma esperança
na ampliação da
cooperação entre sociedade e Estado, combatendo o
tráfico de elementos da
biodiversidade", diz o coordenador de
Comunicação e Campanhas do GTA.
Segundo José Arnaldo, é preciso localizar prioridades e formas de
atuação
conjuntas para construir uma gestão coletiva da
biodiversidade da Amazônia
que sirva de modelo para o resto do país.
"A Amazônia nos leva a pensar a
América Latina, ao contrário do
silêncio mantido por parte da mídia
convencional, pois não se
resolvem suas questões olhando apenas para o
Brasil. Nascentes de
um rio nos Andes ou em Goiás podem comprometer, se destruídas, a
saúde de muitas pessoas e seres vivos a milhares de
quilômetros de
distância", analisa, acrescentando que "ali tudo é muito
interligado e
essa nova visão pode transformar padrões resistentes e
coloniais do
país".
O perigo da biopirataria
Para Eliane Moreira, o maior desafio da Rede Norte é enfrentar a
biopirataria que infesta a Amazônia. "Sem dúvida, é um dos maiores
problemas
que a Amazônia enfrenta, porque tem várias facetas e
necessita de uma
abordagem complexa, pois muito do que chamamos
de pirataria é fruto de
cooperações científicas informais ou
subservientes, além do próprio
desconhecimento sobre o sistema de
propriedade intelectual", observa.
Outro
perigo, para a advogada, é o discurso de que os recursos da
biodiversidade
são patrimônio comum da humanidade ou o que
classifica os conhecimentos
tradicionais como conhecimentos nãocientíficos - e, portanto, inferiores.
"Acredito que precisamos enfrentar essas questões no campo ainda
mais amplo
da proteção intelectual, seja ela de produtos culturais
como de patrimônios
coletivos de comunidades locais ou de povos
indígenas", acrescenta.
Segundo a diretora-executiva do Instituto de Pesquisas da Amazônia,
a
economista Oriana Almeida, leis precisam ser formuladas com
rapidez para
deter a biopirataria. "Tem aumentado no governo o
interesse em estruturar
ações contra esta apropriação de nossa
biodiversidade, o que é fundamental,
pois a pressão exercida sobre o
uso de recursos e do conhecimento das
populações locais tem sido
cada vez maior", alerta. Segundo ela, as
possibilidades da região são
imensas, com inúmeros produtos e processos obtidos a partir de frutos,
plantas e outros recursos, já patenteados, o que
revela o interesse do
mercado internacional. Mas ela afirma que outro
problema
fundamental relacionado a esta questão é o desconhecimento que cerca
a região.
O coordenador do GTA concorda: "Pelo menos metade das espécies
animais e
vegetais da Amazônia, que reúne a maior concentração de
florestas primárias
do mundo, não é sequer conhecida pela ciência.
Não só desconhecemos a
riqueza biológica, mas o próprio
conhecimento tradicional de alimentos e
medicamentos, além de
aspectos éticos e culturais sobre a relação
cultura/natureza e
indivíduo/comunidade das populações locais", destaca.
Segundo José Arnaldo de Oliveira, a biopirataria é um aspecto da
relação do
capitalismo com a natureza e a cultura tradicional, sendo
parte de um ciclo
histórico agravado com o surgimento de novas
formas de utilização comercial,
desrespeitando as condições básicas
de sobrevivência das comunidades
tradicionais. "O desafio é grande
para a Rede, mas se deixarmos que as
demandas comunitárias
norteiem o trabalho das entidades da região na organização de modos
sustentáveis de produção, poderemos mobilizar e envolver todos nesta
luta", finaliza.
Fonte: www.rits.org.br
Em: 11/05/2005
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