O Processo De Humanização Da Natureza Paulo Meksenas A

Propaganda
O Processo De Humanização Da Natureza
Paulo Meksenas
A) PEQUENO ESBOÇO DA EVOLUÇÃO DO SER HUMANO
A existência do planeta Terra é superior a quatro bilhões de anos, segundo pesquisas
geológicas. A vida também é antiga, pois os biólogos acreditam que as primeiras células vivas datam de três
bilhões de anos. Entretanto, o aparecimento dos animais superiores, aqueles que possuem uma
anatomia complexa, é recente:datam de setenta milhões de anos. O ser humano, mamífero
descendente de um ramo dos primatas, se desenvolve há três milhões de anos. Até nossos dias, a evolução do ser
humano esteve condicionada por uma série de mudanças na espécie, que só foram possíveis devido a sua
capacidade de pensar e lutar pela superação de suas necessidades. Foi enfrentando com o raciocínio necessidades
como alimentação, vestuário ou moradia que o gênero humano se desenvolveu. Nesse processo de evolução, a
utilização das mãos foi decisiva.A partir do momento que um grupo específico de primatas conseguiu
adotar uma postura ereta,as mãos começaram a ser usadas como ferramentas para pegar e segurar objetos. Ao
contrário de outros mamíferos, quando o homem passou a utilizar apenas os pés para se locomover., deixando as
mãos livres, pôde fabricar outras ferramentas que o ajudaram a enfrentar o meio em que vivia.
Nasce assim o trabalho: atividade que exige do gênero humano ouso constante das
capacidades mentais e físicas na construção dos meios que possibilitem a sobrevivência.
Vale salientar que iodo esse processo, além de levar milhares de anos, não atingiu um indivíduo
isoladamente, mas todos.
Essas conquistas se deram dentro de um processo educativo coletivo, no qual os seres humanos
aprenderam juntos a sobreviver. Foi esse enfrentamento coletivo com a natureza que
possibilitou o desenvolvimento da linguagem.
De posse das formas de expressão e comunicação que a linguagem possibilitou e,
através do uso de novas ferramentas, os seres humanos aperfeiçoaram seus hábitos alimentares,
o que implicou um maior desenvolvimento do seu modo de viver e de pensar. Assim, com o
passar do tempo, o gênero humano começa a utilizar o fogo, a roda, os metais, novos
tipos de alimentos...
O trabalho leva o ser humano a seguir o caminho da civilização: a partir do
momento em que transforma a natureza, o homem também se transforma.
A natureza, por sua vez, passa a trazer as marcas da ação humana. Passando a
viver em lugares fixos através de atividades agrícolas e pastoris, foi possível ao homem
organizar-se em tribos. As tribos evoluem, as atividades ligadas ao trabalho .se dividem,nasce a
especialização das funções: enquanto alguns caçam, outros plantam ou ainda fabricam cestos.
Aparecem as regras de convivência, as crenças, as tradições, o desejo de domínio de uma tribo
sobre outra. As lutas entre tribos rivais levou às primeiras formas de exploração do homem pelo
homem.
Nascem as primeiras formas de escravidão.
É em meio à divisão social do trabalho e à escravidão que vão aparecendo as primeiras
cidades. O início da vida urbana traz novas atividades como o comércio, a navegação, o
artesanato. A cidade institui nova forma de viver; a troca de idéias passa a ser maior. Surgem
novas formas de organizar a vida: as normas se tornam leis e as leis, por sua vez, fixam
costumes, tradições e maneiras de agir que são tidas como convenientes pelo grupo social.
Nasce assim a sociedade: uma vida em grupo que se caracteriza por apresentar relações
sociais complexas onde, segundo Durkheim, o interesse coletivo impõe regras às condutas
individuais. As primeiras grandes organizações sociais complexas aparecem entre 4000 e 2000
a.C. São as civilizações do Egito, Mesopotâmia, Fenícia, índia, China, Grécia e as civilizações
americanas pré-colombianas.
B) QUANDO A EDUCAÇÃO SE DÁ ATRAVÉS DO MITO
Ao mesmo tempo em que o gênero humano evoluiu, transformando a natureza
através do trabalho, o ser humano também desenvolveu idéias, valores e crenças sobre
seu modo de vida. As pessoas não só trabalham, também refletem e representam o mundo em
que vivem. Esse fato faz com que o ser humano se preocupe em transmitir suas experiências
cotidianas a seus semelhantes. Aquilo que se aprende na prática é veiculado para
outras pessoas, o que possibilita que o conhecimento humano sobre a natureza não se perca,
mas se acumule de geração em geração. Os mais velhos ensinam aos mais jovens os segredos da
sobrevivência e as formas possíveis de entender o mundo em que vivemos.
Nasce assim a educação: maneiras de transmitir e assegurar a outras pessoas o
conhecimento de crenças, técnicas e hábitos que um grupo social já desenvolveu a partir de
suas experiências de sobrevivência. Com isso, podemos afirmar que a educação
também é dimensão essencial na evolução do ser humano, pois em cada conquista rumo a
civilização também se faz presente a necessidade de transmissão aos semelhantes.
A educação nasce como meio de garantira outras pessoas aquilo que um
determinado grupo aprendeu.
A princípio, a educação é informal, nasce de modo espontâneo, sem necessitar de
professores ou escolas, está em todo lugar e atinge a todos em meio a suas atividades
cotidianas. Onde um sabe, faz e ensina; outro não sabe, observa e aprende. Nas palavras do
antropólogo Carlos Rodrigues Brandão, a educação aparece numa sociedade indígena
quando: "As meninas aprendem com as companheiras de idade, com as mães, as avós,as
irmãs mais velhas, os velhos sábios da tribo, com esta, ou aquela especialista em algum tipo de magia
ou artesanato. Os meninos aprendem entre jogos e brincadeiras de seus grupos de idade, aprendem com os pais, os
irmãos da mãe, os avós, os guerreiros,com algum xamã (mago, feiticeiro), com os velhos em volta das fogueiras.
Todos os agentes desta educação de aldeia criam a parte situações que, direta ou indiretamente, forçam iniciativas
de aprendizagem e treinamento. Elas existem misturadas coma vida em momentos de trabalho, de lazer, de
camaradagem ou de amor. Quase sempre não são impostos e não é raro que sejamos aprendizes os que tomam a
seu cargo procurar pessoas e situações: de troca que lhes possam trazer algum aprendizado". 'Vemos que a
educação nasce como processo comunitário de ensinar e aprender, ligado com as necessidades de cada grupo
social. Essas formas primárias de socialização estão presentes, não só nas sociedades do passado, nem só nas
sociedades indígenas,mas também fazem parte da nossa sociedade urbano-industrial, pois, nos dias de hoje, mesmo
existindo uma instituição especializada em educar (a escola), vemos também a existência de toda uma rede de
relações educativas informais na família, no trabalho ou no lazer.
Podemos também afirmar que essa educação se dá através do mito.
O que isso significa?Podemos definir simplificadamente o mito como conjunto de histórias, tendas,
crenças, religiões ou ritos que compõem a vida de qualquer povo. Us mitos carregam mensagens que se traduzem
nos costumes e na tradição de um povo, são uma maneira possível de explicar um modo de vida. Se a filosofia ou
a ciência explicam o mundo através da razão, um mito o explica pela fé (crença sem necessidade de
provas).
Podemos afirmar que o ser humano não se caracterizou sempre por entender o mundo através das provas
que o raciocínio lógico 'lhe oferece. Antes de explicá-lo racionalmente, o ser humano sente o meio em que vive
(tem medo, coragem, ansiedade);o mito fez com que o ser humano procurasse entender o mundo através do
sentimento e buscando a ordem das coisas. Por isso omito é educativo; traz mensagem ou normas que podem
criar um tipo de comportamento no indivíduo necessário para a vida em grupo
Por exemplo, há um mito muito difundido entre alguns índios do Brasil, no qual a origem da noite é atribuída à
atitude de um grupo que, não obedecendo às tradições do seu povo, quebrou um coco proibido. Dali fugiu a
noite, escurecendo toda a mata. Os deuses, sentindo piedade dos demais índios, devolveram-lhes a
claridade do dia, mas com a condição de que agora seria sempre intercalada comum período noturno, para
que todos se lembrassem do ocorrido.Não nos preocupando em saber se realmente a existência da noite
pode ser explicada por esse mito ou pela idéia científica do movimento do globo terrestre, o que importa é saber que
esse mito acaba sendo educativo, porque ele fixa uma norma social: os perigos que podem aparecer a um
grupo quando não se respeitam certas tradições ou o cuidado que devemos ter com o desconhecido. . .
importante salientar que o mito não é algo do passado apenas; em nossa sociedade urbano-industrial,
também vivemos ligados aos mitos: o carnaval ou o futebol são, por exemplo, atividades que nos fornecem mitos
que dão origem a modelos e padrões de comportamentos sociais. Em relação ao passado, a diferença é que não
possuímos apenas a consciência mítica, temos também a consciência filosófica e a consciência científica,
formas racionais de explicar o mundo.
Na época das primeiras civilizações , o conhecimento humano ainda estava nas primeiras etapas de
desenvolvimento e por isso existia apenas a consciência mítica: esta era a única forma possível de pensar. Será
apenas com o desenvolvimento da civilização grega clássica (aproximadamente 300 a.C.) que o ser humano
ocidental começa a entender aquilo que ocorre no mundo, não só pela emoção, mas racionalmente. É
nesse momento que nasce a filosofia.
C) A CONSCIÊNCIA MÍTICA E A CONSCIÊNCIA FILOSÓFICA
O gênero humano desenvolve de tal modo sua consciência no tempo que chega um momento onde não basta
sentir o mundo criando valores (mitos) sobre o mundo. Surge o desejo de descobriras leis que
regem o nosso mundo, a querer entender o mundo de modo racional. Nesse sentido, podemos
afirmar que a filosofia se opõe ao mito, pois a consciência filosófica não se limita a sentir o
mundo. É sua ambição interpretá-lo de modo racional para, em seguida,questionar a realidade.
Enquanto o mito, através de histórias e crenças, contribuía para o ser humano aceitar o
mundo e se adaptar, a filosofia luta por descobrir o porquê das coisas e a possibilidade de
lhes modificar a ordem. Daí a importância da antiga civilização grega clássica; é a primeira
vez que um grupo humano deixa de se guiar apenas pela consciência mítica para ter uma
consciência crítica da realidade. Pitágoras foi quem pela primeira vez forjou a palavra
filosofia, que pode ser traduzida como sendo a atitude de "amor à sabedoria". Nesse sentido,
podemos dizer que a consciência filosófica é um modo de pensar que pretende sempre buscar a
verdade. Para isso, a postura básica é duvidar de todo conhecimento já instituído. Um dos mais
importantes filósofos da Grécia, Sócrates, afirmava que não existe no mundo conhecimento
pronto e acabado e que se desejamos chegar à raiz do conhecimento, devemos — em primeiro
lugar — criticar o que já conhecemos. O método socrático de buscar a verdade constitui-se em
duas etapas fundamentais: a ironia e a maiêutica.
Na primeira etapa, devemos desenvolver perguntas sobre aquilo que já é tido como o
conhecimento verdadeiro. Perguntas bem-formuladas nos levariam a duvidar daquilo que já
conhecemos para, na segunda etapa, podermos construir um conhecimento novo que no futuro,
seria de novo questionado, dando origem a outro dado do conhecimento,e assim por diante.
Nesse sentido, afirmamos que a filosofia é uma tentativa de entender o mundo
racionalmente, contribuindo para o desenvolvimento de uma postura que procura sempre
questionar as certezas antigas na busca de novas certezas. Interessa muito relembrar que a
consciência filosófica se desenvolve no seio duma sociedade (Grécia) já dividida entre escravos
e senhores. Isso implica a divisão entre aqueles que produzem e aqueles que usufruem o
produzido; aqueles que organizam e dirigem e aqueles que são dirigidos. Por isso, a filosofia
não será atividade criativa ao alcance de todos: as mulheres gregas e os escravos estarão dela
excluídos.
Nasce a hierarquização do saber: isto é, a sociedade se divide entre aqueles que podem saber
muito (os senhores que eram filósofos), aqueles que podem saber um pouco (apenas senhores) e aqueles
que não devem saber quase nada (mulheres e escravos). Se na sociedade tribal o saber é comunitário,
isto é, todos aprendem e ensinam, nas primeiras sociedades complexas e ainda hoje o saber é o
privilégio de alguns. Percebemos que quanto mais se desenvolvem as sociedades, maior é a divisão entre
os que podem aprender e aqueles que não podem. Nesse momento que a educação passa a não
ser a mesma para todos; teremos de um lado a educação do senhor, que o levará a ser dominador e
de outro, a educação do escravo, que o levará a ser dominado. Aqui a educação se altera
profundamente, pois deixa de ser meio de fazer com que todos tenham acesso ao mesmo saber e a uma
vida comunitária, para legitimar e aumentar as desigualdades.
D) A CONSCIÊNCIA FILOSÓFICA E A CONSCIÊNCIA CIENTÍFICA
A partir do século XVII (1601-1700 d.C), nova alteração ocorre no mundo ocidental, a
partir do continente europeu. Começa nova era em que tanto a organização do trabalho como o
conhecimento sofrem modificações. O ser humano deixa de apenas explicar ou questionar racionalmente a
natureza, para se preocupar com a questão de como utilizá-la melhor.
Nasce assim a ciência, um modo de interpretar o mundo com fins técnicos; pois agora não se
trata apenas de entender a raiz das coisas, o importante consiste em saber usar melhor a
natureza para nosso maior progresso e conforto. Na Grécia Antiga (= 500 a.C), o filósofo se
perguntava o porquê da existência das coisas, o cientista do século XVII se pergunta como
utilizar melhor as coisas.
Com essa alteração, o conhecimento, Informação sobre o mundo, se toma muito grande, surgem
novos inventos como o telescópio, a bússola, o microscópio, balanças de precisão. Por fim, o
próprio conhecimento se fragmenta; ao contrário do filósofo, que se preocupa com a totalidade
do saber, o cientista se torna o especialista de um só aspecto desse conhecimento.
Nascem as ciências particulares: a biologia, que estuda os seres vivos: a química, que
estuda as substâncias dos elementos; a física, que se preocupa com o movimento dos elementos;
a história, que estuda o desenvolvimento das relações sociais; a geografia, que estuda a
ocupação humana do espaço e assim por diante. Essa divisão vem de que a ciência esteja preocupada
em entender a natureza com muito rigor: é a busca de um conhecimento exato sobre a realidade
para que se possa agir sobre ela, tirando-se o máximo proveito. A ciência dá origem a uma
linguagem objetiva, que tenta evitar ao máximo as idéias e conclusões ambíguas e, com isso, teremos
as pesquisas seguindo um método rigoroso através dessas etapas:
1- Observação dos fatos, que dá origem a uma Hipótese (pergunta cuja resposta exige a investigação
do cientista).
2- Decomposição dos fatos em partes (análise), que dá origem à experimentação e
atividade prática que visa verificar a hipótese.
3- A reordenação dos fatos (síntese) que dá origem às leis da ciência (é a hipótese
confirmada e generalizada para explicar outros fatos semelhantes).
Para exemplificar, observemos as palavras de Otaviano Pereira, que narra as etapas citadas
anteriormente no caso específico da invenção da vacina contra a varíola, desenvolvida na
Inglaterra por um cientista chamado Jenner:
1."MOMENTO DA OBSERVAÇÃO: Jenner observou que num rebanho de vacas atacadas pela varíola,
as que já haviam sofrido anteriormente a varíola branca (varicela) se salvaram, ao passo que as
outras morriam. Por que? Porque as vacas atacadas com varicela não pegam varíola?
2. HIPÓTESE: surgiu-lhe a idéia de relacionar os dois tem tipos da doença. Desconfiou que algo se
formava no organismo das vacas após a primeira enfermidade. Presumiu que provavelmente o
organismo do animal proporciona uma defesa, uma Imunização natural (hoje chamamos de
anticorpos).
3. EXPERIMENTAÇÃO: Jenner Imaginou que poderia tentar uma imunização artificial, inoculando no
organismo do animal gérmens da doença, apenas de forma débil. É o momento da prática, da aplicação da
'vacina'. Ao extrair um pouco da matéria contaminada das vacas doentes e injetando em vacas
sãs .Estas, então, sofriam apenas levemente de varíola e, após curadas, ficavam Imunizadas
contra a doença.
4. GENERALIZAÇÃO OU LEI; aiJenner conclui que os gérmens patógenos (isto é, que produzem a
doença) Injetados nas vacas sãs provocam, no seu organismo, a produção de anticorpos que
combatiam qualquer gérmen da doença. Isto passa então a ter validade para todos os casos".
Conclui-se que o estudo aprofundado de uma realidade qualquer, para ser considerado
como ciência, precisa seguir inicialmente as etapas citadas: observação, hipótese,
experimentação e lei. Um conjunto de leis dá origem a uma teoria e, várias teorias formam uma
doutrina científica. Um dos primeiros cientistas do século XVII a seguir esse método foi Galileu
Galilei (1564-1642), que conseguiu, entre outras coisas, estabelecer a lei da queda dos corpos,
medir o espaço e o tempo que um corpo usa para atingir um plano e ainda confirmou que o
nosso sistema solar é heliocêntrico, isto é, a Terra e demais planetas giram em torno do
Sol...
E) A ORIGEM DA SOCIEDADE CAPITALISTA
Daquilo que foi discutido até aqui, ficam algumas dúvidas: de que modo a sociedade se
altera a ponto de fazer com que, ao lado da consciência filosófica, apareça agora uma outra consciência: a
científica? Como se apresenta a sociedade contemporânea, que tanto valoriza a ciência? Como
se dá a educação nesse novo período da evolução do ser humano? Para responder a tais
questões, é importante inicialmente nos fixar na Europa dos séculos IV a XIV (301-400 a 15011400 d.C) ,pois foi esse período que deu origem a nossa sociedade atual. Sabemos que no
período citado, a Europa era um continente onde a organização econômica principal girava em
tomo da terra e da propriedade da terra. O modo de vida era ligado ao trabalho rural:
principal fonte de organização social. Por ser a terra fonte de riquezas é que os seus
poucos proprietários se tornavam poderosos: a camada dominante dos senhores feudais, que
compreendia a nobreza e o alto clero. Por outro lado, existia uma imensa maioria de pessoas
forçadas a trabalhar nas terras da nobreza feudal para sobreviver, pagando pelo uso dessa terra
vários tributos: a camada dos servos que compreendia uma imensa população de trabalhadores
pobres.
Nessa sociedade de base agrária, o modo de vida era completamente diferente do que é
hoje em dia: pouco comércio, cidades quase não existiam, eram pouco mais que pequenas
aldeias, o pensamento religioso moldava a vida da maioria das pessoas. A partir do século XIV,
esse mundo começará a se transformar rapidamente. E essa transformação que nos interessa,
pois, de mundo agrário, a Europa caminhou pa ra o mundo urbano-industrial. Essa
mudança não ocorreu em pouco tempo, foram precisos no mínimo três séculos para que ela se
completasse. No entanto, como foi uma mudança social radical, muitos a chamaram de
revolução .Essa revolução que levou a Europa do feudalismo ao capitalismo teve muitas
dimensões e momentos:
Em primeiro lugar, foi uma revolução econômica, pois a organização do trabalho se
alterou profundamente: da sociedade estratificada em apenas dois grandes estamentos, surgiu
novo grupo social muito importante, a camada dos comerciantes e artesãos livres: pessoas que, a
partir do século XIV, já não dependiam mais da terra, e sim de atividades puramente urbanas.
Dos artesãos e comerciantes mais poderosos, surgem aqueles que passam a investir grandes
somas de riquezas em manufaturas.
Essas manufaturas, na verdade, eram as primeiras indústrias, ainda primitivas, mas que já se
caracterizavam pela divisão interna de funções, o trabalho parcelado em inúmeras atividades a
partir da introdução de novas e melhores máquinas e técnicas. Cada operador de máquinas já
não elabora o produto por inteiro, mas apenas uma peça que, somada às peças de outros
operadores isolados, dá origem ao produto final.
É a divisão social do trabalho.
Assim, ao entrarmos nos séculos XVIII e XIX, teremos as fases da Revolução Industrial
que foi a dimensão econômica da revolução que deu origem ao capitalismo. Esse modo de produção que se
originou do comércio e da manufatura foi o responsável pelo desenvolvimento de novas
invenções, técnicas, aumento das atividades produtivas, dando origem à moderna indústria. A
intensa urbanização do nosso século é fruto desse processo e o aparecimento de classes sociais também o é.
Agora, sob a sociedade capitalista, a fonte de riquezas não é mais a terra, mas sim a propriedade
de fábricas, máquinas, bancos, isto é, a propriedade dos meios de produção. Assim, os poucos
proprietários dos meios de produção se constituem na classe empresarial (burguesia) enquanto
que uma imensa maioria de pessoas não-proprietárias se constituem na classe trabalhadora
(proletariado), que, para sobreviver, troca sua capacidade de trabalho por salário.
Em segundo lugar, foi uma revolução política, pois a antiga nobreza feudal acaba por
perder o domínio para a classe burguesa,economicamente mais forte. Enquanto no feudalismo persistiu
uma política que representava os interesses dos senhores feudais e do clero, serão agora os empresários que
passarão a organizar a política e, a partir daí, nasce o Estado moderno, isto é, nascem as formas
de governo eleitas pelo voto e regidas por uma Constituição. Nasce o parlamento e o poder do
Estado se divide em executivo, judiciário e legislativo. Todas essas novas dimensões da política burguesa
devem dar a aparência de que o Estado, acima dos interesses de classe, vem organizar democraticamente a
sociedade. Nasce assim a democracia burguesa.
Em terceiro lugar, foi uma revolução ideológica e científica, pois a visão de mundo sob o
capitalismo se alterou: a idéia de progresso se propaga, como também a idéia de
enriquecimento.A vida, dinâmica e competitiva, faz nascer o sentimento de individualismo. A
ciência, como já aprendemos, se origina a partir de novos métodos de interpretação da natureza.
A partir da observação dos fatos, decomposição cm panes (análise) e de sua reordenação
(síntese) se interpreta uma natureza regida por leis. Isso possibilita, com uma série de novos
inventos, grande domínio do ser humano sobre a natureza, nunca visto antes na história da
civilização.
Download