O “valor” do amor em litígios familiares Salvar • 2 comentários • Imprimir • Reportar Publicado por Nelci Gomes - 18 horas atrás 13 Por Carla Moradei Tardelli e Leandro Souto da Silva A atuação do advogado especialista em Direito de Família pode parecer, muitas vezes, aos olhos de experts em áreas mais concorridas e lucrativas, algo pouco complexo e, na maioria das vezes, a consulta inicial é percebida como o momento em que são trazidas à tona questões mal resolvidas que permearam as relações e as levaram ao término. O que se pode compreender nessa área do Direito é a inversão de valores até então cultuados e defendidos pelos envolvidos. Na maioria dos casos em que atuamos, não poderíamos dizer que as pessoas que nos procuraram eram amorais ou sem princípios éticos. Não. Felizmente não. De uma forma bastante recorrente, o que temos apreendido é a relativização de alguns valores até então inerentes à vida das pessoas, como a compaixão, a solidariedade, a honestidade, a dedicação ao outro, o amor próprio, e o surgimento de atitudes que não fariam parte da vida daquela pessoa se ela não estivesse dentro do turbilhão causado pelo fim da relação afetiva/amorosa e o litígio que daí surgiu. Temos notado uma necessidade de vingança pelo fim do amor, que atinge a todos os envolvidos, mas em especial aos filhos. A dificuldade em aceitar não fazer mais parte da vida daquele que foi objeto de investimento de amor, atenção, fidelidade e tantas outras dedicações diárias torna o “abandonado”, muitas vezes, vingativo e perverso, procurando causar algum mal aquele que ousou dar outro rumo à própria vida. Infelizmente essa ira e essa gana por vingar-se pelo “abandono” acabam prejudicando a relação entre os filhos e o pai ou mãe que tomou a iniciativa de deixar, fisicamente, o ambiente familiar. Procura-se transmitir a eles o desamor que ocorreu entre o casal, surgindo as nefastas situações de alienação parental e o consequente afastamento físico e emocional entre aqueles que nunca deveriam ser apartados. Além da vingança emocional, com a utilização de crianças e adolescentes já fragilizados com a mudança da dinâmica familiar, surge também a vingança econômica. A despeito de alimentos estabelecidos ou propostos judicialmente, da obrigatória solidariedade no sustento dos filhos por ambos os genitores, o pai ou a mãe que busca atingir o ex parceiro de todos os modos, transforma os alimentos em um modo de vida e de constantes ações revisionais. Aquele que deveria prestá-los atrasa os depósitos, faz descontos indevidos, exige, ilegalmente, prestação de contas do guardião. Enfim, também deixa de lado os valores que pratica na vida diária, com colegas, amigos e superiores, tornando-se mesquinho e submetendo o outro ao poder que acredita possuir. Até um lanche num dia de visitas se torna um motivo de ostentação e não há nada mais indigno do que juntar aos autos, história da vida daquela família e, em Juízo, um cupom fiscal de uma lanchonete, comprovando que gasta mais do que deveria com seu próprio filho. Enfim, o comportamento das pessoas que litigam em ações envolvendo o Direito de Família, nos mostra um lado que, muito provavelmente, não é revelado a ninguém, por ser tão mesquinho e baseado em sentimentos pouco nobres, como a vingança, a ganância e a vontade de agredir emocionalmente o outro, desestruturando-o psicologicamente. Ainda que não muitos, alguns casais que se separam conseguem preservar a amizade, o afeto que um dia os uniu e, principalmente, transmitir valores aos filhos, conseguindo lidar com as próprias frustrações e com o fim da relação. Valores que permearam a relação em seu início e que foram motivo de encantamento entre o casal devem ser minimamente mantidos para que os que dele dependam possam crescer em um ambiente saudável, pautado pelo respeito e pela ética. Carla Moradei Tardelli é Advogada, membro da Associação dos Advogados do Estado de São Paulo, graduada em Direito pela Universidade Paulista em 2008. Pós graduada em Direito de Família pela Escola Paulista da Magistratura – EPM. Professora em Cursos Jurídicos Preparatórios. Graduada em Psicologia pela PUC/SP em 1988, atuando por 21 anos, junto às Varas de Família e Sucessões e Infância e Juventude do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Leandro Souto da Silva é Advogado, membro da Associação dos Advogados do Estado de São Paulo, graduado em Direito pela Universidade São Judas Tadeu em 2006. Professor em Cursos Jurídicos Preparatórios. Atuou como Assistente Judiciário e Escrevente Técnico Judiciário do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo por seis anos, com lotação em Vara de Família e Sucessões.