A senhora Iracema Portella (PP-PI) pronuncia o seguinte discurso: Senhor presidente, senhoras deputadas e senhores deputados, Conforme relatório da Comissão Global sobre Aids e Leis, divulgado pela ONU no último dia 9 de julho, as leis de diversos países criam dificuldades para o combate à Aids. O estudo, coordenado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, reúne dados de 140 nações, revelando que, apesar de 123 países possuírem leis que protegem os portadores de HIV diretamente ou por meio de legislações de direitos humanos, na maioria deles as normas são "ignoradas, frouxamente aplicadas ou agressivamente desrespeitadas". Mesmo dispondo de leis direcionadas aos portadores da doença, parte dessas leis acaba concorrendo, na 1 prática, para discriminar pessoas e dificultar o tratamento da doença e o controle da epidemia de Aids no mundo. Essa constatação vale até mesmo para o Brasil, um dos países citados como exemplares no relatório. Faz-se referência, especialmente, a leis que proíbem a homossexualidade, a prostituição e os programas de redução de danos para usuários de drogas, bem como às leis que criminalizam a transmissão, mesmo involuntária, do vírus HIV. De acordo com o relatório, mais “de cem países possuem leis e práticas que minam respostas efetivas e exacerbam a epidemia global”. Em 78 países é crime manter relações homossexuais, com punições que vão de prisão e chibatadas à pena de morte. Em mais de 100 países algum aspecto da prostituição é crime. Já a criminalização da 2 transmissão, mesmo involuntária, ocorre em 60 países, seja por definição da lei ou pelo enquadramento em outros crimes, e ao menos 600 pessoas foram condenadas por esse motivo. Na América Latina, 12 países já julgaram casos de transmissão de HIV como tentativa de homicídio ou outro tipo de crime, entre eles o Brasil. Apesar de não haver no Código Penal menção à contaminação ou exposição ao vírus como forma de crime, o País classificou casos de transmissão como homicídio culposo ou tentativa de homicídio de forma cruel. Vale notar que a interpretação contou com o aval de investigadores, promotores e juízes, resultando na condenação de pelo menos dez pessoas. Realmente, merecem especial atenção tais circunstâncias apontadas no relatório da ONU e determinadas por leis que de alguma forma criminalizam e desumanizam as populações de alto risco. 3 Trata-se de grupos que tendem a se isolar ainda mais, evitando a busca de ajuda. O fato de fazer com que essas comunidades fiquem na clandestinidade, sem dúvida, aumenta o risco da doença. Identifica-se também, entre os fatores prejudiciais ao combate à Aids, a falta de vontade política e de coragem. O relatório da ONU adverte que, se tivessem agido com mais determinação, o mundo poderia ter impedido o avanço da epidemia há uma década. Neste caso, seriam, então, poupados milhões de vidas e bilhões de dólares. Verifica-se, inclusive, que, em muitos países, a religião, seja católica, muçulmana ou qualquer outra, dita os rumos dos governos e o dia a dia das pessoas. O texto lembra que no Brasil, por exemplo, a Igreja Católica foi contrária à distribuição de preservativos e à educação sexual nas escolas, mas foi superada. 4 No período 2005-2011, no qual os países em desenvolvimento elevaram em 15% os investimentos para combate à doença, as mortes causadas pela Aids caíram 24% no mundo e podem cair ainda mais. Segundo os dados da ONU, o total de óbitos passou de mais de 2,2 milhões em 2005, quando chegou ao grau mais elevado, para 1,7 milhão no ano passado. Atualmente, 34,2 milhões de pessoas no mundo vivem com o vírus HIV. No ano passado, 2,5 milhões de pessoas foram infectadas pelo vírus. De acordo com a ONU, na década de 1980, o tempo de vida dos soropositivos era, em média, de cinco meses. Hoje, ultrapassa dez anos. Entre as principais advertências da ONU inclui-se ainda a de que é preciso combater o preconceito em relação à Aids, reconhecido como um grande vilão contra a prevenção e o tratamento do HIV. 5 Para a comissão, o trabalho está nas mãos da comunidade internacional. Afirma-se, pois, no relatório, que "líderes globais, grupos civis e a ONU precisam cobrar os governos para que apliquem os mais altos padrões da lei internacional, da saúde pública e dos direitos humanos universais". Por fim, reforço a necessidade de superar questões religiosas e culturais, entre as quais o preconceito e a discriminação, e proceder a mudanças nas leis, tendo como base as normas internacionais de direitos humanos, de modo que os grupos vulneráveis não sejam isolados, que não sejam mais prejudicados, mas que, ao contrário, sejam incentivados a participar do crescente esforço mundial no combate à Aids, favorecendo o tratamento e a prevenção da doença, pela redução do número de mortes, pela melhora das condições de sobrevida dos pacientes. Era o que tinha a dizer. Muito obrigada. 6