1 ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE O DESENVOLVIMENTO

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ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE O DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO
DO PLANALTO NORTE CATARINENSE
Walter Marcos Knaesel Birkner - Universidade do Contestado – UnC
[email protected]
Luciane Tischler Rudnick – Universidade do Contestado – UnC
[email protected] 2
RESUMO: O objetivo deste trabalho é fazer uma revisão teórica sobre as questões que
norteiam a temática do desenvolvimento regional e articulá-la com a realidade da região do
Planalto Norte Catarinense. Para isso faz-se uma leitura sobre o conceito de desenvolvimento,
a relação entre Estado e sociedade civil, a relevância das formas de capital: capital sinergético
(Boisier) e capital social (Putnam). Também se discute a regionalização como estratégia do
Estado para garantir a eficácia das políticas públicas e a importância que as regiões adquirem
diante dessa nova configuração. Em seguida são apresentadas algumas considerações sobre as
possibilidades de desenvolvimento da região do Planalto Norte Catarinense, considerando os
pressupostos apresentados sobre a temática e apontando algumas perspectivas quanto às
estratégias de desenvolvimento que possam vir a ser construídas na região.
Palavras-chave: Desenvolvimento Regional – Regionalização – Políticas Públicas
1 Introdução
A temática do desenvolvimento regional, tão em voga na atualidade, é uma discussão
relevante para a região do Planalto Norte Catarinense tendo em vista a sua realidade
socioeconômica. Os municípios que compreendem a região de Canoinhas (Bela Vista do
Toldo, Irineópolis, Major Vieira, Porto União e Três Barras) apresentam indicadores
socioeconômicos inferiores a outras regiões catarinenses. O modelo de desenvolvimento
econômico baseado no extrativismo da erva-mate e da madeira resultou, nas últimas décadas,
na estagnação econômica da região. Outro fator que interfere na mudança dessa realidade é a
falta de participação política e de organização da sociedade local, o que favorece as relações
1
Sociólogo, doutor em Ciências Sociais pela Unicamp, professor do Curso de Ciências Sociais e do Programa de
Mestrado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado – Campus de Canoinhas (SC).
2
Socióloga, bolsista FAPESC, aluna do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional pela
Universidade do Contestado – UnC – Canoinhas/SC.
2
políticas clientelistas e a conseqüente falta de um projeto de desenvolvimento regional que
realmente envolva toda a sociedade.
Dessa forma, o trabalho apresentado é conseqüência da reflexão teórica sobre as
questões que norteiam a temática do desenvolvimento regional, articulando-a com a realidade
da região do Planalto Norte Catarinense. O conceito de desenvolvimento, a relação entre
Estado e sociedade civil, a relevância das formas de capital: capital sinergético (Boisier) e
capital social (Putnam) fazem parte dessa leitura para compreender os pressupostos do
desenvolvimento regional. A discussão sobre a regionalização como estratégia do Estado para
garantir a eficácia das políticas públicas e a importância que as regiões adquirem diante dessa
nova configuração também estão inseridas no trabalho. Em seguida são apresentadas algumas
considerações sobre as possibilidades de desenvolvimento da região do Planalto Norte
Catarinense, considerando os pressupostos apresentados sobre a temática e apontando
algumas perspectivas quanto às estratégias de desenvolvimento que possam vir a ser
construídas na região.
2 Desenvolvimento
2.1 A problemática do Desenvolvimento Regional
O tema desenvolvimento é uma questão muito ampla a ser discutida, pois remete aos
fatores econômicos, políticos, sociais e culturais de uma determinada sociedade. Pode ser
interpretado de várias maneiras, dependendo do caráter ideológico de quem está analisando.
Geralmente está relacionado ao sentido de mudanças. Nas palavras de Lewontin (apud
FRANCO, p. 238), significa um desenrolar de algo que está presente e em certo sentido préformado.
O fato a ser considerado em todos os casos é a predominância de um projeto político
para o desenvolvimento quer seja a nível local, regional, estadual ou nacional. Ou seja, todos
os projetos de desenvolvimento no Brasil tiveram o Estado como principal idealizador e
articulador. O exemplo mais recente pode ser citado através da Política Nacional de
Desenvolvimento Regional do Governo Federal e da descentralização político-administrativa
de Santa Catarina, com a criação das Secretarias de Desenvolvimento Regional, ambas com o
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objetivo de regionalizar para desenvolver. No entanto cabem aqui algumas reflexões acerca
dos projetos de desenvolvimento acima apresentados principalmente no que se refere ao papel
do Estado e ao tipo de desenvolvimento a ser construído através dessa política.
De acordo com Franco (2001, p. 238) a concepção predominante é de que o “[...]
desenvolvimento é o resultado de crescimento econômico que se atinge em virtude de um
dinamismo que se instala na sociedade quando cada indivíduo se lança na busca desenfreada
pela satisfação de seus interesses materiais egoístas.” O desenvolvimento de uma sociedade
dependeria de seu dinamismo econômico, isto é, do crescimento de sua economia. De fato,
muitos países passaram por esse processo de crescimento econômico3, porém não atingiram o
estágio de desenvolvimento alcançado pelos países industrializados, sendo países
concentradores de renda e com sérios problemas sociais.
Ao contrário das teorias desenvolvimentistas, em que o desenvolvimento de um país
estaria atrelado às etapas de crescimento econômico, as teorias do desenvolvimento regional,
consideram, para além dos fatores econômicos, a importância das formas de organização
social e sua relação com o Estado para a possível promoção do desenvolvimento de uma
determinada região. O crescimento econômico não pode ser entendido simplesmente como
sinônimo de desenvolvimento, idealização de muitos economistas, que pressupõem o
desenvolvimento humano e social como conseqüência do crescimento econômico. Em outras
palavras, trata-se de um processo intangível que abarca a dimensão econômica, social, política
e cultural. Nesse sentido vários autores discutem a relação entre sociedade e Estado e os
processos de desenvolvimento.
Boisier (1999) observa nove formas de capital possíveis de serem encontradas em um
território organizado. Fossem elas articuladas com o capital sinergético produziriam o
desenvolvimento. As nove formas de capital seriam: o capital econômico, referindo-se aos
recursos financeiros, geralmente exógenos a região, enfatizando a importância da articulação
entre os governos territoriais e os agentes financeiros. O capital cognitivo, relacionado a todo
o conhecimento científico e técnico disponível em uma comunidade, gerando o conhecimento
acerca do próprio território e os saberes científicos e tecnológicos que podem ser usados para
promover o seu desenvolvimento. O capital simbólico, relacionado ao poder da palavra, de
construir na região uma auto-referência, um discurso regional, importante para competir com
a concorrência internacional. O capital cultural, referindo-se aos produtos imateriais e
3
Brasil e China são exemplos de países com crescimento econômico considerável, mas com sérios problemas
sociais.
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materiais específicos de uma determinada comunidade, constituintes da identidade coletiva e
da auto-estima.4 O capital institucional, ou seja, as instituições públicas e privadas existentes
em um determinado território e sua capacidade de atuar e tomar decisões (velocidade,
flexibilidade, maleabilidade, virtualidade e inteligência) e principalmente o grau de
cooperação entre elas. O capital psicossocial, entendido como a relação entre pensamento e
ação, os sentimentos e emoções, a auto-confiança coletiva e o reconhecimento de que o futuro
é socialmente construído. O capital social, se referindo a capacidade de cooperação e de
confiança entre os membros de uma comunidade. O capital cívico, construído a partir das
práticas políticas democráticas, de confiança nas instituições públicas e da preocupação com
os assuntos públicos. E o capital humano, de um modo geral relacionado aos conhecimentos e
habilidades que os indivíduos possuem. O capital sinergético seria a capacidade social de
promover ações em conjunto dirigidas para fins coletivos e que supostamente seria um
estoque latente existente em qualquer território. Nesse caso o capital sinergético articulandose com as demais formas de capital e a preparação de um projeto político de desenvolvimento
poderia criar as condições propícias ao desenvolvimento.
Franco (2002) ao investigar as relações entre desenvolvimento local e capital social
recorre a autores como Tocqueville, Jacobs e Putnam para explicar a relação entre as formas
de organização de uma sociedade e seu desenvolvimento. Em todos os casos o autor encontra
um nexo entre os graus de confiança, capacidade de associação e cooperação dos cidadãos
com a boa governança e a prosperidade econômica. O sentimento de pertencimento e o
interesse dos cidadãos com os assuntos públicos explicariam o grau de desenvolvimento da
sociedade americana já no século XIX, por Tocqueville e a diferença entre as localidades do
norte e do sul da Itália, estudadas por Putnam no final do século XX.
Em seus estudos Putnam (2000) argumenta a relação entre a comunidade cívica,
caracterizada pela participação cívica, igualdade política, solidariedade, confiança, tolerância
e capacidade de associação, com as possibilidades de desenvolvimento e a importância do
capital social nesse processo. O capital social conforme Putnam, (2000, p. 177) “[...] diz
respeito a características da organização social, como confiança, normas e sistemas que
contribuam para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando as ações coordenadas.” A
explicação de um bom governo residiria justamente na distinção entre a comunidade cívica da
menos cívica,
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O autor se refere ao acervo de tradições, mitos e crenças, linguagem, relações sociais, modos de produção e os
produtos imateriais (literatura, pintura, dança, musica, etc.) e materiais (produtos produzidos especificamente por
uma determinada comunidade).
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[...] os cidadãos das comunidades cívicas querem um bom governo e (em parte pelos
seus próprios esforços) conseguem tê-lo. Eles exigem serviços públicos mais
eficazes e estão dispostos a agir coletivamente para alcançar seus objetivos comuns.
Já os cidadãos das regiões menos cívicas costumam assumir o papel de suplicantes
cívicos e alienados. (PUTNAM, 2000, p. 191).
Em seu trabalho intitulado Comunidade e democracia: uma experiência na Itália
moderna (2000) comprova que a reforma institucional ocorrida na Itália a partir da década de
1970, caracterizada pela descentralização político-administrativa, provocou mudanças tanto
no comportamento dos atores políticos quanto nos atores sociais. Observa que as políticas
públicas melhoraram com a transferência de responsabilidades político-administrativas para
as regiões, sob a responsabilidade dos conselhos regionais que passaram a ocupar uma
posição intermediária entre o poder local e o nacional, incentivando assim a participação
comunitária.
Essa nova configuração do Estado descentralizado, com a interação entre governo e
sociedade civil possibilitou a aproximação com as realidades regionais mudando o estilo de
atuação política e melhorando dessa forma os processos decisórios, que, tiveram como
conseqüência o desenvolvimento regional.
No entanto Putnam reconhece que somente a reforma institucional não é fator
suficiente para explicar o desenvolvimento. No caso italiano, o autor observa que as regiões
que mais se desenvolveram eram aquelas em que as relações entre Estado e sociedade se
caracterizavam pela horizontalidade e igualdade de condições para participar das decisões de
interesse da comunidade. O desenvolvimento regional teria melhores condições de ocorrer nas
comunidades cívicas onde haveria um significativo estoque de capital social historicamente
construído. Enquanto nas regiões menos cívicas a desconfiança, o individualismo e as
relações verticalizadas entre o Estado e a sociedade dificultariam as estratégias para o
desenvolvimento.
Peter Evans mencionado por Birkner (2006) reconhece no estoque de capital social um
fator importante para o desenvolvimento regional, mas que pode ser promovido através do
Estado, um produto fomentado institucionalmente, gerado por ações governamentais que
permitam a cooperação entre o público e privado. Em ambos os casos, no entanto, o capital
social assume um papel importante para o desenvolvimento demonstrando que as ações
governamentais construídas democraticamente, através da participação e do interesse coletivo
constituem a base do desempenho das novas instituições.
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Com isso fica claro o papel do Estado nos processos de desenvolvimento, quer seja
reafirmando os valores das comunidades cívicas ao incentivar a participação dos cidadãos nas
políticas públicas desenvolvidas, ou, organizando os territórios para fomentar o
desenvolvimento a partir da construção da cooperação entre o público e o privado.
2.2 Descentralização política e o processo de regionalização
Há de se destacar o modelo de Estado que torna possível o processo de
desenvolvimento regional. Para isso pode-se recorrer a Amaral (2002) que faz um estudo
sobre a mudança no modelo de Estado, surgido principalmente na Europa, com o processo de
regionalização. O Estado moderno, soberano e centralizador, em que a concepção racional e
abstrata do indivíduo, base da sociedade, sujeito único e exclusivo, é substituída pelo Estado
das autonomias, um modelo em que a pessoa é situada e real, que reconhece a pluralidade de
comunidades e grupos na qual o indivíduo está inserido.
Neste modelo,
[...] a sociedade não é mais entendida à maneira moderna como um estrito agregado
de indivíduos tomados abstrata e racionalmente, mas como uma simbiose de pessoas
e da pluralidade de grupos e de comunidades desenvolvidas, encadeadas
subsidiariamente para o seu serviço, e nas quais inserem e imprimem significado às
suas vidas: desde a unidade de base e célula social que é a família, até a unidade
mais abrangente, à comunidade mais ampla, a qual constitui, afinal, a matéria ou o
âmbito de ação do próprio Estado. (AMARAL, 2002, p. 129)
A participação política dos cidadãos se dá pela capacidade de pertencerem a
determinadas instituições com relativa autonomia de organização, funcionamento, definição e
execução de seus próprios interesses. O Estado surge nas palavras de Amaral, como “[...]
instância reguladora das atuações autônomas das entidades individuais e coletivas que o
constituem, como responsável, tão-só pelos “interesses mais gerais” e pelo “bem-comum da
sociedade no seu todo”” (2002, p.130). Dessa forma, o poder passa a ser distribuído entre os
novos agentes políticos, as regiões, que surgem em uma posição intermediária entre os
cidadãos individuais e o Estado.
É importante ressaltar que o Estado não se enfraquece com a regionalização, pelo
contrário, se fortalece, o seu poder político continua centralizado e seu poder administrativo é
que se torna regionalizado, descentralizado.
Nas palavras de Amaral,
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[...] a regionalização é um processo artificial de articulação do território nacional a
partir de critérios de eficácia e de racionalidade de implementação do poder político
do Estado. Reforçar, simultaneamente, a sua capacidade de penetração na sociedade,
a lealdade e a confiança dos cidadãos para com suas instituições e suas políticas, tal
é a motivação de base que leva o Estado a regionalizar-se, isto é, a dotar-se de
agentes subordinados hierárquicos, para transmissão mais eficaz das políticas
desenvolvidas pelo seu governo central e para a respectiva execução concreta e
uniforme de todo o território. (2002, p.150)
Com a regionalização o Estado é capaz de desenvolver políticas públicas mais eficazes
uma vez que as regiões passam a se organizar através de conselhos que discutem os
problemas e projetam suas ações. Dessa forma os agentes regionais são capazes de executar as
políticas desenvolvidas pelo governo central de forma mais abrangente.
No entanto a discussão em torno da eficácia das políticas desenvolvidas pelo Estado
através da regionalização passa por questões mais amplas que a própria descentralização
administrativa em si, como condição de desenvolver as regiões. O território deve ser
organizado e fortalecido pelos agentes nele inseridos. Assim, as condições materiais não são
suficientes, sendo necessário ressaltar, uma vez mais, a necessidade de um conjunto de fatores
que articulados são capazes impulsionar o desenvolvimento.
A região passa a ser vista como
[...] um conjunto de pessoas ligadas entre si pelo espaço geográfico que habitam e
por uma série de características específicas, de solidariedades e de relacionamentos
que estabelecem entre si. Estes elementos acabam por se enraizar e por se
institucionalizar, transformando-se numa autêntica rede que reúne e que fixa cada
um dos membros da coletividade no seu seio, elevando à coletividade regional a
unidade, fornecendo-lhe uma natureza ôntica, e construindo-a numa totalidade em si
mesma. (AMARAL, 2002, p. 181).
Dessa forma, embora o Estado desenvolva uma política de descentralização para
melhor administrar as regiões, sua eficácia dependerá da forma como as regiões estão
organizadas. Por extensão, dependerá de relações de solidariedade, coletividade e da
existência de um sentimento de pertencimento àquela região. Nesse contexto a identidade
regional passa a ser considerada como um elemento relevante ao estudar a dinâmica do
desenvolvimento. Segundo Amaral (2002) a identidade regional está relacionada às
representações que a comunidade social desenvolve de si mesma e do território a que
pertence. Essa identidade é a criação de uma auto-imagem que define ou distingue uma
pessoa ou povo dos demais e que assegure a sua sobrevivência e desenvolvimento enquanto
pessoa ou comunidade. O sentimento de pertencimento e os valores que fazem parte da
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comunidade constroem a identidade e a valorização do território ou região contribuindo para o
processo de desenvolvimento socioeconômico.
2.3 Descentralização político-administrativa de Santa Catarina
Seguindo os pressupostos de regionalização do Estado, a partir de 2003 o governo do
Estado de Santa Catarina estabeleceu uma nova estrutura organizacional da administração
pública estadual criando as Secretarias de Desenvolvimento Regional (SDR). As secretarias
foram criadas com o intuito de descentralizar a estrutura do governo e desconcentrar as ações
governamentais, totalizando em 2008, 36 (trinta e seis) SDR distribuídas em várias regiões do
Estado catarinense.
Essa descentralização do governo objetiva o desenvolvimento regional e o
atendimento das demandas apontadas pela sociedade catarinense, sendo a principal mudança a
transferência parcial do poder de decisão à população através das SDR. A criação dessa nova
estrutura e desse novo modelo de gestão serviria para desburocratizar, descentralizar e
desconcentrar os circuitos de decisão para garantir a prestação de serviços públicos de
maneira eficiente e eficaz, tornando o Estado uma referência em desenvolvimento sustentável
e reduzindo as desigualdades entre cidadãos e regiões para elevar a qualidade de vida da
população (DUTRA; LUZ 2008).
O objetivo socioeconômico é de combater a litoralização, fenômeno que vem
esvaziando o campo, ou interior do estado, e inchando as cidades, principalmente as
litorâneas, a começar pela capital do estado. De acordo com o governo catarinense, Santa
Catarina tornou-se nos últimos anos, um dos estados campeões nacionais de êxodo rural, face
à centralização governamental5 e a conseqüente ausência de políticas regionais de
desenvolvimento agro-pecuário gerando a crise urbana caracterizada pelo desemprego,
subemprego, favelização, subnutrição e criminalidade.
A reestruturação proposta pelo governo estadual foi baseada em quatro linhas básicas:
a descentralização, a municipalização, a prioridade social e a modernização tecnológica. A
descentralização é uma proposta de reengenharia da estrutura governamental para que o
governo esteja efetivamente em todo o território catarinense, sendo representado pelas
Até 2003 as decisões concentravam-se na capital – Florianópolis. Conseqüentemente o litoral recebia mais
recursos que o interior do estado.
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Secretarias de Desenvolvimento Regional e pelos Conselhos de Desenvolvimento Regional.
Em relação à reestruturação proposta, na municipalização o estado servirá de apoio aos
municípios por meio de ações que viabilizem a execução de obras locais para garantir a
melhoria da qualidade de vida da população local. A prioridade social proposta pelo governo
visa o desenvolvimento de programas estaduais que priorizem a área social como: habitação,
saneamento e meio ambiente, atendimento ao menor, ao adolescente e ao idoso, entre outros.
E a modernização tecnológica tem como finalidade a maior eficiência, transparência e
participação da sociedade.
Com propósito de instalar uma nova organização regional tendo a finalidade de
descentralizar as funções administrativas, desconcentrar a máquina pública e a regionalizar o
desenvolvimento, a proposta se transformou na Lei Complementar n.º 381/2007. As
Secretarias de Desenvolvimento Regional passam a atuar como agências de desenvolvimento
e tem o papel de executar as políticas públicas do estado nas suas respectivas regiões. Em
cada região onde existe uma Secretaria foi criado um Conselho de Desenvolvimento Regional
- CDR, de caráter deliberativo. O CDR é um órgão de deliberação coletiva, aconselhamento,
orientação e formulação de normas e diretrizes gerais para a execução de Programas voltados
para o desenvolvimento regional. É formado por membros natos, presidido pelo Secretário de
Desenvolvimento Regional, representado pelos Prefeitos da região de abrangência, os
respectivos Presidentes das Câmaras de Vereadores e dois representantes, por municípios da
região, pela sociedade civil organizada assegurando-se a representatividade dos segmentos
culturais, políticos, ambientais, econômicos e sociais mais expressivos da região, definidos
por decreto do Chefe do Poder Executivo. Acrescente-se que o organograma dos CDR prevê a
composição de comitês temáticos, cuja função é a de avaliar a qualidade técnica e a
viabilidade das solicitações e dos projetos que chegam ao Conselho para a homologação. Na
prática, todavia, a maior parte dos CDR ainda não constituiu os comitês.
No entanto, os padrões de atuação das secretarias de desenvolvimento regional não são
homogêneos e as ações de incrementação do desenvolvimento regional entre as regiões
catarinenses são apresentadas de maneira desigual. Dessa forma o caráter problemático da
relação entre o desenvolvimento regional e a política de descentralização catarinense podem
estar relacionados à fatores de ordem econômica, social, política e cultural de cada região que
promovem ações mais eficientes e eficazes em comparação as outras regiões com maiores
dificuldades de desenvolvimento.
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3 Considerações a nível regional
As reflexões aqui apresentadas demonstram a complexidade do tema e o quão
importante é, principalmente quando direcionada aos países emergentes, como no caso do
Brasil, de serem discutidas e analisadas de acordo com as suas especificidades. O
desenvolvimento regional, por ser um processo endógeno, segundo os estudos apresentados,
deve ser pensado a partir da realidade local, regional ou nacional. Embora essas reflexões
sejam importantes, é preciso construir um projeto de desenvolvimento que se adapte aos
fatores sociais, culturais, econômicos e políticos de uma determinada região.
Em uma sociedade como a brasileira, onde as desigualdades são evidentes, quer seja
no âmbito social, econômico, político e cultural, quer seja entre as regiões, como fazer para
fomentar o desenvolvimento? E na região do Planalto Norte Catarinense, uma das regiões
menos desenvolvidas do estado, o que fazer para reverter essa realidade?
Se fizéssemos uma comparação com o estudo de Putnam, a região do Planalto Norte
Catarinense corresponderia, ainda que grosseiramente, ao sul da Itália, marcado por relações
clientelistas, verticalizadas, em que o capital social é quase inexistente e o capital cívico não é
incentivado. As características são semelhantes, inclusive na nítida separação entre as classes
sociais e a concentração de renda, diferente de outras regiões no estado6em que o dinamismo
econômico é mais evidente e as pessoas compartilham das virtudes cívicas.
Recorrendo a Putnam (2000, p. 191) ao dizer que a “[...] existência de instituições
eficazes e responsáveis depende, no jargão do humanismo cívico, das virtudes e práticas
republicanas”, é possível perceber que o Estado por si próprio não é capaz de promover uma
política pública de desenvolvimento sem a participação da sociedade. Mas para que isso
ocorra é preciso mudar o comportamento tanto dos atores sociais quanto dos atores políticos.
Isso significa de um lado a preocupação da sociedade com o que é público, exigindo um bom
desempenho dos governantes, e de outro, que estes desenvolvam uma nova forma de fazer
política, reconhecendo o seu dever perante a sociedade.
A regionalização, proposta pela descentralização político-administrativa do estado de
Santa Catarina, ao que parece, surge com o intuito de promover essa “sinergia” entre Estado e
sociedade. A partir da criação das Secretarias de Desenvolvimento Regional (SDR) foram
criados os Conselhos de Desenvolvimento Regional em cada SDR, como uma forma de
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Fazendo aqui uma referência ao oeste catarinense e sua forma de organização social, como um modelo a ser
seguido pelas demais regiões do estado.
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aproximar a sociedade civil das decisões do Estado. Agora é preciso criar uma cultura mais
democrática, onde a sociedade participe mais das questões de interesse público, que os
cidadãos se preocupem mais com o bem-estar da comunidade em que estão inseridos. Talvez
o que falte para a região do Planalto Norte Catarinense, devido a sua formação sóciohistórica, é forjar, recriar, ou, fortalecer a sua identidade territorial. É preciso incentivar o
sentimento de pertencimento na região para que ela seja valorizada. Para isso é preciso
descobrir a vocação da região. Se no passado teve uma vocação extrativista, o presente exige
que se descubram novas alternativas que possam ser inseridas neste novo contexto econômico
em tempos de globalização.
Como ressalta Boisier (1999), ao falar da importância da construção do capital
sinergético para o desenvolvimento territorial, um território precisa ter recursos naturais e
financeiros, conhecimento técnico e científico, capacidade de gerar auto-referência, produzir
bens materiais e imateriais (cultura) e instituições capazes de atuar de forma dinâmica. É
preciso haver autoconfiança coletiva, capacidade de cooperação e reciprocidade entre os
membros da sociedade, confiança nas instituições e preocupação com os assuntos públicos,
inter-relação entre os setores público e privado, conhecimento e habilidades individuais,
representados nas nove formas de capital latentes em uma sociedade.
A partir do conhecimento, ou reconhecimento, das nove formas de capitais e a
importância de haver a sinergia é possível construir um projeto de desenvolvimento que
abarque a dimensão social, política e cultural e não apenas econômica. Se o Estado é um
agente com o poder para fomentar o desenvolvimento, os governantes precisam ter a
sensibilidade para compreender esse processo, da mesma forma, a sociedade precisa se
engajar nesse projeto, ocupando o espaço a que tem direito.
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