INTEIRO TEOR DA DELIBERAÇÃO 34ª SESSÃO ORDINÁRIA DA SEGUNDA CÂMARA REALIZADA EM 17/05/2012 PROCESSO TC Nº 0910024-6 PRESTAÇÃO DE CONTAS DA PREFEITURA MUNICIPAL DE TRACUNHAÉM, RELATIVA AO EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2008 INTERESSADA: TEREZA CRISTINA BARBOSA DA SILVA ADVOGADOS: DRA. JOSINALVA GUERRA DE SANTANA CAVALCANTI – OAB/PE Nº 27.840; DR. LYNDON JOHNSON DE ANDRADE CARNEIRO – OAB/PE Nº 25.322-D E DR. PAULO ROBERTO DE ANDRADE CARNEIRO – OAB/PE Nº 14.175-D RELATOR: CONSELHEIRO EM EXERCÍCIO RICARDO RIOS PEREIRA PRESIDENTE: CONSELHEIRO JOÃO CARNEIRO CAMPOS RELATÓRIO Prestação de Contas da Prefeitura Municipal de Tracunhaém, referente ao exercício financeiro de 2008, gestão da Sra. Tereza Cristina Barbosa da Silva. Nos autos da Prestação de Contas, constam, além das provas, os seguintes documentos: Relatório de Auditoria - fls. 2146-2250, vol. 12; Defesa Escrita, ofertada, conjuntamente, pelos Srs. Cristiano Luiz da Silva Leitão, Presidente da CPL, Maria Edileuza da Silva Moura e Geraldo Ricardo de Moura, Membros da CPL à época dos fatos - fls. 2260- 2265, vol. 12; Defesa Escrita, apresentada pela Sra. Tereza Cristina Barbosa da Silva, Prefeita à época dos fatos - fls. 2272-2522, vols. 12 e 13; e Cota Ministerial nº 152/2010 – fls. 2528 – 2530, vol. 13; Resposta da Srª Tereza Cristina Barbosa da Silva à Cota Ministerial – fls. 2546 – 2549, vol. 13; Nota Técnica de Esclarecimento – fls. 2616 – 2629, vol. 13. A auditoria, em sua análise, imputou as seguintes irregularidades: Ausência de documentos na Prestação de Contas; Não encaminhamento ao TCE/PE dos Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária relativos aos 3º, 4º, 5º e 6º Bimestres de 2008; Descumprimento do limite da despesa de pessoal; Dívida de parcelamento com o FGTS não reconhecida e não lançada no Balanço Patrimonial; 1 Aplicação inferior ao mínimo exigido na remuneração dos profissionais do magistério com recursos do FUNDEB; Assunção de compromissos à conta do FUNDEB sem o devido lastro financeiro; Percentual de aplicação nas ações e serviços públicos de saúde inferior ao mínimo constitucionalmente exigido; Aplicação nas ações e serviços públicos de saúde fora do Fundo Municipal de Saúde; Ausência de registros contábeis da contribuição previdenciária ao RGPS; Apropriação da contribuição previdenciária ao RGPS descontada dos servidores; Alíquota de contribuição dos servidores ao RPPS inferior ao determinado pela legislação previdenciária; Inexigibilidade para contratação de artistas; Inconsistência das informações contábeis; Despesas com diárias ferindo os princípios da razoabilidade, proporcionalidade e moralidade pública; Despesas sem licitação; Despesas indevidas com aquisições de “prendas” para serem sorteadas no dia das mães; Despesa com caráter assistencialista; Despesas com empresa inidônea; Contabilização incorreta de gastos com pessoal; Burla ao concurso público; Despesas sem comprovação; Diárias sem prestação de contas. O Ministério Público de Contas emitiu o Parecer MPCO nº 281/2012, fl. 2634, vol. 13, da lavra do Procurador Dr. Gustavo Massa, que concluiu pela rejeição das contas, imputação de débito e aplicação de multas. É o relatório. VOTO DO RELATOR Segue o teor da análise do Ministério Público: Inicialmente, a interessada abre a sua defesa suscitando uma preliminar de cerceamento de defesa (fls. 2273 - 2276). Coloca que a atual gestão da Prefeitura de Tracunhaém recusa-se a lhe fornecer cópias dos documentos comprobatórios das despesas. Em função disto, a interessada manejou uma ação cautelar de exibição de documentos (processo judicial nº 000293-69.2009.8.17.1500), requerendo, justamente, a entrega das cópias das notas de empenho, recibos de pagamento, notas fiscais e folhas de pagamento de prestadores de serviços, referentes ao exercício de 2008. Esta ação ainda está sendo processada na comarca de Tracunhaém. 2 Requer, então, que a Corte de Contas realize uma diligência para ouvir as testemunhas arroladas nas folhas 2302 dos autos para que estes atestem sobre a existência de tais documentos. Compulsando os autos, verifica-se que, nas folhas 2546 a 2609, encontra-se uma cópia da referida ação cautelar. A leitura destes documentos demonstra que a defesa da atual gestora municipal de Tracunhaém reconhece que existem documentos comprobatórios de despesas na sede municipal (fls. 2575 – 2577 e 2598 – 2599). Desta forma, a disputa judicial, no fundo, cinge-se, apenas, em quem irá arcar com os custos das cópias reprográficas solicitadas em juízo (a gestão atual coloca que não há verbas municipais para tanto, já a interessada requestou, especificamente, a entrega de tais cópias em juízo). Como se pode perceber, a questão da existência dos documentos comprobatórios é incontrovertida. Tanto a interessada como a gestão atual da municipalidade concordam que existem documentos na sede da prefeitura que, pretensamente, justificariam as despesas realizadas durante o exercício de 2008. Desta forma, a realização da diligência requerida pela interessada torna-se desnecessária, já que a existência de tais documentos não é questionada pela gestão atual. 1. MÉRITO 1. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS A auditoria apontou que (fls. 2164 - 2165) a presente prestação de contas não atendia aos ditames da Resolução TC 19/2008. Faltava documentos, como o balanço orçamentário e financeiro, os demonstrativos da execução das despesas por função e programa. A interessada, em sua defesa, aduz que (fls. 2283 – 2284) a responsabilidade por tal falha é do técnico responsável pela elaboração da prestação de contas. Para sanar o problema, acostou as cópias dos documentos faltantes. Primeiramente, há de se colocar que a entrega intempestiva dos documentos não supre a falha apontada. Pelo contrário, serve como demonstrativo de que a irregularidade de fato ocorreu. Além disso, a irregularidade aqui apontada resulta da falta ou falha dos trabalhos do sistema de controle interno municipal. Várias são as irregularidades imputadas nesta prestação de contas que poderiam ter sido resolvidas de forma simples através da efetiva atuação deste sistema. Desta forma, o MPCO entende que os doutos julgadores desta casa devem considerar a referida falha na formação de suas convicções. 2. NÃO ENCAMINHAMENTO DOS RELATÓRIOS RESUMIDOS DE EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA A auditoria aponta que a gestão da interessada não encaminhou, para esta Corte de Contas, os relatórios resumidos de execução orçamentária dos 3º, 4º, 5º e 6º bimestres. Isto iria de encontro ao disposto na Resolução TC 10/2005 (fls. 2165). A defesa alega que (fls. 2278) os referidos relatórios foram devidamente encaminhados ao TCE-PE, podendo ter havido o caso de entrega em endereço errado. No entanto, tendendo a sanar a falha, acostou-os aos autos. Esta irregularidade é similar a anterior, devendo-se considerar que a mera entrega intempestiva dos documentos necessários não sana a irregularidade apontada. Assim, devem os doutos julgadores considerá-la na formação de suas convicções. 3 3. DESCUMPRIMENTO DO LIMITE DE DESPESA COM PESSOAL Neste ponto, a auditoria coloca que (fls. 2165) a municipalidade efetuou gastos com pessoal acima do limite estabelecido pela LRF, em seu art. 20. Tal falha seria recorrente, já que foi igualmente identificada nos exercícios de 2005, 2006 e 2007. A defesa coloca que (fls. 2279) a despesa total com pessoal, no exercício de 2008, não extrapolou o limite legal. Há de se considerar que, segundo a própria auditoria, o excedente não ultrapassa 0,1%. O MPCO entende que, em função da princípio da bagatela, deve-se desconsiderar a irregularidade apontada. 4. DÍVIDA PÚBLICA CONSOLIDADA Apesar de haver empenhos (folhas 1.822 a 1.828) que evidenciam a existência de parcelamento a longo prazo com a Caixa Econômica Federal, em função de dívida com o FGTS, a municipalidade não realizou o devido registro no Balanço Patrimonial da Prefeitura. Para a auditoria, resta patente que os serviços de contabilidade da Prefeitura de Tracunhaém não observam os artigos da Lei 4.320/64. A defesa coloca que (fls. 2278) o conjunto da dívida consolidada do Município de Tracunhaém carece de reavaliação de valores junto aos órgãos credores para poder ser incorporada ao Balanço Geral. Esta situação é grave, pois há um total mascaramento da real situação da municipalidade, que pode, inclusive, está passando por uma situação de descontrole financeiro. Sem o devido registro da dívida pública consolidada não há como aferir se foi cumprido o limite previsto na Resolução do Senado Federal nº 40/2001, art. 3º, inciso I. No entender do MPCO, a irregularidade permanece hígida. 5. APLICAÇÃO INFERIOR AO MÍNIMO EXIGIDO NA REMUNERAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DO MAGISTÉRIO COM RECURSOS DO FUNDEB Neste ponto, a auditoria coloca que (fls. 2166) a municipalidade aplicou apenas 51,93% dos recursos do FUNDEB na remuneração dos profissionais do magistério. Isto contrariaria o que foi determinado pela Carta Magna em seu art. 60, inciso XII do ADCT. A defesa, por sua vez, coloca que (fls. 2281), o gasto médio dos recursos do FUNDEB na remuneração dos profissionais da educação durante toda a gestão da interessada foi de 61,20%. Logo, não houve descumprimento das exigências constantes da legislação vigente. Ocorre que a defesa se olvida que a determinação legal é de que, anualmente e no mínimo, 60% dos recursos do FUNDEB sejam gastos na remuneração dos profissionais do magistério. Com isto, o índice mínimo deve ser atendido em cada exercício da gestão municipal, e não na média geral. Logo, a argumentação da defesa não é suficiente para afastar a irregularidade. Esta resta cabalmente comprovada pela auditoria. 6. ASSUNÇÃO DE COMPROMISSOS A CONTA DO FUNDEB SEM O DEVIDO LASTRO FINANCEIRO A auditoria apurou que (fls. 2167) a municipalidade efetuou despesas com recursos do FUNDEB sem que houvesse o devido lastro financeiro. Tal fato afronta os ditames do art. 212 da CF e o art. 21 da Lei 11.494/07. A defesa coloca que (fls. 2284 – 2285) a irregularidade apontada é meramente formal, já que o serviço pago foi devidamente prestado. Caberia a atual gestora adotar as medidas necessárias para não mais incidir na falha. Em sua NTE, a auditoria replica que (fls. 2623 – 2624) a defesa não adentrou no mérito da questão. Não há como contestar os números 4 evidenciados pelo trabalho realizado: a auditoria contábil demonstra que a municipalidade não obedeceu aos ditames do art. 21, §2º da Lei 9424/2007. Após verificar os cálculos expendidos pela auditoria não há como deixar de dar razão a ela. O dispositivo legal supra mencionado determina, especificamente, que apenas 5% dos recursos do FUNDEB poderiam ser utilizados no primeiro trimestre do exercício seguinte. A municipalidade, aviltando tal regramento, deixou o valor de R$ 105.520,69 nos restos a pagar (FUNDEB). Isto representa pouco mais de 5,82% dos recursos do referido fundo. Para o parquet de contas, a irregularidade está perfeitamente configurada. 7. APLICAÇÃO NAS AÇÕES DE SAÚDE ABAIXO DO MÍNIMO CONSTITUCIONAL Neste ponto, a auditoria aduz que a municipalidade de Tracunhaém, durante o exercício de 2008, aplicou apenas 14,61% dos recursos previstos nos art. 158 e 159 da CF na área de saúde. A defesa, por sua vez, rebate dizendo que (fls. 2285) a diferença a menor é mínima, menos de 1%. Logo, não caberia a permanência da irregularidade, já que em caso semelhante, esta mesma corte já desconsiderou a irregularidade (por exemplo, nas contas do exercício de 2001 do Recife). Em sua NTE, a auditoria treplica colocando que (fls. 2624 – 2626) a defesa não contesta os cálculos apresentados, resumindo-se a apenas apresentar uma jurisprudência isolada que não reflete o entendimento assentado na casa. De fato, a municipalidade não alcançou o mínimo constitucional de aplicação na área de saúde em função de meros 0,4%. Se esta fosse a única irregularidade perpetrada pela gestão, seria merecedora de um julgamento leniente neste ponto. No entanto, o que se vê nos autos é um conjunto gravíssimo de irregularidades, algumas, até, que vem se perpetuando durante toda a gestão da interessada. Diante desta realidade fática, não pode o TCE-PE relevar esta irregularidade, principalmente, por ela tratar de um tema importantíssimo para a sociedade brasileira (saúde) como pelo fato de sua prática aviltar, justamente, a nossa carta maior. 8. APLICAÇÃO NAS AÇÕES E SERVIÇOS PÚBLICOS DE SAÚDE FORA DO FMS A auditoria aponta, nas folhas 2168, que a municipalidade não aplicou todos os recursos destinados a área de saúde através do FMS. Isto iria de encontro com o art. 77, §3º da CF. A defesa, por sua vez, coloca que (fls. 2286) que as aplicações de recursos nas ações e serviços de saúde sempre foram feitas através dos FMS, tendo havido o devido acompanhamento do Conselho Municipal de Saúde, que sempre se reuniu. Verificando os anexos 6 e 7 do relatório de auditoria (fls. 2203 – 2204), vê-se que foram os próprios dados apresentados pela municipalidade de Tracunhaém que possibilitaram a equipe técnica desta casa a identificar que apenas 3,90% dos recursos da saúde foram aplicados através do FMS. A ampla maioria da aplicação dos recursos neste setor (cerca de 10,71%) foi feita pela Secretaria Municipal de Saúde. Desta forma, resta cabalmente comprovada a irregularidade ora sob análise. 9. PROBLEMAS NA GESTÃO PREVIDENCIÁRIA Durante os trabalhos desenvolvidos, a auditoria identificou os seguintes problemas na seara previdenciária: 1. Ausência de registros contábeis da contribuição patronal ao RGPS e ausência do respectivo recolhimento – tal prática pode ser enquadrada no 5 crime previsto no art. 337-A, inciso II do CP e provoca uma sub-avaliação das despesas com pessoal, em virtude do saldo da conta “obrigações patrimoniais” encontrar-se a menor. 2. Apropriação da contribuição previdenciária descontadas dos servidores ao RGPS – a auditoria ponta que a municipalidade recolhia as contribuições dvidas dos ocupantes de cargos comissionados da prefeitura, mas não os repassava ao órgão previdenciário. Tal prática caracterizaria o crime previsto no art. 168-A do CP. 3. Alíquota de contribuição dos servidores do RPPS inferior à determinada pela legislação previdenciária – a lei municipal 260/2002 determinou que a alíquota pertinente aos servidores seria de 10%, inferior ao determinado aos servidores públicos federais. Isto afronta ao disposto na lei federal 9.717/98. A defesa resume-se a colocar que o município de Tracunhaém foi contemplado com o RPPS, o que torna objeto de análise em separado para os devidos esclarecimentos e defesa (fls. 2282). Deve-se colocar que as irregularidades acima retratadas não são novidades para a interessada. Na prestação de contas do exercício de 2007 (processo TC nº 0810034-2), o TCE-PE já as considerou como relevantes para chegar à conclusão pela irregularidade daquelas contas: CONSIDERANDO que a Prefeitura Municipal de Tracunhaém não contabilizou a Contribuição Patronal ao Regime Geral de Previdência Social incidente sobre a remuneração dos servidores públicos (sobretudo os comissionados e temporários) e que a irregularidade é passível de enquadramento como crime de sonegação previdenciária, previsto no artigo 337, inciso II, do Código Penal (item 2.20 do Parecer MPCO); CONSIDERANDO a ausência de recolhimento ao INSS, dos valores retidos dos servidores comissionados e contratados, a título de previdência social, no montante de R$ 161.055,00 (item 2.21 do Parecer MPCO); CONSIDERANDO a aplicação de alíquota de contribuição dos servidores ao Regime Próprio de Previdência Social inferior ao determinado pela legislação previdenciária (item 2.22 do Parecer MPCO); Levando em conta que a defesa nada fez para buscar justificar as falhas ora sob análise, o MPCO entende que as irregularidades estão perfeitamente caracterizadas. Além disso, cabe a esta corte comunicar ao órgão previdenciário dos problemas acima elencados. 10. INEXIGIBILIDADE PARA CONTRATAÇÕES DE ARTISTAS No entendimento da Auditoria, para se contratar artista com base no inciso III do art. 25 da Lei de Licitações, três requisitos devem ser atendidos: O objeto da contratação deve ser o serviço de um artista profissional; A contratação deve ser feita diretamente ou através de empresário exclusivo; e O contratado deve ser consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. 6 Ocorre que, nas inexigibilidades procedidas pela municipalidade, cujo objeto seria a contratação de artistas, não restou demonstrado que: Os artistas contratados seriam efetivamente profissionais e nem a justificativa de sua consagração; O empresário utilizado não comprovou deter exclusividade dos artistas; Não houve justificativa para o valor da contratação. Tanto a defesa da Srª Tereza Cristina Barbosa (fls. 2286 – 2289) como a dos membros da comissão de licitação (fls. 2260 – 2264), advogam que: Os artistas contratados são bastante conhecidos em toda a região da mata norte. As inexigibilidades sob análise foram realizadas sob o manto da legalidade. A lei não exige que o artista para poder ser contratado tenha que está registrado no Ministério do Trabalho. A auditoria coloca que, em nenhum momento, a auditoria questionou a realização da apresentação. É de bom tom advertir que esta irregularidade é recorrente na municipalidade de Tracunhaém. Na decisão da prestação de contas desta mesma prefeitura, no exercício de 2007, encontra-se o seguinte considerando: CONSIDERANDO que, nos processos de Inexigibilidade de Licitação nº 02/07 e nº 04/07, relativos à contratação de artistas, não ficou demonstrado ser o contratado artista profissional na forma exigida em lei e que não restou evidenciada a exclusividade do empresário, como também não houve justificativa da consagração do artista, nem do valor da contratação, conforme estabelece o artigo 26, parágrafo único, da Lei Federal nº 8.666/93(item 2.15 do Parecer MPCO); Há de se entender que os fatos contidos nos autos são claros, a municipalidade realizou a contratação dos artistas por meio de um intermediário, e não o empresário exclusivo dos artistas. Sobre o tema, este Representante do MPCO já se manifestou, sempre no mesmo sentido, nos Processos TC nº 0870055-2, 0870100-3 e 0840021-0. No julgamento deste último Processo o Relator Carlos Porto assim se manifestou: FUNDAMENTAÇÃO DO VOTO Para fundamentação do voto acolho a análise do mérito proferida pelo Procurador Dr. Gustavo Massa no Parecer nº 394/09 (fls. 2158-2178, vol. XI), resumida a seguir: (...) 4.Irregularidades na contratação de bandas através de inexigibilidade de licitação (item 5.4 do Relatório de Auditoria) Inicialmente, o Ministério Público de Contas tece alguns breves comentários sobre a razoabilidade e proporcionalidade destas contratações. O Município de Panelas tinha, em 2007, uma população de 24.918 habitantes, com uma renda per capita de R$ 2.508,00, segundo dados do IBGE. Ao todo foram gastos R$ 348.200,00 com a contratação de bandas e pagamento do 7 empresário nas três festividades em análise, o que dá um custo per capita de R$ 13,97 (isto representa 6,7% da renda mensal de cada habitante de Panelas). Compare-se com Recife: se a Prefeitura gastasse os mesmos R$ 13,97 por habitante para contratar bandas, daria R$ 21.424.112,60, ou seja, mais de 20 milhões de reais. Com este valor dava para a Prefeitura do Recife contratar 5 shows do U2 ou do Rolling Stones, pois segundo a reportagem da revista Veja de 2006, cada show custava cerca de 2 milhões de dólares, ou cerca de 4,3 milhões de reais. O Relatório de Auditoria apontou irregularidades nos Processos de Inexigibilidade nºs 02/07, 03/07 e 04/07, todos referentes à contratação de bandas para eventos promovidos pela Prefeitura. A primeira irregularidade apontada diz respeito aos documentos de declaração de exclusividade do empresário. Segundo o art. 25 da Lei nº 8.666/93, a contratação de bandas e músicos pode ser realizada por meio de inexigibilidade diretamente com o artista ou através de empresário exclusivo. É clara a intenção do legislador: não é viável fazer uma licitação para contratar um músico que seja consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. Portanto, faculta-se à Administração Pública contratar o artista diretamente, sem a exigência de uma licitação. Só que a maioria dos artistas delega todas as contratações a um empresário, que fica responsável não só pelos acertos comerciais, como pela agenda e condições para a apresentação de seu representado, poupando-o deste desgaste. Por isso é que a lei permite que se contrate o artista por intermédio de seu empresário exclusivo – já que essa é a única forma, na maioria dos casos, possível de se contratar a atração desejada. O que se verifica em quase toda a documentação presente nos três processos de licitações é uma carta do dono da banda ou do empresário da banda afirmando que a empresa contratada por inexigibilidade pela Prefeitura Municipal de Panelas detém a exclusividade para contratar a banda numa data específica ou numa data específica e para tocar no município de Panelas. E algumas vezes, nem isso, como se vê abaixo. No Processo de Inexigibilidade nº 02/07, foram contratadas 18 (dezoito) bandas para se apresentarem no Festival de Jericos, por meio de Charles Cristiane das Neves – ME. O valor total do contrato foi de R$ 168.900,00 (cento e sessenta e oito mil e novecentos reais), sendo que apenas R$ 133.500,00 (cento e trinta e três mil e quinhentos reais) foram pagos às bandas, conforme disposto na fl. 1.425. O Processo de Inexigibilidade nº 03/07 trata da contratação de 13 (treze) bandas para tocarem no período junino, por intermédio de Iris Maria da Silva Quipapá – ME. O valor do contrato foi de R$ 99.800,00 (noventa e 8 nove mil e oitocentos reais), dos quais R$ 70.000,00 (setenta mil reais) foram pagos às bandas. Sendo de responsabilidade da contratada, além de agenciar as bandas, montar palcos, elaborar peças promocionais e até se responsabilizar pela premiação de concursos como o de quadrilhas, ruas ornamentadas e de carro de boi ornamentado (fls. 1479/1489). E no Processo de Inexigibilidade 04/07 foram contratadas 9 (nove) bandas, por intermédio da empresa China Produções Artísticas e Eventos, pelo valor de R$ 79.500,00 (setenta e nove mil e quinhentos reais), para a 25ª Maratona da Vila de Cruzes. Chama a atenção que a Banda Forrozão Só Alegria foi contratada para os três eventos, com três empresários exclusivos diferentes. Já as bandas Tradição Nordestina, Leva Jeito, RMJ, Brasas do Forró, Forró Potência e Forrozão Topázio foram contratadas para dois eventos, e em cada um deles apresentaram empresários exclusivos distintos. Também chama a atenção o fato de que das 40 contratações de bandas, para os três eventos, quase todas apresentem cartas de um suposto empresário exclusivo para um único dia ou um único dia e local. Não é preciso grande esforço para perceber que se trata de empresários exclusivos da prefeitura, ou melhor, Empresário Exclusivo do Erário Municipal, e não da banda. A prefeitura escolhe um empresário por inexigibilidade e contrata todas as bandas por intermédio dessa pessoa. A idéia de contratar um intermediário para ficar responsável por entrar em contato com as bandas, além de organizar toda a festividade, não é reprovável. O problema é tal escolha se dar por meio de uma inexigibilidade e, depois, apresentar pretensa documentação de que se trata do empresário exclusivo da banda, a fim de aparentar conformidade com as exigências da Lei nº 8.666/93. Seria mais barato abrir uma licitação para contratar uma empresa para produzir, por um preço fixo, todo o evento, por exemplo, por R$ 10.000,00 a empresa contratada se encarregaria de produzir a festa e intermediar os contratos com as bandas. Isso resguardaria a livre concorrência, diminuiria a possibilidade de fraudes, em consonância com todos os ditames legais, homenageando o princípio da economicidade. A defesa alega não competir ao Município verificar se o empresário é o exclusivo da banda ou não. Nada mais longe da verdade. Para fazer a contratação por inexigibilidade com base no art. 25, inciso III, da Lei de Licitações, o Administrador Público tem de ter certeza de todas as exigências legais, conforme o disposto no art. 26 da mesma lei. É o mesmo que alegar não competir ao Município verificar a regularidade fiscal e perante o FGTS das empresas a serem contratadas. 9 O Relatório de Auditoria também aponta como irregularidade das contratações, o fato de não haver a comprovação de que os artistas contratados estão registrados na Delegacia Regional do Trabalho, conforme determinação da Lei nº 6.533/78. Novamente a defesa alega não caber à Prefeitura fiscalizar tal registro. O MPCO entende que tal irregularidade deve ser afastada, não porque não seja de responsabilidade da Prefeitura fazer tal fiscalização, mas porque a Lei nº 8.666/93 não diz que só o artista profissional é que pode ser contratado por inexigibilidade. A exigência é de que o artista seja consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública, e não de que se trate de um artista profissional. Destarte, não há empecilho legal para que um artista amador seja contratado, desde que consagrado pela crítica ou pelo público. O Relatório de Auditoria ainda aponta como irregularidade na contratação das bandas, a nãocomprovação de que as bandas contratadas sejam consagradas pela crítica especializada ou pela opinião pública. O interessado se defende alegando ser algo bastante subjetivo o critério para aquilatar as qualidades musicais de um ou de outro artista. O Parquet concorda plenamente que se trata de critério subjetivo, e que é possível um artista ser consagrado pela opinião pública de determinado local, sem o ser em outro. Não obstante, para evitar que tal subjetividade transforme-se em arbitrariedade do Administrador, é esta a razão pela qual o art. 26 da Lei de Licitações, inciso II, do parágrafo único, determina que o processo de inexigibilidade seja instruído com a razão de escolha do executante. O que não foi observado pela Prefeitura Municipal de Panelas. O Relatório de Auditoria também aponta que não houve a justificativa do valor das contratações, em clara infração ao parágrafo único, inciso III, da Lei nº 8.666/93. A defesa manteve-se silente acerca desta irregularidade. Tal omissão é inaceitável. Note-se que mesmo num processo licitatório em que há concorrência, é preciso que a Administração Pública faça antes uma pesquisa de mercado, a fim de determinar se o preço a ser pago está justo ou não. Muito mais importante uma justificativa de preço, numa situação em que não há disputa. Pelo exposto, o MPCO entende que deve ser feita uma recomendação para que a Prefeitura de Panelas passe a instruir seus processos de inexigibilidade com a justificativa da escolha das atrações artísticas, assim como a justificativa de preços e que também seja recomendado que o Município realize licitação para a contratação de empresa de eventos a ficar responsável 10 pela contratação das bandas e organização dos eventos, cobrando um preço fixo para tanto. O Parquet também entende que as irregularidades, no que diz respeito à simulação de empresário exclusivo das bandas, ferem a Lei nº 8.666/93. Deve, portanto, ser motivo para a rejeição das contas, bem como o encaminhamento do Processo para o Procurador Geral do MPCO, para que exare representação ao Ministério Público do Estado de Pernambuco - MPPE, a fim de realizar a denúncia criminal com base no art. 89 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, combinado com o art. 102 do mesmo diploma legal. (...) Ante ao exposto, profiro o seguinte Voto: Considerando os termos do Parecer MPCO nº 394/2009; Considerando a constatação de indícios de simulação da situação de “empresário exclusivo”, nas contratações de bandas musicais objetivando justificar os procedimentos de Inexigibilidades de Licitação nºs 02/07, 03/07 e 04/07 (fls.1409 a 1595), caracterizando infração à Lei Federal nº 8.666/93, artigo 25, inciso III, e motivando Nota de Improbidade Administrativa à luz no artigo 10, VIII, da Lei Federal nº 8.429/92; [grifos no original] O MPCO entende que a presente situação é análoga ao do supra-citado julgamento, devendo tal irregularidade ser suficiente para a rejeição das contas da Srª. Tereza Cristina Borba e para que lhe seja aposta nota de Improbidade Administrativa à luz do art. 10, VIII da Lei Federal nº 8.429/92. 11. INCONSISTÊNCIA DAS INFORMAÇÕES CONTÁBEIS A auditoria aponta que a presente prestação de contas foi apresentada com inconsistências contábeis. Tal problema evidencia a falha nos procedimentos técnicos de registro dos fatos administrativos ocorridos ou irregularidades na elaboração e apresentação das informações contábeis. Algumas delas são: O balanço patrimonial de 2008 e o de 2007 não apresentam os saldos dos anos anteriores; Relação de restos a pagar não identifica de forma clara os processados dos não processados; Não foi contabilizada a contribuição patronal ao RGPS. A defesa da interessada nada fala sobre esta irregularidade, restringindose a imputar a responsabilidade ao técnico responsável pela contabilidade da prefeitura. O contador da prefeitura sequer apresentou defesa, apesar de ter sido devidamente notificado. A irregularidade está perfeitamente configurada, incidindo a responsabilidade tanto sobre o técnico contábil responsável como sobre a gestora que não fiscalizou de forma apropriada os serviços de contabilidade que eram prestados à municipalidade. O MPCO entende que cabe a aplicação da multa prevista na LOTCE. 11 12. IRREGULARIDADES VERIFICADAS NA ANÁLISE DAS DESPESAS DA PREFEITURA Neste ponto, a auditoria apontou a existência das seguintes irregularidades (fls. 2176 - 2184): 1. Despesas com diárias em valores que ferem a razoabilidade, proporcionalidade e a moralidade – o decreto municipal 01/2005 fixou os valores das diárias dos agentes políticos e públicos municipais com valores desarrazoados (tabela das folhas 2176 dos autos). Comparando os valores pagos à interessada com o que foi pago a um Secretario de Estado, a auditoria identificou um excesso da ordem de R$ 6.787,62. A defesa nada alega sobre esta questão. Ela cinge-se, unicamente, a tentar justificar a legalidade do decreto municipal 01/2005 que exime os beneficiados com diárias a fazer a devida prestação de contas. Deve-se colocar que a desproporcionalidade dos valores estabelecidos para as diárias dos agentes políticos da municipalidade é patente. Segundo a legislação utilizada, a mera visita do prefeito a uma cidade vizinha de Tracunhaém, sem pernoite, garantia-lhe a quantia de R$ 400,00. É um total descalabro. Deve-se aplicar, de forma analógica, o que foi determinado no julgamento do processo TC 0402497-7, colacionado pela auditoria em seu relatório. Além disso, o MPCO opina como escorreito o parâmetro utilizado pela auditoria para aferir o excesso de pagamento de diárias. No entender deste membro do parquet, o valor de R$ 6.787,62 deve ser devolvido ao erário municipal. 2. Despesas sem licitação – a auditoria identificou uma série de despesas realizadas pela municipalidade sem que fosse respeitado o princípio constitucional da licitação. Elas estão detalhadas nos anexos 15 a 19 do relatório de auditoria. A defesa coloca que (fls. 2291 – 2294), especificamente quanto a aquisição de peças para veículos, não era factível fazer a licitação. Isto se deve ao fato de não ser possível se saber quando uma peça do veículo irá se desgastar. Além disso, os valores praticados ficaram dentro da faixa de mercado. Em sua NTE, a auditoria coloca que (fls. 2626 – 2627) todas as despesas elencadas como irregulares eram previsíveis e inerentes as atividades municipais, como transporte de estudantes e de lixo, material de construção e peças para a frota da Prefeitura. Além disso, não foi acrescido nenhum documento que busca afastar a irregularidade apontada. De fato, há de se concordar com a auditoria. Analisando as despesas infirmadas, verifica-se que nenhuma dela é totalmente estranha às atividades normais da administração pública. A viabilidade de se fazer um certame para elas é clara. Inclusive é sabido que esta Corte de Contas realiza, periodicamente, licitações para manutenção dos seus veículos, que envolvem peças e serviços. Assim, resta patente a irregularidade que aviltou, frontalmente, um dos princípios da Administração Pública estabelecido pela nossa Carta Maior. 3. Despesas indevidas – a municipalidade efetuou despesas com a aquisição de brindes (dvd's, fogões, fornos de micro-ondas, televisores, etc) a serem distribuídos entre os servidores e munícipes durante as comemorações dos dias das mães. Isto caracteriza afronta direta aos princípios basilares da Administração Pública: impessoalidade, e legalidade, já que não há interesse público em tal ato. No total, foram gastos R$ 2.225,30. 12 A defesa alega que (fls. 2294 – 2295) a distribuição de brindes, mediante sorteio em praça pública, é um costume municipal, que sobrevive a mais de 30 anos. Tanto que existia previsão orçamentária e lei municipal possibilitando que tal ocorra. Interessante notar que as alegações da defesa não são acompanhadas das devidas provas. Se existia lei municipal que albergava tal prática, por que não a acostou aos autos? Qual foi a rubrica contábil que reservou verbas para a aquisição de tais “brindes”? Sequer este detalhamento foi destacado pela defesa. Assim, como a defesa assumiu a prática da irregularidade, a interessada deve ser responsabilizada pela mesma. Com isso, deve-se impor o dever de devolver os recursos gastos indevidamente, já que há total falta de interesse público. 4. Despesas com caráter assistencialista – a municipalidade adquiriu peixes para serem distribuídos no período da semana santa no valor de R$ 52.780,00. Ocorre que não havia previsão no ordenamento jurídico local dos programas assistenciais do município de doação de peixes na semana santa. Além disso, não houve qualquer controle acerca das pessoas que foram beneficiadas com tais bens, o que quebra o princípio da impessoalidade. Por fim, a natureza laica do Poder Público restou prejudicada, já que tal distribuição pode ser caracterizada como uma subvenção pública de caráter religioso. A defesa coloca que (fls. 2295 – 2296) a distribuição de peixes na semana santa é um costume existente em todos os municípios pernambucanos, havendo inclusive previsão orçamentária para tanto. A distribuição de tais gêneros alimentícios dá-se para toda a coletividade, portanto resta caracterizada a impessoalidade da ação. Pela argumentação da defesa, verifica-se que houve uma clara quebra da isonomia, que aconselha tratar os diferentes de forma diferenciada, na medida de suas desigualdades. Tendo a distribuição dos peixes alcançado a todos de forma indiscriminada, pode-se ter beneficiado, justamente, a quem não precisava de tal bem, prejudicando a quem realmente tinha necessidade desta “caridade”. O MPCO entende que deve ser aplicado o mesmo entendimento firmado na decisão do processo TC nº 0890045-0, onde o nobre conselheiro relator, Dr. Ruy Ricardo, assim se colocou: I – Das despesas com caráter assistencialista (item 5.4) – nesse item a auditoria impugnou a realização de despesas com aquisição de peixes supostamente distribuídos entre a população carente, no total de R$ 20.400,00, considerando: a ausência de previsão legal nas normas locais reguladoras dos programas de assistenciais municipais; falta de identificação e controle acerca das pessoas beneficiadas; e descaracterização como atividade assistencial, já que o consumo de peixe na época da páscoa reveste-se de um caráter religioso, em contraposição à natureza laica do poder público, aspectos que em conjunto teria demonstrado a ausência de finalidade pública da despesa, além de afronta aos princípios da legalidade, eficiência, impessoalidade e moralidade que devem nortear os atos dos gestores públicos. O interessado, em sua defesa, faz referência a dispositivos de norma local criando permissivo ao Chefe 13 do Executivo de prestar assistência social a pessoas comprovadamente carentes, inclusive mediante combate à carência alimentar. Acrescentando que, ao contrário do afirmado pela auditoria, teria ocorrido a identificação da condição de hipossuficiência dos beneficiados, sendo público e notório que as doações são feitas em benefício das pessoas vinculadas ao Programa Bolsa família. Sendo assim, o controle das pessoas beneficiadas com doações teria ocorrido por oportunidade da atualização do cadastro e comprovação dos requisitos para a permanência no citado Programa. Foram juntadas 73 cópias de uma pesquisa de diagnóstico da condição sócio-econômica de moradores locais, sem registro de data de preenchimento, contendo a aposição de carimbo “DOAÇÃO DE PEIXE 2007”. As assinaturas (e identificações equivalentes) constantes dos citados documentos correspondem, tãosomente, ao atesto de veracidade das informações fornecidas na pesquisa, e não ao recebimento de eventuais doações. Os carimbos indicando doações sem o respectivo atesto de recebimento possuem o mesmo valor que recibos em branco, portanto, não possuem o condão de comprovar a efetividade das doações sob exame. Ademais, os documentos citados correspondem uma parcela ínfima dos eventuais beneficiados, se considerarmos o montante total envolvido. Entendo que a documentação juntada pela defesa não é suficiente para a efetiva comprovação do controle e identificação dos beneficiados das doações sobre exame. Sequer há comprovação de que o cadastramento dos beneficiados do Programa Bolsa Família ocorreu durante o período da Semana Santa, já que, conforme alegado pela defesa, as doações foram feitas quando dos citados cadastramentos. Analisando precedentes deste Tribunal verifiquei manifestações no sentido da devolução de valores referentes a doações dessa natureza, considerando a não adequação às normas reguladoras e, em especial, a não comprovação da destinação das doações. Conforme ressaltou o nobre Conselheiro Marcos Loreto, no julgamento do Processo TC nº 0890078-4, “...já é pacífico nesta Casa que as doações feitas pelos órgãos públicos devem estar acompanhadas de cadastro das pessoas, com no mínimo, identificação documental, endereço e assinatura do recebedor...”. Ainda nesse sentido destaca-se o julgamento do Processo TC nº 0501344-6, de relatoria do Auditor Substituto Luiz Arcoverde Filho, que imputou dano decorrente da doação de peixes, também em vista da ausência de identificação dos beneficiários, sendo a deliberação confirmada em grau de recurso (vide também julgamento do Proc. TC nº 9901472-5). Sigo os precedentes, determinando a devolução do total impugnado pela auditoria, por entender que a documentação juntada pela defesa não foi hábil para comprovar a efetividade do controle dos beneficiários das doações. 14 5. Despesas com empresas inidôneas – a auditoria identificou que a municipalidade efetuou despesas com empresas inidôneas. São elas J.L. Comércio (a empresa, no momento da diligência, encontrava-se fechada durante o horário comercial); Comercial Nunes Vianna Ltda (em seu endereço encontra-se uma residência); Atha Representações (no local de seu endereço funciona um curso de informática – Microlins) e Ferreira e Moura Comércio e Representações Ltda (no local de seu endereço, encontra-se um posto de combustível). A defesa coloca que (fls. 2296 – 2298) as empresas contratadas pela municipalidade existem e forneceram, de fato, os materiais adquiridos. O mero fato das empresas serem novas não as impossibilita de participarem de licitações. Quanto a empresa Atha, ela mantinha um escritório próximo a Microlins em Carpina, mas mudou o seu endereço. Isto pode ser verificado no alvará de funcionamento espedido por aquela municipalidade. O mesmo pode ser afirmado quanto a empresa JL Comércio. Por fim, a defesa afirma que a empresa Nunes Viana deve ter mudado o seu endereço e não providenciou as devidas alterações no cadastro da Prefeitura. As argumentações apresentadas pela defesa não merecem prosperar. Cabe a esta Corte de Contas privilegiar o princípio da veracidade, e ela é estampada ao vermos as informações obtidas junto a outros agentes (SEFAZ, Contador, etc). Destaco os seguintes excertos do relatório, por achá-los essenciais para a formação da convicção dos doutos julgadores: Em circularização procedida junta à Secretaria da Fazenda do Estado de Pernambuco, através do Ofício TC/IRMN n° 320/2008 obtivemos a seguinte informação, através do ofício 146/2008 – DRR – IRF, a respeito da empresa Comercial Nunes: - “Contactamos o contador , constante no cadastro da empresa, que nos informou, estar a empresa desativada.”; - “Os valores registrados nas notas fiscais são completamente incompatíveis com o local dado como endereço da Empresa, assim como o regime de inscrição do Contribuinte, uma vez que o mesmo é enquadrado no simples nacional; “pelo exposto acima operações fictícias”. podemos informar sobre fortes indícios de Em circularização procedida junta à Secretaria da Fazenda do Estado de Pernambuco, através do Ofício TC/IRMN n° 320/2008 obtivemos a seguinte informação, através do ofício 146/2008 – DRR – IRF, a respeito da empresa ATHA Representações: “Em visita ao estabelecimento no endereço constante no CACEPE, constatamos que o estabelecimento encontra-se fechado/destino ignorado. Segundo informações coletadas com os vizinhos, este estabelecimento já estaria fechado a alguns meses.”; - “Os valores registrados nas notas fiscais são completamente incompatíveis com o local dado como endereço da Empresa, assim como com o regime de Inscrição do Contribuinte, uma vez que o mesmo é enquadrado no simples nacional.” 15 “O contribuinte nunca apresentou qualquer documento de informação fiscal”; - “pelo exposto acima podemos informar sobre fortes indícios de operações fictícias.” Na circularização procedida pela SEFAZ já mencionada, a respeito desta empresa (Ferreira e Moura) há a seguinte informação: - “Em visita ao endereço constante no cadastro constatamos o funcionamento de um posto de combustível no local, sem a existência de salas onde pudessem funcionar outras empresas. Informações colhidas no local atestam que nunca funcionou a referida empresa no local, pelo menos no período de mais de 1 ano, tempo de construção e funcionamento do posto. Desta forma procedemos ao cancelamento da inscrição”: Diante de tais fatos, não há como concluir diferente do que fez a auditoria. No entender deste membro do ministério público especializado, a irregularidade está perfeitamente configurada, cabendo impor à interessada a obrigação de devolver os valores despendidos com tais empresas. Ante o exposto, Afasto a preliminar de realização de oitiva de testemunhas argüida pela Interessada, nos termos do Parecer do Ministério Público. Afasto também a multa sugerida no Parecer ao Sr. Eraldo Ferreira da Silva, e o débito de R$ 6.787,62 relativo ao pagamento irrazoável de diárias à Sra. Tereza Cristina Barbosa da Silva. Assim, Considerando a apresentação da prestação de contas sem todos os documentos considerados essenciais pela Resolução TC nº 19/2008; Considerando o não encaminhamento, a esta Corte de Contas, dos Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária; Considerando a falta de confiabilidade dos registros da dívida pública consolidada, o que mascarou a real situação financeira do município; Considerando a aplicação inferior ao mínimo exigido dos recursos do FUNDEB na remuneração dos professores; Considerando a assunção de compromissos à conta do FUNDEB sem o devido lastro financeiro; Considerando o percentual de aplicação nas ações e serviços de saúde abaixo do mínimo constitucional; Considerando que a municipalidade realizou aplicações nas ações e serviços de saúde fora do FMS; Considerando os problemas identificados na gestão previdenciária, que se repetem desde o exercício de 2007; 16 Considerando os problemas identificados na contratação de artistas (falta de exclusividade do empresário e falta de justificativa para o valor da contratação); Considerando as inconsistências das informações contábeis da prestação de contas; Considerando as irregularidades verificadas na análise das despesas da Prefeitura: Realização de despesas sem licitação; Realização de despesas indevidas com brindes, no valor de R$ 2.225,30; Realização de despesas com caráter assistencialista, no montante de R$ 52.780,00; Realização de despesas com empresas inidôneas, no montante de R$ 593.890,34. Considerando as irregularidades que foram apuradas na “Operação Eleições”, do exercício de 2008: Contabilização incorreta de gastos com pessoal; Burla ao concurso público; Realização de despesas sem comprovação; Concessão de diárias sem a devida prestação de contas. CONSIDERANDO o disposto nos artigos 70 e 71, inciso I, combinados com o artigo 75 da Constituição Federal, Voto pela emissão de PARECER PRÉVIO recomendando à Câmara Municipal de TRACUNHAÉM a REJEIÇÃO das Contas da PREFEITA, Sra. Tereza Cristina Barbosa da Silva, relativas ao exercício financeiro de 2008, de acordo com o disposto nos artigos 31, parágrafos 1º e 2º, da Constituição do Brasil, e 86, parágrafo 1º, da Constituição de Pernambuco. CONSIDERANDO o disposto nos artigos 70 e 71, incisos II, VIII, § 3º, combinados com o artigo 75 da Constituição Federal, e no artigo 59, inciso III, alíneas “b” e “c”, da Lei Estadual nº 12.600/04, (Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco), Julgo IRREGULARES as contas da Ordenadora de Despesas, Sra. Tereza Cristina Barbosa da Silva, relativas ao exercício financeiro de 2008, imputando-lhe o débito de R$ 648.895,64, que deverá ser atualizado monetariamente a partir do 1º dia do exercício financeiro subsequente ao das contas ora analisadas, segundo os índices e condições estabelecidos na legislação local para atualização dos créditos da Fazenda Pública Municipal, e recolhido aos cofres Municipais no prazo de quinze dias do trânsito em julgado da 17 presente decisão, encaminhando cópia da Guia de Recolhimento a este Tribunal para baixa de débito. Não o fazendo que Certidão do Débito seja encaminhada ao atual Prefeito, que deverá inscrever o débito na Dívida Ativa e proceder a sua execução, sob pena de responsabilidade. Aplico-lhe ainda multa individual, nos termos do artigo 73, inciso III, da Lei Estadual nº 12.600/04, no valor de R$ 5.000,00, que deve ser recolhida, no prazo de 15 (quinze) dias do trânsito em julgado desta Decisão, ao Fundo de Aperfeiçoamento Profissional e Reequipamento Técnico do Tribunal, por intermédio de boleto bancário a ser emitido no sítio da internet desta Corte de Contas (www.tce.pe.gov.br). Por último, determino que: -Informe-se ao órgão previdenciário sobre detectados na seara previdenciária municipal; os problemas -Cópia dos autos seja enviada para o Ministério Público de Contas para remessa ao Ministério Público Estadual, para as providências que julgar necessárias. O CONSELHEIRO MARCOS FLÁVIO TENÓRIO DE ALMEIDA VOTOU DE ACORDO COM O RELATOR. O CONSELHEIRO PRESIDENTE, TAMBÉM, ACOMPANHOU O VOTO DO RELATOR. PRESENTE O PROCURADOR DR. GUIDO ROSTAND CORDEIRO MONTEIRO. PAN/CL/ACP 18