O homem e sua circunstância A felicidade, nos ensina Maslow, é uma sensação de preenchimento inversamente proporcional à distância entre o que uma pessoa é e aquilo que ela pode ser. Se adotamos essa perspectiva, percebemos que a felicidade – em sua dimensão mais essencial – não está ligada à posse de bens, às boas condições de saúde e mesmo à tranqüilidade e à paz na vida afetiva e profissional. Todos esses aspectos, sem dúvida, fazem parte de uma vida feliz. No entanto, um ou mais de um deles pode faltar e, mesmo assim, uma pessoa considerar-se e ser realmente feliz. Por que isso ocorre? Isso acontece porque, em sua essência, a felicidade é aquela sensação que resulta da certeza de que estamos realizando nosso potencial. Se isso, de fato, está ocorrendo na vida de uma pessoa, ela será capaz de conviver com a falta de uma ou mais daquelas condições exteriores de felicidade: saúde, vida afetiva-sexual plena, bens materiais e êxito profissional. Pensemos por um momento em tantas pessoas extraordinárias, que se destacaram nos mais diversos ramos da atividade humana, e tiveram suas vidas marcadas pela renúncia ou mesmo a perda desses sinais externos de uma vida feliz. Segundo o paradigma do desenvolvimento humano, todos nós nascemos com um potencial e temos o direito de desenvolvê-lo. Para desenvolver o seu potencial as pessoas precisam de oportunidades. De todas as oportunidades, aquelas que mais diretamente desenvolvem o potencial de uma pessoa são as oportunidades educativas. As demais, embora imprescindíveis, apenas criam as condições para que isso ocorra. Porém, para que uma pessoa realize seu potencial, não basta que ela tenha oportunidades. É preciso que ela saiba valorizar e aproveitar, isto é, capitalizar em favor do seu crescimento essas oportunidades. Para tanto, a pessoa deve ser capaz de fazer escolhas. Não adianta, portanto, alguém ter oportunidades e não saber fazer escolhas, como tampouco de nada servirá saber fazer escolhas e não ter oportunidades. Se pararmos e pensarmos um pouco sobre nossas vidas, veremos que somos frutos de duas coisas: das oportunidades que tivemos e das escolhas que fomos fazendo ao longo de nossa existência. Se procuramos ver o processo de desenvolvimento pessoal por essa ótica, veremos que, freqüentemente, incorremos no erro de confundir os meios com os fins. A educação, por exemplo, não é um fim em si mesma. Ela é apenas um meio, um instrumento para o ser humano desenvolver o seu potencial, isto é, tornar realidade as promessas que trouxe consigo ao vir a este mundo. Por outro lado, se temos em mente o desenvolvimento econômico, social e político de um povo, veremos que o risco de confundirmos meios e fins continua presente. Mais do que o crescimento considerado de per si, os objetivos finais do desenvolvimento estão relacionados às oportunidades reais de os seres humanos desenvolverem o seu potencial. Sem isso, como dizia o Presidente Tancredo Neves, toda prosperidade será falsa. O homem, nos ensina Ortega Y Gasset, é ele mesmo e suas circunstâncias. Quando nos defrontamos com o desafio de desenvolver áreas econômica e socialmente deprimidas, temos uma ótima oportunidade de compreender essa afirmação em sua inteira verdade. Se desenvolvermos as circunstâncias com um investimento produtivo, mas não desenvolvermos as pessoas, acabaremos atraindo de fora gente mais preparada, para tocar o empreendimento, mantendo a população local apartada dos frutos do progresso obtido. 1 Se, por outro lado, desenvolvermos as pessoas pela educação básica e profissional, sem desenvolver a sua circunstância, ou seja, sem criar e oferecer-lhes oportunidades de emprego e renda, elas acabarão migrando para outras terras em busca das oportunidades, que não lhes foram oferecidas em seu meio de origem. Vê-se, portanto, claramente, que é imprescindível desenvolver ao mesmo tempo o ser humano e a sua circunstância. Como fazer isso? Para fazer isso, como nos ensina Norberto Odebrecht, precisamos nos apoiar nas forças – já que nada se constrói sobre as fraquezas – dos homens e das suas circunstâncias naturais, econômicas, sociais, políticas e culturais. Uma das maneiras mais interessantes de definir o homem é vê-lo como um ser de relações, aberto em todas as direções. Na direção de si mesmo, na direção dos outros homens, na direção do ambiente em que vive e na direção da dimensão transcendente da vida, daquelas crenças, valores, princípios e ideais mais profundos, que conferem sentido à sua existência. E, em todos esses planos da existência, a confiança é um bem absolutamente essencial. Confiar em si mesmo, confiar nos outros, confiar nas potencialidades do ambiente em que está inserido e confiar em suas crenças, princípios e valores são condições para que as pessoas, os grupos, as organizações e a inteira sociedade desenvolvam plenamente o seu potencial. Fonte COSTA, Antonio Carlos Gomes da. O homem e sua circunstância. [S.l.: s.n.]. 2