Ariadne Enes ROCHA. “A conservação da mata ciliar como

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Ariadne Enes ROCHA. “A conservação da mata ciliar como estratégia de
segurança alimentar na comunidade ribeirinha de Morros – MA.” (2001)
A conservação da mata ciliar do rio Munim (município de Morros-MA) pela
comunidade extremamente pobre que ali vive contradiz a correlação
largamente reconhecida entre pobreza e degradação do meio físico. Este
estudo buscou subsídios para contextualizar e discutir se a conservação desta
mata ciliar é determinada por valores culturais, ou se é uma estratégia de
sobrevivência desenvolvida como resposta a um ambiente adverso. A
investigação foi feita através da aplicação de questionários e entrevistas semiestruturadas a 35 famílias ribeirinhas que têm em seus quintais a mata ciliar,
abrangendo o total de 240 pessoas. A maioria das famílias (83%) vive abaixo
do nível de pobreza, utilizando os produtos florestais como suplemento das
necessidades básicas. O grande número de pessoas por famílias (sete
pessoas, em média) agrava o problema da limitação de recursos disponíveis,
apesar de formarem a força de trabalho que exerce as demais atividades das
quais o grupo familiar depende. O tamanho das propriedades varia de 0,2 a
693ha, sendo que 52% têm áreas menores que 20ha. O acesso à terra e aos
recursos naturais não são garantidos, já que somente 58% das famílias têm a
propriedade da terra. As principais atividades exercidas pela comunidade são a
agrícola (policultivo, com mandioca como cultura principal) e a extrativista
vegetal. As principais espécies florestais exploradas são a juçara (Euterpe
oleracea) e a andiroba (Carapa guianensis). A juçara, consumida na forma de
vinho juntamente com a farinha de mandioca, é o principal componente da
dieta alimentar das famílias durante seis meses do ano, época em que há
escassez de outros produtos agrícolas. Além disso, a venda da juçara em
caroço é a principal fonte de renda da maioria das famílias. A andiroba é
utilizada para a extração do óleo, que é, em grande parte, vendido para
fabricação de sabão e de medicamentos caseiros. Assim, os produtos florestais
não-madeiráveis são importantes fontes geradoras de renda direta (frutos,
seiva, óleo, fibras e outros) e indireta (comercialização de parcela da
produção). Para aumentar a produtividade das espécies de importância
econômica e social para a comunidade, como a juçara, a comunidade pratica
uma forma de manejo que beneficia esta palmeira, através da eliminação de
indivíduos de outras espécies, contribuindo para a formação de grupos quase
puros dessa palmeira - os juçarais - na mata ciliar. Apesar desta intervenção, a
mata ciliar continua a desempenhar em grande medida as suas funções
ecológicas. A necessidade de garantir a reprodução da unidade familiar através
da utilização dos recursos fornecidos tanto pela roça quanto pela mata ciliar,
influenciadas pelas limitações impostas pelo meio, pode ter levado esta
comunidade ribeirinha a interagir de forma relativamente harmoniosa no meio
que a cerca. Entretanto, a conservação da mata ciliar pode ficar comprometida
a longo prazo em função da forte dependência das comunidades em apenas
dois produtos obtidos desse ecossistema. Fortes flutuações de mercado para
estes produtos poderão desestimular a sua produção, resultando em forte
redução da renda das famílias, e estimulando a venda do palmito e da madeira
destas espécies como compensação. Entre as ações recomendadas para
promover o manejo sustentável dos produtos florestais estão a diversificação
de produtos obtidos da mata, o processamento dos produtos e a redução da
cadeia de comercialização para agregar mais valor localmente, além da busca
de mercados que absorvam produtos com preço diferenciado, produzidos de
maneira ecologicamente mais correta.
Crisanto Lopes de OLIVEIRA. “De vaca sagrada da índia a boi
consagrado na Amazônia: a irresistível ascensão do Zebu.” (2001)
O desmatamento na Amazônia brasileira é um dos temas mais discutido na
atualidade. As possíveis conseqüências da substituição da floresta original por
diversos usos agrícolas geram polêmicas entre os cientistas e pesquisadores.
É consenso entre esses profissionais que a bovinocultura extensiva é uma das
atividades que mais promovem a diminuição das florestas. Sistemas que
proporcionam o aumento da produtividade através da intensificação do uso das
terras, como o melhoramento das pastagens e os sistemas agroflorestais
(SAF), são propostas que reúnem adeptos que acreditam na sua eficácia para
diminuir o desmatamento. Todavia, essas proposições também são motivos de
controvérsias. Este estudo pretende contribuir para a discussão sobre o
desmatamento a partir do caso dos agricultores familiares de pequena escala
de Ouro Preto do Oeste - RO, contextualizando o processo de ocupação das
terras agrícolas. O enfoque à bovinocultura extensiva e aos SAF se deve a
utilização de ambos como estratégia de sobrevivência por parte desses
produtores. A pesquisa confronta dados coletados entre os agricultores locais
mais comuns e entre os produtores autodenominados alternativos relativos ao
período 1994-1999. Os resultados mostraram que, de um modo geral, houve
aumento da área de pastagem e do rebanho bovino, mesmo com a adoção de
culturas perenes, SAF incluídos, e diminuição das áreas de floresta, sugerindo
que o desmatamento não é diminuído pela simples utilização desses cultivos.
Entre os agricultores alternativos, porém, o desmatamento foi menor quando
comparado ao dos convencionais. Outro resultado relevante deste trabalho foi
a constatação de que a grande maioria dos produtores, convencionais e
alternativos, têm a intenção de ampliar as áreas de pastagem e o rebanho
bovino, o que evidencia uma pressão contínua sobre a floresta, de modo que
haverá necessidade de aprofundar a pesquisa em socioeconomia.
Carolina GARTNER. “A função social de uma unidade de conservação de
uso sustentável: um estudo de caso na área de preservação ambiental
Serra Dona Francisca.” (2003)
Este estudo constitui-se na contextualização de um processo de conservação
através da criação de uma Área de Preservação Ambiental – APA, denominada
Área de Preservação Ambiental Serra Dona Francisca, localizada na porção
noroeste do município de Joinville estado de Santa Catarina. Sobre a temática
da conservação ambiental, agem dois fatores até muito pouco tempo
encarados como antagônicos: a proteção da natureza e a inovação,
condicionada pela busca de novas soluções para um velho problema, o da
exclusão de populações consideradas tradicionais das áreas destinadas à
conservação. Com a implantação de unidades de conservação de uso direto,
ou uso sustentável, surge um novo quadro político e ideológico. Neste novo
contexto, ganha relevância não só a proteção aos elementos naturais, mas
também o elemento social. Dentre as unidades de conservação de uso
sustentável está a APA, a sua criação passa a ser entendida como
possibilidade de exercício de atividade econômica por parte dos que a
desejam, sobre condições específicas em lei e que não violem as regras de
conservação ambiental. A APA tem como princípio a permanência das
populações permitindo que a comunidade continue vivendo e desenvolvendo
suas atividades produtivas, no entanto os problemas continuam, pois repete-se
de forma incrível, a imposição de uma dinâmica e de um modelo de gestão
preservacionista. Contraditório ou não, numa unidade de conservação de uso
sustentável, onde a preservação deveria ser vista como uma atividade
complementar, e não exclusiva, pois a mesma instabiliza e fragiliza a economia
nas pequenas propriedades familiares, deixando um grande vazio de
alternativas econômicas para os pequenos agricultores, principais responsáveis
pela implementação do processo de conservação. Assim, através da
percepção destes e de outros atores sociais que estão direta ou indiretamente
envolvidos no processo de conservação analisamos as implicações e as
contradições existentes entre conciliar o existir e o conservar na pequena
propriedade. Fundamentados nos princípios e diretrizes do Sistema Nacional
de Unidades de Conservação que asseguram a ampla participação das
populações tradicionais locais, em todas as fases de criação e gestão
(elaboração, atualização e implementação) das Áreas de Preservação
Ambiental busca-se apontar as lacunas do modelo de gestão adotado, bem
como, são feitas sugestões para o mesmo ambicionando mudanças políticas
num processo de conservação coerente com a realidade local, e que se efetive
com dignidade e participação social.
Arthur Cezar Pinheiro LEITE. Neoextrativismo e desenvolvimento no
Estado do Acre: o caso do manejo comunitário do óleo de copaíba na
RESEX Chico Mendes. (2004)
A extração da borracha e da castanha são, historicamente, as principais
atividades econômicas dos moradores da floresta no Acre. O extrativismo
garantiu a conservação da cobertura florestal do Estado, que ainda tem 90% do
seu território coberto por floresta densa. Por outro lado, o extrativismo foi
marcado por ciclos de prosperidade e decadência que evidenciaram a sua
precariedade e fragilidade como atividade econômica. Nos últimos anos, as
dificuldades por que passa o sistema extrativista são notadas, principalmente
pelo aumento de áreas desmatadas para a expansão da pecuária e da
agricultura itinerante, dentro e fora da Reserva Extrativista Chico Mendes. O
atual governo do Estado quer reverter esta situação e revigorar o extrativismo
como modelo de desenvolvimento, baseado no uso racional dos recursos
florestais, incentivando e modernizando a atividade. Neste contexto, ganham
importância os produtos florestais não-madeireiros, através de projetos
comunitários de manejo que buscam somar conhecimentos tradicionais e dos
técnicos que promovem o desenvolvimento local. O modelo é discutido e
avaliado nesta dissertação, a partir do estudo de caso do Projeto Copaíba, uma
experiência de manejo do óleo da copaíba (Copaifera sp.) na Reserva
Extrativista Chico Mendes, no município de Xapuri-AC. Além de dados
ecológicos e econômicos da espécie e do produto, foram realizadas entrevistas
com os seringueiros, levantando as suas opiniões sobre o trabalho com
produtos florestais não-madeireiros e o seu potencial como uma alternativa de
uso da floresta. Foram também discutidas outras atividades desenvolvidas nos
seringais como a agricultura itinerante e a pecuária, além da possibilidade da
exploração da madeira. Os resultados do trabalho revelaram que a
incorporação de tecnologias simples de manejo da espécie e o suporte técnico
para acompanhamento dos processos de beneficiamento e comercialização do
produto, além do registro do plano de manejo comunitário resultaram em
melhoria da renda dos seringueiros e na valorização da espécie manejada e da
floresta pelos seringueiros. Segundo a avaliação realizada neste trabalho, o
projeto revelou-se promissor.
Fabiana Massoca SCARDA. Cultivando tartarugas: implicações da
agricultura de praia na conservação de populações de quelônios
(Podocnemis spp.) na várzea do médio Rio Solimões, Amazonas, Brasil.
(2004)
Este estudo foi desenvolvido junto à comunidade Marirana, localizada na
Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Mamirauá, área de várzea da
Amazônia, pertencente ao estado do Amazonas, Brasil, entre agosto e
dezembro de 2003. As praias localizadas na região formadas no período da
seca, são utilizadas pelos moradores locais para agricultura e pelos quelônios,
como ponto de nidificação. Buscou-se, então, estudar a relação entre a
agricultura e três espécies de quelônios (Podocnemis expansa - tartaruga, P.
unifilis - tracajá e P. sextuberculata - iaçá). Para isto, foi feito um estudo
quantitativo verificando a ocorrência e predação das espécies em quatro praias
onde foram desenvolvidas atividades agrícolas, anotando-se o número de
covas e rastros encontrados. No total foram anotadas 152 vezes a presença de
quelônios nas praias, sendo que em 70 vezes houve desova. A espécie com
maior incidência foi a iaçá, (54,0%), seguida da tartaruga (27,6%) e tracajá
(18,4%). Apenas três (4,3%) covas ficaram intactas, sendo que o restante foi
predado pelo homem (92,9%) e pelo lagarto jacuraru (2,8%). Afim de se
verificar se a presença humana nas épocas de plantio e colheita e de espécies
agrícolas nas praias estariam afastando as espécies de seus locais de desova,
foi feito um estudo da distância entre as covas e as áreas agrícolas e da
densidade de covas por área (agrícola e não agrícola). Encontrou-se um maior
número de covas (28,6%) entre 100 e 300 metros de distância, entretanto, em
três praias, a densidade de covas foi maior nas áreas agrícolas. Como nas três
espécies estudadas a temperatura dentro da cova durante o período de
incubação é que determina sua razão sexual (um número maior de fêmeas
nasce a temperaturas mais altas) e como a cobertura vegetal influencia na
temperatura do solo, diminuindo-a, em três praias, foi feito um estudo da
temperatura do solo em diferentes áreas (centrais e próximas à beira, com e
sem agricultura e vegetação natural). Ao contrário do que se esperava,
encontrou-se a média de temperatura mais alta em pontos com plantios. Isto
deve ter ocorrido pois os agricultores escolhem áreas altas e centrais, para
proteger as culturas dos repiquetes e devido ao grande espaçamento adotado
pelos agricultores. Os resultados foram discutidos com auxílio de entrevistas
realizadas com famílias da comunidade. O trabalho mostrou que o
desenvolvimento de atividades agrícolas de forma tradicional nas praias não
está prejudicando as populações das espécies estudadas e pode ainda ser
utilizada como aliada na sua preservação. Entretanto, alterações no modo
como é desenvolvida tal atividade poderiam trazer danos a estas populações.
Charle
Ferreira
CRISÓSTOMO.
“Diferentes
Olhares,
Distintos
Significados: Conflitos de Interesses e Engajamento na Questão da
Exploração Madeireira na Reserva Extrativista Chico Mendes.” (2006)
Neste trabalho, foi analisada a situação-problema da exploração comercial de
madeira como uso da terra na comunidade Rio Branco da Reserva Extrativista
Chico Mendes, Estado do Acre, onde está sendo implementado o Projeto de
Manejo Florestal Comunitário (PMFC). Vinte e um extrativistas da comunidade
participaram do estudo, além de diversos profissionais de nove instituições
governamentais e não-governamentais ligadas à questão. Com base nas
entrevistas com os envolvidos no trabalho, foi elaborada uma lista de oito usos
da terra adequados aos objetivos da Reserva, e cada participante foi solicitado
a ordená-los de acordo com as suas prioridades. Através do uso do Indicador
de Sustentabilidade em Sistemas de Interesse (ISSI) foi calculado o grau de
convergência entre o interesse (ordenamento de prioridades) de cada
extrativista e o interesse coletivo. Foi também calculado o ordenamento médio
das prioridades de cada instituição e o grau de convergência entre elas e entre
elas e os extrativistas. Os extrativistas se identificam como ‘não-participantes’
ou como ‘participantes’ do PMFC. O manejo de Produtos Florestais NãoMadeireiros (PFNMs) e o cultivo da roça ainda são os usos da terra preferidos
pelos extrativistas não-participantes’, que atribuem prioridade mínima para a
exploração da madeira. Os extrativistas participantes do projeto apontaram a
exploração da madeira como prioridade máxima no seu primeiro ordenamento
de usos da terra. As outras instituições apontaram preferência pelos usos da
terra com menor impacto sobre a floresta, se aproximando mais das
prioridades do grupo dos não-participantes do PMFC. Todos os extrativistas,
após conhecerem o resultado dessa primeira etapa e compararem as suas
prioridades com as prioridades da coletividade, tiveram oportunidade de
reordená-las. Os não-participantes do PMFC reafirmaram a sua posição inicial,
enquanto os participantes a mudaram substancialmente, elegendo o manejo de
PFNMs e o cultivo da roça como prioridades máximas. Os resultados do
primeiro ordenamento de prioridades, mas principalmente do seu
reordenamento, revelam que a questão da exploração da madeira na Reserva
Extrativista Chico Mendes constitui um complexo sistema de interesses. Os
extrativistas participantes do PMFC podem ter decidido reordenar
significativamente as suas prioridades simplesmente pelo constrangimento que
a divergência em relação aos outros extrativistas da comunidade lhes causou.
A outra possibilidade é que desejaram de fato mudar as suas prioridades com o
objetivo de se aproximarem do interesse coletivo. Independentemente da
razão, entretanto, esses resultados indicam que os extrativistas ainda se
sentem inseguros em relação às conseqüências da implementação do projeto,
ou seja, que o projeto não estava suficientemente discutido para ser
implementado.
Juan Carlos Aguirre NEIRA. “Ocupação e Gestão Territorial de Indígenas
Mbyá-Guarani: Analise a partir da formação da Aldeia Itanhaen, em Santa
Catarina – Brasil”. (2008)
Atualmente, os processos de regularização fundiária para comunidades
indígenas no Brasil geram novos espaços de interação entre as populações
tradicionais e setores da sociedade majoritária. No caso dos indígenas Guarani
no sul do país, alguns episódios conflituosos demonstram a necessidade de um
melhor diálogo intercultural, pois se evidencia uma compreensão ainda
insuficiente por parte dos não índios sobre a forma Guarani de pensar a
ocupação territorial e de gerenciar o uso dos recursos disponíveis. Visando
contribuir nessa questão, a presente dissertação analisou o sistema de
ocupação e gestão territorial de indígenas Mbya-Guarani e a sua dinâmica de
adaptação no contexto atual. Com um enfoque qualitativo, a pesquisa se
desenvolveu em várias aldeias Guarani em Santa Catarina, através de
entrevistas semi-estruturadas a vários informantes chave. Além disso, o estudo
do processo de formação da aldeia indígena Itanhaen, localizada no município
catarinense de Biguaçu, permitiu analisar a dinâmica de ocupação e
adaptação. No decorrer da pesquisa se observaram no Estado
comportamentos preconceituosos e xenofóbicos em contra de vários grupos
Guarani, fruto do desconhecimento generalizado e a desinformação
preponderante na mídia do Estado. Assim mesmo, a pesquisa retratou uma
enorme capacidade de adaptação do sistema de organização territorial guarani
que, mantendo seus princípios cosmológicos que definem sua identidade,
flexibilizam seu padrão de ocupação territorial de forma criativa. No fim,
conseguiu-se esboçar um modelo Guarani de ocupação do espaço e de
gerenciamento dos recursos disponíveis, permitindo definir elementos que
contribuem ao diálogo entre sistemas de gestão no uso dos recursos naturais,
visando à consolidação de sistemas mais duradouros.
Murilo da Serra SILVA. “Leite de Amapá (Parahancornia fasciculata (Poir)
Benoist): Remédio e renda na floresta e na cidade”, (2010).
Este estudo abordou a cadeia de produção e de comercialização e aspectos do
consumo do látex medicinal de amapá amargoso (Parahanconia fasciculata)
em Belém e Ponta de Pedras, no estado do Pará. A exemplo de muitos outros
produtos florestais não-madeireiros (PFNMs), o “leite de amapá”, como é
localmente conhecido, não figura nas listas de agências oficiais responsáveis
pelas estatísticas sobre produção e comercialização de produtos da floresta.
Entretanto, o leite de amapá e seu uso no tratamento de doenças das vias
respiratórias é amplamente conhecido pela população local. Assim, este estudo
teve como objetivo trazer à luz diversos aspectos do manejo e uso desse
produto, revelando a sua importância na vida de seus produtores e
consumidores. Foi utilizada a abordagem da “cadeia da produção ao consumo”
partindo-se da comercialização do produto nos centros urbanos até a sua
extração na floresta, estratégia que permitiu identificar os atores envolvidos em
todo o processo. Consumidores e comerciantes em todos os níveis foram
entrevistados. Com os extrativistas do produto foram realizadas oficinas e
turnês guiadas nos locais de produção. Com a participação de extrativistas
foram também realizados inventários florestais para estudar aspectos da
ecologia e manejo da espécie. O volume de oito mil litros de leite de amapá
comercializado anualmente na região de Belém demonstra a importância da
espécie, principalmente para os consumidores de baixa renda, que são
maioria. A tradição secular do uso do látex também revelou-se importante fator
na escolha pelo produto. Quando o volume produzido é grande, o leite é
vendido diretamente aos mercados urbanos, sem intermediários. A renda
obtida com o látex representa, em média, 42% da renda total do extrativismo
dos 12 extrativistas que participaram da pesquisa, chegando a 92%. Em uma
das áreas inventariadas, a população de árvores de P. fasciculata apresentou
grande número de indivíduos e distribuição diamétrica do tipo “J-invertido” o
que sugere que a espécie é do tipo clímax e se encontra, nesse local, em
equilíbrio dinâmico. Em outros dois locais, entretanto, a população apresentou
distribuição mais próxima da curva normal, o que indica forte perturbação do
ecossistema. Nesses locais, as árvores também apresentaram número
proporcionalmente maior de árvores danificadas pela exploração do látex.
Entretanto, o estudo não confirmou a morte de árvores devido à exploração do
produto. A utilização da faca de seringueiro para o corte do tronco é uma
adaptação recente introduzida pelos extrativistas e provoca significativamente
menor dano e permite cicatrização mais rápida do tronco. Além de reduzir as
perdas de látex em relação ao uso do facão, reduz o tempo entre duas
extrações seguidas. A melhoria na técnica de extração do látex revela que os
extrativistas têm conhecimento da anatomia da árvore. O leite de amapá é um
produto florestal cuja extração pode ser manejada visando a sua produção
sustentável, ao contrário da exploração da madeira da árvore, outro uso
competitivo da espécie. O presente estudo revelou que o leite de amapá tem
significativo impacto na vida de pessoas da floresta, de comerciantes e de
consumidores nos centros urbanos. Possivelmente, entretanto, é somente um
dos casos de centenas de PFNMs que têm importância regional, seja na
geração de renda seja na oferta de fitoterápicos acessíveis à população de
baixa renda, mas que continua invisível às agências governamentais.
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