www.innovatio.org.br INTRODUÇÃO E DIDÁTICA DE FILOSOFIA Sabrina Fernanda Demozzi “Cada um de nós é como um homem que vê as coisas em um sonho e acredita conhecê-las perfeitamente, e então desperta para descobrir que não sabe nada” (Platão 428/427- 348/347 a.C.). Esta frase extraída da obra Político do filósofo grego Platão, é um convite à provocação. A partir de que momento o homem sai deste estado de plena confiança do que pensa conhecer e desperta para uma realidade em que não sabe de nada? Já que a filosofia é a ciência que nos provoca a pensar, sugerimos que iniciemos este nosso encontro com essa questão para já começarmos as nossas reflexões. Geralmente costuma-se associar à filosofia ou os filósofos uma atividade de gente “doida” que apenas fica pensando e não faz nada com isso. Ora, além de absurdo imaginar que pensar é fazer nada, é no mínimo injusto com a história da filosofia não considerarmos séculos e séculos de produção de conhecimento que nos ajudaram a esclarecer e discutir muitos dos dilemas da humanidade, não é mesmo? A professora Marilena Chaui discute esta questão: Qual seria, então, a utilidade da filosofia? Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão às ideias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências e na política for útil, se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem conscientes de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade de todos for útil, então podemos dizer que a Filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes. (CHAUI, p.24, 2010) Diante disso, pretendemos com este curso fornecer algumas pistas para o aprendizado e a didática da filosofia. Para que possamos nortear nossos estudos dividimos este curso em três partes: a origem da filosofia, alguns temas básicos da filosofia aplicados à nossa realidade e finalmente o ensino da filosofia no Brasil e a didática em filosofia. Paralelamente a esta divisão, acrescentaremos alguns recursos como: sugestão de filmes e leituras, pequenas biografias de personagens importantes, glossário, imagens entre outros. Bom curso! 1. A origem da filosofia A palavra filosofia tem origem grega e é a junção de duas palavras: philo e sophia. Philo quer dizer “aquele ou aquela que tem sentimento amável” e Sophia quer dizer “sabedoria”. Filosofia então quer dizer “amor e respeito pelo saber”. Costuma-se atribuir ao filósofo grego Pitágoras de Samos (V a.C) a invenção da palavra filosofia. Mas, em que contexto histórico surge a filosofia? É preciso que façamos um breve retrospecto antes de responder a esta questão. Você já deve ter ouvido falar nos mitos gregos. Os mitos eram narrativas que contavam com elementos fantásticos carregados de religiosidade e tradição. A transmissão dos mitos dava-se principalmente através da linguagem oral, e era uma forma de fazer com que todos levassem a vida de modo a agradar aos deuses para obter resultados positivos em diversos aspectos de sua vida e quem não observasse as lições de moral contidas nos mitos poderiam ser “punidos”. Logo, o mito não era apenas uma história, mas sim um exemplo a ser seguido. Entre os objetivos dos mitos estava o de transmitir mensagens para o povo, como por exemplo, as explicações sobre os fenômenos da natureza, a origem do mundo, os acontecimentos sociais e históricos da época. Além disso, os mitos tinham claramente a intenção de manter a tradição e preservar a memória do povo grego. Os mitos cumpriam uma função social moralizante de tal forma que essas narrativas ocupavam o imaginário dos cidadãos da pólis grega direcionando suas condutas. Na Atenas do século V a.C. existia também o espaço para as comédias que satirizavam os poderosos e personagens célebres, e as tragédias que narravam as aventuras e prodígios dos heróis, bem como suas desventuras e fracassos. (SANTOS, CARDOSO, SEEDPR, 2006) Para isso, eles lançavam mão de personagens e figuras mitológicas como os heróis, ninfas, deuses, centauros, entre outros, que se dividiam entre o plano da fábula e o da realidade cotidiana dos gregos. São alguns exemplos destes seres: os heróis que eram seres mortais, filhos de deuses e seres humanos como Hércules, seres como a Medusa, figura mitológica que tinha serpentes na cabeça e transformava em pedra quem a olhasse diretamente nos olhos e principalmente os deuses gregos como Zeus, o mais poderoso de todos os deuses, Hera mulher de Zeus e a deusa do matrimônio e Afrodite, deusa do amor e da beleza. O legado destas narrativas até hoje nos fascina e alguns nomes como Sofócles, Aristófanes e o poeta Homero são sempre lembrados quando falamos da Grécia antiga e da maneira que eles concebiam o mundo. É importante lembrar que tanto o mito como a poesia, fazem parte da origem da filosofia. Veja abaixo o exemplo do Mito de Sísifo que versa sobre o homem que desafia os deuses e é condenado a um castigo pior do que a morte. Após a leitura, responda às questões que seguem: O Mito de Sísifo Sisifo, de Tiziano Vecellio, 1548-1549 Link da imagem: Acervo: Museo del Pradohttps://www.museodelprado.es/en/the-collection/online-gallery/on-linegallery/obra/sisyphus/ “Sísifo, rei da Tessália e de Enarete, era o filho de Éolo. Fundador da cidade de Éfira, que mais tarde veio a chamar-se Corinto, e também dos jogos de Ístmia (ou Ístmicos). Sísifo tinha a reputação de ser o mais habilidoso e esperto dos homens e por esta razão dizia-se que era pai de Ulisses. Sísifo despertou a ira de Zeus quando contou ao deus dos rios, Asopo, que Zeus tinha sequestrado a sua filha Egina. Zeus mandou o deus da morte, Tanatos, perseguir Sísifo, mas este conseguiu enganá-lo e prender Tanatos. A prisão de Tanatos impedia que os mortos pudessem alcançar o Reino das Trevas, tendo sido necessário que fosse libertado por Ares. Foi então que Sísifo, não podendo escapar ao seu destino de morte, instruiu a sua mulher a não lhe prestar exéquias fúnebres. Quando chegou ao mundo dos mortos, queixou-se a Hades, soberano do reino das sombras, da negligência da sua mulher e pediu-lhe para voltar ao mundo dos vivos apenas por um curto período, para a castigar. Hades deu-lhe permissão para regressar, mas quando Sísifo voltou ao mundo dos vivos, não quis mais voltar ao mundo dos mortos. Hermes, o deus mensageiro e condutor das almas para o Além, decidiu então castigá-lo pessoalmente, infligindo-lhe um duro castigo, pior do que a morte. Sísifo foi condenado para todo o sempre a empurrar uma pedra até ao cimo de um monte, caindo a pedra invariavelmente da montanha sempre que o topo era atingido. Este processo seria sempre repetido até à eternidade.” (in Infopédia. Porto: Porto Editora, 2003-2015. [consult. 2015-01-26 16:11:11]. Disponível na Internet: http://www.infopedia.pt/$mito-de-sisifo) 1. O que você compreende por mito? 2. O que lhe chama a atenção no Mito de Sísifo? 3. É possível relacionarmos o mito de Sísifo com a vida do homem no mundo em que vivemos? Justifique: ILUSTRAÇÃO Crédito da imagem: http://pt.wikipedia.org/wiki/Homero - Acervo Helenístico no Museu Britânico Homero nasceu em 928 a.C na região da Jônia, no Egeu oriental. Foi um dos poetas mais importantes da Grécia antiga. A ele é atribuída a autoria dos poemas épicos Ilíada e Odisséia. Crédito da imagem: http://www.biografiasyvidas.com/bio Aristófanes nasceu em Atenas em 457 a.C. Foi um dramaturgo grego e escreveu mais de 40 peças. É considerado o maior representante da comédia antiga. VEJA TAMBÉM: LEITURA COMPLEMENTAR: O poema épico, Ilíada, cuja autoria é atribuída a Homero, é considerado um marco na literatura narrativa ocidental. Confira abaixo um trecho desta obra que descreve a Guerra de Tróia, o grande confronto entre os aqueus e os troianos, que durou 10 anos e vitimou inúmeros soldados, além dos heróis gregos Heitor e Aquiles. Procure ler! É um trabalho de complexidade incrível, repleto de informações históricas, filosóficas, geográficas e sociais. A queda de Tróia, por Johann Georg Trautmann (1713–1769)- Crédito da Imagem: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:J_G_Trautmann_Das_brennende_Troja.jpg – Da coleção dos grãos duques de Baden, Karlsruhe. Ilíada Canto I Canta, ó deusa, a cólera de Aquiles, o Pelida (mortífera! que tantas dores trouxe aos Aqueus e tantas almas valentes de heróis lançou no Hades, ficando seus corpos como presa para cães e aves de rapina, enquanto se cumpria a vontade de Zeus), desde o momento em que primeiro se desentenderam o Atrida, soberano dos homens, e o divino Aquiles. Entre eles qual dos deuses provocou o conflito? Apolo, filho de Leto e de Zeus. Enfurecera-se o deus contra o rei e por isso espalhara entre o exército uma doença terrível de que morriam as hostes, porque o Atrida desconsiderara Crises, seu sacerdote. Ora este tinha vindo até as naus velozes dos Aqueus para resgatar a filha, trazendo incontáveis riquezas. Segurando nas mãos as fitas de Apolo que acerta ao longe e um cetro dourado, suplicou a todos os Aqueus, mas em especial aos dois Atridas, condutores de homens: “Ó Atridas e vós, demais Aqueus de belas cnêmides! Que vos concedam os deuses, que o Olimpo detêm, saquear a cidade de Príamo e regressar bem a vossas casas! Mas libertai a minha filha amada e recebei o resgate, por respeito para com o filho de Zeus, Apolo que acerta ao longe.” Saiba mais: Platão (428/427 – Atenas, 348/347 a.C.) Link da imagem: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Plato_Silanion_Musei_Capitolini_MC1377.jpg Platão- Reprodução em mármore do retrato do filósofo feito por Silanion em 370 a.C. para a Academia de Atenas. Disponível atualmente no Museu Capitolino, em Roma. Para aprofundar os seus conhecimentos, sugerimos a leitura do texto A Alegoria da Caverna, escrito por Platão no livro A República, tomo VII. Este é um dos textos filosóficos mais conhecidos e podemos afirmar que ele não perde a sua atualidade. Em A Alegoria da Caverna, Platão utiliza a linguagem mítica, repleta de elementos fantasiosos, para explicar como os homens tinham dificuldade de libertar-se das crendices, mantendo-os em constante estado de passividade. Em resumo, o texto narra uma história em que alguns homens vivem toda a sua vida dentro de uma caverna e ficam todos voltados de costas para a entrada. Como estão acorrentados, eles não podem se mover e apenas visualizam na parede do fundo da caverna as sombras refletidas dos homens que vivem além do muro, por uma fresta de luz. Um dia, um destes habitantes da caverna sai e se depara com algo que nunca viu antes, pois o seu mundo era apenas o do fundo da caverna. Para saber o que acontece com ele, leia o texto todo. Vale a pena. Aproveite para perceber como podemos pensar o Mito da Caverna nos dias de hoje, quando pensamos o porque algumas pessoas optam por permanecerem no “fundo da caverna” apenas vendo as sombras dos outros homens. Analise! A pólis grega e o desenvolvimento da filosofia Pode-se dizer a filosofia surge a partir da combinação de alguns fatores. No período entre o século V e IV, importantes mudanças favorecem o desenvolvimento de uma nova forma de compreensão do mundo mais objetiva e fundamentada nas observações mais racionais sobre os conflitos, as guerras, as conquistas, os problemas do homem, dentre outros. O estabelecimento da vida urbana na pólis grega (Cidades-Estados independentes), a invenção da escrita, o comércio e a produção de alimentos são essenciais para o fortalecimento das cidades, bem como, o surgimento do espaço público por excelência, como por exemplo, as Ágoras que são importantes pontos em que as pessoas encontravam-se para comercializar nas feiras livres, discutir ideias e ter contato com a cultura e a política. A pólis passa então a representar a voz e os interesses da população e gradativamente as interpretações sobre a realidade são consolidadas a partir da experimentação, da observação dos fenômenos e elementos da Natureza e da discussão dos fatos. Vale salientar que mesmo que a pólis representasse então a “voz do povo”, não eram todos que tinham as mesmas condições de participação pública na cidade grega, como por exemplo, os estrangeiros, as mulheres e os escravos. A visão mítica dos gregos antigos não é mais a “única” e possível explicação para o mundo. Não podemos afirmar, porém, que esta ruptura aconteceu de uma hora para outra. Tanto o mito quando a religiosidade são elementos muito presentes na vida grega, e é certo que alguns setores da sociedade ateniense hesitavam em considerar outros pontos de vista sob o risco de perderem o seu poder. Os filósofos então têm papel essencial nesta sociedade. Destaca-se como um dos personagens mais emblemáticos nesta fase de transição do pensamento, o ateniense Sócrates (-469/- 399) que forneceu as bases para a prática da filosofia. Seu método era baseado principalmente no uso da ironia que, diferente do que entendemos hoje, não tinha como objetivo expor o interlocutor ao ridículo ou fazer graça, mas sim fazer uma pergunta sobre algo em discussão e incitar o debate, refutando conceitos e ideias, e a maiêutica, palavra que significa dar a luz (parto), e que neste caso, era a busca intelectual pela verdade, pela discussão das ideias. Os temas contemplados por Sócrates eram os mais distintos, por exemplo, questionamentos sobre que é belo, o que é justo, o que é ética, o que é a morte, o que seria um governo ideal, dentre outros. Sobre Sócrates: Despreocupado com os bens materiais — cujo acúmulo era o objetivo da maioria —, usufruindo os prazeres sem se atormentar em viver à sua cata, mas também sem deles fugir em exageros ascetas, Sócrates dedicava-se ao que considerava, desde certo momento de sua vida, sua missão — a missão que lhe teria sido confiada pelo deus de Delfos e que o tornara um "vagabundo loquaz": dialogar com as pessoas. Mas dialogar de modo a fazêlas tentar justificar os conhecimentos, as virtudes ou as habilidades que lhes eram atribuídos. Com esse objetivo inicial, levava o interlocutor a emitir opiniões referentes à sua própria especialidade, para em seguida interrogar a respeito do sentido das palavras empregadas. (PESSANHA, 1987, p.9) Sócrates não deixou nada escrito e o que conhecemos de sua obra e vida foi registrado por seus alunos e também por seus adversários. Uma obra importante para se ter uma ideia de quem foi Sócrates é o livro que traz a visão de Platão, Xenofonte e Aristófanes sobre o filósofo. O texto de Platão (427-347 a.C), A Defesa de Sócrates é um dos mais conhecidos e versa sobre o julgamento de Sócrates que fora acusado de má influência sobre a juventude ateniense e uma ameaça à tradição da pólis grega. Este texto mostra um pouco do método de Sócrates quando ele rebate inclusive aos seus acusadores questionando-os sobre os seus princípios. Confira um trecho desta obra. Outra coisa não faço senão andar por aí persuadindo-vos, moços e velhos, a não cuidar tão aferradamente do corpo e das riquezas, como de melhorar o mais possível a alma, dizendo-vos que dos haveres não vem a virtude para os homens, mas da virtude vêm os haveres e todos os outros bens particulares e públicos. Se com esses discursos corrompo a mocidade, seriam nocivos esses preceitos; se alguém afirmar que digo outras coisas e não essas, mente. Por tudo isso, Atenienses, diria eu, quer atendais a Ânito, quer não, quer me dispenseis, quer não, não hei de fazer outra coisa, ainda que tenha de morrer muitas vezes. A importância de Sócrates para a filosofia ultrapassa os limites do seu tempo. Além de instaurar um método dialético que priorizava a argumentação e o debate como maneiras do homem buscar a verdade e a virtude, seu legado é considerado um marco, tanto que é comumente utilizada na filosofia a classificação dos períodos filosóficos em: Período pré-socrático (-600/-400)- Os filósofos deste período buscavam refletir sobre a natureza, sobre a sua estrutura e fundamento. São representantes deste período Tales de Mileto, Heráclito, Zenão de Élea e Demócrito. Período Socrático ou Clássico (-400/-100)- A preocupação dos filósofos deste período volta-se para o homem, sobre os seus comportamentos e ideias, crenças, valores. intelectuais Neste período surgem os sofistas, principais opositores de Sócrates. Também conhecido como o período clássico da filosofia, tem entre os seus filósofos mais importantes Platão, Aristóteles e claro, Sócrates. Período pós-socrático ou Helenístico (36 a.C até 30 a.C)- O último período da filosofia grega antiga é considerado um marco entre o domínio da civilização grega e a ascensão da civilização romana, graças à expansão territorial conseguida pelo poderio bélico de Alexandre Magno, rei da Macedônia. Destacam-se três escolas filosóficas neste período: o estoicismo que privilegiava uma visão sistemática do mundo e das coisas representada por filósofos como Sêneca, Epicteto e Zenão de Cítio. O epicurismo, representado principalmente pelo filósofo Epicuro, que buscava no prazer, a paz de espírito e a felicidade. E, o ceticismo que basicamente propõe à dúvida frente às questões do mundo. Principais filósofos: Pirro de Élis e Carnéades de Cirene. Alguns pesquisadores declaram que o fim do pensamento grego acabou oficialmente no início do século VI, mas esta não é uma afirmação correta. Historicamente a filosofia grega influenciou e até hoje a influencia a produção de conhecimento no ocidente, as reflexões sobre a natureza, o campo das ideias, as discussões sobre leis, a moral, a ética, a política. A Filosofia, entendida como aspiração ao conhecimento racional, lógico e sistemático da realidade natural e humana, da origem e causas do mundo e de suas transformações, da origem e causas das ações humanas e do próprio pensamento, é um fato tipicamente grego. Por razões históricas e políticas, tornou-se, o modo de pensar e de se exprimir predominante da chamada cultura européia ocidental, da qual, em decorrência da colonização portuguesa do Brasil, nós também participamos. Por meio da Filosofia, os gregos instituíram para o Ocidente europeu as bases e os princípios fundamentais do que chamamos de razão, racionalidade, ciência, ética, política, técnica, arte. Basta observarmos que palavras como lógica, técnica, ética, política, monarquia, anarquia, democracia, física, zoológico, farmácia, entre muitas outras, são palavras gregas, para percebemos a influência decisiva e predominante da Filosofia grega sobre a formação do pensamento e das instituições das sociedades européias ocidentais. (Fonte: http://www.brasilescola.com/filosofia/a-filosofia-grega.htm) Se o desenvolvimento de uma nova forma de conceber as explicações sobre o homem e o mundo surgiu com a filosofia, é certo de que muitos destes temas ainda são comuns entre nós. Ainda hoje ouvimos a palavra mito quando ouvimos, por exemplo, alguém se referir a alguma celebridade ou esportista. Alguns termos já fazem parte do nosso cotidiano e nós não nos damos conta de onde eles vêm e qual o seu significado. Acreditamos que este entendimento é essencial para quem busca o conhecimento. A partir disto, convém neste momento explorarmos alguns conceitos básicos para a compreensão da filosofia aplicada à realidade em que estamos inseridos. Optamos por trazer alguns temas como a liberdade, a ética e a felicidade, antes de nos debruçarmos sobre o ensino da filosofia propriamente dito. Esta foi uma opção para que você já vá incorporando alguns dos temas e quando finalmente falarmos da didática já possa estar munido (a) de informações e referências para melhor visualizar a aplicação de alguns conceitos. Pensar a política, a ética e a liberdade hoje "Nós vos pedimos com insistência: nunca digam 'isso é natural' diante dos acontecimentos de cada dia. Numa época em que reina a confusão, em que corre o sangue, em que se ordena a desordem, em que o arbítrio tem força de lei, em que a humanidade desumaniza (...) não digam nunca: isso é natural. A fim de que nada passe por imutável. Sob o familiar, descubram o insólito. Sob o cotidiano, desvelem o inexplicável. Que tudo que seja dito ser habitual, cause inquietação. Na regra é preciso descobrir o abuso, e sempre que o abuso for encontrado, é preciso encontrar o remédio." Bertolt Brecht A palavra política tem origem grega e deriva de Pólis e, como vimos anteriormente está relacionada à vida na cidade e a participação pública. Logo, politikós seria um campo de estudos sobre a ciência do governo, as leis, a relação com o povo e a discussão sobre a natureza da política. Aristóteles discute a fundo na obra Política, considerada por ele uma continuação da Ética, de que forma os governos podem ser pensados como “instrumentos” na busca da felicidade e assim considerando que o homem é um “animal político” ou seja, é político porque convive com seus pares na pólis. A política neste sentido, seria a ciência da felicidade dos homens como um todo, e não um sistema rígido de leis e regras a serem seguidas. A saber: Vemos que toda cidade é uma espécie de comunidade, e toda comunidade se forma com vistas a algum bem, pois todas as ações de todos os homens são praticadas com vistas ao que lhes parece um bem; se todas as comunidades visam a algum bem, é evidente que a mais importante de todas elas e que inclui todas as outras tem mais que todas este objetivo e visa ao mais importante de todos os bens; ela se chama cidade e é a comunidade política (ARISTOTÉLES, 1985, p.20) A interpretação do termo política vai mudando na história à medida que grandes revoluções e mudanças acontecem no mundo, tais como a Revolução Francesa, a Revolução Industrial, o advento do capitalismo, a globalização mundial, dentre outros igualmente importantes. Mudam os protagonistas, os debates e o papel do povo na política também é reinterpretado. Por exemplo, quando mencionamos o pensamento de Karl Marx (1818-1883) sobre a luta de classes, a interpretação sobre política adquire um significado de confronto entre duas classes: a burguesia e o proletariado. Posto assim, parece que o pensamento do filósofo alemão é simples, mas ao contrário. Ao propor que o trabalhador lutasse por sua dignidade e se organizasse politicamente, Marx desafiou um sistema em que este tipo de ação era combatido e suprimido por meio da força política e econômica. Outro importante pensador que eleva à política a uma discussão sobre os usos dos aparatos de poder como forma de controle, como as escolas, a prisão e o manicômio é o filósofo francês, Michel Foucault (1926-1984) cujo trabalho é essencial quando pensamos nos sistemas de “produção de verdades” sobre as condutas humanas, um dos textos mais emblemáticos do autor é A Ordem do Discurso que visa a propor uma análise do aparato das práticas discursivas na sociedade: quem fala? Todos podem falar? São todos autorizados a falar? De acordo com Foucault (1971) a produção de discursos em todas as sociedades passa por filtros que delimitam, selecionam e controlam quem pode falar. O discurso como entendido pelo autor não é o ato retórico de discursar, mas o de compreender que na sociedade em que vivemos não se pode falar tudo e nem todos tem voz. A estes mecanismos do discurso, Foucault refere-se respectivamente como interdição e exclusão, que representam respectivamente a ideia de proibição para que nem todos participem e eliminação daqueles que não se enquadrem, por motivos diversos, de terem sua voz ouvida e considerada. Podemos nos questionar a partir de algumas ideias propostas por Foucault se somos realmente livres, se decidimos por nós mesmos e se temos a capacidade crítica de pensar e de ensinar a pensar. Mas, e o que isto tem a ver com filosofia e política? Praticamente tudo. A política está diretamente relacionada aos conceitos de ética e de liberdade, especialmente quando nos referimos à vida em sociedade e as relações entre os homens. Vamos exemplificar com uma questão que é muito debatida na sociedade em que vivemos: as drogas. No famoso seriado norte-americano Breaking Bad (2008) vemos o personagem principal, o professor Walter White (Bryan Cranston) diante de um dilema pessoal. Ele leva uma vida extremamente séria: tem uma família, não ganha muito, a esposa está grávida do segundo filho, o filho mais velho tem uma deficiência e o seu trabalho como professor de química não é exatamente o que ele desejava fazer de sua vida. Em um dado momento, ele é diagnosticado com um câncer e a possibilidade de morrer logo, faz com que ele comece a quebrar algumas regras sociais e junto com um ex-aluno, começa a produzir meta-anfetamina. No começo as coisas são meio difíceis, mas com o tempo, o talento de químico de Walter começa a fazer com que ele se torne reconhecido nesta atividade e passe a melhorar sua vida e também da sua família, buscando inclusive um tratamento adequado para sua doença. Outro exemplo, bem próximo da nossa realidade, é o tratamento dispensado aos viciados em craque. Em 2014 no Rio de Janeiro, o governo resolveu internar “por conta” os dependentes da droga. Na época, aconteceu uma grande discussão sobre até que ponto esta era uma questão ética e se o governo poderia fazer isso. Deste modo, considerando tudo o que ouvimos diariamente sobre as drogas e utilizando os exemplos que mencionamos, fazemos algumas provocações. 1) A ética está relacionada com a palavra grega ethos que significa modo de ser, caráter. Logo, é uma teoria que trata com os homens devem se comportar em sociedade, visando ao bem estar social. Ela não deve ser entendida como um comportamento individual, mas também deve nortear a ação de grupos, instituições, da mídia, dentre outros. É comum também a ética estar atrelada ao desenvolvimento das profissões, comissões, associações, dentre outros. A ética que rege a prática profissional dos jornalistas, por exemplo, enuncia que a apuração dos fatos e a imparcialidade diante das notícias devem ser os nortes destes profissionais. A moral, por sua vez, é uma palavra latina que vem de mores e significa costumes. A moral então normatiza os comportamentos e é fruto da educação, tradições e pela vida no cotidiano. A moral vigente na década de 50 no Brasil, por exemplo, dizia que as mulheres deveriam estar preparadas para uma vida doméstica voltada ao lar e à família. Logo esta era a noção de que a mulher que vivesse nestas condições era boa, virtuosa. Aquela que fugisse a esta regra, era o seu oposto. Hoje esta é uma ideia que não é regra, apesar de alguns setores da sociedade acreditarem que o papel da mulher deve ser secundário. Portanto, a moral não é imutável e é passível de questionamento. - Tendo como base os exemplos que citamos, pergunta-se: se você tivesse a oportunidade de “quebrar” algumas regras sociais para promover o seu bem-estar e de sua família, você faria? Até que ponto a moral em que você fundamenta a sua vida influenciaria na sua decisão? - Considerando o exemplo da internação compulsória dos dependentes de drogas, pergunta-se: você aceitaria fazer algo à sua revelia e ter que aceitar fazê-lo por meio da imposição da força? É ético fazer isso com qualquer pessoa? São questões complexas, não é mesmo? E, acredite, elas não tem uma resposta única. E é neste sentido que reside o trabalho de ensinar a pensar, problema fundamental da filosofia. Quando falamos de uma didática de filosofia, podemos imaginar que a empreitada é tarefa das mais difíceis nos dias de hoje. Fácil, não é. Mas, é essencial. Para isso, porém é preciso estimular diferentes formas de conceber a realidade, promover a leitura e diversificar as fontes de informação. Além disso, é preciso gostar de pensar. Conforme Tescarolo (2012) em sua análise sobre o método de Sócrates na formação do mestre, o papel do professor não é, portanto, o de “encher” a cabeça do seu discípulo com informações, como se a cabeça do aluno estivesse vazia, mas sim auxiliar o aluno a buscar o conhecimento por meio do diálogo e do questionamento. O filósofo Paulo Ghiraldelli Jr. menciona que ensinar filosofia é para quem gosta de filosofia e não há como separar a filosofia de seu ensino. Ghiraldeli (2002) “as perguntas dos filósofos, diferentemente das perguntas de outras pessoas, nem sempre são para ser respondidas. Elas ficam no ar, nunca respondidas, para nos alertar, para tirar o que é banal da liberdade. A liberdade é banal até a perdermos.”. Isto nos leva a uma discussão muito interessante sobre ética e educação no mundo contemporâneo. Se compreendermos a ética como um conjunto de comportamentos e hábitos aceitos e normalizados em uma determinada época, entendemos que os valores que norteavam as condutas de nossos pais e avós, não são mais os mesmos nos dias de hoje, não é mesmo? De acordo com o Vocabulário técnico e crítico da filosofia, do autor André Lalande (1999), uma das características subjetivas da palavra é: “característica das coisas que consiste em serem elas mais ou menos estimadas ou desejadas por um sujeito ou, mais comumente, por um grupo de sujeitos determinados”. Mas, valor também pode ser entendido como aquilo a que damos importância, estimamos. Quando ouvimos as pessoas mencionando que os valores hoje estão passando por uma crise é que a maioria delas percebe que estamos vivenciando um momento em que não se sabe muito bem para onde vamos e como devemos agir em um mundo cada vez mais globalizado. Para alguns estudiosos, este “mal-estar” contemporâneo está diretamente relacionado à sociedade capitalista em que nos encontramos, em que o dinheiro norteia as ações das pessoas e quem não se enquadra nos padrões determinados pelo mercado automaticamente está fora, marginalizado. Podemos pegar como exemplo diversas esferas da vida das pessoas como as relações no trabalho, nas quais as pessoas trabalham exaustivamente para cada vez mais ter mais bens e incessantemente pagar por eles. A pessoa vai deixando de lado os relacionamentos com amigos, familiares e quando o fazem é de forma superficial, calcada em relações de dinheiro e consumo. Outro exemplo é o que está se chamando de “camarotização” da sociedade brasileira, ou seja, a segregação das pessoas por aquilo que elas consomem e assim possam ser separadas das outras pessoas que não tem o mesmo poder de compra. Assim, são as separações de espaço físico nos shoppings, eventos, casas noturnas e até nos grupos, principalmente entre os mais jovens que selecionam aqueles colegas que se enquadram nos quesitos para serem aceitos. Estes comportamentos são amplamente aceitos em nossa sociedade. É claro que não há nada de mal no sujeito gastar o seu dinheiro, fruto do seu trabalho, da maneira que desejar. Nossa intenção não é fazer um julgamento sobre isso, mas sim, propor um debate em se analisa até que ponto estas situações contribuem para uma sociedade cada vez mais desigual, competitiva e com os interesses individuais acima do bem-comum. Você já deve ter se deparado com alguma situação em que viu alguém colocar o seu interesse acima do bem estar das outras pessoas. Por exemplo, quando alguém estaciona em uma vaga destinada a pessoas deficientes sem ser deficiente. Ou ainda quando as pessoas estão em uma fila, aguardando a sua vez para atendimento e alguém passa na frente. Muitos são os exemplos que podem ser retirados do nosso cotidiano e da vida em sociedade. A ética pressupõe que o ser humano tenha maturidade intelectual, boa formação educacional, conhecimento político, estrutura social, dentre outros, portanto não é uma tarefa fácil para ser banalizada. Mas, como é possível almejar uma vida pautada pela ética e reciprocidade com a liberdade do outro? Acreditamos que é por meio da educação. O tema da ética e da educação está longe de ser um assunto fácil, mas ainda assim precisa ser retomado por aqueles que se interessam pelo conhecimento. Hoje vivenciamos um mundo em que são diversos os valores, as noções de liberdade e as crenças, as culturas e os intercâmbios sociais em âmbito mundial, regional e local. Assim, não é possível pensar o papel do educador fora deste cenário multifacetado. Uma ideia de educação moral é a proposta de Pedro Gorgen (2005) que fundamenta a sua análise tendo como base a noção de valor, ética e formação moral, que em sua percepção não objetiva normatizar o conhecimento, doutrinando os alunos, mas sim, trata-se de um processo complexo em que há o desenvolvimento de uma consciência moral autônoma, adquirida através da educação formal ou informal, e também através das trocas culturais. De acordo com o autor: A educação moral pode ser entendida como um dos aspectos da educação integral, que abrange a educação corporal, a educação intelectual, a educação afetiva, a educação artística, para ficarmos apenas nos aspectos mais tradicionais. A educação ocupa um lugar de destaque porque pretende dar uma orientação e um sentido ao ser humano como um todo; ela, de certo modo, perpassa transversalmente todas as dimensões da formação humana (GOERGEN, p.23, 2005). Deste modo, entendemos que a preocupação com a ética e a educação pode contribuir para repensarmos os valores na sociedade em que vivemos e assim, colocar o indivíduo, considerando toda a sua complexidade, no centro das discussões. O estudo da filosofia se faz essencial para que este caminho seja trilhado, pois é emergente a necessidade de propormos uma interpretação humanista sobre os diversos problemas que assolam a nossa sociedade. VEJA TAMBÉM: Livro: Introdução à ética contemporânea do autor Olinto Pegoraro. É um livro interessante para compreendermos a noção de ética nos dias de hoje e nortear as nossas ações com autonomia e conhecimento. Editora UAPE. ATIVIDADES 1. Faça uma entrevista informal com seus colegas e familiares sobre o que eles compreendem pela palavra valor. Debata com seus colegas as diferentes noções que você conseguiu. 2. A ética pode ser analisada em diversos aspectos, tais como a ciência, a tecnologia, nas relações sociais, dentre outros. Pesquise qual é a relação existente entre a ciência e a ética na produção de alimentos e traga algumas ideias para discussão. Pensar a felicidade. É possível? E para quê? Sem querer você já foi exposto (a) a algumas questões filosóficas a partir da leitura do título acima. Você deve estar se perguntando: ora, e o que a felicidade tem a ver com filosofia, política e didática? Bem, tudo. A busca da felicidade, na filosofia, é um direito do homem. Tales de Mileto que viveu entre 7.a.C e 6. aC. acreditava que a felicidade dependia da saúde, do espírito e da sabedoria. Outros filósofos como Platão e Sócrates abordaram a felicidade do ponto da vista da justiça e da virtude. E, pensadores contemporâneos como Zygmunt Bauman e Gilles Lipovetsky investigam este sentimento e o momento em que vivemos. Nós retomaremos alguns temas propostos pelos autores no decorrer deste tópico, mas antes vamos analisar algumas questões. Em Carta sobre a Felicidade, Epicuro (341 a.C- 270 a.C) pondera que a todos os homens (jovens e velhos) o exercício da filosofia deve ser entendido como a busca da felicidade e que esta prática serviria para que todos pudessem alcançar a saúde do espírito. Diz ele: “Quem afirma que a hora de dedicar-se à filosofia ainda não chegou, ou que ela já passou, é como se dissesse que ainda não chegou ou já passou a hora de ser feliz”. Para o filósofo, os mais velhos sentir-se-iam rejuvenescidos por meio da lembrança dos tempos que já foram e os mais jovens poderiam envelhecer sem medo das coisas que estão por acontecer. É preciso então cultivar as coisas que trazem felicidade e deste modo fazer de tudo para alcançá-la. Neste caso, é preciso agir para alcançar a felicidade e exercitar este sentimento por meio do conhecimento de si e da sabedoria. Aristóteles contempla o tema em seu livro Ética a Nicômaco. Para o filósofo, a felicidade consistiria em viver uma vida plena, em que a virtude e ação acompanhassem a vida do homem até o fim de seus dias. Apesar de parecer simples, a ideia de felicidade não é fácil de ser conceituada. Para o objetivo que nos propomos com este curso, buscamos trazer alguns conceitos e ideias relacionadas ao momento em que vivemos para que estes possam nortear o trabalho em sala de aula. Certamente que o professor e o aluno tem suas interpretações a respeito do que significa ser feliz hoje e esta é uma preocupação que nos interessa. Para nós, a noção de felicidade pode ser analisada na sociedade contemporânea a partir das relações de consumo, nas interações sociais e nas diversas representações midiáticas, artísticas, publicitárias... Falando nisso... Citamos o jingle de uma famosa campanha publicitária de um supermercado cujo público alvo é composto majoritariamente pelas classes A e B. Você já deve ter ouvido: insistentemente, a musiquinha pergunta ao ouvinte “o que faz você feliz? você feliz o que que faz”... e toda a campanha de televisão é permeada por pessoas de diferentes faixas etárias em momentos de felicidade com seus familiares e em situações que lembram o consumo de alguns produtos no referido supermercado, em piqueniques e outros momentos. Fazendo uma breve pesquisa em sua rede social, veja as fotos dos seus colegas e amigos: a maioria está sorrindo, não é? Ou em situações que denotam felicidade. A prática de publicar reclamações e desabafos é mal vista nestes espaços, e algumas pessoas até optam por bloquear os amigos por causa disso. Veja as propagandas de carros, bebidas, bancos, comida congelada, viagens... tudo é ilustrado por pessoas felizes e de bem com a vida. Já pensou se de repente alguém decidisse colocar em uma propaganda de pizza, por exemplo, alguém entristecido e infeliz por comer a pizza? E, nas propagandas de carro, quem não gostaria de realmente dirigir um carro como é retratado nas propagandas com as ruas livres e sem congestionamento? Citamos estes exemplos informais para promover a discussão de que a felicidade pode ser pensada a partir da ideia de consumo e também como um produto. Neste sentido, o trabalho do filósofo também é enxergar o porquê a felicidade é tão explorada nos dias de hoje. Há quem diga que só pensamos tanto na felicidade porque o homem de hoje é infeliz e precisa encontrar maneiras de lidar com isso. Outros, como o escritor Aldous Huxley, tem uma visão ainda mais “sombria”, por assim dizer, de que ser infeliz é um medo que muitas pessoas tem e por isso, não se questionam o que é ser feliz, e o que significa a felicidade. Bem, se as respostas fossem fáceis, não haveria tantos livros, artigos, filmes sobre o tema. Este tema foi amplamente analisado pelo autor e mestre em Psicologia, Luciano Espósito Sewaybricker no trabalho intitulado “A felicidade na sociedade contemporânea: contrastes entre diferentes perspectivas filosóficas e a modernidade líquida” (2012). Nesta dissertação, o autor faz um trabalho intenso de pesquisa sobre o conceito de felicidade na história do pensamento e busca analisar este conceito considerando a globalização e o que ele chama de “virtualização” das relações, ou seja, as interações humanas mediadas pelos ambientes virtuais, tais como as redes sociais diversas. Não é nossa intenção detalhar a fundo este trabalho, mas sim chamar a atenção para a ideia de que ideia da felicidade é muito mais complexa do que imaginamos, e da mesma maneira que as noções de liberdade e política, ela inspira interpretações distintas na história da humanidade e está diretamente relacionada à vida em sociedade. Na análise proposta por este autor, é investigada a noção de bem-estar social e a relação do trabalho com a felicidade. Ele investiga tendo como base autores como Pedro Bendassoli e Zygmunt Bauman, como o trabalho adquire valor cultural (como forma de necessidade moral), valor social (ao definir os valores de cada um na sociedade) e valor psicológico (ao constituir o caráter e a identidade de cada sujeito). Sobre esta questão, a da relação da felicidade e do trabalho na cultura brasileira, Bendassoli (2007) sugere que para algumas pessoas não há relação entre felicidade e trabalho, tanto que há o pensamento de que é feliz quem não precisa trabalhar. Porém, o autor analisa que existe um paradoxo nesta percepção, pois ao mesmo tempo em que as pessoas desejam ter um trabalho quando não têm, elas também minimizam o seu valor quando estão empregadas. De acordo com este autor: É provável que esse paradoxo se explique no contexto da tradição ocidental sobre a felicidade anteriormente apresentado: de um lado, o ideal da felicidade como vida boa – uma vida simples, tranqüila e estável, com poucos desejos, mas desejos certos; de outro, o ideal moderno do sucesso – uma vida agitada, acossada pelo fantasma do fracasso, pelo medo de não ter status ou de ficar “empacado”. Ambos os ideais estão costurados no sentido do trabalho no Brasil. A conseqüência disso é a relação de amor e ódio típica do brasileiro com o trabalho: o desejo de que logo chegue o final de semana e o tédio quando as férias se prolongam. (BENDASSOLI, 2007, p.59). Foi o filósofo Karl Marx (1818-1883) um dos primeiros a analisar a relação do homem e do trabalho considerando- o como uma atividade alienante. A alienação poderia se expressar de diversas formas, mas a ideia que queremos mencionar é a noção de que o homem transformava a natureza por meio de seu trabalho e ação, porém, o trabalho em seu caráter mecanicista, sem criatividade alienava o homem, tornando-o refém deste trabalho. Claro que este é um pequeno trecho do pensamento de Marx sobre este assunto, gradativamente o filósofo aborda outros temas de igual complexidade. É interessante mencionarmos que os estudos de Marx sobre os trabalhadores são desenvolvidos em um contexto em que o trabalhador, fosse homem, mulher ou criança, trabalhava durante horas a fio e não tinha direitos. Desta maneira, o homem vivia para o trabalho e a sua vida resumia-se a isso. Mas, atualmente, será que as pessoas são realmente felizes com seu trabalho? Muitas empresas oferecem benefícios e oportunidades para que as pessoas permaneçam em seus trabalhos e deem o melhor de si, e naturalmente, estes podem ser fatores que motivem (este é um termo muito comum nas empresas) aos seus funcionários e familiares. Porém, há também situações como a exploração sistemática da mão de obra de milhares de pessoas, que vivem em situações análogas à escravidão que trabalham dia e noite na indústria têxtil, tecnológica e de bens de consumo. A estas pessoas é relegado o pior lugar no mercado de trabalho: o da exploração em nome do lucro de grandes empresas. Podemos concluir que este é um exemplo contemporâneo de alienação do trabalho. As pessoas estão fadadas a obedecerem a ordens, executar um trabalho automático e repetitivo que não exige nenhuma criatividade e ainda por cima vivem as piores condições de vida, tornam-se “coisas”. Para os autores que mencionamos anteriormente, Zygmunt Bauman e Giles Lipovetsky, é possível pensar a noção de felicidade contemporânea a partir de uma crítica ao modelo de consumo desenfreado que vivenciamos em nossa sociedade. Bauman (2008) analisa no seu livro Vidas para consumo, o funcionamento da Sociedade de Consumidores, e que em sua percepção é aquela que encoraja e incentiva comportamentos consumistas a todo custo. Logo, para o sujeito pertencer a esta sociedade, ele deve consumir e atender aos ditames do mercado, como estar atento à moda, as últimas novidades e não criar “vínculos” com os objetos, substituindo-os assim que possível. Lipovetsky no livro A Felicidade paradoxal (2006) analisa o conflito que existe no que ele chama de hiperconsumo, ou seja, um momento na economia contemporânea que todas as relações e experiências são marcadas pelo consumo, em que o consumidor por um lado, espera ávido por novidades em produtos e sensações, e o mercado por outro, não cessa em oferecer estes serviços para atender aos mais diferentes desejos. O paradoxo do hiperconsumo seria a análise de que ao consumir estes bens e melhorar satisfatoriamente a sua vida, o homem sempre vai estar à mercê do mercado e das ofertas de produtos que não param de surgir. O autor menciona um ponto importante, já que a maioria das pessoas se diz feliz, porque há tanta tristeza, ansiedade e depressões entre as pessoas. Conforme Lipovetsky: Nossas sociedades são cada vez mais ricas: apesar disso, um número crescente de pessoas vive na precariedade e precisa fazer economias em todos os itens de seu ornamento, tornando-se a falta de dinheiro uma preocuparão cada vez mais obsessiva. Somos cada vez mais bem cuidados, o que não impede que os indivíduos se tornem uma espécie de hipocondríacos crônicos. Os corpos são livres, a miséria sexual e persistente. As solicitações hedonísticas são onipresentes: as inquietudes, as decepções, as inseguranças sociais e pessoais aumentam. Aspectos que fazem da sociedade de hiperconsumo a civilização da felicidade paradoxal. (LIPOVETSKY, p.11, 2006) A filosofia não tem como objetivo fornecer regras de como devemos conduzir a nossa vida, mas pode nos fornecer as bases para pensarmos sobre a nossa vida e também da vida em sociedade. Naturalmente que as referências que mencionamos não tem como objetivo encerrar o tema da felicidade, mas provocar a reflexão sobre assuntos importantes como o trabalho e o consumo. VEJA TAMBÉM: Livro: Felicidade de Eduardo Gianetti- Editora Companhia das Letras- A abordagem encontrada pela economista Eduardo Gianetti para a abordagem de um dos temas fundamentais da filosofia é um diálogo filosófico, em que a noção de felicidade é analisada sob o ponto de vista da biologia, ética, sociologia, filosofia, religião, política e economia. ATIVIDADES: 1. Analise, tendo como base propagandas de TV, nas redes sociais e nor jornais como a imagem da felicidade é explorada. Faça um exercício crítico e verifique como é retratada a felicidade nestes meios. 2. Leia o poema de Paulo Leminski Bem no Fundo e analise a abordagem utilizada pelo poeta para falar sobre algo que nos incomoda ou entristece. Bem no fundo No fundo, no fundo, bem lá no fundo, a gente gostaria de ver nossos problemas resolvidos por decreto a partir desta data, aquela mágoa sem remédio é considerada nula e sobre ela — silêncio perpétuo extinto por lei todo o remorso, maldito seja quem olhar pra trás, lá pra trás não há nada, e nada mais mas problemas não se resolvem, problemas têm família grande, e aos domingos saem todos a passear o problema, sua senhora e outros pequenos probleminhas. Sobre a liberdade Muitos são os estudiosos que se debruçam ao estudo sobre o que é liberdade. A interpretação do conceito de liberdade tem diferentes significados na história da filosofia e da política. Na pólis grega, liberdade significava poder participar da vida pública- lembremos que não eram todos os homens livres para poder participar das decisões na cidade-, na Idade Média desenvolve-se com Santo Agostinho (354-430) a noção de livre arbítrio, ou seja, é a capacidade consciente de escolher entre o bem e o mal, dando à pessoa o poder de decidir qual o caminho certo a ser seguido. Immanuel Kant (17241804), o fundador da filosofia crítica, desenvolve as suas teorias sobre a liberdade e o direito no contexto do século XVIII e que teve início pelo movimento do Iluminismo. Com as diversas mudanças sociais e políticas que aconteceram na Europa durante este período, também a noção de liberdade passa por uma reavaliação. Para Kant, a ideia de liberdade está fundamentada na razão, ou seja, o homem deve conhecer as regras e leis que regem a vida em sociedade e a partir disso compreender a sua atuação da liberdade. Na sua obra Crítica da Razão Prática, Kant analisa que a liberdade teria dois aspectos: o negativo e o positivo. Como afirmam Trevisan e Neta (2006): “Sob o aspecto negativo ser livre e não se submeter a nada externo ao individuo, que significaria independência, vale dizer a desnecessidade de ser orientado a agir. Este é o chamado conceito negativo ou prática de liberdade, apresentado pelo autor em sua obra Crítica da Razão Prática. De outro lado, sob o aspecto positivo, a liberdade seria agir conforme o direito e a lei que se exprimem no dever ser.” (TREVISAN, NETA, p. 2, 2006). Além deste ponto, para Kant o homem não seria nada sem educação e seria através dela que o ser humano conquistaria a sua autonomia e liberdade. Neste momento, queremos chamar a atenção do aluno para as noções de liberdade e sociedade. O filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831) analisou o conceito da liberdade em sua famosa obra Fenomenologia do Espírito em que exemplifica o paradoxo da liberdade exemplificando a relação do senhor e do escravo. Para Hegel, a liberdade não se dá sozinha e para existir é preciso que haja a condição de não-liberdade. Ao mencionar o exemplo do senhor e do escravo, Hegel esclarece que o senhor precisa do escravo para viver e ser quem é, pois do contrário, não é mais senhor. Já o escravo, quando o senhor não existe mais, torna-se livre. Desta forma a compreensão de liberdade que escutamos comumente de que a minha liberdade termina onde começa a do outro, pode ser analisada a partir da ideia de que a liberdade de um sujeito depende da liberdade do outro, logo, uma completa a outra. Para Hegel, ser livre é ser sujeito de sua própria ação. Quando nos deparamos, porém, com situações de crise, medo e falta de esperança, a noção de liberdade parece ser ainda mais complexa. Um dos filósofos que mais se dedicou a analisar a noção da liberdade em contextos de crise foi Jean Paul Sartre (1905-1980). Seus estudos situam-se na corrente filosófica chamada de existencialismo, que se consolida na Europa depois da Primeira Guerra Mundial e se desenvolve no período entre guerras, até tornarse reconhecida nos anos 50 até os anos 70 tendo influenciado muitos artistas, músicos, cineastas e escritores. O desenvolvimento desta forma de pensamento se dá, sobretudo graças à inquietação de pensadores diante da degradação da Europa por meio da ascensão de regimes totalitários e consequente perda da liberdade, de direitos e de uma vida digna. O existencialismo se opõe à noção de determinismo, ou seja, apregoa que a vida do homem já está desenhada e que não há nada a fazer para se livrar disso. Para os gregos antigos era a crença de que a vida dos mortais já havia sido preparada pelas divindades. Para os calvinistas, a ideia de predestinação sugere que a vida de cada pessoa já está traçada por Deus. O determinismo também está ligado a outros fatores como forças econômicas, biológicas e sociais que condicionam o homem a aceitar a sua condição e a não buscar sua liberdade. Se fizéssemos uma relação com os dias de hoje, poderíamos mencionar a questão do determinismo social, ou seja, uma pessoa que nasce em um meio violento fatalmente vai se tornar violenta ou uma pessoa que nasce em um ambiente de pobreza dificilmente sairá desta condição. As duas ideias mostraram-se falhas, ainda que existam forças e sistemas que insistem em utilizar os determinismos das mais diferentes naturezas para justificar a exclusão social e a miséria, por exemplo. Para Sartre, portanto, “o homem está condenado a ser livre” e é responsável por tudo o que fizer. Ao negar a noção de um determinismo religioso, Sartre sugere que o homem é a liberdade em essência, e cabe a cada ser humano descobrir e viver conforme as suas regras e valores, por meio dos meios e imposições que ele escolher e não outrem. De acordo com o autor: O que significa, aqui, dizer, que a existência precede a essência? Significa, que, em primeira instância, o homem existe, encontra a si mesmo, surge no mundo e só posteriormente se define. O homem, tal como o existencialista o concebe, só não é passível de uma definição porque, de início não é nada: só posteriormente será alguma coisa e será aquilo que fizer de si mesmo. (SARTRE, p.4, 1987) Todas estas ideias sobre o conceito de liberdade são importantes para pensarmos o que entendemos sobre isto nos dias de hoje. Podemos afirmar que vivemos em um momento em que as pessoas conseguem, até certo ponto, exercer o seu direito à liberdade política, escolhendo democraticamente seus candidatos por meio do voto, à liberdade sexual, em que as mulheres podem optar por casarem e terem filhos ou não, e à liberdade de expressão em que a maioria das pessoas tem acesso à informação e podem expressar seus sentimentos em relação aos acontecimentos no mundo. Mas, o que queremos dizer com até certo ponto? Basta fazermos um exercício bem rápido e relembrar, por exemplo, a verdadeira polarização ocorrida principalmente nas redes sociais em relação às eleições de 2014. De maneira positiva e negativa, o que se viu foi um verdadeiro fenômeno no que diz respeito à defesa “apaixonada” e às vezes até raivosa por parte dos internautas na defesa deste ou outro candidato. Amizades foram desfeitas e os debates nas mídias sociais chegaram a um nível sem precedentes no Brasil. Muito se discutiu neste cenário sobre o papel da liberdade de expressão: pode-se tudo em nome daquilo que acreditamos? O historiador Pierre Ansart tem um texto muito interessante sobre a paixão nas ciências políticas e acreditamos ser importante mencioná-lo nesta discussão a que nos propomos. Segundo Ansart: As emoções, os sentimentos, as paixões encontram-se presentes nas instituições, nas decisões, nos fatos políticos e fazem parte da experiência cotidiana: esperanças e inquietudes durante as campanhas eleitorais, alegrias e decepções face aos resultados, iras, ciúmes e rancores no seio de um partido, angústia diante das ameaças imaginadas, entusiasmo quando se proclama uma vitória nacional ou humilhação quando se proclama uma derrota. Todos estes fatos são bastante conhecidos. Eles abundam ao longo da história e manifestam-se incessantemente. (ANSART, 2001, p.146). Seguindo esta linha de pensamento de Ansart, em que as paixões manifestam-se das mais diferentes formas e nas mais diversas intensidades, citamos algumas noções contemporâneas a respeito da liberdade que são importantes para o nosso curso. Ao final deste tópico confira algumas indicações de leitura e propostas de atividade, bem como, o trecho de uma matéria e uma dica de filme para aprofundar os conhecimentos sobre os temas da liberdade, educação, ética e política. Vamos aos exemplos: - Liberdade religiosa- De acordo com o artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias; Costuma-se afirmar com base na Constituição Brasileira que o Brasil é um país laico, ou seja, neutro em relação às questões religiosas. E, em tese protege às diferentes formas de liberdade e expressões religiosas. Mas, o que vemos na prática, é diferente. É comum nos depararmos com interpretações por vezes até preconceituosas em relação aos cultos religiosos no Brasil. Em 2012, uma matéria do jornal O Globo escrita pela jornalista Márcia Abos, trouxe um exemplo claro de intolerância religiosa. Um estudante de 15 anos sofria agressões em uma escola de São Paulo por causa da sua opção religiosa, o candomblé. De acordo com o texto, as agressões teriam sido motivadas pela postura da professora, que antes das aulas fazia todos os alunos lerem a Bíblia e rezar, enquanto permaneciam de cabeça baixa. O bullying teria começado quando o aluno questionou esta postura da professora e foi chamado de macumbeiro pelos colegas. As agressões se intensificaram e o pai do menino fez um Boletim de Ocorrência registrando a situação. Alguns estudiosos como Oro e De Bem (2008) comentam que há um processo histórico no Brasil na construção da discriminação das religiões afrobrasileiras. De acordo com os autores: [...] as formas dessa religiosidade também foram vistas com suspeita e preconceito e, por isso mesmo, discriminadas e seus agentes perseguidos. Tais procedimentos em relação às religiões afro-brasileiras resultam, em grande medida, de representações depreciativas e desqualificadoras que, ao longo do tempo, foram construídas, no ocidente e no Brasil, sobre as etnias e as culturas africanas, tidas como “primitivas” e “arcaicas”, destinadas, portanto, a desaparecerem porque representam o passado da humanidade. No Brasil, os intelectuais, a Igreja Católica e o Estado contribuíram, cada um a seu modo, para moldar o imaginário social desqualificador do negro e das religiões afro-brasileiras (ORO, DE BEM, p.305) Esta é uma questão que é muito pertinente quando nos referimos à educação. Cabe ao professor não apenas desenvolver de maneira consistente a sua área de atuação, mas também, ter conhecimento para a interpretação crítica do mundo em que vive. Naturalmente que quando nos deparamos com um tema tão delicado quando o da religião, as “paixões” costumam falar mais alto, mas é preciso ter uma visão humanista, voltada para a construção do conhecimento. A mídia tem papel essencial na disseminação de lugares-comuns e análises pouco fundamentadas em alguns casos. Cabe a nós, analisar criticamente os fatos e separar aquilo que realmente tem consistência. Um exemplo mais recente foram alguns comentários sobre o atentado terrorista contra a redação do jornal Charlie Hebdo que resultou em 12 mortos, inclusive os jornalistas e cartunistas do jornal, em janeiro deste ano. Charlie Hebdo costumeiramente estampava as capas com matérias de cunho satírico ao profeta Maomé e a outros líderes religiosos e políticos. Milhares de pessoas se manifestaram na Europa e também no Brasil. Cartunistas e jornalistas, de modo geral, mostraram solidariedade aos familiares dos mortos e expressaram preocupação em relação à violação aos direitos de liberdade de expressão. Por outro lado, as opiniões foram divergentes se também o humor utilizado pelo jornal não “feria” a liberdade religiosa dos muçulmanos. Independente das opiniões, o fato que não pode ficar de fora desta discussão é que esta situação reacendeu um debate importante sobre o humor, a política e a religião, e principalmente, sobre a questão do preconceito aos estrangeiros e a intolerância religiosa. A partir destes pontos sugerimos a leitura do texto que segue abaixo e em seguida algumas propostas de atividades. Link da imagem: http://en.wikipedia.org/wiki/Je_suis_Charlie#mediaviewer/File:Charlie_Hebdo_Tout_est_pardon n%C3%A9.jpg - A imagem é a reprodução da capa da edição de 14 de janeiro de 2015 do jornal Charlie Hebdo. A frase Je Suis Charlie (Eu sou Charlie) foi amplamente compartilhada pelo mundo como forma de solidariedade aos mortos no ataque. Na capa podemos ler: “Todos estão perdoados” e na imagem o profeta Maomé segura o cartaz com a frase Je suis Charlie. VEJA TAMBÉM: Livro: Sartre, uma biografia de Annie Cohen-Solal: Apresenta a vida e o trabalho de Jean-Paul Sartre (1905-1980) para quem gostaria de conhecer um pouco mais sobre este importante filósofo. O leitor vai encontrar como se deu a trajetória deste intelectual e o seu pensamento filosófico, e também, acompanhar a sua vida, seus relacionamentos, sucessos e fracassos. ATIVIDADES 1. Pesquise em sites de notícia diversos (procure ir além dos convencionais) como o tema da liberdade é abordado atualmente. Analise as diferentes maneiras de representação da ideia da liberdade. 2. Analise a letra de Apesar de Você (1978) do compositor Chico Buarque e pesquise sobre o que fala esta música. Uma dica: apesar de parecer uma canção de amor, na verdade é mais uma das canções de protesto feitas pelo compositor à ditadura militar instaurada no Brasil nos anos 60. Hoje você é quem manda Falou, tá falado Não tem discussão A minha gente hoje anda Falando de lado E olhando pro chão, viu Você que inventou esse estado E inventou de inventar Toda a escuridão Você que inventou o pecado Esqueceu-se de inventar O perdão Apesar de você Amanhã há de ser Outro dia Eu pergunto a você Onde vai se esconder Da enorme euforia Como vai proibir Quando o galo insistir Em cantar Água nova brotando E a gente se amando Sem parar Quando chegar o momento Esse meu sofrimento Vou cobrar com juros, juro Todo esse amor reprimido Esse grito contido Este samba no escuro Você que inventou a tristeza Ora, tenha a fineza De desinventar Você vai pagar e é dobrado Cada lágrima rolada Nesse meu penar Apesar de você Amanhã há de ser Outro dia Inda pago pra ver O jardim florescer Qual você não queria Você vai se amargar Vendo o dia raiar Sem lhe pedir licença E eu vou morrer de rir Que esse dia há de vir Antes do que você pensa... - Educação para a vida em liberdade- Partimos das ideias propostas pelo educador Paulo Freire (1921-1997) de que a educação tem como missão primeira promover o conhecimento e possibilitar o desenvolvimento de uma vida em criação, em constante diálogo para a conquista da autonomia do pensamento. Para Freire, o processo de aprendizado é uma atividade conjunta, em que educador e educando agem juntos no desenvolvimento de uma consciência crítica, segundo o autor, é preciso ter em mente que o aluno quando chega para as aulas não é alguém sem conhecimento e o professor não deve ter a visão de que é “melhor” do que o aluno, a estes processos educacionais em que o educador é quem educa e os alunos são educados e onde este aluno é considerado mero objeto, e o educador sujeito da situação, Freire (1970) os classifica como “práticas bancárias de educação” que devem ser repensadas quando se compreende a educação como atividade conscientizadora. “A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres “vazios” a quem o mundo encha de conteúdos; não pode basear-se numa consciência especializada, mecanisticamente compartimentada, mas nos homens como “corpos conscientes” e na consciência como consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas relações com o mundo. (FREIRE, 1970, p. 41) Esta reflexão proposta por Freire idealiza a educação como um trabalho de liberdade e de libertação dos sujeitos. Interessa-nos particularmente a noção de que é preciso levar em conta a história e a visão de mundo do aluno e a discussão em sala de aula das problemáticas que dizem respeito a esta realidade. Atualmente, este pensamento se faz muito adequado especialmente porque vivenciamos um momento em que o aluno já chega à sala de aula com muita informação advinda das mais diferentes fontes. É um cenário muito distinto ao analisado por Freire, entretanto, refletir sobre a educação é tarefa que não se esgota, ao contrário, faz parte do exercício de educar e de pensar. Neste sentido, quando pensamos na proposta de uma vida livre a partir da educação nos dias de hoje, remetemo-nos imediatamente às ideias propostas pelo sociólogo francês, Edgar Morin. Considerando o momento em que vivemos, de globalização, tecnologia e disseminação de informações a um nível sem precedentes, Morin propõe no livro Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro temas que são fundamentais para a educação dos cidadãos no século 21. Conforme menciona, esta obra não tem o objetivo de versar “sobre o conjunto das disciplinas que são ou deveriam ser ensinadas: pretende, única e essencialmente, expor problemas centrais ou fundamentais que permanecem totalmente ignorados ou esquecidos e que são necessários para se ensinar no próximo século. Há sete saberes “fundamentais” que a educação do futuro deveria tratar em toda sociedade e em toda cultura, sem exclusividade nem rejeição, segundo modelos e regras próprias a cada sociedade e a cada cultura” (MORIN, p.13, 2000). Os sete saberes propostos por Morin são: - As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão- Visa propor uma análise sobre o que é o conhecimento humano, a importância de saber mais sobre o conhecimento “É necessário introduzir e desenvolver na educação o estudo das características cerebrais, mentais, culturais dos conhecimentos humanos, de seus processos e modalidades, das disposições tanto psíquicas quanto culturais que o conduzem ao erro ou à ilusão.” (MORIN, p.13). - Os princípios do conhecimento pertinente- Promoção do conhecimento global para compreensão dos conhecimentos parciais e locais, ou seja, conforme Morin é preciso repensar o modelo em que o conhecimento é fragmentado em disciplinas e apresentar propostas que tratam o aprendizado em sua totalidade, possibilitando que o cidadão consiga compreender os temas em sua complexidade e contexto. - Ensinar a condição humana- Para Morin, é preciso compreender a natureza complexa do ser humano e conceber as disciplinas de tal modo que levem em conta esta complexidade. Para ele “a condição humana deveria ser o objeto essencial de todo o ensino”. - Ensinar a identidade terrena- O autor propõe que o aprendizado contemple o “destino planetário” do gênero humano, ou seja, a realidade “globalizada” em que nos encontramos. Conforme menciona o autor: “Convém ensinar a história da era planetária, que se inicia com o estabelecimento da comunicação entre todos os continentes no século XVI, e mostrar como todas as partes do mundo se tornaram solidárias, sem, contudo, ocultar as opressões e a dominação que devastaram a humanidade e que ainda não desapareceram.” (MORIN, p.16) - Enfrentar as incertezas- O autor parte da ideia de que as ciências ofereceram muitas certezas para a humanidade e que neste momento se faz necessário promover um aprendizado para lidar com os imprevistos e o inesperado. “É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza”. - Ensinar a compreensão- Morin acredita a educação é o meio que dispomos que para se promover o desenvolvimento da compreensão, da noção de alteridade no ambiente educacional. Mas, para isso é preciso uma “reforma das mentalidades” e buscar compreender na história as raízes da incompreensão nas manifestações racistas, na xenofobia, no desprezo. - A ética do gênero humano- Na compreensão do sociólogo a educação deve direcionar a compreensão de uma “antropo-ética”, ou seja, a compreensão do ser humano como indivíduo parte da sociedade e parte da espécie. A ética em sua visão, não deve ser ensinada por meio de lições de moral, mas promover a noção de cidadania e compreensão do ser humano. Demoramos-nos nestas ideias apresentadas por Morin por acreditar que elas dialogam com o que acreditamos ser um caminho para pensarmos a educação como ferramenta para uma vida em liberdade. E quando nos referimos à educação, não necessariamente falamos da instituição escola, mas das diferentes maneiras de compartilhar e promover o conhecimento. Acreditamos que os temas propostos por Freire e Morin e brevemente explorados aqui por nós analisam a educação em um aspecto muito mais amplo, voltado para a formação humanista e alinhada a realidade em que estamos inseridos. Como forma de aprofundar os seus conhecimentos, sugerimos abaixo um filme e um trecho de uma entrevista com o educador e filósofo Mario Sergio Cortella. Dica Cultural- Filme “A onda” (Die Welle,2008) Dir.: Dennis Gansel Link da imagem: http://en.wikipedia.org/wiki/The_Wave_%282008_film%29#mediaviewer/File:Diewelle_poster.jpg – Cartaz do filme A Onda Assim, de nada serve ignorar as forças destrutivas de nosso século. O problema é que a nossa época interligou de modo tão estranho o bom e o mau que, sem a expansão dos imperialistas levada adiante por mero amor à expansão, o mundo poderia jamais ter-se tornado um só; sem o mecanismo político da burguesia que implantou o poder pelo amor ao poder, as dimensões da força humana poderiam nunca ter sido descobertas; sem a realidade fictícia dos movimentos totalitários, nos quais — pelo louvor da força por amor à força — as incertezas essenciais do nosso tempo acabaram sendo desnudadas com clareza sem par, poderíamos ter sido levados à ruína sem jamais saber o que estava acontecendo. E, se é verdade que, nos estágios finais do totalitarismo, surge um mal absoluto (absoluto, porque já não pode ser atribuído a motivos humanamente compreensíveis), também é verdade que, sem ele, poderíamos nunca ter conhecido a natureza realmente radical do Mal. (ARENDT, 1979, p.12) Sinopse: O filme trata da experiência feita por um professor em uma turma de ensino médio para abordar o tema da autocracia de forma instigante e interativa com os alunos. Ao invés de apenas aplicar os conceitos em sala de aula, o professor Rainer Wenger (Jürgen Vogel) decide incentivar os alunos a colocar em prática os procedimentos de regimes fascistas e ditatoriais, numa clara menção ao nazismo alemão. Entretanto, esta experiência começa a fugir do controle e de repente todos os envolvidos (e aqueles que não querem se envolver) começam a vivenciar situações de violência e tensão. Por que é interessante- O filme que é uma adaptação de uma história real, é inspirado no livro de mesmo nome do autor americano Todd Strasser e relata uma situação semelhante, que aconteceu nos Estados Unidos sobre uma experiência intitulada a Terceira Onda. Por meio de um experimento proposto em sala de aula em que o professor questiona aos alunos se na Alemanha dos dias de hoje uma ditadura seria instalada são revelados os mecanismos que levam à doutrinação das massas e a conseqüente exclusão daqueles que se negam em fazer parte de um movimento. Tudo é pensado para que o movimento A Onda tenha uma identidade e desta forma consiga conquistar adeptos: desde uma saudação própria até a adoção de roupas brancas como identificadoras dos membros deste grupo. Com o tempo, alguns alunos passam a interiorizar este sentimento de pertença e começam a requerer a autoridade de fazer qualquer coisa em nome da Onda. É um filme interessante, pois aborda diversos aspectos dos mecanismos dos regimes fascistas e a cooptação de mentes para as suas causas. Também são discutidos aspectos do anarquismo e as diferentes ideologias que podem existir em um sistema político. Perceba ao assistir o filme que quando o professor resolve trabalhar com a ideia de um governo ditatorial e toma para si a responsabilidade de ser este “ditador” ele entra em uma via de mão dupla: por um lado consegue reunir quase toda a turma na atividade e desperta a atenção do tema até por quem não se interessa por isso, por outro lado, ao não testar esta experiência e desta forma conseguir prever ou minimizar as conseqüências, ele adentra em um terreno perigoso em que as conseqüências podem ser irreversíveis. Procure assistir a este filme considerando a questão da liberdade conforme mencionamos acima e busque relacionar alguns elementos com os pontos também abordados como a condição humana, a política e as paixões e os regimes totalitários, como o nazismo na Alemanha. Para somar a este filme sugerimos a leitura do livro As origens do Totalitarismo (1979) da escritora política alemã Hannah Arendt (1906-1975). Confira um trecho da entrevista de Mario Sergio Cortella concedida ao jornal Gazeta do Povo em 04 de outubro de 2011. A entrevista faz parte da matéria intitulada: Escola também é lugar para falar sobre política. Para ver a matéria completa, acesse o link que segue nas referências bibliográficas do curso. Gazeta do Povo- Tratar de política dentro da escola ainda é algo pouco comum no Brasil. É possível determinar os principais motivos disso? Mario Sergio Cortella- Em primeiro lugar, temos uma democracia ainda muito jovem. O país tem 511 anos e sua democracia plena não tem nem 25 anos, sendo seu marco a Constituição de 1988. Durante esse tempo, tivemos momentos rarefeitos de inclusão da sociedade nas decisões. E um modelo com participação restrita acaba tendo reflexos dentro da escola, onde o debate sobre esses temas acabava não acontecendo. Se formos lembrar, a geração anterior teve aulas de Educação Cívica, que eram impostas e se tornaram indesejadas. Com isso, os pais dos alunos de hoje também valorizam pouco a discussão da política no cotidiano. Gazeta do Povo- Em alguns textos, o senhor comenta sobre a confusão que é feita com os termos “política” e “cidadania” no ensino. Qual a sua visão sobre eles e o que essa definição errada acaba acarretando? Mario Sergio Cortella- A confusão é usar esses termos como coisas separadas. Essas palavras têm origens em locais diferentes, mas seus significados são os mesmos e têm a ver com a noção de comunidade, convivência. Ao entender e promover sentidos diversos, muitas vezes a ideia que fica é a de que política se limitaria apenas à prática partidária, o que não é correto. Sem levar isso em conta, por vezes apostam no ensino do funcionamento dos três poderes, por exemplo, acreditando que se está ensinando política, o que é errado e totalmente insuficiente. Gazeta do Povo- E o que deveria ser ensinado, então? E de que forma? Mario Sergio Cortella- Justamente a convivência: seu significado, seu respeito à democracia, o que demanda e em que resulta. E isso não deve ser encarado como um componente curricular, que são as disciplinas, mas como conteúdo curricular, estando presente e orientando o ensino desses valores nas matérias. Assim, isso deve acontecer desde a educação infantil, com noções de partilha e respeito recíproco. E no ensino médio já se pode pensar em aliar essa prática ao conteúdo, dentro da teoria das matérias. Link da imagem: http://pt.wikipedia.org/wiki/Mario_Sergio_Cortella#mediaviewer/File:Mario_Sergio_Cortella_ 2012.jpg Mario Sergio Cortella no programa Café Filosófico de 2012. Mario Sergio Cortella nasceu em Londrina- PR. Graduou-se em Filosofia em 1975 e em 1989, tornou-se mestre em Educação pela PUC-SP e em 1997 concluiu o doutorado em educação pela PUC-SP. É professor titular do Departamento de Teologia e Ciências da Religião e de pós-graduação em Educação da PUC-SP. É autor de diversas obras de filosofia e educação, entre elas, Não Nascemos Prontos (2009) e Educação e Esperança - Sete Breves Reflexões Para Recusar o Biocídio (2009). Conheça um pouco mais sobre alguns autores citados neste capítulo. Paulo Freire- Divulgação - Link da imagem: http://acervo.paulofreire.org/ Paulo Freire (1920-1997) é um dos educadores brasileiros mais importantes e reconhecidos internacionalmente. Em 2012 foi nomeado Patrono da Educação Brasileira. O autor de A Pedagogia do Oprimido influenciou muitos educadores e professores a pensarem a educação como parte da realidade dos educandos, buscando a autonomia por meio da promoção do conhecimento. Para Freire a educação deve ser vista como prática libertadora. É autor de diversas obras e inspirou centenas de outras. Como sugestão de leitura, indicamos: Paulo Freire, Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, 1996. Edgar Morin- Link da Imagem: http://www.edgarmorin.org.br- Crédito da imagem: Lila Rodrigues. Edgar Morin é um sociólogo e filósofo e nasceu em Paris em 1921. Pesquisador do CNRS (Centre National de la Recherche Scientifique), Morin é também formado em Direito, História e Geografia. Autor de mais de trinta livros, é um dos mais renomados pensadores sobre a complexidade e aborda esta temática no livro Introdução do Pensamento Complexo (2001). Morin colabora com o pensamento sobre a educação nos dias de hoje na obra Os sete saberes necessários para a educação do futuro (2004). DIDÁTICA EM FILOSOFIA Conforme mencionamos no decorrer deste curso, optamos por apresentar inicialmente alguns conceitos introdutórios de filosofia, bem como, alguns temas relacionados para que o leitor já se familiarize com a temática e possa assim apreender melhor as noções de didática e metodologia em filosofia. Como este é um curso introdutório nos debruçaremos principalmente nas noções básicas de didática e passaremos a uma análise sobre a leitura do texto filosófico. Além disso, falaremos brevemente sobre a legislação que rege o ensino da filosofia no Brasil. De todos os livros e textos que consultamos para produzir este material, na maioria deles encontramos um questionamento que nos parece interessante de ser reproduzido: é possível ensinar filosofia? Qual a utilidade da filosofia? Acreditamos que neste ponto desta nossa jornada, tentamos lançar alguma luz a estas questões, mas elas não desaparecem assim facilmente. Podemos afirmar que o trabalho do professor de filosofia é um trabalho árduo e não muito reconhecido e para completar, não são muitos os materiais que forneçam as bases para a didática e metodologia da Filosofia. Mas, acreditamos que podemos contribuir com alguns pontos para que o aluno e futuro professor possam trilhar o seu caminho para a descoberta de como aprender e como ensinar a filosofia. 1. 1- Breve histórico do ensino da filosofia no Brasil O ensino da filosofia no Brasil remonta ao ensino jesuítico do período colonial (século XVI), em que o colonizador europeu impunha sua visão de mundo fortemente marcada pela moral católica e atendendo principalmente os interesses da elite, a filosofia neste contexto, tinha papel doutrinador. Os jesuítas tiveram grande influência na primeira fase da História da Educação no Brasil. De acordo com Costa (1967), havia pouco espaço para a reflexão e a filosofia já vinha “pronta da Europa” e para a elite colonial reproduzir estas ideias já era sinal de grande cultura. Neste contexto, não eram levados em consideração a realidade local, tampouco, os interesses do índio, do negro e do colono. Com a proclamação da República, a Filosofia passa a fazer parte dos currículos oficiais, mas a sua representatividade é meramente institucional. Durante a Era Vargas (1930-1945) o ensino da filosofia foi altamente prejudicado por causa da política educacional do governo que priorizava o desenvolvimento da educação técnica profissional, em nível técnico e superior, relegando o ensino das disciplinas da área de humanidades para um plano secundário. Em 1961, a Lei nº 4.024/61 extinguiu a obrigatoriedade do ensino de Filosofia e a partir de 1968, com o recrudescimento do governo militar, a disciplina é finalmente extinta dos currículos escolares do Segundo Grau em 1971. Para Cartolano (1985) essa ação já vinha sendo articulada e culminou com Lei nº 5.692/71. O ensino de filosofia não atendendo a essas solicitações tecno burocráticas e político-ideológicas, já não servia aos objetivos das reformas que se pretendiam instituir na estrutura do ensino brasileiro. A sua extinção como disciplina, já optativa no currículo, em 1968, foi pensadamente preparada através de uma série de leis e decretos, pareceres e resoluções do Conselho Federal de Educação e do Conselho Estadual de São Paulo, que, neste caso, centralizavam as decisões da área educacional. (CARTOLANO, 1985, p.72). Com o fim da ditadura e iniciado o processo de redemocratização do Brasil no começo dos anos 80 é que são retomadas as discussões sobre a volta da disciplina da Filosofia ao Ensino Médio. Depois de muitos anos, em 1996 com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de acordo com o artigo IV da LDB nº 9394/96 “serão incluídas a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias em todas as séries do ensino médio. (Incluído pela Lei nº 11.684, de 2008)”. O artigo 2º da resolução CNE/CEB nº 4/2006 prevê que “no caso de escolas que adotarem, no todo ou em parte, organização curricular estruturada por disciplinas, deverão ser incluídas as de Filosofia e Sociologia” No ensino superior, o parecer CNE/CP nº 28/2001 apresenta as Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de Filosofia, História, Geografia, Serviço Social, Comunicação Social, Ciências Sociais, Letras, Biblioteconomia, Arquivologia e Museologia. De acordo com este documento, a construção do perfil do formando em filosofia pede: 1. Perfil dos Formandos- Sólida formação de história da filosofia, que capacite para a compreensão e a transmissão dos principais temas, problemas, sistemas filosóficos, assim como para a análise e reflexão crítica da realidade social em que se insere. O licenciado deverá estar habilitado para enfrentar com sucesso os desafios e as dificuldades inerentes à tarefa de despertar os jovens para a reflexão filosófica, bem como transmitir aos alunos do Ensino Médio o legado da tradição e o gosto pelo pensamento inovador, crítico e independente. O bacharel deverá estar credenciado para a pesquisa acadêmica e eventualmente para a reflexão trans-disciplinar Os egressos podem contribuir profissionalmente também em outras áreas, no debate interdisciplinar, nas assessorias culturais etc. Entre as competências e habilidades esperadas por este profissional, espera-se: [...] - Capacitação para um modo especificamente filosófico de formular e propor soluções a problemas, nos diversos campos do conhecimento; - Capacidade de desenvolver uma consciência crítica sobre conhecimento, razão e realidade sócio-histórico-política; - Capacidade para análise, interpretação e comentário de textos teóricos, segundo os mais rigorosos procedimentos de técnica hermenêutica; - Compreensão da importância das questões acerca do sentido e da significação da própria existência e das produções culturais; - Capacidade de relacionar o exercício da crítica filosófica com a promoção integral da cidadania e com o respeito à pessoa, dentro da tradição de defesa dos direitos humanos. [...] Diante deste breve cenário sobre o desenvolvimento do ensino da filosofia no Brasil e o perfil do formando em filosofia, partimos agora para uma proposta de didática em filosofia. A importância da didática em filosofia Marilena Chauí (1995) utiliza uma expressão muito apropriada ao referirse à “prática” da filosofia, para a autora é preciso “ensinar-aprender-fazer Filosofia”, isto é, desenvolver a capacidade de reflexão a partir da análise questionadora da realidade e dialogar com o educando. De nada adianta o professor ser dotado de muito conhecimento teórico se não é capaz de transmitir este saber. Para esta autora, a atitude filosófica consiste em “indagar” e a Filosofia se torna reflexão sobre o vivido. Dentre as características desta atitude, figuram, na visão da autora: - perguntar o que a coisa, ou o valor, ou a idéia, é. A Filosofia pergunta qual é a realidade ou natureza e qual é a significação de alguma coisa, não importa qual; - perguntar como a coisa, a idéia ou o valor, é. A Filosofia indaga qual é a estrutura e quais são as relações que constituem uma coisa, uma idéia ou um valor; - perguntar por que a coisa, a idéia ou o valor, existe e é como é. A Filosofia pergunta pela origem ou pela causa de uma coisa, de uma idéia, de um valor. (CHAUÍ, 1995, p.12) A atitude filosófica é então posicionar-se criticamente frente aos problemas e situações no mundo em que vivemos em nível global, local e regional. Não se refere apenas ao questionamento, mas como atitude prática de mudança da forma que pensamos e agimos no mundo. Neste sentido, ao invés de aceitarmos as situações perguntamo-nos, nos questionamos sobre nós mesmos. Neste aspecto, a Filosofia torna-se reflexão e incita perguntas e questões sobre a maneira que pensamos, como nos posicionamos e para que pensamos. Este é um passo “básico” para “ensinar-aprender-fazer Filosofia”, porém não menos desafiador. Como já mencionou Kant, não se pode ensinar filosofia, mas, apenas ensinar a filosofar. Como vimos anteriormente, o ensino da filosofia foi bastante prejudicado no Brasil e até bem pouco tempo atrás, ela não era nem considerada como uma disciplina autônoma. Mas, no momento histórico em que vivemos com as crises, a globalização da informação, os embates e confrontos, a participação popular, as redes sociais e novas lutas, revelam que há muito terreno a ser explorado pelo futuro filósofo. O olhar do filósofo é emergencial neste cenário. A didática em filosofia, portanto, tem como objetivo sistematizar o pensamento filosófico de modo a oferecer possibilidades de que o aluno consiga desenvolver o seu trabalho intelectual. Sobre a Didática, convém apresentarmos algumas definições. De acordo com Silva e Borba (2011), até o final do século XIX, a Didática encontrou seus fundamentos na Filosofia, principalmente nos trabalhos de Comenius (Jan Amos Komenksy- 1592-1670) considerado o fundador da didática moderna, e também, de Jean Jacques Roussseau (1712-1778), Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827), Johann Friedrich Herbart (1777-1841). Posteriormente, também buscou referenciais na outras ciências como a Biologia e a Psicologia. Para Pimenta e Anastasiou (2010) o papel da didática é o de compreensão do funcionamento em seu momento, suas funções sociais e implicações estruturais. Sobretudo deve realizar uma ação auto-reflexiva e dialogar com aquilo que estuda, pois isto faz parte da ação de ensinar. Os autores mencionam que se faz necessário o intercâmbio de conhecimentos e culturas e constante avaliação crítica sobre os métodos de ensino, e atualização intelectual. Neste sentido, o que se espera do professor é que ele direcione o processo de aprendizado do aluno e promova uma relação de troca de conhecimentos com o aluno. Este caminho de inter-relação é possível quando o professor tem noção de que não é um “especialista” em apenas uma disciplina, mas tem a capacidade de desenvolver-se também de maneira plural. Sobre isto mencionam Silva e Borba (2011): Exige-se ainda um professor transformador, que mude o foco do ensinar e passe a se preocupar com o aprender, principalmente com o “aprender a aprender”. Que abra caminhos coletivos de busca que subsidiem a produção do conhecimento de seus estudantes, auxiliando-os a ultrapassarem o papel passivo de repetir ensinamentos e a se tornarem críticos e criativos., indo-se além, a necessidade de um professor capaz de trabalhar em equipe, que seja capaz de integrar grupos de pesquisa com profissionais de diferentes áreas, participar de projetos multidisciplinares e que aceite o desafio da interdisciplinaridade. (SILVA, BORBA, 2011, p.26) Como podemos ver tendo como base estas definições, a Filosofia e a Didática se complementam no sentido em que são ciências que estimulam o aprendizado e o desenvolvimento para um ensino autônomo e crítico. Ensinar a filosofar, como já mencionamos algumas vezes, é uma tarefa que exige boa formação intelectual e capacidade de organizar os conhecimentos de maneira organizada, pois os textos filosóficos, conforme mencionado por Ariel e Porta (2002), não é são textos que contam histórias (de caráter narrativo) ou apresentam notícias (informativos), e por isso, exigem que saibamos como ler este texto para poder analisá-los. A didática, portanto, neste sentido pode ser entendida para além dos limites metodológicos e desempenhar um papel analítico, de investigação sobre a natureza da educação, de construção e troca. É importante mencionar que didática e metodologia não significam a mesma coisa, mas dependem uma da outra no processo de construção da aprendizagem e do ensino. Se pudéssemos fazer uma analogia, diríamos que a didática é o “sistema nervoso” do nosso corpo que opera em diferentes níveis para o perfeito funcionamento das nossas funções, que compreenderemos aqui como a educação como um todo. Este “sistema” contempla o atual panorama da educação que exige que o educador atenda às demandas intelectuais pertinentes ao conhecimento e também ao seu trabalho “burocrático”, por assim dizer, como a organização pedagógica dos diferentes modelos de ensino, o comprometimento na organização dos conteúdos para a formação do educando, a construção dos diversos saberes, dentre outros. A metodologia seria as nossas funções propriamente ditas, a maneira como pensamos e agimos para nos fazer entender. Isso posto convém agora apresentarmos a nossa proposta de didática em filosofia. Gallo (2004) propõe uma análise interessante sobre como é possível despertar o interesse do aluno em filosofar. Com base em um encontro realizado com professores pela Unimep, verificou-se uma queixa recorrente dos professores em relação aos materiais didáticos para o ensino da filosofia que nos chama a atenção. O nível da linguagem utilizada é geralmente “hermético”, fechado e que ao invés de atrair o aluno, acaba o afastando. A proposta então é “transformar” a filosofia para uma linguagem que o aluno entenda, não vulgarizando a disciplina, mas esforçando-se ao máximo para que se consiga estabelecer uma comunicação proveitosa com o púbico a que se destina. Achamos muito interessante a abordagem feita pelo autor porque ela desmistifica a filosofia e oferece propostas contemporâneas e conectadas com a realidade dos educandos. No material desenvolvido em conjunto com diversos professores, a filosofia é analisada à luz dos problemas contemporâneos e ao invés de fornecer as respostas “fechadas” para o aluno, sugere questionamentos sobre os grandes temas da filosofia como a liberdade, a política, ideologia, o corpo, dentre outros. Acreditamos que este é um caminho possível para os futuros educadores, isto é, procurar apresentar os problemas da filosofia de modo que eles possam estar acessíveis e compreensíveis aos alunos. A proposta não é banalizar a disciplina, mas compreendê-la em toda a sua complexidade para que então, o professor consiga “traduzi-la” para a diversidade discente. Somado a isso, se faz necessário lançar mão de recursos diversos que possam ser reinterpretados no contexto da sala de aula, tais como, filmes, notícias, debates, matérias jornalísticas, crônicas, poemas, simulação de júris, pesquisas orientadas em grupos, visitas à patrimônios públicos, instituições... Atualmente o professor dispõe de uma infinidade de soluções para apresentar os mais diferentes conteúdos, basta querer! Logicamente que não somos inocentes a ponto de desconhecer a realidade de grande parte das escolas e algumas universidades brasileiras, e também conhecemos que em muitos casos certas “ousadias” não são vistas com bons olhos nos planejamentos pedagógicos, mas reforçar estas dificuldades é incorrer no senso comum, e não é este o nosso objetivo. Modestamente esperamos que possamos propor alguns pontos para nortear o ensino em filosofia e fornecer pistas para que cada um siga o caminho que achar melhor e mais adequado à sua realidade e a de seus educandos. Em seguida, apresentaremos algumas propostas de atividades para serem desenvolvidas no ambiente educacional. 1. Para compreender a Filosofia- Conceitos Introdutórios Temas sugeridos: a) As raízes da filosofia- Neste momento convêm apresentar as origens da Filosofia considerando como surge a filosofia e o que ela significa para o desenvolvimento do pensamento ocidental. Desmistificar as noções do senso comum sobre o que é filosofia. Além disso, a proposta é não se prender aos conceitos e teorias, mas procurar instigar o aluno tendo como pressuposto a sua realidade, a sua vivência. b) O problema em filosofia- De acordo com Ariel e Porta (2002), o primeiro passo para a compreensão da filosofia é sempre estabelecer qual é o problema proposto por aquele ou este filósofo. O leitor deve se perguntar: qual é o problema proposto por este filósofo? Por que ele o formula dessa maneira? Ao compreender estes pontos, o leitor tem noção de como determinado filósofo se posiciona em relação aos problemas ele coloca. c) A filosofia e o conhecimento- Importante instigar o educando a reconhecer o papel da filosofia como instrumento de reflexão e as suas relações com as demais formas de conhecimento como a arte, a religião, as ciências. Convém apresentar ao aluno a noção de senso comum e o pensamento reflexivo, instigar o olhar reflexivo sobre esta forma de conhecimento e não preconceituoso; d) Os grandes temas da Filosofia- Situar os grandes temas da filosofia no contexto histórico em que se desenvolvem. Relacionar os grandes temas com os problemas que vivenciamos. Propor reflexões críticas a respeito de temas do cotidiano. Sugestões de abordagens possíveis: o indivíduo e a sociedade, ideologia, política, a questão do trabalho, a liberdade, a moral e a ética, a morte, o consumo, a estética, discussões sobre o corpo, justiça, os preconceitos, as redes sociais, a comunicação de modo geral, felicidade, diversidade. É claro que com estes exemplos não pretendemos limitar o trabalho do professor e educador. Em nossa concepção, estes são alguns pontos para se começar a inventar seu próprio caminho de “ensinar-aprender-fazer Filosofia”. Assim, finalizamos, este tópico com uma citação que nos parece adequada. É essencial, portanto dispor, em filosofia, como na aprendizagem das ciências teóricas ou aplicadas, de métodos que não se confundam com simples técnicas pragmáticas, aplicá-las a todos os problemas, mas que permitam pensar melhor, raciocinar melhor, refletir melhor por si mesmo sobre as questões colocadas pela própria vida. Aprender filosofia não é aprender a servirse de um instrumento para aumentar nosso poder sobre as coisas ou sobre os homens, mas é adquirir progressivamente a arte de desenvolver as aptidões de nosso próprio espírito a julgar a raciocinar em geral. (FOLSCHEID, WUNEMBURGUER, 1999, p. 10). PROPOSTA DE ATIVIDADES O grande júri Descrição da atividade: Simular o espaço de um tribunal em que a sala se divide em dois ou três grupos para debater sobre um dos grandes temas da filosofia e relacioná-lo com os dias de hoje. Podem ser utilizados textos jornalísticos, artigos opinativos e outros textos para fundamentar as discussões; Objetivos: Incentivar os alunos a fundamentarem as suas argumentações com ideias. Promover a troca de conhecimento e o respeito à opinião dos outros grupos. Realização das atividades: O professor fará a leitura prévia dos conceitos que pretende trabalhar. Ao escolher, por exemplo, analisar a temática da liberdade deve levar textos para apresentar aos alunos a noção de liberdade e qual o tema que será explorado, como a liberdade religiosa, de gênero, corpo, etc. Em seguida, apresentará os pontos conflitantes dividirá a turma em dois grupos que debaterão entre si, ou em três, e o último será o responsável por ponderar as opiniões dos outros grupos. Em seguida o professor lança as questões pertinentes ao debate e dá 10 minutos para os grupos responderem as questões e começarem a preparar a sua defesa. Cada grupo terá 10 minutos para fazer a sua arguição e em seguida, haverá a réplica. O terceiro grupo, se houver, vai analisar se os pontos citados correspondem às noções apresentadas pelo professor e vai ponderar os argumentos. Finalmente, o professor desenha uma linha divisória no quadro negro enumera as respostas dadas pelos grupos. Faz um resumo dos pontos apresentados e associa à temática escolhida, explicando aos alunos que as opiniões divergentes fazem parte do processo filosófico. SEMINÁRIO- Filme e discussão teórica Filme: Nós que Aqui Estamos por Vós Esperamos- Dir. Marcelo Masagão (1999) Crédito da Imagem: Pôster de divulgação do filmehttp://www.imdb.com/title/tt0206805/ Síntese do filme: É um filme documentário que apresenta diversos fatos marcantes do século XX como as guerras e as suas consequências, a banalização da violência, a evolução tecnológica, a representação da loucura, da morte e também da esperança. Objetivo: Fazer o aluno refletir sobre as mudanças que aconteceram no mundo e como elas transformaram a sociedade. Atividade: Antes da exposição do filme, abordar a questão dos valores, da banalização da morte e a questão da liberdade. Falar brevemente sobre o filme, o contexto em que ele foi produzido, como era o Brasil nos anos 90, entre outros. Elaborar 2 a 3 questões, colocá-las no quadro e após a exposição do filme, dar um tempo para que os alunos respondam e finalmente debatam sobre o que viram. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANSART, Pierre. Em defesa de uma ciência social das paixões políticas. História: Questões e Debates, Curitiba n.33, p.145-162; 2001, Editora da UFPR. Acesso em 14/02/2015. Aristóteles. A Política. Editora Universidade de Brasília, Brasília, 1985. BAUMAN, Zigmunt. Vida para Consumo: a transformação das pessoas em mercadorias.Tradução Carlos Alberto Medeiros.Rio de Janeiro: Jorge Zahar. 2008. BENDASSOLI, Pedro. Felicidade e Trabalho. Revista FGV. Vol.6 • Nº4 • Jul./Ago. 2007. Acesso em 13/02/2015. BRASIL. Senado Federal. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: nº 5692/71. Brasília :1971. BRASIL. Senado Federal. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: nº 9394/96. Brasília :1996. BRASIL. Conselho nacional de Educação. Parecer CNE/CP 21/2001. Brasília. 2002. 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