BIOCORROSÃO EM CUPONS DE AÇO CARBONO EXPOSTOS À ÁGUA DOCE E. S. D. de Oliveira1, R. F. C. Pereira2, P. Silva2, G. M. T. Calazans1, M. A. G. A. Lima2 Av. Prof. Moraes Rego, 1235 - Cidade Universitária, Recife-PE, CEP: 50670901. Email: [email protected] - 1 Departamento de Antibióticos – UFPE; 2Departamento de Engenharia Química – UFPE; RESUMO É difícil determinar os custos associados à Biocorrosão que é resultante da presença e atividade dos micro-organismos. Nas hidrelétricas, os microorganismos formam biofilmes que podem causar dificuldades operacionais ocasionando a perda de eficiência nos equipamentos. O objetivo principal deste estudo foi avaliar a biocorrosão em cupons de aço carbono SAE 1010 monitorados em biorreator estático expostos à água doce proveniente de uma hidrelétrica por 60 dias. Foi analisada a concentração celular dos grupos microbianos presentes no biofilme, a perda de massa e taxa de corrosão. Os resultados mostraram que as bactérias redutoras de sulfato e as produtoras de ácidos aeróbias não estavam presentes na água de entrada do sistema. Dentre os micro-organismos estudados as bactérias heterotróficas aeróbias totais apresentaram a maior concentração celular. A taxa de corrosão do aço carbono no biorreator teste foi maior em relação ao controle, sendo classificada como moderada de acordo com a Norma NACE RP-07-75. Palavras-chave: biocorrosão, biofilmes, aço carbono SAE 1010. INTRODUÇÃO A Biocorrosão ou Corrosão Microbiologicamente Induzida (CMI) ocorre sinergicamente devido a interações entre consórcios de micro-organismos no biofilme formado, liberação de produtos do metabolismo microbiano no meio, e a relação destes com a superfície do metal, ocorrendo em aerobiose e/ou anaerobiose(1). Várias espécies bacterianas produzem metabólitos agressivos que influenciam no processo de corrosão acelerando as taxas de reações do processo corrosivo(2). Além de bactérias, outros micro-organismos podem estar presentes no biofilme, tais como fungos, algas e protozoários(3). Os biofilmes são ambientes dinâmicos que abrigam micro-organismos, substâncias 1 poliméricas como polissacarídeos e proteínas, além de água (97%) (4). A formação de biofilmes nos equipamentos metálicos principalmente de aço carbono, quando submersos em água, são os responsáveis por causar problemas em muitas hidrelétricas(5). As indústrias mais afetadas pela formação de biofilmes são a de geração de energia, produção de óleo, transporte, estocagem e distribuição de água. Nas hidrelétricas, os biofilmes podem causar diversas dificuldades operacionais através da formação de biofouling (acúmulo de biofilmes), que levam a perda de eficiência nos radiadores e trocadores de calor, assim como a diminuição de sua vida útil(6,7). MATERIAIS E MÉTODOS Corpos de prova Nos ensaios foram utilizados cupons de aço carbono SAE 1010 nas dimensões 30x25x3 mm, com área de 18,1371 cm2. Os cupons foram previamente jateados, tratados e pesados conforme metodologia(8). Em seguida foram expostos ao fluido por 60 dias com adição de solução nutriente a cada 14 dias para a manutenção da viabilidade dos micro-organismos presentes na água(9). Fluido de processo Foram coletadas amostras de água do rio São Francisco que abastece a Unidade Geradora de Energia Elétrica de Paulo Afonso II em Paulo Afonso – BA. As amostras de água foram analisadas microbiologicamente, em seguidas colocadas nos biorreatores. Biorreatores Os experimentos foram conduzidos em biorreatores (sistemas estáticos abertos) construídos em vidro com as seguintes dimensões: biorreator 1 – 50x25x30 cm (volume útil de 34 L) e biorreator 2 - 29,3x16,5x30 cm (volume útil de 11,4 L). No biorreator 1 (teste) os cupons foram expostos ao fluido de processo “in natura”. No biorreator 2 (controle) os cupons foram expostos ao fluido de processo estéril adicionado de 0,75% de azida sódica com o intuito de garantir a ausência de micro-organismos(10). Os cupons foram aprisionados por 2 fios de nylon e posicionados na mesma altura dentro dos biorreatores proporcionando a formação de biofilme em todos os cupons. Análises microbiológicas A cada 14 dias foram analisadas as concentrações celulares para quantificação dos micro-organismos sésseis. Foram quantificados os seguintes microorganismos: bactérias heterotróficas aeróbias e anaeróbias totais(11), bactérias precipitantes do ferro(12), bactérias produtoras de ácidos aeróbias e anaeróbias(11), bactérias redutoras de sulfato (BRS)(13), Pseudomonas sp.(11) e fungos filamentosos(11). Perda de massa e taxa de corrosão A perda de massa e taxa de corrosão foram realizadas conforme metodologia empregada para decapagem ácida dos corpos-de-prova(8). A Norma NACERP–07–75(14) foi adotada para avaliar a perda de massa dos cupons. RESULTADOS E DISCUSSÃO Concentração celular dos micro-organismos sésseis As Figs. 1, 2 e 3 apresentam as concentrações celulares dos principais grupos de micro-organismos presentes nos cupons de aço carbono SAE 1010 nos tempos de 15, 30, 45 e 60 dias de exposição à água doce em sistema estático. Dentre os micro-organismos isolados, as bactérias heterotróficas aeróbias totais foi o grupo microbiano que atingiu maior concentração celular nos biofilmes seguido das bactérias precipitantes do ferro como apresentado na Fig. 1. Dantas, 2009(15) também verificou esta predominância ao estudar a formação de biofilmes em cupons de aço carbono SAE 1008 em água do mar. Marangoni, 2010(5) isolou e identificou bactérias aeróbias e anaeróbias facultativas, BRS e fungos em corpos de prova metálicos, que permaneceram em contato direto com a água de rio de duas centrais hidrelétricas. Nos gráficos da Fig. 2 verifica-se que a concentração das Pseudomonas sp. e dos fungos foi praticamente constante, com pouca variação nos tempos estudados. As Pseudomonas sp. e os fungos atingiram concentração celular máxima de 3 3,03x101 UFC/cm2 (15 dias) e 2,21x101 UFC/cm2 (60 dias), respectivamente. Dantas, 2009(15) observou uma concentração máxima de Pseudomonas sp. aos 30 dias (7,9x102 UFC/cm2), enquanto os fungos foram constantes em todo experimento (1,6x101 UFC/cm2). Correia et al., 2010(16) identificaram fungos nos biofilmes presentes em estruturas metálicas corroídas expostas à água doce de uma hidrelétrica. Figura 1 - Concentração celular das bactérias heterotróficas aeróbias totais (a) e precipitantes do ferro (b) em células/cm2. Figura 2 - Concentração celular das Pseudomonas sp. (a) e fungos filamentosos (b) em UFC/cm2. 4 Figura 3 - Concentração celular das bactérias produtoras de ácidos anaeróbias (a) e heterotróficas anaeróbias totais (b) em células/cm2. Através da Fig. 3 (a) observa-se que as bactérias produtoras de ácidos anaeróbias mesmo estando presentes no fluido não sobreviveram no sistema, provavelmente devido sua baixa concentração inicial na água do rio. Já na Fig. 3 (b), as bactérias heterotróficas anaeróbias totais apresentaram um crescimento praticamente constante ao longo dos 60 dias. As bactérias produtoras de ácidos aeróbias e redutoras de sulfato não estavam presentes na água de alimentação do sistema. Embora neste estudo não tenha sido encontrada BRS, na maioria das pesquisas relacionadas ao tema (5), estes micro-organimos geralmente estão presentes e constituem o grupo mais importante dos processos corrosivos. Perda de massa e taxa de corrosão A Fig. 4 apresenta a taxa de corrosão, por perda de massa, de cupons de aço carbono SAE 1010 nos tempos de 15, 30, 45 e 60 dias de exposição à água doce. A taxa de corrosão dos cupons teste foi 0,0710 mm/ano, entretanto nos cupons controle (estéril) foi de 0,0040 mm/ano, sendo considerada de moderada e baixa corrosividade, respectivamente (14). Observou-se de uma forma geral que a corrosão foi uniforme em ambos os sistemas. Os cupons 5 testes apresentaram uma taxa de corrosão 94,4% maior que a dos cupons controle. Este aumento na taxa de corrosão foi ocasionado pela ação de metabólitos agressivos microbianos que alteram a interface metal/solução contribuindo para acelerar a corrosão nos metais. Figura 4 – Taxa de corrosão dos cupons de aço carbono SAE 1010. Rao et al., 2000(17) correlacionaram o crescimento de bactérias precipitantes do ferro com a taxa de corrosão de cupons de aço carbono em contato com água de resfriamento. A taxa de corrosão do sistema teste (entre 3-13,5 mm/ano) foi superior à taxa do sistema estéril (1.75 ± 0.62 mm/ano). Em 2009, Dantas(15) verificou que a taxa de corrosão teste (0,0561 mm/ano) foi inferior a dos cupons controle (0,0632 mm/ano). A formação dos biofilmes nas superfícies dos cupons teste contribuiu para a proteção do metal contra o ataque corrosivo. CONCLUSÕES As bactérias heterotróficas aeróbias totais foi o grupo microbiano que obteve maior concentração celular, seguido das bactérias precipitantes do ferro; As Pseudomonas sp., bactérias heterotróficas anaeróbias totais e fungos filamentosos também estavam presentes nos biofilmes estudados porém em concentrações inferiores; Apesar das bactérias produtoras de ácidos anaeróbias estarem presentes na água de entrada do sistema, as mesmas não sobreviveram após 30 dias; As BRS e as bactérias produtoras de ácidos aeróbias não estivam presentes na água de alimentação; 6 Os corpos-de-prova do sistema estudado apresentaram maior taxa de corrosão em relação aos corpos-de-prova do controle. REFERÊNCIAS (1) BEECH, I. B.; SUNNER, J. 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In hydroelectric, micro-organisms form biofilms that can cause operational difficulties leading to loss of efficiency in equipment. The objective of this study was to evaluate the biocorrosion coupons in carbon steel SAE 1010 monitored in static bioreactor exposed to freshwater for 60 days. It was analyzed the cellular concentration of microbial groups present in biofilm, weight loss and corrosion rate. The results showed that the sulfate reducing bacteria and aerobic producing acids were not present in the water inlet system. Among the micro-organisms studied total aerobic heterotrophic bacteria showed the highest cell concentration. The corrosion rate of carbon steel in the bioreactor test was higher than the control, classified as moderate according to NACE Standard RP-07-75. Key-words: biocorrosion, biofilms, carbon steel SAE 1010. 9