excelentíssimo senhor doutor juiz de direito da vara da fazenda

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE DEFESA DA SAÚDE PÚBLICA DE CURITIBA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA
CÍVEL DA COMARCA DE CURITIBA
VARA
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO
PARANÁ, representando os interesses da comunidade, através de sua Promotora
de Justiça adiante assinada, em exercício junto à Promotoria de Justiça de
Proteção à Saúde de Curitiba, situada na rua Mal. Floriano Peixoto, n.º 1251, CEP
80.230-110, Rebouças, Curitiba-Pr, nos termos do art. 129, inciso II da
Constituição Federal, dos arts. 3º, 5º, 11, 12 e 19 da Lei n.º 7.347, de 24 de julho
de 1985 e do art. 461 “caput” e parágrafos 3º e 4º do Código de Processo Civil
Brasileiro, vem à presença de Vossa Excelência propor esta AÇÃO CIVIL
PÚBLICA, com pedido de medida liminar e de multa cominatória em face da
Universidade Tuiuti do Paraná, situada na rua Mário Tourinho, n.º 1375, CEP
80.215-900, Curitiba-PR, na pessoa de seu sócio-gerente, Sr. Sydnei Lima
Santos, da Srª Regina Mara Teixeira, brasileira, divorciada, sexóloga, Diretora
da Clínica de Sexologia da Universidade Tuiuti do Paraná, com endereço
residencial na rua Aristides Athayde Júnior, nº 588, apto. 103, Champagnat,
Curitiba-PR, e do Hospital Erasmo de Roterdam, localizado na Rua Mateus
Leme, nº 2600, Bom Retiro, também nesta capital, na pessoa de seu DiretorGeral Luiz Fernando Zarpelon, pelos motivos de fato e de direito que abaixo
deduz:
Lei n.º 7.347/85:
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Art. 11. Na ação civil que tenha por objeto o
cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz
determinará o cumprimento da prestação da atividade
devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de
execução específica, ou de cominação de multa diária,
se
esta
for
suficiente
ou
compatível,
independentemente de requerimento do autor.
Art. 19. Aplica-se à ação civil pública, prevista nesta lei,
o Código de Processo Civil, aprovado pela lei n. 5869, de
11 de janeiro de 1973, naquilo em que não contrarie suas
disposições.
Código de Processo Civil:
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento
de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a
tutela específica da obrigação ou, se procedente o
pedido, determinará providências que assegurem o
resultado prático equivalente ao do adimplemento.
§ 3º - Sendo relevante o fundamento da demanda e
havendo justificado receio de ineficácia do provimento
final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou
mediante justificação prévia, citado o réu. A medida
liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer
tempo, em decisão fundamentada.
§ 4º - O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior
ou na sentença, impor multa diária ao réu,
independentemente de pedido do autor, se for
suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe
prazo razoável para o cumprimento do preceito.
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I. DA LEGITIMIDADE DO ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO AO PLEITO
A Magna Carta em vigor, ampliando o campo
de atuação do Ministério Público, atribui-lhe a incumbência da defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis (art. 127), ao mesmo tempo em que, dentre outras funções
institucionais, confiou-lhe o zelo pelo efetivo respeito dos poderes públicos e dos
serviços de relevância pública aos direitos nela assegurados, promovendo as
necessárias medidas a sua garantia (art. 129, inc. II). No mesmo sentido é o art.
120, inc. II, da Constituição Estadual.
Diante do contexto constitucional, extrai-se
que o Parquet, de modo genérico, promove todas as medidas necessárias para a
restauração do respeito dos poderes públicos aos direitos constitucionalmente
assegurados. Consequentemente, clara está a legitimidade postulatória naqueles
casos em que o poder público seja o patrocinador de lesão a direito líquido e
certo, utilizando o remédio jurídico indicado e mais adequado.
Art. 129 - São funções institucionais do Ministério
Público:
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos
e dos serviços de relevância pública aos direitos
assegurados nesta Constituição, promovendo as
medidas necessárias a sua garantia;
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública,
para a proteção do patrimônio público e social, do
meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos;
No presente caso, claramente, ocorreu
por parte dos requeridos Universidade Tuiuti do Paraná, da sexóloga Srª
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Regina Teixeira eo Hospital Erasmo de Roterdam, direta violação ao
preceituado pelo Conselho Federal de Medicina (Resolução nº 1482/97), que
autorizou,
experimentalmente,
a
realização
de
cirurgias
de
transgenitalização no Brasil, uma vez que inexiste qualquer equipe
multidisciplinar acompanhando o paciente transexual, conforme se comprovará
adiante, além de não se tratar, o Hospital em comento, onde até o momento
foram realizadas 04 (quatro) cirurgias, de Hospital Universitário ou Público.
Resolução CFM nº 1482/97:
3 . A seleção dos pacientes para cirurgia de
transgenitalismo obedecerá a avaliação de equipe
multidisciplinar constituída por médico-psiquiatra,
cirurgião, psicólogo e assistente social, obedecendo
aos critérios abaixo definidos, após dois anos de
acompanhamento conjunto:
 diagnóstico médico de transexualismo;
 maior de 21 (vinte um) anos;
 ausência de características físicas inapropriadas
para cirurgia; (grifos nossos)
4. As cirurgias só poderão ser praticadas em
hospitais universitários ou hospitais públicos
adequados à pesquisa. (grifo nosso)
Assim sendo, é clara a legitimidade do
Ministério Público para o desencadeamento da ação civil pública no caso em tela,
e imperativa é a desincumbência desse mister pela Promotoria de Defesa da
Saúde Pública, um dos setores especializados do Parquet paranaense.
Com efeito, no Estado do Paraná, a
preocupação do Ministério Público em se constituir no efetivo defensor do povo
resultou, dentre outras providências, no ato de criação da prefalada Promotoria
de Proteção à Saúde Pública, quando então determinou-se a observância ao
disposto no art. 129, inc. II, da Constituição Federal. Ora, se a qualquer membro
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do Ministério Público incumbiria, por dever de ofício, promover as medidas
necessárias à garantia ou efetivação dos direitos previstos na CF, com muito
maior razão é de se exigir da Promotoria Especializada (da Saúde Pública) uma
pronta e positiva atuação nas hipóteses ensejadoras de interposição da cabível
ação civil pública.
Diante do exposto, resta inconteste a
legitimidade ad causam do Parquet, por sua especializada Promotoria de Defesa
da Saúde Pública, no ajuizamento da ação civil pública para exercício da função
institucional do art. 129, inc. II, da Constituição Federal.
II. O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
CF. art. 1º:
A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito
Federal, constitui-se em Estado Democrático de
Direito e tem como fundamentos:
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana; (grifo nosso)
CF. art. 5º, inciso II :
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de
fazer alguma coisa senão em virtude de lei
Como é intuitivo, Estado de Direito nos
conduz, com acerto, à idéia de supremacia da lei, ou seja, a lei como patamar de
todas as suas ações. O Estado, pessoa jurídica que é, poderia, não fosse o
Princípio da Legalidade, fazer tudo aquilo que a lei não proibisse. É o que
preceitua o inciso II do art. 5º da CF, porém, o Princípio mencionado coloca o
Estado como fosse um sujeito de direito despersonalizado, ou seja, somente
podendo fazer aquilo que, expressamente, a lei lhe permita.
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“Inseria-se por igual forma nessa concepção do
Estado de Direito a limitação dos fins e tarefas do
Estado à garantia da liberdade e segurança da
pessoa e da propriedade individual”.
(Celso Ribeiro Bastos/Ives Gandra Martins)
Por certo, tal Princípio tem por escopo a
proteção do cidadão, já que ele, quando erguido à condição de governante, titular
de um poder supremo, teria, ainda que indiretamente, o controle dos seus atos
exercido pela população, através da autorização expressa na legislação,
previamente elaborada.
Por outro lado, tanto a Universidade quanto
o Hospital, pessoas jurídicas de direito privado, e a sexóloga, Srª Regina
Teixeira, pessoa física, podem fazer tudo que a legislação não proíba, no dizer do
artigo 5ª, II da CF.
LC n.º 04/75 (Código Sanitário do Estado do Paraná):
art. 1º - Todos os assuntos pertinente à saúde da
comunidade do Estado serão regidos pelas
disposições contidas nesta lei, no ato que a
regulamentar e nas Normas Técnicas Especiais
baixadas pela Secretaria de Saúde Pública,
obedecendo, no que couber, à legislação federal
vigente. (grifo nosso)
Resolução CFM nº 1482/97:
3 . A seleção dos pacientes para cirurgia de
transgenitalismo obedecerá a avaliação de equipe
multidisciplinar constituída por médico-psiquiatra,
cirurgião, psicólogo e assistente social, obedecendo
aos critérios abaixo definidos, após dois anos de
acompanhamento conjunto:
 diagnóstico médico de transexualismo;
 maior de 21 (vinte um) anos;
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 ausência de características físicas inapropriadas
para cirurgia; (grifos nossos)
4. As cirurgias só poderão ser praticadas em
hospitais universitários ou hospitais públicos
adequados à pesquisa. (grifo nosso)
Decreto 3641/77 (Regulamento Sanitário):
Art. 691 - Considera-se infração, para fim deste
Regulamento, a desobediência ou inobservância das
normas legais, regulamentares e outras que, por
qualquer forma, se destinem à promoção,
preservação e recuperação da saúde. (girfo nosso)
Código de Ética Médica (Resolução 1246/88):
É vedado ao médico:
Art. 44. Deixar de colaborar com as autoridades
sanitárias ou infringir a legislação pertinente;
(grifo nosso)
Art. 124. Usar experimentalmente qualquer tipo de
terapêutica ainda não liberada para uso no País, sem
a devida autorização dos órgãos competentes e
sem consentimento do paciente ou de seu
responsável legal, devidamente informados da
situação e das possíveis conseqüências. (grifos
nossos)
Lei 3268/57:
Art. 2º. O Conselho Federal e os Conselhos
Regionais de Medicina são os órgãos supervisores da
ética profissional, em toda a República e ao mesmo
tempo, julgadores e disciplinadores da classe
médica, cabendo-lhes zelar e trabalhar por todos os
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meios ao seu alcance, pelo perfeito desempenho ético
da medicina e pelo prestígio e bom conceito da
profissão e dos que a exerçam legalmente. (grifos
nossos)
Se o Estado deve obediência à lei, se ele não
pode agir se não quando autorizado por ela, natural que, não só, somente atue
quando autorizado, mas, em atuando, o faça da forma como preceitua a norma
jurídica. No caso em tela, se a legislação pertinente somente permite o
procedimento médico mencionado, quando existente uma equipe multidisciplinar
e, ainda assim, realizado em Hospital Universitário ou Público, claro nos parece
que há infringência da legalidade na situação posta, fato que obriga o Poder
Público, em vista do Princípio da Legalidade supra citado, à imediata proibição de
funcionamento do Programa de Tratamento de Transexualismo da Universidade
Tuiuti do Paraná, sob a responsabilidade da Srª. Regina Teixeira, uma vez que, se
a legislação permite o procedimento com determinados pré-requisitos, uma vez
inexistentes esses requisitos, em uma interpretação a contrario sensu, tal
atividade estaria vedada.
Constituição Federal:
Art. 1.° A República Federativa do Brasil ..., constitui-se
em Estado democrático de direito e tem como
fundamentos:
...
II - a dignidade da pessoa humana; (grifo nosso)
Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o
trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição. (grifo
nosso).
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do
Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e
de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
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ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação (grifo nosso).
Por seu turno, a Lei Orgânica da Saúde (Lei n° 8.080,
de l9 de setembro de 1990) estabelece:
Art. 2°. A saúde é um direito fundamental do ser
humano, devendo o Estado prover as condições
indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1°. O dever do Estado de garantir a saúde consiste na
formulação e execução de políticas econômicas e sociais
que visem à redução de riscos de doença e de outros
agravos e no estabelecimento de condições que
assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos
serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
Desta forma, sendo, o Estado, obrigado à obediência
estrita à legislação e, esta, a contrario sensu, proibindo o funcionamento de um
programa nos moldes do desenvolvido pela Srª Regina Teixeira, visando, por
óbvio, proteger os cidadãos, urge, sejam os requeridos, proibidos de exercer
qualquer atividade relativa ao tratamento do transexualismo, extinguindo o
programa em foco.
III. DOS FATOS.
Foi instaurado, em 17 de abril de 2000,
mediante portaria, o Procedimento Administrativo n.º 15/00, já que foi trazida
ao conhecimento deste órgão, situação envolvendo o paciente transexual E.I.
operado aos 26 de setembro de 1999, no Hospital Erasmo de Roterdam, nesta
Capital, cujo resultado da cirurgia havia repercutido em problemas funcionais.
Tal situação individual alertou esta Promotoria de Justiça, uma vez que soube-se
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que outras 03 (três) haviam sido realizadas na mesma ocasião, para as questões
genéricas relativas às cirurgias corretivas realizadas em transexuais, inseridos
em um “programa” desenvolvido pela Universidade Tuiuti do Paraná, em tese, com
respaldo na Resolução n.º 1482/97 emanada pelo CFM.
Tal Resolução n.º 1482/97 (fls. 10/11), do
Conselho Federal de Medicina, foi publicada em 19.09.97, com o seguinte
objetivo:
“autorizar
a
título
experimental,
a
realização de cirurgia de Transgenitalização
do tipo neocolpovulvoplastia, neofaloplastia
e/ou procedimentos complementares sobre
gônadas e caracteres sexuais como
tratamento dos casos de transexualismo”.
A
referida
resolução
estabelece
objetivamente quais são os pacientes que se enquadram na definição de
transexualismo, bem como, os critérios à seleção dos mesmos para se
submeterem a tal intervenção cirúrgica. Esta deve obedecer a certos requisitos,
como, por exemplo, ser realizada avaliação do paciente por equipe multidisciplinar
constituída por médico-psiquiatra, cirurgião, psicólogo e assistente social;
diagnóstico médico de transexualismo; dever ser realizada a cirurgia após dois
anos de acompanhamento conjunto pela mencionada equipe multidisciplinar; os
procedimentos cirúrgicos só poderão ser praticados em hospitais Universitários
ou Hospitais Públicos adequados à pesquisa.
Embasando-se na já citada resolução do
CFM, a Universidade Tuiuti do Paraná, através de um programa coordenado pela
requerida Sra. Regina Mara Teixeira, sexóloga, diretora da Clínica de Sexologia
da referida Universidade, tendo como participantes os cirurgiões plásticos, Dr.
Jalma Jurado (também professor Universitário em Jundiaí) e Dr. Pérsio Ferreira
Filho, realizou um número de quatro cirurgias no Hospital Erasmo de Roterdam.
A coordenadora deste programa de
atendimento, a Sra. Regina Mara Teixeira, cuja formação acadêmica é na área de
psicologia, exerce suas funções há vinte anos, junto a Universidade Tuiuti do
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Paraná, onde dirige a Clínica de Sexologia, existente dentro do Curso de
Psicologia, sendo que ouvida nesta Promotoria de Justiça às fls. 49/55, declarou
que:
“...a já referida resolução do CFM autorizou então, para desenvolvimento em
gestão acadêmica a realização da cirurgia de Transgenitalização, sendo que o
doutor Jalma, sendo experiente em tais procedimentos (mais de cinqüenta
realizados), se prestou à realizá-los dentro do programa desenvolvido pela
declarante de forma graciosa; que neste contexto a declarante passou a fazer a
avaliação de pacientes, sendo que quatro deles já foram submetidos a
realização da cirurgia dentro do programa desenvolvido sob sua
coordenação;... que no final do ano passado, após a declarante ter feito inúmeros
contatos visando a viabilização, inclusive da cirurgia nesta cidade, e levando-se
em conta já estar sendo feito o acompanhamento de mais três pacientes já
considerados “prontos” para o ato operatório, o Dr. Jalma acompanhado do Dr.
Pérsio, além de toda uma equipe considerada multidisciplinar, realizou um
número de quatro cirurgias junto ao Hospital Erasmo de Roterdam; que tais
cirurgias se deram entre a sexta-feira e o sábado, tendo o já citado transexual
feminino sido submetido a uma nova cirurgia, que visou a adaptação da uretra o
neofalo; que para tanto foram envolvidos os residentes de medicina que faziam
estágio no hospital, de cuja faculdade a declarante não sabe informar;
...ressaltou a declarante que o hospital foi “super aberto” e compreensivo a tais
situações; que todos os pacientes submetidos às intervenções cirúrgicas foram
devidamente informados das eventuais complicações, as quais costumam ocorrer
em até cinqüenta por cento dos casos e compreendem desde infecção até a
necessidade de retoque; que a declarante esclarece nesta oportunidade que a
vaginoplastia é considerada de menor complexidade do que a neofaloplastia, uma
vez que esta compreende o aproveitamento do tecido para a feitura do pênis e
costuma não ocorrer em uma só cirurgia; que no caso específico que deu origem
aos presentes autos e envolvem a pessoa de E.I, esclarece que por se tratar de
descendente da raça japonesa, como característica apresenta uma cicatrização
mais rápida do que a normal, o que implica em diversas conseqüências, inclusive na
permanência do uso de sonda para urinar por um tempo maior; que a referida
paciente, desta forma está tendo um problema de estenose (fechamento
uretral), o que dificulta o ato de urinar, justamente porque a cicatrização se deu
de forma muito rápida;... que a declarante informa ter conhecimento de que o
procedimento não é previsto na tabela do SUS, sendo que os pacientes inscritos
no programa, incluindo-se os oito já operados, representam um número de
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quarenta e um; que a declarante informa que junto a Universidade Tuiuti, não é
cobrada qualquer importância do interessado, caso este não reuna condições de
arcar com gastos, que são cobrados através de uma tabela representada por
UVR, na qual se leva em conta a renda do envolvido; ... que a declarante esclarece
que contatou com o Hospital Erasmo de Roterdam, através do contato feito por
meio de uma paciente, cujo irmão trabalha para um vereador; que as cirurgias não
mais se realizaram em função da falta de local e porque o Hospital alega ter um
custo muito alto; que a declarante tem feito contatos com o Hospital de Clínicas,
através de indicação do Dr. Armando Raggio, estando inclusive disposta a
gestionar em Brasília a viabilização de tal procedimento; que ainda nomina o
profissional Dr. Tadeu Brenny Filho (urologista), o qual igualmente está engajado
no programa;... que em relação a resolução que trata da questão, a declarante
informa que o CFM e o CRM não exercem qualquer controle sobre o
desenvolvimento do programa que torna viável o procedimento autorizado a título
experimental, valendo dizer que o citado Dr. Júlio Cesar, (Secretário do CFM),
teria autorizado publicamente as intervenções feitas pelo Dr. Jalma, muito
embora o CFM não tenha se pronunciado em tal sentido de forma expressa; que a
declarante indagada informa que não existe médico psiquiatra avaliando os
pacientes interessados, sendo que a seu ver não é necessário, já que a
presença do psicólogo excluiria tal necessidade; que a declarante nesta
oportunidade igualmente esclarece que o médico psiquiatra firmaria laudo
referente a existência de eventual distúrbio mental do inscrito, enquanto
psicólogo emite além de tudo um laudo psicosexual; que a declarante informa que
a assistente social que atualmente presta atendimento e integra a necessária
equipe multidisciplinar, atende pelo nome de Alessandra, estando lotada junto a
Vara de Família da Capital; que a declarante igualmente afirma conhecer o
teor da resolução em seu item “4”, quando diz que as cirurgias só poderão
ser praticados em Hospitais Universitários ou Públicos, adequados a
pesquisa, motivo pelo qual está gestionando a inclusão do HC no programa;
que a declarante igualmente afirma ter conhecimento da previsão expressa na
legislação penal brasileira, que corresponde ao tipo penal de lesão corporal
gravíssima, sendo o ato cirúrgico que se realiza em tais pessoas, pode se
entendido como tal, oportunidade em que igualmente esclarece que voltando-se
para tal questionamento, integrou em conjunto com vários operadores do direito
um estudo, no qual se discutiu a questão, dentre os quais pode nominar o Dr. Lenz
Cesar, Dr. Ivan Xavier Viana Filho e Dra. Joeci Camargo; que tal estudo
compreende a realização de uma reunião lavrada em ata realizada no gabinete do
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tribunal já a quase dois anos; ... que nesta oportunidade a declarante se
compromete a apresentar junto a esta promotoria de justiça toda a
documentação referente ao programa que envolve a resolução do CFM,
incluindo-se a forma pela qual se deu a constituição da necessária equipe
multidisciplinar, com o nome de seus membros, os inscritos, inclusive aqueles
que já realizaram a cirurgia de forma exitosa”. (grifos nossos)
Posteriormente, às fls. 97 do procedimento
administrativo, o Hospital de Clínicas em resposta à solicitação da requerida Sra.
Regina, manifestou-se no sentido de que sua estrutura, reconhecidamente, uma
das melhores do Estado, além de se adequar às exigências contidas na Resolução,
não estaria em condições de viabilizar os procedimentos em tela, mesmo após
acompanhamento psicológico por mais de dois anos.
Às fls. 107, vê-se o ofício nº 537/00 de
30.06.00, em que foram requisitados os documentos que a requerida Sra. Regina
Mara Teixeira, teria se comprometido em declarações a apresentar nesta
Promotoria de Justiça, relativos ao programa da Universidade Tuiuti do Paraná,
além da indicação de dois contatos telefônicos feitos em 17.07.00 e 01.08.00
através de assessoria jurídica, onde em um deles a requerida, Sra. Regina Mara
Teixeira teria se declarado impedida de fornecer a documentação, por “motivos
éticos”, olvidando-se por certo de que tal argumentação não procede frente às
investigações que estavam sendo levadas a efeito por este órgão.
Às fls. 156/163,
se vê publicação de
circulação na internet, onde há clara indicação de que o procedimento estava
sendo feito pelos requeridos, ou seja, a Sra. Regina Mara Teixeira sempre se
apresentou como representante da Instituição de Ensino e efetuou os
atendimentos do programa utilizando-se da estrutura física da Universidade
Tuiuti do Paraná, o que era do conhecimento de todos e assim foi veiculado por
todos os meios, valendo dizer que a requerida Universidade Tuiuti do Paraná
sempre foi vista como referência no programa em desenvolvimento, conforme
pode se extrair da leitura dos autos.
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Às fls. 169, novo ofício (nº 628/00) a Srª
Regina Mara Teixeira, reiterando a requisição de documentos anterior e,
novamente, a requisição ministerial foi ignorada.
Ouvido nesta Promotoria de Justiça, às fls.
173/178, o Dr. Pércio Ferreira Filho declarou que:
“...o declarante esclarece ter sido cirurgião auxiliar nas quatro cirurgias de
transgenitalização realizadas entre os dias 25 e 26 de setembro de 1999 no
Hospital Erasmo de Roterdam, sendo que três delas foram de transexuais
masculinos para femininos e uma de feminino para masculino;...que o declarante
esclarece que o procedimento foi e continua sendo autorizado pelo CFM através
de Resolução, sendo que à época existiam 28 pacientes que vinham desenvolvendo
o programa junto à Clínica de Sexologia da Universidade Tuiuti do Paraná, tendo
sido 04 deles escolhidos para realização das cirurgias; que o declarante
indagado, esclarece que a pessoa responsável pelo desenvolvimento do
programa se trata da Drª Regina, a qual é igualmente responsável pela citada
clínica, se considerando o declarante um dos membros da equipe multidisciplinar
existente;... que para a realização das cirurgias foi tentado viabilizar
hospital público ou universitário, o que não foi possível, sendo que ouviu dizer
que através de uma paciente se chegou ao hospital Erasmo de Roterdam..;
...que o declarante informa também serem membros da equipe multidisciplinar o
Dr. Tadeu Brener (Urologista) e a Drª Maria de Tal (Ginecologista), sendo que
somente o primeiro acompanhou as cirurgias realizadas;... que o declarante
afirma existir junto à clínica de sexologia da Universidade Tuiuti do Paraná
uma equipe referenciada como multidisciplinar, conforme preceitua a
Resolução do CFM; que indica como membro da referida equipe o Dr. Tadeu
Brener (médico urologista), a Drª Maria de Tal (médica ginecologista), além
de existir um médico psiquiatra, assistente social, geneticista,
endocrinologista, cujos nomes não sabe indicar, porém são referenciados pela
equipe da Drª Regina, a qual seguramente saberá dizer de quem se
tratam;...que o declarante informa que somente participou de cirurgias de
transgenitalização nas ocasiões descritas nos presentes autos; que o
declarante informa que atualmente tais cirurgias em novos pacientes não
mais foram realizadas, muito embora haja a insistência de vários pacientes,
sendo que o declarante está aguardando uma solução do CRM e do Ministério
Público;...”. (grifos nossos)
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Em 27.09.00, nova requisição foi feita a Sra
Regina Mara Teixeira através do ofício nº 808/00 (fls. 184) e, novamente, o
mesmo foi ignorado por ela, não obstante o alerta de que a recusa reiterada
poderia ensejar seu processamento por crime de desobediência.
Diante da tentativa infrutífera de ouvida do
Sr. Sócio-gerente da Universidade Tuiuti do Paraná, face o estado de saúde do
mesmo, conforme manifestação desta Promotora de Justiça de fls. 180,
compareceu a este órgão, representando a instituição de ensino, também
requerida, conforme fls. 188/191, o Sr. João Henrique Faryniuk, Diretor da
Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Tuiuti do Paraná, o
qual informou sinteticamente que, no concernente às cirurgias de
transgenitalização realizadas por iniciativa do programa de atendimento
fornecido por tal Universidade, não foi assunto de discussão entre os Colegiados,
tomando conhecimento apenas informalmente, acrescentando, inclusive, que este
programa não está sendo desenvolvido pela referida instituição de ensino, uma
vez que não observou os trâmites exigidos para tanto. Esclarece também que as
pessoas envolvidas com tal programa não são vinculadas de qualquer forma à
Universidade Tuiuti, inclusive que os profissionais médico-psiquiatra, cirurgião e
assistente social não compõe os quadros da Universidade Tuiuti do Paraná, bem
como, desconhece a existência do “Comitê de Identidade Sexual”. Reafirma
que esse tipo de intervenção cirúrgica não tem a participação oficial da
Clínica de Sexologia e nem da Universidade Tuiuti do Paraná, e afirma
categoricamente que não existe na referida Universidade um grupo
multidisciplinar, mesmo sob qualquer outra denominação, para fazer o
acompanhamento pré-operatório das cirurgias de Transgenitalização. (grifo
nosso)
Às fls. 288/290, o Dr. Thadeu Brenny Filho
declarou que:
“o declarante é médico urologista e membro da Sociedade Brasileira de Urologia
desde o ano de 1986, pelo que lembra o ano de 1996 ou 1997 dá aulas, como
convidado no curso de Psicologia e na pós-graduação de Sexualidade Humana da
Universidade Tuiuti do Paraná e também por isso há uns 2 anos atrás passou a
fazer parte do Comitê de Identidade Sexual da Clínica de Sexologia da já
mencionada universidade”. (grifo nosso)
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Ouvida às fls. 291/292, a Drª Maria Eugênia
Sabóia Baggio declarou que:
“é médica com especialidade em Ginecologia e Obstetrícia além de sexologia;
afirma que não faz parte de um grupo de profissionais que atendem
pacientes na Universidade Tuiuti do Paraná, mas a pedido da psicóloga Regina
Teixeira atendeu e examinou quatro pessoas que haviam se submetido a cirurgias
de mudança de sexo; a declarante jamais teve qualquer contato com
interessados em cirurgia de mudança de sexo antes das intervenções e
somente conheceu quatro deles como já explicou, após as operações;...que
dessa forma taxativamente diz que não participa e nunca participou do Comitê
de Identidade Sexual da Universidade Tuiuti do Paraná e profissionalmente
não tem qualquer interesse em integrar esse grupo”. (grifos nossos)
Em declaração (fls. 305/307) prestada
nesta Promotoria de Justiça, na data de 10 de janeiro de 2001, A.C.M, VicePresidente do Instituto Paranaense 28 de junho - Conscientização e Direitos
Humanos, afirmou que tomou conhecimento do serviço prestado pela
Universidade Tuiuti e pela Dr.ª Regina Mara Teixeira, no que se refere à cirurgia
de Transgenitalização, através de reportagens jornalísticas, tendo tal programa
o intuito de realizar a cirurgia de Transgenitalização. Ao participar de tal
programa, costumava questionar a forma com a qual era conduzida a questão
envolvendo os transexuais, uma vez que o acompanhamento somente se dava
a nível psicoterápico, sabendo a declarante em função do conhecimento que
tem da questão, de que é necessário a avaliação com endocrinologista,
psiquiatra, dentre outros profissionais da área. Aduz ainda que, após a
intervenção do Ministério Público, soube que diversos procedimentos foram
cancelados; tendo-lhe sido atribuída tal responsabilidade, bem como tem
conhecimento que há, na data atual, o tratamento a cerca de 04 pacientes,
inclusive, do interior do estado, contudo, desconhece no que constitui esse
tratamento que ainda é mantido pela Sra. Regina. Segue que tais cirurgias
provavelmente estariam sendo realizadas em Londrina, PR. sob a
responsabilidade do Dr. Márcio Dantas de Menezes, em conjunto com as
requeridas. Que as informações podem ser obtidas inclusive, junto ao “site”
do referido médico, donde se vê que as consultas são cobradas e teria sido
informado que existe convênio com as Secretarias Estadual e Municipal de
Saúde, o que é uma inverdade.
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No curso do procedimento, foi ouvido o
cirurgião responsável pelas cirurgias realizadas, Dr. Jalma Jurado, através de
carta precatória, conforme fls. 226/227, sendo evidente que se trata de
profissional com ampla experiência em tais cirurgias, e que teria conhecido a
requerida Regina Mara Teixeira no Rio de Janeiro, RJ, daí tendo surgido o
convite para que o mesmo acompanhasse o tratamento de alguns casos de
disforia de gênero (transexualismo), tanto que veio até esta cidade nos dias 25 e
26 de setembro de 1999 e realizou as cirurgias.
Após manifestação desta agente de fls.
356/375, foram encaminhadas cópias dos autos ao Juizado Especial Criminal
através do ofício, conforme fls. 376, visando a solução da situação vivenciada
pelo paciente E.I., tendo se seguido o feito no aspecto cível.
Aqui incumbe esclarecer-se que o CRM-PR
foi participado da situação, conforme se vê do ofício de fls. 99, tanto que
instaurou Sindicância visando apurar as questões éticas envolvidas, conforme
informado aos 27 de julho de 2000, através do ofício de fls. 154, sendo que a
última informação de 30 de outubro de 2000 é de que a mesma estava em
instrução, conforme fls. 297. Ressalte-se que o CFM se pronunciou no sentido de
que os Conselhos Regionais deveriam exercer a fiscalização em suas áreas
jurisdicionadas (fls. 246).
Resumidamente, vale dizer que após
inúmeras e infrutíferas tentativas de tentar obter os nomes dos
profissionais que comporiam a citada “equipe multidisciplinar” da Srª Regina
Mara Teixeira, claro fica que a mesma inexiste, aliada ao fato de não
terem sido realizados os procedimentos cirúrgicos em hospital universitário
ou público, motivação mais que suficiente para a propositura desta ação civil
pública em defesa da coletividade de pacientes com desvios sexuais, antes
que mais pessoas sofram conseqüências funcionais e estéticas até mesmo
irreparáveis, com as cirurgias realizadas em desconformidade com as exigências
legais.
Os pacientes que buscam tal alternativa de
tratamento, sem dúvida estão fragilizados e descontentes com suas condições
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particulares e depositam todas as suas esperanças no atendimento que vem
sendo prestado pela Universidade Tuiuti do Paraná, através de sua Clínica de
Sexologia, cuja responsável é a Sra. Regina Mara Teixeira, já que aqui encontram
a possibilidade de virem a resolver aquilo que se entende como seus problemas,
não cabendo a eles por certo, duvidarem ou desacreditarem da falta de
estrutura e condição do atendimento que vem sendo feito.
Aqui, incumbia à instituição de ensino
através de seus membros ter iniciado sim, um programa que hoje conta com
respaldo médico-cientifíco, porém observando aos critérios elencados através da
Resolução do CFM, cujo resultado retratou ampla consulta e estudo, na qual se
visou resguardar a mínima segurança àqueles envolvidos. Ora, a Sra. Regina Mara
em declaração prestada junto a esta Promotoria de Justiça, entendeu por bem
em desconsiderar a exigência de um médico psiquiatra na equipe multidisciplinar,
alegando que o psicólogo supriria tal falta, conforme já citado, enquanto que a
Resolução previu tal necessidade pelo fato de que o paciente deve ser submetido
a uma averiguação de eventual psicopatologia, cujo diagnóstico por certo
incumbiria a um médico e não a um psicólogo firmar, conforme fls. 122.
Se está com a presente Ação Civil Pública
pretendendo conter os impulsos irresponsáveis e inconseqüentes que vem levando
a requerida Sra. Regina Mara Teixeira a não só encampar, como dar continuidade
a um programa de “acompanhamento” falho e que não atende aos preceitos
firmados, gerando uma expectativa nos pacientes inscritos e ainda, uma falta de
atendimento adequado e devido no pós-operatório, como é o caso do paciente
E.I..
Prova disso é que não existe qualquer
hospital público ou universitário que tenha concordado em abrigar em sua
estrutura a realização de tais cirurgias, tendo porém, as quatro realizadas sido
acolhidas em hospital privado, o que demonstrou igualmente uma irregularidade.
IV. O DIREITO À SAUDE NA CONSTITUIÇÃO E NA LEGlSLAÇÃO. A SUA
VIOLAÇÃO NA ESPÉCIE.
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A atual Constituição Federal e a Lei Orgânica de Saúde
consagraram a prevalência de determinados direitos fundamentais, dentre eles o
direito à vida e à saúde, que no caso concreto foram flagrantemente vulnerados.
A mera leitura dos dispositivos constitucionais que
seguem, em confronto com a hipótese dos autos, revela de pronto a lesão em
causa:
Art. 1.° A República Federativa do Brasil, (...),
constitui-se em Estado democrático de direito e tem
como fundamentos: II- a dignidade da pessoa humana;
Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o
trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do
Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e
de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.
Lei Orgânica da Saúde (Lei n° 8.080/90):
Art. 2°. A saúde é um direito fundamental do ser
humano, devendo o Estado prover as condições
indispensáveis ao seu pleno exercício.
§ 1°. O dever do Estado de garantir a saúde consiste na
formulação e execução de políticas econômicas e sociais
que visem à redução de riscos de doença e de outros
agravos e no estabelecimento de condições que
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assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos
serviços para a sua promoção, proteção e recuperação .
Portanto, a Constituição da República e a Lei Orgânica
da Saúde tutelam firmemente o direito do cidadão à saúde e impõe ao Estado o
dever de garanti-lo, reconhecendo ao usuário um direito público subjetivo que o
legitima a exigir esse acesso e assistência do Poder Público.
Ressalte-se, desde logo, que a aplicação destes
princípios legais, é imediata, não necessitando assim, de regulamentação.
Comentando o assunto, veja-se a doutrina de Sueli
Gandolfi Dallari:
"Isto significa que ninguém - legislador ou
administrador pode alegar a ausência de norma
regulamentadora para justificar a não aplicação
imediata da garantia do direito à saúde”.
Por outro lado, a saúde não é apenas uma
contraprestação de serviços devida pelo Estado ao cidadão, mas sim um direito
fundamental do ser humano, devendo, por isso mesmo, ser universal, igualitário e
integral, não se podendo prestar "meia-saúde", ou seja, fornecem-se algumas
prestações e negam-se outras, ou fornecem-se apenas aquilo que permitem os
recursos do momento.
E não é outro o entendimento que deflui do
conceito de direito à saúde, elaborado por Tupinambá Miguel Castro do
Nascimento:
“Todo ser humano, pelo simples fato de ter nascido com
vida, no momento do nascimento adquire o direito
subjetivo à sua saúde, direito que lhe acompanha até a
morte. E, como é direito exigível do Estado, no que
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concerne à sua proteção, trata-se de direito subjetivo
público,
estruturando-se
uma
relação
jurídica
específica entre cada ser humano e o Estado, em que
aquele é o credor e este, o devedor”.
O direito de acesso universal e igualitário aos serviços
de saúde, também está previsto na Constituição do Paraná em seu art. 167:
" A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que
visem a prevenção, redução e eliminação de doenças e
de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às
ações e serviços de saúde para a sua promoção,
proteção e recuperação." (grifo nosso)
Com tudo isto, diante do desrespeito ao
direitos mais comezinhos dessa coletividade que necessita de um tratamento
amplo de sua sexualidade, e que viu no programa da Universidade Tuiuti do
Paraná, se não a única, pelo menos, uma chance de pacificar seus enormes
conflitos internos, embora correndo o risco de ser mutilada física e
psicologicamente, é que se pleiteia a tutela jurisdicional no sentido de impedir a
continuação dessas experiências irregulares executadas pela Sra Regina Mara
Teixeira, através da Universidade Tuiuti do Paraná, junto ao Hospital Erasmo de
Roterdam ou em qualquer outro nosocômio deste Estado, efetivamente,
garantindo a saúde desta população.
Desta forma, o direito da coletividade aqui
assistida é incontestável, de berço constitucional, devidamente demonstrado na
sua existência e individualizado na sua extensão.
IV. DO PEDIDO LIMINAR.
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Para a concessão da liminar devem concorrer dois
requisitos legais, ou seja, o fumus boni iuris e o periculum in mora.
O fumus boni iuris é a existência e ocorrência do
direito substancial invocado por quem pretende a segurança, o que já foi
castamente demonstrado pelas razões de direito apresentadas.
O periculum in mora se configura em um dano potencial,
um risco que corre o processo principal de não ser útil ao interesse demonstrado
pela parte, e que, no caso em questão, se caracteriza pela gravidade e potencial
letalidade das conseqüências advindas da cirurgia de transgenitalização
desacompanhada dos requisitos exigidos pela classe médica nacional,
representada pelo Conselho Federal de Medicina, a exemplo do ocorrido com o
paciente E.I, que deu origem ao presente procedimento, que possivelmente
enfrentará problemas físicos e psicológicos pelo restante de sua vida, cuja
correção cirúrgica para o seu problema aliás, não está sendo assumida pelos seus
responsáveis, ou seja, a Sra. Regina Mara Teixeira e Dr. Jalma Jurado, gerando
um problema funcional com conseqüências sérias e desagradáveis. Aqui, observese que se o programa de acompanhamento e cirurgia tivesse se realizado dentro
do profissionalismo pertinente, o referido paciente não teria sido tratado com
tamanho descaso, o que lhe obrigou a recorrer ao Ministério Público, que está
tentando compor o problema através do Juizado Especial Criminal conforme
antes mencionado.
Logo, diante das conseqüências irreversíveis que podem
advir da execução irregular de cirurgias dessa natureza, com profundas
modificações de ordem anatômica, moral, psicológica e, mesmo, profissionais, é
que se pleiteia a concessão da liminar, no sentido de determinar a suspensão
do programa de tratamento de transexualismo da Universidade Tuiti do
Paraná e da Srª Regina Mara Teixeira, onde quer que se desenvolva no
Estado do Paraná, visando impedir o descumprimento da Resolução que disciplina
tais cirurgias, além da mutilação de mais pacientes que, em vista do desespero,
submetem-se em qualquer situação, sob qualquer risco, admitindo graus
crescentes de degradação, tentando livrar-se da incongruência em que vivem,
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cominando-se multa pelo atraso no cumprimento desta decisão liminar, nos
termos da Lei (art. 461, pár. 4º do CPC).
Citando a lição de Guido Ivan de Carvalho e Lenir
Santos:
“Em primeiro lugar a assistência integral combina, de
forma harmônica e igualitária, as ações e os serviços de
saúde preventivos com os assistenciais ou curativos.
(grifo nosso)
V. DO PEDIDO.
Isto posto, protestando-se pela produção de todas as
provas admitidas em direito, pleiteia-se:
a. a citação dos requeridos nos endereços mencionados,
para que, querendo, apresentem no prazo da lei a contestação que entenderem
pertinente;
b. o deferimento da tutela liminar, na forma e pelas
razões invocadas, observado o procedimento legal;
c. a cominação de multa diária, no valor de R$
10.000,00 (dez mil reais), pelo atraso na cessação das atividades em tela;
d. seja julgada procedente a ação nos termos do pedido
liminar retro gizado, ou seja, determine-se a proibição do tratamento de
transexualismo realizado pela Universidade Tuiuti do Paraná e pela Srª Regina
Teixeira, no Hospital Erasmo de Roterdam e em todo o Estado do Paraná, já que
a forma como o mesmo vem se desenvolvendo não atende ao contido na Resolução
do CFM e, portanto, acaba por gerar uma expectativa infundada nos pacientes
inscritos, cujo rol não se pode determinar em função da requerida não ter
atendido às reiteradas requisições deste órgão, o que ensejará a tomada das
providências pertinentes.
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Dá-se à causa, apenas para fins fiscais, o valor de R$
1.000,00 (mil reais).
Nestes Termos,
Pede Deferimento.
Curitiba, de 08 de maio de 2001.
MICHELE ROCIO MAIA ZARDO
Promotora de Justiça
TESTEMUNHAS:
1 - Jalma Jurado, cirurgião plástico, endereço comercial na rua Carlos Souza
Lima, nº 255, Jundiaí-SP;
2 - Edimo Iriguti, costureiro, endereço residencial na rua Professor Porto
Veloso, nº 106, Vila Guaíra, Curitiba-PR;
3 - Alexandre Caldas de Miranda (Maitê), endereço comercial na rua 13 de maio,
nº 1206/03, centro, Curitiba-PR;
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