1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA _ª VARA DA COMARCA DE SÃO MIGUEL DO OESTE/SC. “Qualquer que seja a modalidade de tutela adiantada, que o arsenal jurídico brasileiro contemple, terá ela em vista a realização de dois nortes fundamentais: a celeridade do processo e a efetividade (ou efetiva eficácia) da decisão judicial” (Sérgio Ferraz). O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por seu promotor de justiça em exercício neste juízo, no uso de suas atribuições institucionais, ora agindo na qualidade de Curador da Cidadania e dos Direitos Humanos, com fundamento nos artigos 127, “caput”, 196 e 230, “caput”, da Constituição Federal; artigo 25, inciso IV, alínea “a”, da Lei nº 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional dos Ministérios Públicos Estaduais); artigo 82, inciso VI, alínea “c”, da Lei Complementar Estadual nº 197/00 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Santa Catarina) e artigos 74, inciso I e 79, inciso I, da Lei nº 10.741/03, vem perante Vossa Excelência propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO LIMINAR em face do ESTADO DE SANTA CATARINA, pessoa jurídica de direito público interno, representado pelo excelentíssimo senhor Procurador-Geral do Estado, com endereço na rua Saldanha Marinho, nº 189, Florianópolis/SC, pelas seguintes razões fático-jurídicas: Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 2 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE DA COMPETÊNCIA A Lei nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) estabeleceu como critério para fixação da competência, em sede de ação civil pública, o foro do local onde ocorrer o dano (artigo 2º). O artigo 21 do mencionado diploma legal, por sua vez, determina que se aplicam na defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, os dispositivos do Título III da Lei n. 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor, que trata da defesa dos consumidores em juízo e estabelece, dentre outras diretrizes processuais, regras de definição da competência. Assim, da conjugação do artigo 2º da Lei de Ação Civil Pública com o artigo 93 do Código de Defesa do Consumidor, extrai-se que a competência para a propositura da presente ação se define, nos termos da legislação invocada, pelo local do dano ou possível evento lesivo. Destarte, cuidando-se no presente caso de dano à direito individual indisponível consistente na saúde e na própria vida da paciente BÁRBARA TERESINHA COSTA, residente neste município, a competência para o processo e julgamento da presente ação civil pública é mesmo desta comarca, onde o tratamento deverá ser prestado através do fornecimento da medicação de que necessita. DOS FATOS Chegou ao conhecimento deste órgão de execução, a partir de declarações prestadas nesta promotoria, que a idosa MARIA CATARINA COSTA, nascida no dia 19 de junho de 1922 (com 81 anos de idade), é portadora de demência do tipo Alzheimer (CID 10:G.30), e por isso necessita do Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 3 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE uso constante e ininterrupto de medicamentos excepcionais e de alto custo denominados Risperidona 1mg, Donepezil 10mg e Aeranz 5mg (Donepezil). Como a doença do tipo Alzheimer implica no comprometimento irreversível das funções mentais, o objetivo primordial do tratamento é aliviar os sintomas e gerar uma proteção contra os efeitos da deterioração dos tecidos cerebrais, no sentido de melhorar as condições de vida da pessoa que é portadora da demência e seus familiares. Denota-se através dos documentos anexos que a paciente MARIA CATARINA COSTA, há época em que residia no município de Porto Alegre/RS estava realizando o tratamento de sua doença naquele estado, onde recebia os medicamentos necessários para o controle da demência de Alzheimer. Ocorre que em razão da alteração de sua residência para este município, onde reside com sua filha Bárbara Teresinha Costa, os deslocamentos até Porto Alegre/RS passaram a ser extremamente desgastantes, sobretudo em decorrência da idade avançada da paciente. Em razão disso, sua filha resolveu solicitar o encaminhamento do processo de tratamento pelo SUS para este estado, quando foi informada por funcionários da Gerência de Saúde da 1ª Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional que um novo processo de solicitação de medicamentos deveria ser encaminhado, o que poderia demorar em torno de seis meses. Ocorre que a paciente Maria Catarina Costa é pessoa idosa e hipossuficiente, pois percebe mensalmente benefício previdenciário no valor de um salário mínimo mensal, não possuindo condições para arcar pelo Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 4 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE período mencionado com a compra dos medicamentos de que necessita para sobreviver, conforme declaração anexa. Diante de tal contexto, não resta outra alternativa senão a de buscar a tutela jurisdicional pretendida, com escopo de fazer valer os preceitos constitucionais e infraconstitucionais que amparam o cidadão idoso no que concerne ao seu indisponível direito à vida, à saúde e à dignidade. Estes, em resumo, são os fatos que envolvem a presente provocação jurisdicional. DA LEGITIMIDADE ATIVA Conforme preceito constitucional inscrito no artigo 127 da Constituição Federal, incumbe ao Ministério Público, enquanto Instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis: Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis [sem grifo no original]. Dentre suas funções institucionais, contempla-se a de promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, ex vi do artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. Como direitos indisponíveis por excelência que são, a saúde, a vida e a dignidade, objetos da presente provocação, não poderiam escapar o raio de abrangência da ação ministerial, ainda mais quando inerente Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 5 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE à pessoa econômica e tecnicamente hipossuficiente como no presente caso, no qual é admitida a provocação jurisdicional deste órgão de execução na qualidade de substituto processual. O artigo 74, inciso I, da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso), alinhando-se à simetria constitucionalmente estabelecida, dessa forma legitima o Ministério Público a intentar a ação civil pública para defesa de interesses interesses individuais indisponíveis, difusos ou coletivos relativos aos idosos, dentre os quais inegavelmente se inclui a saúde, porquanto traduz um interesse de toda a coletividade e um dever do Estado em assegurar aos idosos um desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência (artigo 15º da Lei nº 10.741/03). Da conjugação exegética desses diplomas legais (rectius: artigo 127 da Constituição Federal e artigo 74, inciso I, da Lei nº 10.741/03), pode-se seguramente afirmar que, na seara das relações que envolvem a proteção dos interesses dos idosos, é conferida ao Ministério Público a legitimidade para promover quaisquer espécies de ações pertinentes (artigo 82 do mencionado diploma legal), ainda que na defesa do interesse individual indisponível de uma única pessoa idosa, desde que, por certo, caracterizado pela indisponibilidade que limita sua destinação institucional. Por abordar com precisão e coerência, de bom alvitre trazerse à colação recente julgado do egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que ao tratar da legitimidade ministerial para a defesa direito individual indisponível, assim assentou: AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL – VIDA E SAÚDE – CF, ART. 127 – LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO – MEDICAMENTO DE ALTO CUSTO – FORNECIMENTO – OBRIGAÇÃO DO ESTADO Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 6 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE 1. O Ministério Público tem legitimidade ativa para desencadear ação civil pública com a finalidade de resguardar direito à vida e à saúde, mesmo que afeto a uma ou mais pessoas identificadas. Pleito dessa magnitude tem inegável reflexo social e deve se sobrepor às questões meramente processuais. 2. O Sistema Único de Saúde, por imperativo legal, deve incluir no seu campo de atuação a execução de ações direcionadas à assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica (Lei n. 8.080/90, art. 6º, inc. I, alínea “d”) (TJSC. Apelação Cível nº 2003.018892-4, de Balneário Camboriú. Rel. Desembargador Luiz Cézar Medeiros. Julgado em 10.11.2003). Irrefragável, destarte, a legitimação do Ministério Público, através de seu órgão de execução, para figurar no pólo ativo desta presente ação. DO DIREITO DO IDOSO E SUA DEFESA EM JUÍZO De acordo com o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03), para a “defesa dos direitos e interesses protegidos por esta Lei, são admissíveis todas as espécies de ações pertinentes” (artigo 82). Também se regem pelas disposições do mesmo diploma legal, “as ações de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados ao idoso, referentes à omissão ou ao oferecimento insatisfatório de acesso às ações e serviços de saúde” (artigo 79, inciso I), sendo certo a natureza exemplificativa do rol, não exclui a “proteção judicial de outros interesses difusos, coletivos, individuais indisponíveis ou homogêneos, próprios do idoso, protegido em lei” (parágrafo único). Ora, fazendo o Estatuto do Idoso remissão expressa ao não oferecimento de serviços de saúde como suporte fático necessário à provocação jurisdicional, a qual poderá ser perfectibilizada através de qualquer Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 7 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE espécie de ação pertinente, afiguram-se incontestes também a possibilidade jurídica do pedido e o interesse de agir manifestados através do presente instrumento processual, na forma adiante tratada. Com efeito, preceitua a Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso): Art. 2º O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade. Art. 3º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. E de modo mais específico, é no artigo 15 de mencionado diploma legal que resta delimitado explicitamente o direito ora perseguido: Art. 15. É assegurada a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde – SUS, garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos. § 1º A prevenção e a manutenção da saúde do idoso serão efetivadas por meio de: I – cadastramento da população idosa em base territorial; II – atendimento geriátrico e gerontológico em ambulatórios; III – unidades geriátricas de referência, com pessoal especializado nas áreas de geriatria e gerontologia social; IV – atendimento domiciliar, incluindo a internação, para a população que dele necessitar e esteja impossibilitada de se Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 8 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE locomover, inclusive para idosos abrigados e acolhidos por instituições públicas, filantrópicas ou sem fins lucrativos e eventualmente conveniadas com o Poder Público, nos meios urbano e rural; V – reabilitação orientada pela geriatria e gerontologia, para redução das seqüelas decorrentes do agravo da saúde. § 2º Incumbe ao Poder Público fornecer aos idosos, gratuitamente, medicamentos, especialmente os de uso continuado, assim como próteses, órteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação. § 3º É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade. § 4º Os idosos portadores de deficiência ou com limitação incapacitante terão atendimento especializado, nos termos da lei [sem grifo no original] Assim, como direito fundamental que é, cumpre ao Estado de Santa Catarina, enquanto gestor primário das ações e serviços na área da saúde, o fornecimento de medicamentos a pessoas hipossuficientes de que dele necessitem, mormente nos casos afetos à população idosa, que goza de prioridade absoluta de preferência no atendimento (artigo 3º da Lei nº 10.741/03). De acordo com o que já decidiu o conspícuo Supremo Tribunal Federal, o “direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida”, pois o “Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional” (STF. RE nº 271286 AgR/RS. Segunda Turma. Rel. Ministro Celso de Mello. DJU 24.11.2000, pág. 101). Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 9 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE Razão por que, ainda de acordo com a mesma decisão, “a essencialidade do direito à saúde fez que o legislador qualificasse, como prestações de relevância pública, as ações e serviços de saúde (CF, art. 197), em ordem a legitimar a atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário naquelas hipóteses em que os órgãos estatais, anomalamente, deixassem de respeitar o mandamento constitucional, frustrando-lhe, arbitrariamente, a eficácia jurídico-social, seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra inaceitável modalidade de comportamento governamental desviante”. Constituindo-se a saúde e a vida direitos fundamentais de primeira grandeza perante a ordem jurídico-constitucional, sua garantia pelo Estado constitui-se num verdadeiro direito líquido e certo de todos os idosos, que devem receber, com absoluta prioridade, a proteção integral que lhes é conferida em virtude de suas peculiares condições de pessoas em envelhecimento. Assim, estando devidamente comprovado que idosa Maria Catarina Costa não vem recebendo os medicamentos de que necessita para sua sobrevivência, somente resta a condenação do Estado de Santa Catarina na obrigação de fazer valer de forma efetiva o direito materialmente consagrado à saúde, através do fornecimento do medicamento que lhe é indispensável. DA CONDENAÇÃO DO REQUERIDO EM OBRIGAÇÃO DE FAZER Havendo lei que assegura com absoluta prioridade a efetiva garantia da saúde da paciente, deve o Estado “prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício” (artigo 2º da Lei nº 8.080/90). Assim sendo, e para que se concretize a eficácia do resultado final pretendido, que é justamente o de providenciar a prestação Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 10 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE contínua e ininterrupta, incondicional e na quantia exigida dos medicamentos Risperidona 1mg, Donepezil 10 mg e Aeranz 5mg (Donepezil), perfaz-se imprescindível a condenação do ESTADO DE SANTA CATARINA em obrigação de fazer, consistente na entrega, à idosa Maria Catarina Costa, da aludida medicação na forma de prestações de trato sucessivo. De acordo com o artigo 3º da Lei nº 7.347/85: Art. 3º. A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer. Logo, estando devidamente evidenciado que o Estado de Santa Catarina não vem cumprindo satisfatoriamente com sua inescusável obrigação de assistência prioritária à saúde da idosa MARIA CATARINA COSTA, cabe ao Poder Judiciário determinar o restabelecimento imediato de seu lídimo direito à manutenção da sua qualidade de vida, hoje em risco por omissão intolerável do requerido. De outro lado, uma vez admitida a condenação do estado em obrigação de não fazer, cumpre a essa autoridade a cominação de multa diária, nos termos do que dispõe o artigo 11 da Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85) e o artigo 84, §4º, do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), pois de acordo com o Superior Tribunal de Justiça, a “ determinação legal contida no artigo 11, da Lei 7.347/85, tem o objetivo imanente de fazer valer a obrigação, uma vez que retirada da mensagem legal a imposição de pena, é consectário lógico a mitigação da ordem, à míngua de punição ante seu descumprimento” (RESP nº 205153/GO. DJU 21.08.2000, p. 98. RSTJ 139/55) DO FORNECIMENTO IMEDIATO DO MEDICAMENTO INAUDITA ALTERA PARTE Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 11 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE Verificada a plausibilidade do direito material invocado na forma acima mencionada (direito da substituída processual em receber prioritariamente a medicação de que depende sua sobrevivência) assim como o perigo de dano decorrente da situação de risco provocada pela paralisação da ingestão contínua e ininterrupta dos medicamentos Risperidona 1mg, Donepezil 10 mg e Aeranz 5mg (Donepezil) (agravamento da doença), da mesma forma se mostra necessário o deferimento da medida acauteladora de fornecimento liminar e imediato, inaudita altera pars, do medicamento Risperidona 1mg, Donepezil 10 mg e Aeranz 5mg (Donepezil), incondicionalmente e na quantia exigida, na forma do artigo 12, “caput”, da Lei nº 7.347/85 c/c artigo 798 do Código de Processo Civil. De acordo com José dos Santos Carvalho Filho, ao comentar o dispositivo da Lei da Ação Civil Pública: O art. 12 da lei faculta ao juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo. É imprópria a expressão mandado liminar. O que o juiz concede, na verdade, é a medida liminar, vale dizer, a providência in limine litis que objetiva impedir ou paralisar a conduta ofensiva aos interesses tutelados. Mandado é mero instrumento de documentação processual, já que comprova a existência de ato judicial, no caso o que concedeu a medida liminar... A liminar é medida de natureza acautelatória e consubstancia a função preventiva do processo, como bem define Alfredo Buzaid. Se bem analisarmos a expressão, não será difícil perceber que a medida liminar só indica que a providência judicial está sendo concedida de plano, normalmente sem audiência da outra parte. Não explica, contudo, seu conteúdo ou seu objetivo. É este, no entanto, que vai caracterizar sua natureza jurídica como sendo medida cautelar, exatamente porque visa acautelar direitos e resguardá-los contra eventual demora na solução do processo. (...) Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 12 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE Na ação civil pública também pode ser concedido mandado liminar. Embora as medidas cautelares guardem mais adequação com a ação cautelar, a doutrina tem entendido que normas processuais prevêem, algumas vezes, esse tipo de providência em diversas ações. É o chamado poder geral de cautela conferido ao juiz pelo artigo 798 do Código de Processo Civil, que autoriza a expedição de medidas provisórias quando julgadas necessárias em determinadas situações fáticas. Como bem anota Humberto Theodoro Júnior, “tais providências que carecem da qualidade de processo e ação, apresentam-se essencialmente como acessórias do processo principal”, motivo por que “não devem sequer ensejar autuação apartada ou em apenso”... O que é importante, é que se façam presentes os pressupostos da medida – o risco de lesão irreparável em vista da eventual demora e a plausibilidade do direito. Desse modo, o autor da ação civil pública, vislumbrando situação de risco aos interesses difusos ou coletivos a serem protegidos, pode requer ao juiz, antes mesmo de formular o pedido na ação, a concessão de medida liminar, a exemplo, aliás, do que ocorre naturalmente em outros procedimentos especiais, como o mandado de segurança e a ação popular (“Ação Civil Pública – Comentários por Artigo”. Editora Lumen Juris. 3ª edição. p. 334/335). De mais a mais, a acessoriedade que qualifica a medida liminar em comento encontra fundamento na jurisprudência, segundo a qual não “há necessidade de ajuizar-se ação cautelar, antecedente de ação principal, para pleitear a liminar, como evidente desperdício de tempo e atividade jurisdicional”, pois o “pedido de concessão de liminar pode ser cumulado na petição inicial de ACP de conhecimento, cautelar ou de execução” (RJTJSP 113/312). Acerca da impossibilidade de liminar contra a Fazenda Pública (e também liminar satisfativa), mister uma primeira consideração de que não se pretende, no presente caso, com a presente providência acauteladora, o exaurimento do objeto da presente ação, porquanto este é caracterizado, como afirmado, por uma prestação de trato sucessivo (obrigação do requerido prestar, de forma contínua e ininterrupta, na quantia exigida, medicamento excepcional e de alto custo), que não se confunde com a tutela Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 13 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE liminar que virá a resguardar eventual situação de risco (em última análise o falecimento da idosa) até final julgamento da lide. Em segundo lugar, cumpre asseverar que é consabido que o poder geral de cautela do magistrado deve sempre ser compreendido com amplitude compatível com a sua finalidade primeira, que é a de assegurar a correspondente eficácia da função jurisdicional; por tal razão, no enfrentamento do conflito entre a eficácia da tutela jurisdicional da vida e as limitações legais desse poder inerente à atividade judicante, há de prevalecer sempre aquela, sem a qual despicienda se tornaria o sistema de garantias constitucionais, frente ao espezinhamento jurisdicional do sagrado direito à vida, maior legado de um Estado Democrático de Direito. Por essa razão lógica e humanitária tem a jurisprudência relativizado a vedação de concessão de medidas liminares contra atos do poder público sem a prévia ouvida do representante jurídico da pessoa interessada em casos como o presente, a exemplo do que transcreve-se algumas decisões: PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE DEFERIU LIMINAR EM AÇÃO CAUTELAR – CARÁTER SATISFATIVO – EXCEPCIONALIDADE – VIOLAÇÃO À LEI FEDERAL NÃO CONFIGURADA – FORNECIMENTO PERIÓDICO E CONTINUADO DE MEDICAMENTO (ACETATO DE DESMOPRESSINA) – DIABETE INSÍPIDA – SITUAÇÃO EMERGENCIAL – DIREITO À VIDA – DIVERVÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA – LEI Nº 8.038/90 E RISTJ, ART. 255 E PARÁGRAFOS – PRECEDENTES. É vedada a concessão de liminar contra atos do poder público, em ação cautelar, que esgote, no todo ou em parte, o objeto da ação. Na hipótese, a prestação cautelar liminar não tem o caráter satisfativo, por isso que o fornecimento do medicamento é periódico e continuado; caso em que estaria sendo negado direito indisponível e absoluto à vida, já que sem o medicamento a recorrida não sobreviveria. Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 14 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE Interpretação restrita do art. 1º, §§ 1º e 3º da Lei nº 8.437/92. Divergência jurisprudencial que desatende às determinações legais e regimentais para demonstração do dissídio pretoriano. Recurso não conhecido (STJ. REsp. nº 93658/RS. 2ª Turma. Rel. Min. Francisco Peçanha Martins. DJU 23.08.1999, pág. 91). Ou então: MEDICAMENTO - CERIDASE - FORNECIMENTO - LIMINAR SATISFATIVA - DIREITO A VIDA. E VEDADA A CONCESSÃO DE LIMINAR CONTRA ATOS DO PODER PUBLICO, NO PROCEDIMENTO CAUTELAR, QUE ESGOTE, NO TODO OU EM PARTE, O OBJETO DA AÇÃO. NESTE CASO, ENTRETANTO, O QUE ESTARIA SENDO NEGADO SERIA O DIREITO A VIDA, POIS SEM O MEDICAMENTO O RECORRIDO NÃO SOBREVIVERIA. RECURSO IMPROVIDO (STJ. RSTJ 106/109). E ainda: A PROIBIÇÃO DO DEFERIMENTO DE MEDIDA LIMINAR QUE ESGOTE O OBJETO DO PROCESSO SÓ SUBSISTE ENQUANTO O RETARDAMENTO NÃO FRUSTRAR A TUTELA JUDICIAL, QUE É GARANTIA CONSTITUCIONAL (STJ. ROMS nº 6063/RS. 2ª Turma. Rel. Ministro Ari Pargendler. LEXSTJ 105/86). Considere-se, ainda, que em reiteradas manifestações decidiu o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina que as “restrições legais ao poder cautelar do Juiz, dentre as quais sobreleva a vedação de liminares contra atos do Poder Público (art. 1o da Lei n. 8.437/92), consoante orientação do STF (RTJ – 132/571), devem ser interpretadas mediante um controle de razoabilidade da proibição imposta, a ser efetuado em cada caso concreto” evitando-se assim um “abuso das limitações e a conseqüente afronta à plenitude da jurisdição do Poder Judiciário” (Agravo de Instrumento nº 97.001945-9, da Capital. Rel. Desembargador Eder Graf). Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 15 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE Frente a essas considerações, afigura-se perfeitamente admissível a concessão da medida liminar pretendida, initio litis e inaudita altera pars, assegurando-se, destarte, a eficácia do provimento final pretendido. Uma vez deferida a medida liminar de fornecimento imediato dos medicamentos Risperidona 1mg, Donepezil 10 mg e Aeranz 5mg (Donepezil), na forma aludida, a fim de garantir sua regular eficácia, impõe-se a fixação de multa diária (astreinte) em caso de descumprimento, nos termos do artigo 12, §2º, da Lei nº 7.347/85. DOS REQUERIMENTOS Em face do exposto, REQUER-SE: 1. que seja concedida, initio litis e inaudita altera pars, sem justificação prévia, a medida liminar de fornecimento imediato dos medicamentos Risperidona 1mg, Donepezil 10 mg e Aeranz 5mg (Donepezil), incondicionalmente e na quantia exigida, até final julgamento da lide, à idosa Maria Catarina Costa, no seu endereço residencial (Rua Teresinha Gaio Basso, 219, bairro Progresso, nesta cidade e Comarca) ; 1.1 – A fim de garantir o cumprimento da medida liminar, com fundamento no artigo 12, §2º da Lei nº 7.347/85, requer seja fixada multa diária equivalente a 1000 (mil) UFIR’s, em caso de descumprimento. Cumprida a medida liminar, REQUER-SE: 1. a citação do ESTADO DE SANTA CATARINA, na pessoa de seu Procurador-Geral (artigo 12, inciso I, do CPC), no endereço preambularmente declinado, para que, Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 16 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE querendo, conteste a presente ação, sendo alertado desde já sobre os efeitos da revelia (artigo 215 e 319 do CPC); 2. intimação pessoal deste órgão do Ministério Público de todos os atos processuais, na forma que dispõe o artigo 236, § 2º, do CPC e artigo 41, inciso IV, da Lei 8625/93; 3. a produção, se necessária, de todas as espécies de provas admitidas documentais, em periciais direito, e em especial testemunhais as (testemunha adiante arrolada), além de outras por ventura necessárias (artigo 332 e 407 do CPC); A procedência do pedido, com a confirmação da medida liminar deferida, para o fim de: 1. condenar-se o ESTADO DE SANTA CATARINA em obrigação de fazer, consistente na prestação contínua e ininterrupta, incondicional e na quantia exigida, dos medicamentos Risperidona 1mg, Donepezil 10 mg e Aeranz 5mg (Donepezil), à idosa MARIA CATARINA COSTA no endereço já indicado (prestação periódica de trato sucessivo). E ainda: a) nos termos do artigo 11 da Lei nº 7.347/85, a cominação de multa diária consistente em 1000 (mil) UFIR’s, para pagamento em caso de descumprimento da sentença final, além das perdas e danos eventualmente verificados (artigo 1056 do CC); Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA 17 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO OESTE Requer-se, por fim, a isenção de custas, emolumentos e outros encargos, conforme artigo 18 da Lei nº 7.347/85, atribuindo à causa, para todos os efeitos, o valor de R$100,00 (cem reais). São Miguel do Oeste, 7 de junho de 2004. Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA ROL DE TESTEMUNHAS: BÁRBARA TERESINHA COSTA (residente e domiciliada na rua Teresinha Gaio Basso, 219, bairro Progresso, nesta cidade e Comarca). Fernando da Silva Comin PROMOTOR DE JUSTIÇA