UMA ODISSÉIA DE PROFESSORAS EM BUSCA DO APERFEIÇOAMENTO Marilac Luzia de Souza L. S. Nogueira Lígia Maria de Oliveira Regino Benedita Branco da Silva Alves Eudócia Maria Amaral de Paula Ana Maria dos Santos Jorge Megid Neto Maria Inês de Freitas P. S. Rosa Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE-SP) Secretaria de Educação do Município de Campinas (SME-Campinas) Faculdade de Educação da UNICAMP (FE-Unicamp) Esse foi e está sendo um momento único nas nossas vidas, pois o que mais queríamos era ter a oportunidade de estarmos dentro da universidade participando e desenvolvendo-nos, fazendo parte integrante da vida acadêmica com toda a nossa prática, na tentativa de alguma forma dar uma melhor contribuição aos nossos alunos. Com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB 9394/96 fazendo parte de nossas vidas profissionais, independentemente das críticas de que é passível, surgem maiores possibilidades de aperfeiçoamento dentro das Universidades, dentre as quais a criação deste grupo. E foi com momentos de encontros, desencontros, de desânimo e certezas que começamos uma odisséia a procura do nosso espaço como profissionais, mulheres, mães, enfim, à procura de nós mesmas. Esse caminhar teve início com a formação de um grupo de estudos, a partir de um curso de extensão de 30 horas-aula, desenvolvido no âmbito da disciplina “Prática do Ensino de Ciências e Estágio Supervisionado” do Curso de Biologia, período noturno, da Faculdade de Educação da UNICAMP, no ano de 2000. O curso de extensão consistia na realização, com professoras da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental, dos mesmos mini-projetos de ensino desenvolvidos e aplicados pelos alunos-estagiários a alunos de 5a a 8a séries do ensino fundamental. Dado o interesse de algumas professoras de após o curso prosseguir com os encontros, foi constituído um grupo que passou a se reunir em média duas vezes ao mês, geralmente aos sábados. Inicialmente houve muitas oscilações no que se refere ao número de pessoas que constituía o grupo. Hoje, ele mantém um número fixo de cinco professoras de Educação Infantil e Ensino Fundamental que se reúnem para refletir as práticas pedagógicas do ensino de Ciências. Em face de nossas discussões nos primeiros encontros, foi-nos pedido para comentar como era o planejamento anual da escola e o nosso planejamento em sala de aula. Juntamente com a reflexão sobre nossos planejamentos escolares, registramos o nosso dia a dia pessoal e profissional ao longo de uma semana, passando a refletir sob essa perspectiva. Nesse momento tivemos algumas tarefas simultâneas solicitadas pelo nosso professor orientador, como a leitura de BIZZO (1998), para nossa qualificação e assim podermos discutir um pouco sobre o ensino de Ciências e sobre nossas práticas. Nos detivemos mais sobre o capítulo dois, onde são comentadas as antigas representações que se tem no ensino de Ciências. O autor comenta o mito que ainda vem sendo passado de geração em geração sobre o que se entende por ensino forte ou fraco de Ciências nas escolas. Para pessoas não muito atentas às necessidades do indivíduo e ainda apegadas à visão tradicionalista da Ciência, enquanto verdade única e inquestionável, incorre-se no erro de oferecer aos alunos apenas conteúdos prontos sem que os mesmos tenham significação para suas próprias vidas. Como o próprio autor salienta "... toda e qualquer terminologia técnica deve ser abandonada. Ela tem sentido e deve ser valorizada, mas através de objetos muito claros, que desenvolvam capacidade de compreensão do aluno, além da simples memorização de nomes complicados" (BIZZO,1998 p.30) Não só na busca de aperfeiçoamento no ensino de Ciências este grupo encontrou espaço, mas também para pensar como nos constituímos professoras, ficando claro o quanto nossa vida pessoal está ligada à profissional . Novos questionamentos surgiram. Como se constitui um professor? Como um professor se forma ao longo do tempo? Quais as determinações desse professor, tanto do ponto de vista pedagógico como também fora da escola? Que aspectos/elementos determinam a pessoa, constituindo o ser humano como profissional? Nesse momento, tomamos consciência da necessidade de administrarmos o nosso dia a dia voltando nosso olhar para a sistematização dessas reflexões, de ampliar nossos conhecimentos e definir nossas metas. No consenso, definimos objetivos os quais originaram-se das nossas dificuldades, podendo ser apresentados da seguinte forma: dar continuidade a um processo de formação continuada iniciado no segundo semestre do ano de 2000; aprofundar e refletir sobre fundamentos do ensino de Ciências, enquanto espaço de investigação desenvolvida pelos participantes; estabelecer um programa de pesquisa mais extenso no tempo e que envolvesse mudanças na prática pedagógica dos professores, de forma articulada com a produção acadêmica na área. A partir daí nos demos conta da quantidade de experiências por nós vivenciadas. Decidimos estar gravando nossas reuniões, pois só assim não perderíamos os momentos tão deliciosamente e tão dolorosamente vividos por todas, de onde tiramos boas risadas como também ficamos emocionadas em relembrar nossas vidas. Neste momento, uma nova leitura foi-nos sugerida, a do livro de Fontana (2000) como elemento de suporte para nossa reflexão profissional e o processo de formação continuada que vínhamos vivenciando. Essa leitura mais uma vez nos leva ao encontro da identificação pessoal e profissional, agora com o grupo de professoras coordenado por Fontana, num entrelaçamento de vidas, sonhos e aspirações. Durante e após a leitura, sistematizamos nossas reflexões, através de relatos gravados sobre nossos prazeres e angústias na docência, e mais uma vez encontramos vários pontos em comum. Essas fitas de áudio estão sendo transcritas por duas participantes do grupo, de forma relativamente lenta em razão do grande número de compromissos que acumulam e também do demorado processo de transcrição de fitas. Percebemos o quão estamos sozinhas em nossas salas de aula, que a teimosia, a vontade, o profissionalismo e o carinho pelo que fazemos é imenso. São nossos alunos que nos preenchem inúmeras vezes o vazio pela falta de estrutura e, por eles, superamos nossos limites. Um outro ponto comum é a necessidade de estarmos na busca de acrescer conhecimento, refletindo sobre a nossa prática nas turbulências do dia a dia da sala de aula, enfim, renovar. Chegar até aí foi-nos muito difícil. Introduzir uma ou mais situações novas, onde os conflitos aumentam, quebrando condutas, desmitificando conceitos já organizados, onde somos mulheres, mães, esposas, divididas muitas vezes em abraçar a família ou dar-nos o direito da nossa satisfação profissional. Esse caminhar já havia se estendido por boa parte de 2001 e estávamos próximos do final do ano letivo. O grupo sentia-se mais forte; ia tomando forma reunindo-se semanalmente, no espaço do grupo de pesquisa FORMAR - Ciências da Faculdade de Educação da Unicamp, para discutir e refletir a própria prática pedagógica em sala de aula, vinculada ao ensino de Ciências Naturais, sob a coordenação dos professores orientadores, objetivando a articulação do conhecimento acadêmico com a prática pedagógica de ensino da Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental. Em decorrência, surge o nome e o símbolo do nosso grupo de estudo - CONPPEC (Construção de Novas Práticas Pedagógicas no Ensino de Ciências). Iniciamos no segundo semestre de 2001 um trabalho de pesquisa realizado em sala de aula, utilizando o tema Natal, e propondo uma abordagem de Ciências com enfoque interdisciplinar. Buscamos também no trabalho valorizar os aspectos sócio culturais trazidos pelos alunos, bem como se intenciona à ampliação desses conhecimentos proporcionando um movimento contínuo de reflexão e redimensionamento de conceitos dos alunos, como também abrindo espaço para que essa dinâmica ocorra na própria ação do professor ao ensinar Ciências. Esse trabalho sobre o tema Natal está sendo apresentado em outra sessão de comunicação deste COLE. No semestre passado o grupo participou da disciplina FE 190 - Pesquisa e Metodologia em Educação em Ciências, do Programa de Pós Graduação da Faculdade de Educação da Unicamp, como proposta de ampliação de conhecimento dos integrantes em relação a metodologia de pesquisa científica, coerência de procedimentos metodológicos adotados em trabalhos científicos, análise de documentos deste caráter, além de discussões mais gerais sobre os objetivos, finalidades e compromisso social da pesquisa acadêmica. Esse estudo ofereceu mais uma oportunidade de conhecimento e também aprendizagem para a realização de futuros trabalhos que necessitem de rigor científico. Foi uma grandiosa oportunidade de aprofundamento de nosso conhecimento na área acadêmica. Não há como negar diante de todo esse processo a contribuição destes encontros como referencial reflexivo, proporcionando parâmetros de auto-avaliação, contribuindo para nossa formação na área de Ciências Naturais, como também nos instrumentalizando para a realização de um trabalho de melhor qualidade com nossos alunos. Torna-se notória a necessidade da articulação universidade - escola no propósito da reflexão sobre o processo educativo e na busca contínua pelo seu aprimoramento. O grupo está bastante satisfeito no sentido de conseguir rever a própria prática, e pretende continuar realizando estudos e pesquisas que ultrapassem o limite individual, oferecendo contribuições ao ensino de Ciências surgidas dessa parceria academia/escola para outros professores da Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental. Ao mesmo tempo essa experiência alinha-se a uma das perspectivas de interação universidade-escola da educação básica, visando a formação contínua de todos os integrantes do grupo, envolvidos em processos de pesquisa-ação colaborativa. Na continuidade, pretendemos retomar o trabalho sobre o Natal, agora com novos olhares, além de iniciar o planejamento de uma ação mais prolongada em nossas aulas, tomando todo um ano letivo e investindo na perspectiva de realizar trabalhos de natureza interdisciplinar. BIBLIOGRAFIA BIZZO, Nélio. Ciências fácil ou difícil? São Paulo : Ática, 1998. FONTANA, Roseli A. Cação. Como nos tornamos professoras. Belo Horizonte : Autêntica, 2000. ROSA, Maria Inês F. P. S. A pesquisa educativa no contexto da formação continuada de professores de ciências. Campinas : Faculdade de Educação da UNICAMP, 2000. (Tese de Doutorado).