A CIÊNCIA NEURAL COGNITIVA SE APÓIA EM CINCO ABORDAGENS PRINCIPAIS. A ciência neural cognitiva emergiu a partir de cinco principais desenvolvimentos técnicos e conceituais. 1. nas décadas de 60 e 70 foram desenvolvidas técnicas para examinar a atividade de células isoladas nos cérebros de primatas intactos e ativos, tornando possível estudar processos perceptuais e motores ao nível celular enquanto os animais estavam engajados em comportamentos típicos. 2. estudos celulares levaram ao achados de que mesmo processos cognitivos complexo, como a atenção e a tomada de decisões, estão correlacionados com o padrão das descargas de células individuais em regiões específicas do cérebro. Isto mudou a maneira pela qual o comportamento é estudado tanto em animais experimentais quanto em seres humanos, de modo que o foco atualmente não é sobre como um estímulo provoca uma resposta, mas sobre como se chega a uma resposta _ sobre o processamento da informação. 3. os desenvolvimentos da neurobiologia dos sistemas e da psicologia cognitiva estimularam um interesse renovado da neurologia comportamental. Já que a base neural da cognição começa com operações locais no cérebro, aprendeu – se muito com o estudo de lesões corticais. Muitos pacientes com lesões em regiões específica do cérebro exibem déficits cognitivos bastante específicos. Esses estudos indicam que dentro de qualquer sistema cognitivo há muitos módulos independentes de processamento de informações. O sistema visual, por exemplo, tem vias especializadas para o processamento de informações acerca da cor, forma e movimento. 4. desenvolvimento das técnicas de imagem_ a tomografia por emissão de pósitrons (PET), a imagem por ressonância magnética (MRI), a magneotoencefalografia, e as colorações sensíveis à voltagem _ tornaram possível relacionar alterações da atividade em populações de neurônios com processos mentais específicos no cérebro humano vivo. 5. a ciência da computação fez duas contribuições distintas à ciência neural cognitiva de grande populações de neurônios e começar a testar idéias específicas sobre funções cerebrais complexas. Sistemas complexos de neurônios, como os que medeiam a percepção e a ação, requerem que se compreenda não apenas as propriedades celulares mas também os circuitos dos sistemas. Os processos cognitivos são análogos aos programas dos Neurofisiologia aula 7 1 computadores (processamento, transformação, armazenamento e recuperação de informações). O CÉREBRO TEM UMA REPRESENTAÇÃO ORDENADA DO ESPAÇO PESSOAL O tato e a propriocepção são duas modalidades sensórias conduzidas pelo sistema sensorial somático. O tato é o sentido da textura dos objetos e o seu movimento sobre a pele. A propriocepção é o sentido da posição estática e do movimento de nossos dedos e membros. O tato e a propriocepção nos tornam capazes de sentir o tamanho e a forma de objetos colocados na mão. O sistema sensorial somático também está implicado com a nocicepção (dor) e o sentido da temperatura (calor e frio), mas não consideraremos estas modalidades aqui. O sistema sensorial somático contém primariamente neurônios receptores, localizados na pele e em outros tecidos do corpo, que transformam a energia dos estímulos em eventos neurais. O sentido do tato é mais discriminativo nas pontas dos dedos. Os receptores do tato nos dedos mandam informações sobre a textura dos objetos para o cérebro de modo que podemos ler braille ou tocar um instrumento musical. Receptores nos músculos e articulações dos dedos mandam informações acerca das angulações das articulações dos dedos, que são importantes para o reconhecimento do tamanho e da forma dos objetos apreendidos. No sistema sensorial somático há apenas três retransmissões sinápticas entre os neurônios sensoriais e o córtex cerebral. A primeira é feita pelos prolongamentos centrais das células ganglionares da raiz dorsal para os neurônios nos núcleos grácil e cuneado do bulbo. Em seguida, os axônios desses neurônios bulbares cruzam a linha média e ascendem para o núcleo posterior ventral do tálamo. Finalmente, os neurônios talâmicos mandam axônios para uma região do lobo parietal anterior chamada de córtex sensorial somático primário, ou S-1. A remoção de S-1 produz déficits na propriocepção e na capacidade de discriminar o tamanho, textura e forma de objetos. O sistema sensorial somático e cada um dos outros sistemas sensoriais estão organizados em série mas também incluem vários componentes que operam em paralelo. As respostas evocadas foram usadas mais tarde por Marshall, Clinton Woolsey e Philip Bard para mapear a representação da superfície do corpo no giro pós – central em macacos. Neurofisiologia aula 7 2 Penfield construiu um mapa da representação neural do corpo no córtex sensorial somático. MAPAS CORTICAIS CONFIÁVEIS DO CORPO SÃO A BASE DA EXTIDÃO DO EXAME NEUROLÓGICO CLÍNICO Os distúrbios dentro do sistema sensorial somático podem ser localizados clinicamente com notável exatidão porque há uma relação direta entre a organização anatômica do cérebro e funções perceptuais e motoras específicas. exemplo: crise jacksoniana, um ataque de epilepsia sensorial característico descrito pelo neurologista John Hughlings Jackson. No início ocorre dormência e parestesia (sensação inapropriadas como queimação ou alfinetadas) as quais começam num local e se espalham por todo o corpo. Por exemplo, a dormência pode começar nas pontas dos dedos, se espalhar para a mão, subir pelo braço, atravessar o ombro, ir para o dorso, e descer pela perna do mesmo lado. A extensão ordenada da crise _ começando lateralmente na área da mão e se propagando em direção à linha média _ é explicada pela disposição das projeções sensoriais no cérebro. O CÓRTEX TEM UM MAPA DO CORPO PARA CADA SUBMODALIDADE DE SENSAÇÃO o uso de microeletródios revelou não apenas um mas quatro mapas bastante completos no córtex sensorial somático primário (S-!), em cada uma das quatro áreas de Brodmann: as áreas 3 a, 3 b, 1 e 2. Cada uma dessas áreas representa características diferentes do tato e da informação proprioceptiva. As informações sensoriais a partir dos músculos e das articulações, importantes para propriocepcão dos membros, se projetam para área 3 a, e as informações a partir da pele, importantes para o tato, para a área 3 b. As informações sensoriais da pele são adicionalmente processadas na área 1 e combinadas com informações dos músculos e articulações na área 2. Isto explica por que uma pequena lesão discreta na área 1 prejudica a discriminação tátil, enquanto uma pequena lesão na área 2 prejudica a capacidade de reconhecer a forma e o tamanho de um objeto na mão. Das quatro representações corporais no córtex sensorial somático primário as das Neurofisiologia aula 7 3 áreas 3 a e 3 b são elementares, enquanto as das áreas 1 e 2 são complexas porque representam a elaboração das informações sensoriais. Nos mapas somatossensoriais de Brodmann áreas 3b e 1 são paralelas uma à outra e correspondentes em sua representação medial a lateral da superfície do corpo. Isto explica por que os primeiro estudos, que exploravam uma área limitada do giro pós – central e usavam técnicas de resolução precária, concluíram que havia apenas uma grande representação da superfície do corpo no córtex. S-1 projeta para outras áreas do lobo parietal. Por exemplo, S-1 projeta para as áreas sensoriais somáticas secundárias, onde as entradas somatossensoriais são usadas para o aprendizado de novas discriminações sensoriais, e para o córtex parietal posterior, onde as informações somáticas são usadas para configurar a imagem corporal e para o planejamento de movimentos no espaço extrapessoal. A REPRESENTAÇÃO INTERNA DO ESPAÇO PESSOA; PODE SER ESTUDADA AO NÍVEL CELULAR: CADA NEURÔNIO CENTRAL TEM UM CAMPO RECEPTIVO ESPECÍFICO Cada ponto da pele é monitorizada por uma população de células em vez de por uma única célula porque os campos receptivos se superpõem. Quando um ponto da pele é tocada, a população de neurônios corticais cujos campos receptivos incluem aquele sítio é excitada. A estimulação de um outro ponto na pele ativa uma outra população de neurônios corticais. Assim, percebemos que um ponto determinado da pele está estimulado porque uma população específica de neurônios no cérebro é ativada. Inversamente, como Penfield ilustrou, quando um ponto sobre o córtex é estimulada eletricamente, experimentamos sensações táteis sobre uma parte específica da pele. O ESPAÇO REAL, BEM COMO O IMAGINADO OU LEMBRADO, É REPRESENTADO NAS ÁREAS DE ASSOCIAÇÃO PARIETAIS POSTERIORES Até aqui consideramos a função das áreas sensoriais somáticas primária e secundária no córtex parietal anterior. Como vimos as áreas 3b e 3 a são as Neurofisiologia aula 7 4 áreas de recepção cortical de uma variedade de informações somatossensoriais a partir do tálamo, enquanto as áreas 1 e 2 congregam as entradas provenientes das áreas 3b e 3 a, providenciando o reconhecimento das formas dimensionais dos objetos e a execução de movimentos finos. As áreas sensoriais somáticas primária e secundária do córtex parietal anterior projetam – se para as outras principais subdivisões do lobo parietal: o córtex parietal posterior (as áreas 5 e 7 de Brodmann). As áreas parietais posteriores também recebem entradas a partir do sistema visual e auditivo e estão implicadas na integração das entradas sensoriais somáticas com essas outras modalidades sensoriais para dar origem a percepções e focalizar a atenção no espaço extrapessoal. As lesões nessas áreas não produzem deficiências sensoriais simples como a cegueira, surdez, ou perda da sensibilidade tátil. Os déficits são de natureza mais complexas, incluindo defeitos da percepção espacial, da integração visuomotora, e da atenção dirigida. Lesão do lobo parietal posterior dominante (geralmente o esquerdo) pode produzir afasia (um distúrbio da linguagem, ao qual retornaremos). Além disso, essas lesões produzem agnosia (incapacidade de perceber objetos através de canais sensoriais que funcionam normalmente sob outros aspectos). Uma das agnosias, vista após a lesão do córtex parietal posterior esquerdo, é a estereognosia, incapacidade de reconhecer a forma dos objetos pelo tato mesmo que não haja deficiência pronunciada das vias somatossensoriais. As lesões do lobo parietal posterior não – dominante (geralmente o direito) não causam distúrbios da linguagem. Em vez destes, os pacientes com lesões situadas à direita exibem alguns dos mais notáveis defeitos cognitivos que podem ser vistos num paciente neurológico. Frequentemente apresentam uma agnosia que se manifesta como um déficit impressionante da imagem corporal e da percepção consciente dos aspectos espaciais de todas as entradas sensoriais a partir do lado esquerdo do corpo, bem como do espaço externo. Apesar de duas sensações somáticas estarem intactas, esses pacientes ignoram a metade do corpo, deixando de vestir, tirar a roupa, a lavar o lado afetado (síndrome da negligência).Os pacientes podem mesmo negar ou desconhecer um braço ou uma perna afetados, chegando até a dizer. “Quem pôs este braço na minha cama?” Podem também negar a existência de qualquer paralisia nesse membro e podem tentar sair do hospital prematuramente, já que sentem que não há nada de errado com eles. Os pacientes com a síndrome da negligência não apenas ignoram a metade de seu corpo, também ignoram a metade do mundo exterior. Por Neurofisiologia aula 7 5 exemplo, esses pacientes às vezes mostram um grave distúrbio da sua capacidade de copiar figuras desenhadas. Assim, o paciente pode desenhar uma flor com pétalas apenas do lado direito da planta. Quando se pede que copiem um relógio, ignoram os números à esquerda e tentam colocar todos os 12 números do lado direito, ou desenham ao longo do lado correndo para fora do mostrador. Um exemplo particularmente dramático de negligência visual é evidenciado nas pinturas de um artista alemão que sofreu um derrame que afetou seu córtex parietal posterior direito. Pediu – se que pintasse auto – retratos durante sua recuperação, e os quadros mostravam uma profunda negligência do lado esquerdo da face nos retratos feitos aos 2 e 3,5 meses. Houve recuperação parcial aos 6 meses, mas a negligência persistiu, apesar de em menor grau, mesmo depois dos outros sintomas do paciente terem essencialmente se recuperado ao 9 meses. Alguns aspectos da negligência resultam da falta de percepção da metade contralateral do corpo. Essa perda da percepção inclui não apenas a perda da representação do espaço pessoal. Há também uma perda da memória, que explica por que esses pacientes geralmente não se dão conta de seus déficits. AS LESÕES NO CÓRTEX DE ASSOCIAÇÃO PARIETAL POSTERIOR PRODUZEM DEFEITOS DA ATENÇÃO Uma característica crítica da percepção é o desvio da atenção de um objeto no campo visual para o outro. A imagem por PET de pessoas normais mostrou que, quando as pessoas desviam sua atenção no campo visual tanto o córtex parietal (posterior) superior quanto o córtex frontal são ativados. Cada área está implicada com diferentes aspectos da atenção. A região parietal se ativa quando a atenção é desviada com base em indícios sensoriais, independentemente da execução de um ato motor. A região frontal se ativa apenas quando estímulos seletivos levam a uma resposta motora a ser executada. Quando pacientes com lesões do lobo parietal são confrontados com estímulos simultâneos em ambos os campos visuais, esquerdo e direito, são incapazes de detectar os estímulo sensorial no lado contralateral ao da lesão. Apesar do déficit da focalização espacial da atenção por si só não explicar a ampla faixa de fenômenos observados que contribuem para a negligência, parece que contribui de modo importante para síndrome clínica. Neurofisiologia aula 7 6