Explorando o ciberespaço nas trilhas da inclusão

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Explorando o ciberespaço nas trilhas da inclusão
Maria Teresa Eglér Mantoan
Universidade Estadual de Campinas – Unicamp
Faculdade de Educação
Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diversidade – LEPED/FE/
Unicamp
[email protected]
Junho, 2003
Palavras-chaves: inclusão escolar; tecnologias da educação; acessibilidade ao
conhecimento
Novos cenários educacionais
O impacto do uso de novas tecnologias de comunicação e de informação
potencializado pelos desafios da inclusão escolar provoca mudanças verdadeiramente
revolucionárias no contexto educacional e precipita o rompimento com modelos tradicionais
de ensinar e aprender.
A democratização e descentralização do controle do conhecimento rompem com
paradigmas nos quais se assentam as bases da educação formal e a abertura das escolas às
diferenças é conseqüência desse rompimento, implicando a adoção de novos pressupostos
frente aos quais a escola está ainda muito defasada.
Consoante novas tendências educacionais, em que a multi/interdisciplinaridade,
a interatividade, a acessibilidade são motores desses avanços, este texto foi organizado de
modo a apresentar ao leitor contribuições das tecnologias educacionais ao processo de
inclusão escolar de pessoas com e sem deficiências temporárias ou permanentes de
adaptação, nessa nova perspectiva.
A consciência cada vez mais aberta às diferenças entre as pessoas, aos contextos
em que se inserem, seus valores e especificidades têm mudado o modo de conviver e de
compartilhar o mundo com o outro. O acesso de todos aos bens que a humanidade produz e
à Natureza que nos cerca depende da transformação de nossos espaços e de nossas
concepções e de se ultrapassar as fronteiras que nos impedem realizar um intercâmbio mais
intenso de sentimentos, idéias, costumes, vivências com nossos semelhantes.
Uma busca constante de uma melhor qualidade de vida estimula a nossa
inventividade e o nosso desejo de encontrar meios que promovam o bem-estar, a saúde, a
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educação, o lazer, o trabalho indistintamente a todos, mas sem discriminações e
preconceitos.
Entendemos que não estamos mais vivendo um tempo de comunicação em que
o emissor e o receptor estão separados, distanciados. Por outro lado, a mobilidade não é mais
um deslocamento necessariamente físico, mecânico, prisioneiro dos limites do tempo e do
espaço, apenas.
Movimentos, palavras promovem envolvimento entre pessoas, intercâmbios
intrinsecamente imbricados, que formam redes, conexões entre seus pólos e se expandem
indefinidamente.
Todas essas mudanças que começam a despontar no mundo contemporâneo são
conquistas que temos de estender às escolas e às salas de aulas.
Como, então, buscar uma maneira de tornar o acesso à educação de qualidade
uma conquista de todos e para todos? Seria uma pretensão de nossa parte solucionar esta
questão – a inclusão escolar - porém nos dispusemos a enfrentá-la.
A tarefa é desafiante, pois os conceitos e práticas envolvidos e a extensão do
significado dessa inovação educacional necessitam de diferentes sistemas interpretativos e
de novas explicações e artefatos que dêem conta da sua complexidade.
Por tudo isto é que nos aventuramos a explorar o ciberespaço, nas trilhas da
inclusão!
O problema
Muitas indagações estão surgindo a respeito das formas de comunicação e de
ensino e dos estilos de aprendizagem decorrentes do uso de novas mídias eletrônicas na
escola, especialmente no ensino infantil e fundamental. O problema se amplia e se complica
ainda mais, quando é proposta a utilização de ferramentas de comunicação a distância em
ambientes educacionais inclusivos.
Habituada à sua lógica transmissiva e distributiva do conhecimento, a escola
tem negligenciado o que acontece a seu redor.
De fato, a multiplicação infinita das informações e a quebra das fronteiras
geográficas da comunicação tornam impossível o domínio do conhecimento. O homem
moderno precisa aprender a buscar, selecionar, tratar e construir conhecimentos autonoma e
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cooperativamente, no coletivo das representações, das idéias e sentimentos que se
complementam e se interpenetram, abalando com tudo isso o ensino disciplinar,
tradicionalmente praticado nas escolas.
Nenhum conhecimento é definitivo; o que vale é o processo de busca do saber e
nesse processo cada pessoa tem um percurso singular, cada vez menos canalizado em uma
única direção.
Todas as mudanças próprias do nosso tempo inserem novos fatos no universo
educacional, tais como o diálogo entre as diferenças, as redes de conhecimento resultantes
dessas interações, a complexidade do pensamento.
A identidade da escola, dos professores e do aluno estão sendo afetadas por
essas características do tempo/espaço em que vivemos, embora poucos tenham se dado
conta disso.
A esse propósito, formulamos algumas questões, que nos parecem pertinentes e
intrigantes. Podemos resumi-las, perguntando se a introdução de novas ferramentas
educacionais nas escolas, tais como o computador, os laboratórios de informática estão,
realmente, penetrando a velha lógica do sistema educativo e fecundando-a com novas
práticas e perspectivas de transformação. Como as tecnologias estão sendo concebidas e
introduzidas nas escolas, de modo que possam provocar mudanças efetivas na maneira de se
ensinar e aprender? O que essas inovações têm propiciado de novo?
Sabemos que a existência de computadores na escola não é suficiente para se
desencadear toda a gama de possibilidades que esse equipamento pode trazer à educação,
especialmente, nos seus níveis básicos.
A sub-utilização desse recurso é patente, quando estão locados em laboratórios,
recheados de programas que reproduzem técnicas de ensino mecanicistas, que não exploram
todo o potencial que essas máquinas nos oferecem.
Dificilmente se associa a existência dos computadores na escola à idéia de cocriação do conhecimento, interdisciplinaridade, aprendizagem colaborativa, ampliação de
experiências de comunicação e expressão entre aprendizes e professores, vivências intra e
interescolares, que implicam na multiplicidade de pontos de vista, intercâmbio de idéias,
diante de um mesmo tema ou resolução de problemas pela troca de soluções possíveis,
escolhas compartilhadas.
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O uso de computadores na escola tem sido reduzido a atividades que não
exploram devidamente o desenvolvimento de atividades interativas que empregam uma
variedade de ferramentas de telecomunicação, como o correio eletrônico, as listas de
discussão, os fóruns, as teleconferências e outras.
O design de ambientes de aprendizagem que utilizam a Internet como mídia é
um tópico de pesquisa que começa a surgir em função do desenvolvimento tecnológico e das
expectativas em torno da educação a distância. Por outro lado, pouco temos feito para tornálos acessíveis a todos os aprendizes, indiscriminadamente.
Explorar o ciberespaço na escola é ainda uma promessa, mas não podemos
deixar de cumpri-la, mesmo com um bom atraso...
O problema, portanto, não está apenas em conhecer os limites desse novo
espaço na educação e as possibilidades de seus ambientes de aprendizagem, mas de projetálos de tal modo que se afinem aos preceitos de uma educação para todos, inclusiva.
Em uma palavra, não basta apenas criar ambientes que são capazes de garantir a
todos os aprendizes o acesso à tecnologia, mas possibilitar-lhes, independentemente de suas
diferenças, o acesso ao conhecimento.
Por outro lado, é imprescindível que se integre a esses ambientes a idéia de que
os conhecimentos se constroem a partir de conexões, de idéias enredadas, de uma trama
imprevisível de relações, próprias de uma concepção indissociável das áreas disciplinares,
como as que naturalmente tecemos, nos hipertextos, no ciberespaço.
Essas novas tendências de ensino escolar, que implicam o uso de ferramentas
computacionais de comunicação a distância e envolvem uma atuação do professor, que não
está habituado e/ou preparado a fazer uso delas é um barreira que temos de transpor.
A transposição, no nosso ponto de vista, não ocorrerá enquanto se pretender
ensinar o professor a usar essas ferramentas, fora de suas salas de aulas, em cursos
específicos, isolados do contexto escolar em que atuam.
Acreditamos que se aprende a ensinar o novo, conhecendo e praticando a
novidade, em toda a sua extensão, oferecendo aos professores a oportunidade de passar pelas
mesmas dificuldades e fases de compreensão, vivendo os mesmos sentimentos dos/com seus
alunos para assimilar o novo, no cotidiano das escolas e de suas salas de aulas.
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Os professores precisam viver o desafio de aprender pela descoberta, pela
experimentação, com seus alunos, diante de situações que problematizam a sua atuação,
pois, do contrário, continuarão reproduzindo em suas turmas, o que queremos que seja
abolido – conhecer antes para aplicar, depois! Essa relação linear e causal inexiste nos
processos inventivos do conhecimento ativamente construído e todas as regulações
necessárias para esse fim são incertas, provisórias, incompletas e geradoras de conflitos,
pelos quais o entendimento avança.
Precisamos, pois, desconfiar de toda formação que pretende fazer com que os
professores progridam, evoluam nas suas práticas (mesmo as que são intermediadas pela
mais poderosa tecnologia), mas que continuam fundamentadas nos velhos princípios
educacionais que sustentam a escola tradicional. Isso tem acontecido em muitos cursos a
distância, que repetem as mesmas situações de ensino pelas quais aprendemos outrora,
quando o livro texto, as instruções programadas, as avaliações fechadas num dado nível de
desempenho, entre outras, constituíam o perfil metodológico da formação.
Democracia eletrônica e inclusão escolar
A emergência de novas competências de comunicação, que surgem da passagem
de uma lógica distributiva, unidirecional e hierárquica da escola tradicional para a lógica
interacional da escola da contemporaneidade, desconsidera a passividade do educando e
propõe a criação coletiva, como sua fonte revitalizadora.
Tecnologias que provocam interatividade entre os usuários permitem
confrontação coletiva e construção de conhecimentos em teias interdisciplinares e baseados
na liberdade de expressão, pluralidade de idéias e cooperação. Essas tecnologias liberam o
professor do peso de ser a única fonte do conhecimento.
Assim sendo, todo o autoritarismo dessa posição vai cedendo lugar para outros
comportamentos, ou melhor, para que uma outra ética se materialize nas escolas, tendo
como eixos o convívio com as diferenças, a aprendizagem relacional, participativa, que faz
emergir a subjetividade dos alunos e os sentidos do saber.
O poder revolucionário de certas ferramentas que envolvem experiências de
comunicação e de construção do conhecimento, via Internet, não se resume em dotar o
professor e o aluno de novos recursos didático-metodológicos para o desenvolvimento do
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processo formal de educação a distância. Essa já seria uma importante contribuição, não fora
a possibilidade que elas têm de condicionar novas maneiras de pensar o outro e de viver em
grupo, democraticamente.
É certo que a nossa maneira de engendrar e de administrar o conhecimento é
uma das geradoras da nossa (in)capacidade de ver e/ ou de entender o outro.
Se concebemos o outro a partir da escolha arbitrária de atributos pelos quais
inventamos e aprisionamos as pessoas em classificações, categorias, separando-as segundo
normas definidas para esse fim, dificilmente chegaremos a entender o sentido da inclusão e
de seu caráter necessariamente radical, ao negar toda e qualquer exclusão no ambiente
escolar.
A inclusão propicia experiências pessoais e interpessoais que afetam objetiva e
subjetivamente as relações entre os educandos e entre professor e sua turma, exigindo
avanços nas práticas pedagógicas e na estruturação dos sistemas de ensino.
Cenários de trabalho, que fazem convergir aprendizagem escolar e novas
tecnologias proporcionam um entendimento entre os atores educacionais que fortalece os
elos que os unem entre si e fazem circular o conhecimento, como uma seiva que alimenta
cada um deles, na medida de suas necessidades.
Eis aí a condição ideal para que se enfrentem os desafios de se ensinar a turma
toda, sem discriminações, currículos adaptados e ensino à parte, em classes e escolas
especiais.
Ambientes computacionais inclusivos
Visando a esta condição, estamos realizando um estudo de natureza
interdisciplinar, que reúne alunos e professores da Faculdade de Educação/Unicamp e do
Instituto de Computação/Unicamp, focando o processo de aprendizagem de alunos com e
sem deficiências, incluídos no ensino fundamental, no ensino fundamental.
Vale reafirmar que, afinados com os princípios da educação inclusiva,
buscamos um design de ambientes computacionais que não seja exclusivo para usuários com
necessidades específicas, mas que possa ser usado por todos os aprendizes, sem discriminar
as possibilidades de cada um, no processo educativo.
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O estudo iniciou-se em 1999, quando reunimos um grupo de alunos com
síndrome de Down, em processo de alfabetização, e solicitamos a participação ativa desses
alunos como usuários finais do primeiro software educativo que estávamos produzindo. Essa
participação se deu ao longo de todo o ciclo de design e de desenvolvimento de um desses
ambientes, o Papo-Mania (Barcellos e Higachi, 1999). Este software e outros dois,
denominados Desenho-Mania (Barcellos, 2000) e Teatro
no
Computador
(Oliveira, 2000), são produtos de dissertações de Mestrado e de tese de Doutorado do
Instituto de Computação/ Unicamp.
Entre 1999 e 2001 foram implementadas as três ferramentas e todas as ações do
projeto se limitaram a realizar essa tarefa.
Cada um desses ambientes tem a sua especificidade e a sua proposta
educacional. Todos eles foram desenvolvidos a partir de uma abordagem participativa e
mudanças foram gradualmente introduzidas nas interfaces, visando uma melhor adaptação
ao usuário: alunos do ensino fundamental, como e sem deficiência.
O Papo-Mania é um ambiente de chat, em que o acesso ao conhecimento é
entendido como a possibilidade de o software mediar a comunicação, propiciando aos
alunos com e sem deficiências situações em que ampliam os recursos necessários ao uso da
linguagem escrita. Existem expressões faciais e falas associados a ícones, assim como frases
semi-prontas, que ajudam na introdução de temas e composição de respostas, facilitando
igualmente a digitação de frases; há possibilidade de o professor intervir diretamente na
comunicação, para facilitar a conversação.
COLOCAR AQUI UMA TELA DO PAPO_MANIA - OPTATIVO ( arquivo
em anexo)
O Desenho-Mania é software proposto para possibilitar o desenvolvimento
de trabalhos cooperativos a distância, estimulando o compartilhamento de metas, a interação
em grupo, a colaboração e a capacidade de decisão entre as crianças em geral, com e sem
deficiências. Os alunos discutem e decidem, via Rede, o que vão desenhar; depois cada
grupo ou criança constrói a parte e finalmente as contribuições de todos são visualizadas e
os participantes podem trabalhar na construção final do trabalho desenhado. Finalmente é
gerada um página da Web que para apresentar a produção do grupo. Esta ferramenta destaca
que outras linguagens e não apenas o código escrito podem ser utilizadas para expressão do
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pensamento, além de desenvolver a memória visual, a seqüência lógica temporal, a
organização do trabalho, a mudança de perspectiva para analisar um objeto e outras
competências educacionais. Trata-se de uma ferramenta que oferece uma gama de
possibilidades de participação e de aprendizagens e que, em conseqüência, não exclui os
alunos com deficiência mental dos trabalhos que estão sendo produzidos.
COLOCAR AQUI UMA TELA DO DESENHO-MANIA – OPTATIVO
(arquivo em anexo)
O Teatro no Computador é o resultado de uma metodologia de design de
interfaces em que as pessoas não são meros usuários, mas atuam como habitantes dos
espaços virtuais criados pelo designer. As crianças, nesse ambiente, podem habitar de
diversas maneiras o espaço virtual do teatro. Cada uma dessas maneiras é função da relação
semiótica que a criança contrai com as demais entidades que habitam a interface e cria
diferentes oportunidades de aprendizagem. Da mesma forma que os ambientes anteriores, o
Teatro no Computador é uma ferramenta inclusiva, pois não especifica um tipo de
usuário para sua utilização, dada a flexibilidade e a abrangência de seus recursos e propostas
educacionais.
Habitando o teatro como um autor, a criança usa sua imaginação, sua
capacidade inventiva, expressa sua visão de mundo livremente. Como diretor, ela aprende a
usar os recursos disponíveis na ferramenta para expressar uma idéia, um sentimento,
improvisando sons, montando cenários, adequando os recursos existentes ao roteiro da peça.
Como ator, a criança pode melhorar a percepção de si mesma, do outro e do mundo e como
espectador, ela pode se posicionar em espaços dentro do teatro virtual e mudar de
perspectiva para melhorar sua percepção dos fatos e interpretar o mundo sob diferentes
enfoques.
COLOCAR AQUI UMA TELA DO TEATRO NO COMPUTADOR –
OPTATIVO (arquivo em anexo)
Neste momento, um outro software está sendo produzido para ampliar ainda
mais os meios pelos quais estamos propiciando aos professores e alunos melhores condições
de ensinar e de aprender, dentro do que nos propõem as novas teorias educacionais.
Essas teorias vão de encontro a todas as formas de fragmentação e disjunção do
pensamento, combatem as hiper-especializações e se propõem a formar “cabeças bem
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feitas”, ao invés de “cabeças bem cheias” (Morin, 2001). A maioria dos professores,
contudo, ainda se empenham em encher a cabeça de seus alunos, pressionados pelos
sistemas educacionais, pelos pais e pela sociedade em geral, que defendem obstinadamente,
o ensino meramente disciplinar.
Já conseguimos vencer etapas do cronograma do estudo referentes à produção
dos três ambientes computacionais inclusivos idealizados.
Em fins de 2001, iniciamos a implementação dos ambientes em computadores
localizados em algumas salas de aula do ensino regular de uma rede pública de ensino
municipal do Estado de São Paulo, que adota princípios educacionais inclusivos.
Esses alunos já estavam começando a ler, mas com muita dificuldade em
escrever, segundo as expectativas da escola, que insistia no nível de escrita ortográfica. Os
alunos sem deficiência, por sua vez, estavam mais próximos do padrão de escrita exigido
pela escola, porém não se distanciavam muito dos alunos com deficiência, quando a tarefa
era produzir frases com sentido, escrever pequenos textos, enfim usar e a língua como meio
de comunicação interindividual e grupal. Eram crianças não tinham liberdade para se
exprimir, seja desenhando, como escrevendo, contando fatos, histórias, narrando situações
do cotidiano, nas atividades de sala de aula.
As professoras, embora aceitassem bem os alunos com deficiência em suas salas
de aula, não propunham e desenvolviam atividades em que os alunos pudessem demonstrar
os seus interesses, competências peculiares.
O ensino, bastante livresco, estava centrado nos conteúdos curriculares e era
transmitido unidirecionalmente do professor para os alunos, sem qualquer tentativa de
interdisciplinarização das áreas acadêmicas.
Alguns resultados animadores
Primeiramente é de se destacar que os alunos com e sem deficiência
contribuíram em todas as fases do design participativo dos ambientes computacionais
propostos, mostrando suas necessidades e expectativas diante dos recursos das ferramentas
em produção e colaboraram como membros da equipe de design e não apenas como
sujeitos de observação e de experimentos.
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Resultou dessa participação uma maior adequação dos softwares às tarefas do
usuário e destacou-se o poder deste nas decisões que afetam o uso que fará da ferramenta
no seu próprio ambiente de trabalho, ou seja, o contexto escolar.
Nas salas de aula, todos os alunos com e sem deficiência participaram com
interesse e espontaneidade do que lhes foi solicitado, nas fases posteriores do estudo.
Apesar dos obstáculos iniciais (a maioria deles já esperados e referentes a
aspectos irrelevantes, pois se referiam ao acesso à tecnologia e não ao acesso à comunicação
e ao conhecimento), os alunos dessas classes conseguiram entrar em contato com seus
colegas de outra escola por meio do Papo-Mania e do Desenho-Mania e também
conseguiram produzir várias peças de teatro, utilizando o Teatro no Computador1.
Os alunos com e sem deficiência participaram da produção das peças de teatro
como atores e diretores e influíram no roteiro, apresentando sugestões muito pertinentes aos
autores.
Ficou evidente que não há barreiras para a participação dos alunos em geral
nesse e nos demais ambientes de comunicação à distância aqui referidos, pois todos eles
atendem à diversidade das possibilidades de participação das crianças em geral – por
exemplo, quando não sabem escrever uma fala, podem gravá-la ou mesmo ditá-la a um
colega da turma.
A ferramentas desenvolvidas propiciaram a esses alunos com e sem deficiência, até
então, ampliar seus recursos de comunicação oral e escrita e uma compreensão dos
conteúdos escolares, que foge ao que é da rotina nas salas de aula, em que as práticas de
ensino separam, repartem o saber em fatias disciplinares e colocam grades entre o que
precisa ser explorado e descoberto de modo integrado.
As práticas dos professores têm evoluído pouco a pouco para uma concepção
transversal, unificadora, mesmo quando essas ferramentas não são as intermediárias dos
processos escolares de ensino e aprendizagem.
Esses profissionais estão aperfeiçoando sua atuação pedagógica e revendo-a
diariamente, em conseqüência do que está ocorrendo no dia-a-dia escolar, ao se defrontarem
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Essas histórias constituem o material de estudo de uma dissertação de Mestrado em Educação de uma de
nossas orientandas do LEPED, Profa. Janaína Speglish Amorim. O trabalho intitula-se: “Uma Janela Para
Todos: as novas mídias informatizadas nas escolas abertas às diferenças”.
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com o poder dessas ferramentas e ao compararem o que elas lhes propiciam com outros
recursos didático-pedagógicos usuais.
Cada ferramenta mostrou individualmente ser capaz de mediar níveis de
interatividade diferentes, sendo que no caso do Teatro no Computador, constatamos
que os alunos com e sem deficiência se integraram de tal forma às suas tarefas (imersão
virtual), que se confundiam com a própria interface.
Como a nossa intenção não á de criar apenas tecnologias “web-acessíveis”, mas de
acesso aos conhecimentos e interconexão entre os mesmos, acreditamos estar a meio
caminho dos nossos objetivos que pretendemos alcançar neste estudo.
Tendo conseguido afinar os instrumentos, fazendo convergir o design dos ambientes
com os preceitos educacionais inclusivos e com práticas de ensino cooperativas, multi/
interdisciplinares, esperamos chegar aos benefícios que esses softwares poderão propiciar ao
desempenho escolar de alunos com e sem deficiência, na aquisição dos conteúdos
acadêmicos e na sua efetiva e pertinente utilização como veículo de comunicação facilitador
da inclusão o escolar e social.
As ferramentas de comunicação a distância de que trata este estudo têm propiciado
aos professores constatar os resultados de uma ação educativa que não exclui ninguém, em
razão da utilização de recursos e da definição de objetivos a serem alcançados que diferem
dos habitualmente presentes em salas de aula do ensino regular e especial. Eis aí uma
constatação a que não é fácil de se chegar, com a mesma visibilidade que essas ferramentas
lhes oferecem.
As atividades desenvolvidas por intermédio desses ambientes educativos, referenda
a educação não disciplinar (Gallo, 1999), cujo ensino se caracteriza pela criação de
ambientes polissêmicos de aprendizagem, provocados por temas de estudo que partem da
realidade, da identidade social e cultural dos alunos, contra toda a ênfase no primado do
enunciado desencarnado e no conhecimento pelo conhecimento.
Para se ensinar a turma toda, temos de propor atividades abertas, diversificadas, isto
é, atividades que possam ser abordadas por diferentes níveis de compreensão e de
desempenho dos alunos e em que não se destaquem os que sabem mais ou os que sabem
menos. Em uma palavra, as atividades devem ser exploradas, segundo as possibilidades e
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interesses dos alunos que optaram livremente por desenvolvê-las, como ocorre nos
ambientes virtuais aqui apresentados.
Estamos procurando responder às questões que formulamos na problematização
deste artigo e conscientes de que há muito a caminhar, porque, as escolas resistem muito à
adoção de práticas pedagógicas transgressoras e de aparatos educacionais inovadores, que
fazem parte das propostas de um ensino, verdadeiramente, inclusivo.
Mas estes são os desafios educacionais do milênio e temos mais é que não
esmorecer e buscar soluções para enfrentá-los.
Referências bibliográficas
Barcellos, G.C. (2000). Estudo e desenvolvimento de ambientes de aprendizado
colaborativo a distância para o contexto da educação inclusiva. Dissertação de mestrado,
Instituto de Computação, Universidade Estadual de Campinas, Unicamp, Campinas, São
Paulo.
Barcellos, G. C., Higaki, P. L. (1999). O processo comunicativo em ambientes
virtuais de aprendizagem – um estudo exploratório. Anais do X Simpósio Brasileiro de
Informática na Educação. V.1 (pp271-278).
Gallo, S. (1999). Transversalidade e de educação: pensando uma educação nãodisciplinar.In N. Alves (org.), O sentido da escola da escola (pp17-43).Rio de Janeiro:
DP&A editora.
Morin, E. (2001). A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento.
Trad. Eloá Jacobina, 4ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
Oliveira, O.L. (2000). Design da interação em ambientes virtuais: uma abordagem
semiótica.
Tese de doutorado, Instituto de Computação, Universidade Estadual de
Campinas, Unicamp, Campinas, São Paulo.
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