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EDUCAÇÃO PARA A CONSERVAÇÃO E EDUCAÇÃO PARA A
TRNSFORMAÇÃO NA PERSPECTIVA DE DURKHEIM, ATHUSSER E
GRAMSCI E A EDUCAÇÃO DO CAMPO DO MST
Felipe Cordeiro da Rocha1
Introdução
Este artigo surge a partir das contribuições da disciplina teorias sociais da educação na
história contemporânea, do mestrado em educação da Universidade Estadual do Oeste
do Paraná, campus Cascavel e pretende discutir o papel da educação a partir da
perspectiva conservadora de Émile Durkheim e da visão de Louis Althusser e Antonio
Gramsci, ambos autores marxistas, que no entanto atribuem um papel e possibilidades
distintas para a educação quanto ao seu papel, se é de conservação ou de transformação
e a partir da possibilidade que Gramsci enxerga da educação no sindicato de formar o
intelectual orgânico da classe trabalhadora, isto é, no espaço contraditório dentro da
sociedade civil discutir o papel da educação do campo na sua possibilidade de ser uma
educação transformadora.
PAVAVRAS-CHAVE: Educação tradicional, educação na perspectiva marxista e
história da educação.
Para falar em educação conservadora em Durkheim, precisamos antes falar alguns
conceitos de sua sociologia que acredita que o social está acima do indivíduo, que em
última análise a sociedade funciona como um grande organismo, como um corpo
orgânico harmônico e quando um indivíduo ou mesmo uma instituição da sociedade não
cumpre seu papel cria-se um estado de anomia, vejamos mais de perto esta questão:
Durkheim por vir de uma perspectiva positivista, a sociologia durkheimiana teve grande
influência das ciências naturais: química, física, biologia e astronomia, pois estas
ciências têm leis especificais, na biologia, por exemplo, os organismos vivos funcionam
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Mestrando em Educação, UNIOESTE Campus Cascavel. Email: [email protected]
como um sistema inteligível, onde cada parte do corpo humano, tem uma função
especifica, mas funcionam em relação com o todo e em harmonia e quando está
harmonia é desfeita surgem as doenças. Ao enxergar a sociedade Durkheim via a
mesma necessidade de harmonia e cooperação entre os indivíduos e instituições desta
mesma sociedade, não é o indivíduo que determina a sociedade, pelo contrário existe a
necessidade para que a sociedade funcione harmonicamente que o social se imponha
sobre o indivíduo e mais que isso, que ao agir o indivíduo pense no bem comum e o
próprio significado para a vida do mesmo é dado pelo coletivo e pela tradição, quando
ele não consegue se enquadrar mais nesta totalidade social sua vida perde significado e
o mesmo pode se suicidar, ao que chamamos suicídio egoísta ou quando há uma
mudança brusca nas regras sociais ao não conseguir se enquadrar no novo momento
social ao qual não desenvolve sentimento de pertença a vida desse indivíduo perde
significado e o mesmo comete o suicídio anomico, ou ainda, quando o indivíduo está
tão integrado a sociedade em que vive que os valores da sociedade se impõe acima de
sua individualidade, por este pensar que os valores sociais são mais importantes que sua
própria vida se mata em prol destes valores e assim comete o suicídio altruísta. Como
vemos, mesmo a atitude considerada mais egoísta, o suicídio, está em relação com o
social, logo para Durkheim é o social que reina sobre a perspectiva individual.
Outro ponto que fica claro nesta perspectiva em que a sociedade se impõe acima do
indivíduo é a divisão que Durkheim faz da história humana através do trabalho social,
quando Durkheim cria o conceito de solidariedade social
que se subdivide em
solidariedade mecânica e solidariedade orgânica, onde a primeira é típica das sociedades
tribais ou sociedades primitivas, onde o indivíduo está integrado a sociedade, inclusive
pela divisão do trabalho se dá de maneira simplificada, por exemplo, imaginemos numa
aldeia onde os homens são caçadores e as mulheres cuidem de funções domesticas e das
plantações em torno da oca, neste caso até pela proximidade e por exercerem funções
correspondentes, as pessoas sentem-se parte de um todo social, onde não está em
primeiro plano o desejo do indivíduo, pelo contrário, as pessoas cumprem seu papel por
se sentirem parte do organismo social e para o bom funcionamento da comunidade e há
maior homogeneidade social e quando o indivíduo se afasta desta totalidade social ele é
punido pelo grupo; pelo contrário, em nossos dias , as pessoas cumprem os mais
distintos papeis sociais, têm as mais diversas profissões, o que tem como resultado que
a linha que liga as pessoas a totalidade do social é mais tênue, como consequência disso
há menor homogeneidade social o que para Durkheim é um problema, é a partir deste
ponto que se pode entender a razão que a sociologia tenha nascido na modernidade, pois
Durkheim atribuía os problemas da sociedade de seu tempo a um enfraquecimento do
social e um avanço do individual e as pessoas já não cumprem seu papel social e é daí
que entraremos no problema que traz a necessidade da educação e também nos motivos
pelo qual devemos considerar a educação durkheimiana conservadora..
A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre aquelas que ainda
não estão maturas para a vida social. Ela tem como objetivo suscitar e
desenvolver na criança um certo número de estados físicos, intelectuais e
morais exigidos tanto pelo conjunto da sociedade política, quanto pelo meio
especifico ao qual ela está destinada em particular (DURKHEIM, 2012, p.
54).
A definição de educação de Durkheim pressupõe que a educação passa das gerações
mais velhas para as mais novas, podemos sinalizar aqui, em primeira mão, a perspectiva
conservadora, se compreendemos como conservador a função dada para a educação por
Durkheim que é de fazer da escola um novo instrumento de coesão social necessário
para a modernidade, pois esta de alguma forma tem perdido esta coesão que é
necessária com o aumento do individualismo, que o próprio Durkheim atribui ser típico
da divisão do trabalho e da própria evolução. Durkheim chama a atenção para o caráter
individualista da educação de seu tempo.
A educação variou muito de acordo com o tempo e com os países, na polis
grega e latina a educação ensinava o indivíduo a se subordinar cegamente à
coletividade, tornou-se a coisa da sociedade. Hoje, ela tenta ela tenta
transformá-lo em uma personalidade autônoma. Em Atenas buscava-se
formar intelectos finos, perspicazes, sutis, amantes da proporção e harmonia,
capazes de gozar e dos prazeres da pura investigação, em Roma, desejava-se
antes de tudo que as crianças se tornassem homens de ação, apaixonados pela
glória militar, indiferentes a tudo que envolve letras e artes. Na idade média,
a educação era acima de tudo cristã[...] Se a educação romana tivesse sido
tomada pelo individualismo parecido com o nosso, a polis romana não teria
podido se manter. As sociedades cristãs da idade média não teriam sobreviver
se tivessem concebido a importância que nós à atribuímos hoje. Existem,
portanto necessidades inelutáveis que é impossível abstrair. De que adianta
imaginar uma educação que seria fatal para a sociedade que a colocasse em
pratica? (DURKHEIM, 2012, p. 48).
Aqui já podemos perceber o caráter conservador da educação para Durkheim ao buscar
uma educação que seja um elemento de coesão, no entanto, neste momento suspenderei
a perspectiva conservadora da educação durkheimiana e tomamos um elemento, que se
aproxima inclusive da pedagogia histórico crítica, para tal tomamos uma definição desta
última dada por Demerval Saviani que é que a educação tem como papel repassar as
futuras gerações o conhecimento acumulado pela humanidade, vejamos mais de perto
esta questão, primeiro destacando os pontos em comum e depois percebendo a
diferença, aí então retornaremos a questão que deixamos em suspenso.
Considerando que as perspectivas especificamente humanas não estão
inscritas na genética e, portanto, não são herdadas pelos indivíduos ao nascer,
mas são produzidas historicamente devendo ser adquiridas por meio da
atividade educativa, a pedagogia histórico-critica define a educação como ato
de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular a
humanidade que é produzida histórico pelo conjunto dos homens. Isso
significa que o papel da educação é tornar os indivíduos contemporâneos a
sua época, pois quando vem ao mundo, os membros da espécie humana já se
encontram num contexto que, é produto histórico, isto é, produto das
gerações procedentes (SAVIANI, 2013, p. 18).
Se aqui percebe-se que a educação tem o papel de repassar as futuras gerações o
conhecimento acumulado pela humanidade na perspectiva da pedagogia histórico critica
retomemos na perspectiva conservadora de Durkheim este mesmo ponto.
Ora, não somos nós, individualmente, que inventamos os costumes e as ideias
que determinam este tipo de educação. Eles são o produto da vida em comum
e refletem suas necessidades. Em sua maior parte, eles são inclusive fruto das
gerações anteriores. Todo o passado da humanidade contribui para elaborar
este conjunto de máximas, que dirige a educação de hoje, nela está gravada
toda história e mesmo a história dos povos que nos procederam. Este
mecanismo é similar ao dos mecanismo superiores, que carregam como eco
de toda evolução biológica da qual eles são resultado (DURKHEIM, 2012, p.
48).
Aqui vemos que tanto a perspectiva conservadora de Durkheim que pode ser
considerado um dos pais da pedagogia moderna, quanto a visão da pedagogia histórico
crítica de Saviani se aproximam ao reconhecer que a educação é resultado da história
das necessidades e das conquistas dos homens, algo que Lênin já havia destacado,
mesmo ao dizer dos limites da velha escola livresca, no entanto, o mesmo diz que não
reconhecer que nela há um tesouro acumulado pela humanidade seria um erro seríssimo
(LÊNIN apud FAVORETO, 2008, p. 63) no entanto, há uma diferença crucial entre a
perspectiva tradicional, a perspectiva marxista de educação e por seguinte na
perspectiva histórico crítica, que por sua vez, também filha da perspectiva do marxismo
na educação,
é que embora ambas estejam centradas na divisão do trabalho a
perspectiva marxista enxerga a luta de classes ao passo que a educação tradicional
durkheimiana é fruto de um processo evolutivo, onde a divisão do trabalho é
comparável à própria expansão dos organismos.
Ainda hoje, não vemos a educação variar com as classes sociais ou mesmo os
habitats? A da cidade não é igual a do campo, a do burguês não é igual à do
operário. Dirão por aí que esta organização não é moralmente justificável e
pode ser considerada um anacronismo destinado a desaparecer. A tese fácil
de defender. É claro que a educação dos filhos não deveria depender do acaso
que os faz ao nascer aqui ou lá, de tais pais em vez de outros. Porém mesmo
que a consciência moral de nosso tempo tivesse sido satisfeita neste ponto,
nem por isso a educação seria mais uniforme. Mesmo que a carreira de uma
criança não fosse, em grande parte, predeterminada por uma cega
hereditariedade, a diversidade moral das profissões não deixaria de exigir
uma grande diversidade pedagógica (DURKHEIM, 2012, p. 50).
Durkheim não está preocupado com esta diferenciação, uma vez que ela é natural, que
por um lado é resultado da etapa do progresso e efeito da divisão do trabalho, pois já
que os organismos se expandem e se especializam, logo a sociedade também segue esta
lógica e como no caso dos organismos não há conflito, se cada um cumprir seu papel
social não importa se operário ou burguês a educação preparará cada um para assumir
sua posição, não importa se esta educação é para o operário ou para o burguês, para o
que pensa e para o que faz, por isso o próprio Durkheim admite que a educação tem
uma base especifica, onde cada um aprende a executar sua função e outra com base
comum que tem como papel manter a coesão social e é neste ponto que retomamos a
ideia da educação durkheimiana como uma educação conservadora, já que ela não
pretende a emancipação, não pretende acabar com a divisão da escola das classes, não
porque Durkheim acredite que a educação tenha que ser para a submissão de uma classe
sobre a outra, mas que talvez porque ele acredite que tal qual na natureza há uma ordem
que faz que plantas e animais embora distintas ou diferenciadas formando vários nichos,
são em certa medita harmonizadas pela força da natureza, assim como no sistema social
cada indivíduo embora cumprindo papeis e funções distintas, sejam harmonizados
dentro de um organismo social de forma similar aos membros de um corpo, onde não
importa se pé ou cabeça cada membro tem sua função para o funcionamento o todo.
Durkheim não é a favor da exploração excessiva e a põe no rol dos comportamentos que
causam anomia, compreendendo anomia como desarmonia social, provocada pela ação
em desarmonia com a ordem social vigente, logo se um patrão explora em demasiado
seu empregado há desarmonia, logo a questão da exploração fica reduzida apenas como
um comportamento não apropriado, não há luta de classes.
Já a perspectiva marxista não vê que a escola possa ser considerada transformadora,
primeiro por não acreditar que a diferença social, ou que a divisão entre aqueles que
trabalham e produzem a riqueza e aqueles que se apropriam do trabalho alheio seja
natural, nem mesmo resultado de uma lei da natureza, mas sim uma construção social e
cabe destacar que o próprio Marx não se preocupou com o tema educação ou escola ou
simplesmente o seculariza por não acreditar que a escola possa romper por si só o
abismo entre as classes, entre exploradores e explorados que tem sua gênese na divisão
do trabalho, na propriedade privada, ou em outras palavras, na base material, que em
última análise determina as relações e a existência humana.
Já que, para Marx e Engels, a superação do capital não poderia ser enfrentada
por um único elemento, eles não colocaram o centro da transformação da
sociedade na educação escolar. Para eles, em primeiro lugar, deveria ocorrer
um ataque à propriedade privada, apenas depois disso é que, em conjunto
com outras medidas tomadas pelos revolucionários, se realiza a educação
comunista, cuja a preocupação primordial seria buscar a íntima relação entre
ensino escolar e trabalho. Assim, a escola antes não assumiria a tarefa prévia
de criar a consciência revolucionaria no proletariado (FAVORETO, 2008, p.
39).
Para compreender as razões que a escola não pode para Marx assumir este papel
tomamos das ideias de Louis Althusser, que toma um conceito criado por Marx o
aprofundando, que é o conceito de infraestrutura e superestrutura, antes de avançarmos
por esta linha é importante compreender que embora Marx compreenda o trabalho
humano como transformador da natureza, pois ao lhe dar com os elementos da natureza
o homem transforma não só a natureza, assim como a si próprio, no entanto, a forma
que este trabalho é apropriado muda nos diferentes períodos históricos e quando surge a
apropriação do excedentes e a propriedade privada, o trabalho humano que produz toda
riqueza passa a ser apropriado por uma classe dominante, mas é preciso compreender
que para esta classe dominante continue dominante ela cria meios para tal, entre eles
destacamos o Estado, que conforme Lênin destaca ao citar Marx e Engels é a prova da
existência de antagonismos de classe, isto é, o Estado serve como um aparelho para a
perpetuação tanto dos interesses da classe dos dominantes ou daqueles que se
apropriaram dos meios de produção e exploram a força de trabalho da classe
trabalhadora para enriquecerem, no entanto, não basta haver um modelo produtivo que
garanta os interesses da classe dominante, é preciso fazer que este modelo se reproduza.
Althusser diz ao citar Marx, que até uma criança sabe que se uma formação social não
reproduz suas condições de produção a mesma tente a desaparecer (ALTHUSSER,
1983, p.53). Aqui surge entre outros aparelhos ideológicos a escola burguesa.
Se Durkheim via que a escola assumia o papel que a Igreja tinha na Idade Média para
coesão social, Althusser vê na escola a forma que o modelo produtivo vigente, isto é, a
base econômica tem de se reproduzir e este local é hoje, dentre outros, cada vez mais a
escola.
Ora, vejamos, como se dá na está reprodução (diversificada no regime
capitalista? Ao contrário do que ocorria nas formações sociais escravistas e
servis, esta reprodução da qualificação da força de trabalho se dar-se não
mais no local do trabalho, porém, cada vez mais, fora da produção, através do
sistema escolar capitalista e de outras instâncias e instituições
(ALTHUSSER, 1983. p. 57).
No entanto, se a escola pode sim elevar o nível de conhecimento de seus alunos,
primeiro, há uma escola para o trabalhador e outra para o burguês e mesmo entre os
trabalhadores, há uma escola voltada para a formação de quadros para a administração,
uma para a formação de profissionais liberais, outra para técnicos, ponto levantado tanto
por Durkheim, como por Gramsci, logo a escola não é única e tem como função para
Althusser ensinar o “know-how”, o ensinar a fazer, o reproduzir o trabalho, porém ela
tem outra função, que é a de aprender as regras, o bom comportamento, que aqui
podemos comparar com a base de conhecimento comum disseminado pela escola ao
qual já falava Durkheim, que tinha como função dar coesão a sociedade, no entanto,
cabe destacar que se esta ordem não é natural, mas socialmente construída com base na
dominação e a escola tem tido como papel naturalizar esta ordem construída com base
na dominação.
Ora, o que se aprende na escola na escola? É possível chegar a um ponto
mais ou menos avançado nos estudos, porém de qualquer maneira aprende-se
a ler, escrever e contar, algumas técnicas, e outras coisas também, inclusive
elementos (que podem ser rudimentares ou ao contrário aprofundados) de
“cultura científica” ou “literária” diretamente utilizáveis nos diferentes postos
da produção (uma instrução para os operários, outra para os técnicos, uma
terceira para engenheiros, uma última para quadros superiores, etc....).
Aprende-se o “know-how”.
Porém, ao mesmo tempo com, e junto com estas técnicas e conhecimentos,
aprende-se na escola as ‘regras” do bom comportamento, isto é, as
conveniências que devem ser observadas por todo o agente da divisão do
trabalho conforme o posto que ele esteja “destinado” a ocupar; as da moral e
da consciência cívica e profissional, o que na realidade são regras de respeito
à divisão sócio técnica do trabalho e, em definitivo, regras da ordem
estabelecida da dominação de classe” (Id; Idem; p. 58)
Aqui podemos observar, que Althusser, como marxista que é, não atribui à educação um
papel libertador, pelo contrário, ele acredita que a escola burguesa não passa de um
instrumento de conservação da ordem estabelecida que tem relação com a base material,
que em última análise, dentro da visão marxista é o que determina a existência humana,
nesta mesma perspectiva Antonio Gramsci compreende a escola, ele diz que a escola
está a serviço da ordem vigente e tem o papel de criar intelectuais para esta ordem.
Cada grupo social, nascendo no terreno originário de uma função essencial
no mundo da produção econômica, cria para si ao mesmo tempo, de um
modo orgânico, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão
homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo
econômico, mas também no social e no político: o empresário capitalista cria
consigo o técnico da indústria, o cientista da economia política, o organizador
de uma nova cultura, de um novo direito etc. (GRASCI, 2004, p. 15)
Se criou um estado, onde o trabalhador não é aquele que pensa, o trabalho de pensar não
é atribuído ao trabalhador braçal, no entanto, não é bem assim, na realidade Gramsci
compreende que se existe esta divisão, que fica exposta na reforma Gentile na Itália, que
cria uma escola técnica apenas para reproduzir a mão de obra e para as classes
dominantes o ensino universitário. E hoje, mesmo que as classes populares tenham
acesso ao ensino superior, primeiro destaca-se que isso é resultado da luta, e segundo,
as carreiras que os filhos dos trabalhadores tem acesso, geralmente são os cursos de
menor prestigio e mesmo com os programas que buscam a democratização do acesso a
cursos, como, por exemplo medicina, há grande resistência na aceitação destes alunos,
muito porque no imaginário social que é fruto da divisão do trabalho, o trabalhador não
pode ser o intelectual.
Quais são os limites “máximos” da acepção de “intelectual”? É possível
encontrar um critério unitário para caracterizar igualmente todas as diversas e
variadas atividades intelectuais e para distingui-las, ao mesmo tempo e de
modo essencial das atividades dos outros agrupamentos sociais? O erro
metodológico mais difundido, ao que me parece, consiste em se ter buscado
este critério de distinção no que é intrínseco às atividades intelectuais, em vez
de buscá-lo no conjunto do sistema de relações no qual estas atividades (e,
portanto, os grupos que as personificam) se encontram, no conjunto geral das
relações sociais. Na verdade, o operário ou o proletário, por exemplo, não se
caracteriza especificamente pelo trabalho manual ou instrumental, mas por
exercer este trabalho em determinadas condições e em determinadas relações
sociais (sem falar no fato de que não existe trabalho puramente físico [...]
Todos os homens são intelectuais, poder-se-ia dizer então: mas nem todos os
homens desempenham na sociedade a função de intelectuais (Id; Idem; p.
18).
A escola é o lugar da formação de intelectuais para a reprodução da ordem vigente, não
é uma escola democrática a fim de superar a divisão entre trabalho intelectual ou mesmo
transformar todos os trabalhadores braçais em trabalhadores que sejam intelectuais, é a
condição econômica que determina qual o nível de conhecimento que uma pessoa de
modo geral pode alcançar.
Deve-se notar que a elaboração das camadas intelectuais na realidade
concreta não ocorre em um terreno democrático abstrato, mas de acordo com
processos históricos tradicionais muito concretos. Formaram-se camadas que,
tradicionalmente “produzem” intelectuais; trata-se das mesmas camadas que,
muito frequentemente, especializaram-se na “poupança”, isto é, a pequena e
média burguesia fundiária e alguns estratos da pequena e média burguesia
das cidades. A diversa distribuição dos diversos tipos de escolas (clássicas e
profissionais) no território “econômico” e as diversas aspirações das várias
categorias destas camadas determinam ou dão forma à produção dos diversos
ramos de especialização intelectual (Id; Idem; p. 20).
Se a escola é este lugar de dominação e de reprodução da ordem vigente, precisamos
recordar de dois espaços, um é o espaço do público estatal e outro é o espaço da
sociedade civil, que também pode representar os interesses da classe dominante, mas
paradoxalmente é dentro do espaço da escola civil que Gramsci enxerga a possibilidade
de uma escola que possa formar o intelectual que é da classe trabalhadora e ao mesmo
tempo está a serviço da classe trabalhadora.
Para a realização da hegemonia a classe dominante recorre a instituições
privadas, dentre elas a escola, uma vez que este exercício permite a
dominação das consciências – um momento indispensável para se estabelecer
uma relação de dominação. No entanto, também abre a possibilidade da
classe oprimida criar e consolidar uma contra hegemonia, uma vez que a
sociedade civil é o lugar da circulação livre de ideologias. A hegemonia,
portanto, implica uma passagem do momento ético-político (ou egoísta e
economicista) para o ético-político universal, onde se supera os interesses
meramente econômico-coorporativos, momento que Gramsci denomina por
cartase, a qual configura o momento de uma relação hegemônica [...]Neste
contexto, Gramsci compreende que a construção de uma educação
emancipatória depende da corrosão do bloco histórico dominante. Deste
modo, Gramsci não se limita à crítica da sociedade existente, mas também
oferece instrumentos para se pensar e realizar, com o auxílio da escola e das
demais instituições da sociedade civil, uma nova estrutura social (CASTRO e
RIOS, 2007 p.226).
Aqui destacamos que a possibilidade de dar um papel transformador para Gramsci
existe, mas não na escola do Estado, a escola pública, mas é no sindicato, ou na
sociedade civil que a escola pode assumir um papel contra hegemônico, por estar a
serviço da classe trabalhadora.
A EDUCAÇÃO PARA O MST
Se a educação que assuma um papel libertador e não engessado pela ordem econômica
vigente, mas que possa ir além da mesma, que assim como Gramsci diz, é uma
possibilidade que surge como possibilidade dentro da sociedade civil e dirigida pela
classe, assim se põe a luta pela educação dos trabalhadores sem-terra do MST, que luta
por educação pública como direito e ao mesmo tempo dever do Estado e pode parecer
que lutar por educação pública seja algo contraditório, se tomarmos o papel atribuído à
escola púbica tanto por Althusser como por Gramsci, no entanto, o movimento ao lutar
por educação pública, não está lutando por qualquer educação pública e sim uma
educação que possa transcender a educação reprodutora, a educação como mero
instrumento reprodutor da ordem social capitalista, não que esta escola não esteja
submetida a ela, pois dentro da ordem capitalista totalizante que vivemos, ainda não nos
é dada condições objetivas de escapar da totalidade das reações capitalistas de
produção, uma vez que precisamos para sobreviver e para tal precisamos nos submeter a
esta ordem, mas que isso, nossa forma de ver o mundo está impregnada da lógica
capitalista, mas temos sim a possibilidade de criar uma nova direção que tem relação
com os interesses dos trabalhadores, sendo assim, uma perspectiva contra hegemônica,
só é possível fazer isso através da luta e o movimento se torna protagonista do modelo
de educação que quer.
A velha escola do campo não contradiz a concentração da terra, pelo contrário, prepara
o camponês para deixar o campo, inclusive ao não valorizar seu cultura, porém mais que
isso ao não problematizar a concentração da terra ao contrário, dentro de um modelo
onde a moral da propriedade da terra não pode ser questionada, muito menos a sua
concentração na mão de poucos, esta escola não cria a rebeldia necessária para que o
trabalhador entenda que é e que produz riqueza pelo seu trabalho, sendo assim, ele tem
direito a usufruir do fruto do seu trabalho, ele tem direito à terra, tem direito a viver nela
e como MARIÁTEGUI (2007) já destacava, os povos latino-americanos tem uma
relação com a terra, com a produção coletiva, que esteve presente nas sociedades
incaicas, mais também no Paraguai antes da guerra da tríplice aliança, quando apenas
1,6 nas terras estavam na mão de proprietários particulares, o restante eram terras
públicas de uso coletivo, como destaca (VÁSQUEZ, 2008, p. 48) ao citar Pastore. É da
terra que este trabalhador reproduz não só a sua existência, mas ele tem ligação com a
mesma.
O recorte que muitos consideram arbitrário entre educação, educação rural e educação
do campo, surge primeiro, pois há um poder que é um direito dos movimentos sociais,
direito este que é de se auto designar, de se auto reconhecer, pois quando assumem do
nome pelo qual são designados pejorativamente sem terras, esta identidade ao qual, se
constitui de duas palavras sem e terra que se tornam substantiva composta sem-terra,
neste mesmo movimento estes trabalhadores têm o direito de ao lutar pela escola que
querem também nomear esta educação rural que pela sua própria realidade objetiva já
estava designada de rural e sem por isso deixou de ser educação do nome educação, ou
da educação única e universal e da mesma forma quando se cria o termo educação do
campo apenas localizando esta educação na sua especificidade ser uma educação
construída pelos trabalhadores do campo; segundo por faz este recorte a partir de uma
consciência de classe, isso é a partir das necessidades de classe, da forma de ver o
mundo de classe, mas é preciso ter um certo cuidado, que ao meu ver o movimento tem
desenvolvido, isto é, o risco de ao pensar um modelo especifico de educação, esquecerse que ele também é universal, que a escola tem o papel de trazer o conhecimento
universal acumulado e mais que isso, ela também como já destacava Paulo Freire ao
mesmo tempo que parte da realidade do indivíduo precisa superar esta realidade, precisa
ir além da mesma.
Se sou puro produto da determinação genética ou cultural ou de classe, sou
irresponsável pelo que faço no mover-me no mundo, e se careço de
responsabilidade não posso falar em ética. Isso não significa negar os
condicionamentos genéticos, culturais, sociais a que estamos submetidos.
Significa reconhecer que somos seres condicionados, mas não determinados
(FREIRE, 2004, p. 26).
Os movimentos sociais que lutam por educação o fazem para não ser apenas receber de
forma passiva o modelo de educação pronto, que inclusive vai contra seus interesses,
pelo contrário, se põe como sujeitos ativos na construção de um modelo educativo
contra hegemônico, isso não significa, que ao lutar por um modelo educativo com
características próprias não estejam lutando pela educação universal, que é resultado da
história universal e humana.
Nossa proposta é pensar a educação do campo como processo de construção
de um processo de educação dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo,
gestado desde o ponto de vista dos camponeses e da trajetória da luta de suas
organizações. Isto quer dizer que se trata de pensar a educação (política e
pedagogicamente) desde os interesses sociais, políticos e culturais de um
determinado grupo social; ou trata-se de pensar a educação (que é um
processo universal) desde uma particularidade, ou seja, desse sujeitos
concretos que se movimentam dentro de determinadas condições sociais de
existência em um tempo histórico. A educação assume sua particularidade,
que é o vínculo com sujeitos sociais concretos, e com um recorte especifico
de classe, mas sem deixar de considerar a dimensão da universalidade antes,
(durante e depois) ela é educação, formação de seres humanos. Ou seja, a
Educação do Campo faz o diálogo com a teoria pedagógica desde a realidade
particular dos camponeses, mas preocupada com a educação do conjunto da
população trabalhadora do campo, e mais amplamente, com a formação
humana (CALDART, 2005, p. 18).
Educação do campo jamais pode ser um debate corporativo, pois ela está inserida no
debate geral da educação, pois não podemos discutir educação do campo sem discutir
um sistema nacional de educação, assim como não é possível pensar um sistema
nacional de educação sem pensar em educação do campo (CALDART, 2005, p. 18), no
entanto, aqui se pretende ir além deste discurso, que ao meu ver deve ser superado e
retomamos Gramsci, que compreende que está na sociedade civil a possibilidade de
romper com a característica reprodutora da sociedade, característica esta que, segundo
ele, apenas está a serviço da reprodução da força de trabalho nos moldes do sistema
econômico vigente e que separa o intelectual do trabalhador manual, daí podemos
concluir, que cabe ao sindicato formar para a educação universal ao mesmo tempo que
luta, neste sentido o MST e outros movimentos que lutam pela terra, ao mesmo tempo
que lutam por melhores condições de vida, estão lutando por uma educação contra
hegemônica, estão formando o intelectual orgânico.
CONCLUSÃO
Não se pode tanto na perspectiva conservadora, considerando-a conservadora, por esta
não reconhecer na sociedade a luta de classes, alguma possibilidade de transformação,
pelo contrário, o próprio Durkheim (2012, p. 45) discorda da afirmação de James Mill
que a educação seria um instrumento para levar o homem a felicidade, ele somente
atribui à educação o papel de dar coesão social e de reproduzir o conhecimento
acumulado pela humanidade, no entanto o próprio admite que a educação é diferente
para os diversos seguimentos sociais, operários, trabalhadores técnicos e de nível
superior. Embora Marx e Althusser partam da perspectiva de classes, onde há
dominadores e dominados, e por compreender que a classe dominante dentro de um
modelo onde a base material é capitalista e, no entanto, desigual não é possível que está
escola burguesa seja transformadora pela mesma ser um instrumento de reprodução
desde modo de produção, em outras palavras do status quo e é em Gramsci que aparece
a escola e a educação na perspectiva transformadora, porém cabe destacar, que somente
no espaço da sociedade civil, no espaço do sindicato, onde a educação pode sim ser
usada para formar intelectuais da classe trabalhadora que possam agir em sentido
diverso dos intelectuais a serviço da classe dominante e do sentido da escola burguesa
que é a de reproduzir a ordem social vigente. É nesta perspectiva que quando a classe
trabalhadora, aqui especificamente cita-se os trabalhadores sem-terra, que pressionam o
Estado por uma escola que não tenha apenas o papel de reproduzir as reações de
produção capitalistas, nem mesmo só por uma escola que tenha como papel ser o agente
da coesão social, mas que tenha o papel de repassar o conhecimento acumeado pela
humanidade, no entanto, a partir dos interesses de classe dos trabalhadores e não
meramente dos interesses de reproduzir o status quo dando assim a educação uma
perspectiva transformadora se e somente se esta educação anda junto com a luta dos
trabalhadores.
REFERÊNCIAS
ALTHUSSER, Louis. Aparelho ideológico do Estado. Rio de janeiro: Graal, 1983.
CADART, Roseli. Elementos para a construção do Projeto Político-Pedagógico da
Educação do Campo. In: Contribuições para a construção de um Projeto de Educação do
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