Balanço Social

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FACULDADE ÍTALO BRASILEIRA
ADRIANA DE SOUZA LIMA
DEBORA CRISTINA APELLE
JOSE AUGUSTO RITTES NETO
PALOMA FARIA PULASTRO
BALANÇO SOCIAL:
RESPONSABILIDADE SOCIAL OU MARKETING?
SÃO PAULO
2003
1
FACULDADE ÍTALO BRASILEIRA
ADRIANA DE SOUZA LIMA
DEBORA CRISTINA APELLE
JOSE AUGUSTO RITTES NETO
PALOMA FARIA PULASTRO
BALANÇO SOCIAL:
RESPONSABILIDADE SOCIAL OU MARKETING?
Trabalho apresentado como parte do processo de
consolidação do PROIN – Projeto Interdisciplinar
de Pesquisa e Desenvolvimento Profissional –
Curso de Ciências Contábeis da IEPAC –
Faculdade Ítalo Brasileira sob a orientação do
Professor José Divanil S. Berbel.
SÃO PAULO
2003
2
"Realizar o Balanço Social significa uma grande
contribuição para consolidação de uma sociedade
verdadeiramente democrática".
(Betinho)
3
Dedicamos este trabalho a nossos professores e
familiares.
4
Agradecemos ao Prof. José Divanil S. Berbel
5
RESUMO
Este estudo, na área de administração, traz como tema de investigação o Balanço Social e,
dentro dele o problema de pesquisa que consiste em avaliar até que ponto este instrumento de
medição tem correspondência direta com a responsabilidade social de uma organização
empresarial. O trabalho parte de uma pequena exposição sobre a Contabilidade, sua
importância e seus procedimentos, passa pela questão da responsabilidade social, de como as
empresas são cobradas hoje no sentido de reverterem benefícios sociais no meio onde atuam,
e finaliza com algumas notações sobre marketing e marketing social até chegar, finalmente à
questão do Balanço Social. Como conclusão à questão formulada, o estudo deixa entender que
faltam meios ou mesmo padronização em relação às formas de execução e apresentação do
Balanço Social, e também que muitas empresas podem se aproveitar do fato para trabalharem
mais com a divulgação do que com ações sociais propriamente ditas. Por outro lado, o estudo
não se esmera em responder à questão formulada, por entender que a própria ação da
coletividade social contra organizações “mal intencionadas” pode, como de fato deverá ser, o
melhor instrumento para avaliá-las negativamente.
6
ABSTRACT
This study, in the administration area, brings as investigation theme the Social Balance and,
inside of him the research problem that consists of evaluating to what extent this mensuration
instrument has direct correspondence with the social responsibility of a managerial
organization. The work part of a small exhibition on the Accounting, its importance and its
procedures, goes by the subject of the social responsibility, of as the companies are collected
today in the sense of they revert social benefits in the middle where they act, and it concludes
with some notes on marketing and social marketing until arriving, finally to the subject of the
Social Balance. As conclusion to the formulated subject, the study let to understand that they
lack means or same standardization in relation to the execution forms and presentation of the
Social Swinging, and also that a lot of companies can take advantage of the fact for they work
more with the popularization than with social actions properly said. On the other hand, the
study it doesn't tidy up in answering to the formulated subject, for understanding that the own
action of the social collective against deliberate organizations evil cannot be, and in fact it
should be, the best instrument to evaluate them negatively.
7
SUMÁRIO
SUMÁRIO
Introdução............................................................................................................................
08
1.Sistema de informação contábil........................................................................................
13
1.1
O que é contabilidade...............................................................................................
14
1.2
Pequeno histórico da contabilidade..........................................................................
15
1.3
Sistemática: Princípios contábeis geralmente aceitos..............................................
16
1.4
Campo de atuação da contabilidade.........................................................................
20
1.4.1 Interesses pelos dados contábeis..............................................................................
21
1.4.2 Finalidades de usos para as informações contábeis.................................................
22
1.5
Limitações do método contábil................................................................................
23
1.6
Conclusões sobre a contabilidade............................................................................
24
2. Responsabilidade Social..................................................................................................
26
2.1
A questão ambiental.................................................................................................
27
2.2
As desigualdades sociais...........................................................................................
28
2.3
A revolução tecnológica...........................................................................................
29
2.4
A globalização..........................................................................................................
30
2.5
A força crescente do terceiro setor...........................................................................
31
2.5.1 O que são organizações do terceiro setor..................................................................
32
2.6
Definindo responsabilidade social............................................................................
35
2.6.1 A espera pelo retorno sobre investimentos em projetos sociais................................
37
3. Marketing Social e Balanço Social.................................................................................
40
3.1.
Do marketing ao marketing social; o balanço social................................................
41
3.1.1 Conceitos de marketing............................................................................................
41
3.1.2 O marketing e a esfera social..................................................................................
43
3.1.3 O marketing social...................................................................................................
44
3.1.4 Marketing social: histórico......................................................................................
47
3.2
49
O cenário atual e o marketing social.......................................................................
8
3.3.
Objetivos das empresas com o marketing social.....................................................
52
3.4
O balanço social.......................................................................................................
59
3.5
Legislação do balanço social....................................................................................
60
3.6
Balanço social: uma realidade?................................................................................
63
3.7
Considerações finais................................................................................................
65
Conclusão...........................................................................................................................
69
Referências.........................................................................................................................
71
Anexos................................................................................................................................
72
9
INTRODUÇÃO
Este trabalho apresenta o resultado de um estudo na área de Ciências Contábeis destacando a importância desta disciplina -, porém com um foco maior na questão do Balanço
Social, ou seja, da “prestação de contas” que as empresas modernas se vêem na contingência
de praticarem, face às novas exigências criadas pelo mercado consumidor e pela sociedade em
geral, notadamente no que diz respeito às questões voltadas para a preservação do meio
ambiente e também para a diminuição das desigualdades sociais.
O Balanço Social, em uma análise bastante simples e direta, pode ser visto como a
resultante de uma cobrança generalizada por parte da sociedade quanto à destinação dos
resultados de todo o progresso tecnológico até o momento construído, no sentido de que o
mesmo não pode continuar sendo visto como um fator de destruição do meio ambiente e,
muito menos, de exclusão social simplesmente. Em outras palavras, ao medir e avaliar as
consequências - os benefícios e/ou malefícios - do progresso industrial, há uma clara
percepção de que, em seu balanço final, não podem ser apontados e pesados apenas os valores
tangíveis para as organizações, quais sejam, os indicativos de sua riqueza material. Essa
percepção leva a entender, finalmente, que a economia de um país ou a economia mundial não
pode mais estar voltada apenas para o crescimento de si mesma, das organizações que a
movem, mas sim de toda a sociedade, sem distinção. Balanço Social, portanto, mais do que a
simples indicações numéricas e tangíveis das ações sociais de uma empresa, significa também
uma forma de buscar o verdadeiro equilíbrio entre o desenvolvimento tecnológico e o
desenvolvimento social. Diante destas considerações preliminares, foi então proposto como
problema de pesquisa, uma avaliação sobre a exata medida em que as informações hoje
10
publicadas no Balanço Social de uma organização qualquer atendem às expectativas dos
usuários da contabilidade e da sociedade em geral.
Por “expectativa da contabilidade” pode ser entendida toda a enumeração de valores –
tangíveis ou não tangíveis – que levam ao crescimento de uma organização empresarial.
Afinal, não se pode pretender que uma organização de tal natureza não objetive lucro e
crescimento em suas ações. Deve, portanto, o Balanço Social, traduzir os meios gerais pelos
quais a organização lucra e cresce, mesmo sem fugir da sua responsabilidade social.
Por “expectativas da sociedade em geral”, entende-se exatamente a possibilidade de
conciliar progresso tecnológico com progresso social. Ou seja, parte-se do princípio de que a
oferta de produtos diversos a uma determinada parcela da população, em detrimento de uma
outra parcela maior, não é exatamente o modelo de desenvolvimento social que se propõe. Se
a isto for somada ainda a questão da degradação ambiental, tem-se então o eixo central da
questão, ou seja, a “expectativa” da sociedade em relação ao modo de ação das organizações.
Contudo, ainda que uma empresa publique o seu Balanço Social e demonstre suas
ações efetivas no sentido de corresponder a estas expectativas, pode pairar uma certa dúvida
quanto à realidade ou mesmo veracidade dos valores apresentados, não exatamente em
relação aos valores propriamente dito – mesmo que isso seja também motivo de dúvidas –
mas sim em relação aos tipos de ações praticados por determinada organização, se estariam
essas ações realmente voltadas para uma prática de responsabilidade social, ou se visariam
apenas a uma estratégia de marketing. A pergunta faz sentido, visto que até mesmo um novo
ramo na disciplina de marketing tem se formado; o chamado “marketing social”, ou seja, um
tipo de marketing voltado para o destaque das ações sociais de uma empresa. No mesmo
sentido ou caminho, se fala também em “marketing verde”, mas isto já pode ser uma outra
11
questão, muito embora sirva aqui como ilustração para o problema que se propõe, qual seja, o
de investigar a natureza última do Balanço Social.
Até que ponto o Balanço Social traduz uma ação social verdadeira, e até que ponto ele
pode ser tomado apenas como uma ação mercadológica? Esse é o problema proposto e para o
qual parece pairar uma hipótese de negação, qual seja, a de que as informações publicadas no
Balanço Social não atendem às expectativas dos usuários. Essa hipótese carece, no entanto, de
uma explicação primária, para que não seja interpretada de forma errônea. Quando se diz que
as informações não atendem às expectativas, refere-se mais à falta de padronização na
elaboração dos Balanços Sociais e – face a essa falta de padronização - pela tendência de sua
utilização como ferramenta de marketing, apenas. Tanto o problema de pesquisa quanto sua
hipótese e o estudo propriamente dito justificam-se plenamente, pois, como se pretende
demonstrar, não foram essas as bases para a criação do Balanço Social, ou seja, os primeiros
movimentos com vistas à sua criação estavam voltados muitos mais – ou até mesmo
puramente – para um sentido de apuração e cobrança de responsabilidade social por parte das
organizações empresariais, e não para que o mesmo servisse de instrumento de marketing,
simplesmente.
Como objetivo geral do estudo teve-se então a preocupação em traçar um perfil da
utilização do Balanço Social, principalmente no Brasil, com vistas a mostrar as razões e/ou
condições para o seu surgimento, e também a forma como o mesmo tem sido implantado e
aplicado em nossas empresas em geral. Dentro deste mesmo objetivo pretende-se então criar
uma gama razoável de conhecimento que possibilite, ao menos, perceber-se as diferenças
entre uma ação verdadeiramente voltada para a responsabilidade social, e outra com fins
puramente mercadológicos.
12
A pesquisa realizada adotou, no entanto, um caráter apenas exploratório. Ou seja, não
se objetivou ir a fundo na questão, investigando detalhadamente os muitos aspectos
envolvidos, nem mesmo adotando o estudo de caso como modelo metodológico. Ao contrário,
optou-se pela construção de uma visão panorâmica da questão, com base em pesquisas
bibliográficas, tendo como meio de informação livros e /ou matérias em geral publicadas em
jornais, revista ou na internet. A princípio, previa-se uma pesquisa de campo, com entrevistas
a profissionais diversos. Esse procedimento metodológico foi, no entanto, abandonado por
duas razões principais: em primeiro lugar pelas próprias limitações do grupo de trabalho. Em
segundo lugar pelas limitações da própria pesquisa de tal natureza. Ouvir vozes de alguns
poucos profissionais ou mesmo levar a efeito um bem elaborado estudo de caso, pode oferecer
indicativos mais aprofundados, mas levam ao pecado de se trabalhar com poucas opiniões,
sem a possibilidade da construção do panorama geral, como era a intenção.
E para traduzir esse panorama geral, tal como foi percebido pelo grupo de estudo,
estrutura-se o trabalho do seguinte modo. No primeiro capítulo, apresenta-se um panorama
geral da Contabilidade, não quanto às suas técnicas, modelos ou qualquer coisa do tipo, mas
sim em função da sua necessidade e importância para a sociedade em geral, independente do
tipo de economia que pratica. No segundo capítulo, constrói-se, ou procura-se construir uma
visão sobre a responsabilidade social e, dentro desta, a responsabilidade social da empresa.
Entende-se, portanto, que responsabilidade social é algo que está, ou pelo menos deveria
estar, no âmago de cada indivíduo e não apenas nas corporações. Por outro lado, entende-se
também que uma corporação ou organização não pode se pretender como algo dotado de vida
própria, longe portanto da obrigação de trabalhar para a sociedade em geral e de a ela prestar
contas. O terceiro capítulo, tratando do Balanço Social propriamente dito visa mostrar seu
surgimento, sua implantação e sua utilização. Ou seja, é dentro deste capítulo que se trata do
problema da pesquisa propriamente dito, com base, porém, nas informações colhidas e nas
13
reflexões aplicadas nos capítulos anteriores. Este capítulo se fecha com as “considerações
finais”, ou seja, com as reflexões do grupo de estudo sobre os resultados apurados.
14
CAPÍTULO I
SISTEMA DE INFORMAÇÃO CONTÁBIL
Para chegar ao objetivo final deste estudo, que é o Balanço Social,
sente-se, em primeiro lugar, a necessidade de entender o que é um
Balanço propriamente dito, para uma empresa. O que este capítulo
pretende mostrar, portanto, ainda que em linhas gerais, são as
características básicas das informações contábeis – Contabilidade -, sua
importância para as sociedades em geral - e principalmente para o
mundo atual -, seus objetivos, suas possibilidades e também limitações,
procurando assim construir uma idéia do que seja um Balanço Contábil,
sem, contudo, entrar em detalhes quanto aos métodos contábeis e/ou
procedimentos, preferindo-se passar aqui apenas uma visão geral.
Quando se fala em Balanço Social, a primeira idéia que aparece é a da empresa
fazendo uma demonstração das suas atividades relacionadas com a prática da
responsabilidade social. Ou seja, é a empresa mostrando suas ações em benefício da sociedade
em geral. Na verdade não é bem assim, pois o Balanço Social, como se terá oportunidade de
demonstrar, ao longo deste estudo, é mais ou menos um “meio termo” entre, por um lado, a
cobrança radical de alguns membros e/ou setores da sociedade quanto a uma demonstração de
responsabilidade social por parte das empresas e, por outro lado, a forma encontrada por essas
empresas para associar suas ações produtivas com a requerida responsabilidade social. O
Balanço Social tornou-se então um misto de “demonstrações contábeis” associadas a
“demonstrações sociais”. Antes de chegar então a esta última questão, ou até mesmo para
poder entendê-la melhor – sob o ponto de vista das organizações empresariais -, torna-se
interessante conhecer antes o que são as “demonstrações contábeis”, ou o que é
Contabilidade.
15
Esse conhecimento, no entanto, não há de ser necessariamente aquele mesmo dos
profissionais de Contabilidade, com seus métodos, suas técnicas e uma infinidade de
pormenores. Para o propósito deste trabalho, basta conhecer desta Ciência aquilo que ela tem
de mais relevante quanto a expressar os valores de uma organização – valores financeiros, no
caso, mas que podem ser traduzidos também em valores sociais.
1.1 O que é Contabilidade
Em um breve resumo - aproveitando o próprio saber enciclopédico (Britannica, 1999)
e também as definições de autores diversos1 -, pode-se conceituar a Contabilidade como a
ciência que estuda e controla o patrimônio, sendo ela um elemento essencial nas tomadas de
decisões de todos os setores direta ou indiretamente envolvidos com a empresa. Porém,
Contabilidade vai muito além do que simples conceitos, e mais ainda do que um mero
departamento de controle do patrimônio da organização. A Contabilidade pode dar um
histórico do passado da empresa, mostrar sua saúde no presente e servir de poderoso
instrumento para projeções futuras, decisões corretivas ou de estratégia. Aquele sabe tirar
proveito dos frios números mostrados nos informes contábeis está muito melhor preparado
para conduzir a empresa – e também o patrimônio pessoal - no caminho certo.
No caso de uma empresa, para que a mesma seja devidamente administrada, há a
necessidade de variados instrumentos colocados à disposição do administrador, de forma a lhe
garantir um certo conhecimento sobre os resultados obtidos; se estão ou não de acordo com o
esperado, ou com o planejado. Este administrador precisa controlar, através de resultados
1
Chiavenato (1993); Iudicibus (1990; Marion (1990 e 1996); Ribeiro (1993); Rossetti (1991).
16
financeiros, as muitas atividades que compõe os negócios de uma empresa, e isso é feito
através da Contabilidade: uma espécie de balanço, ou controle, constante entre todas as fontes
de rendas e as fontes de despesas. Em dias atuais, com o crescente fluxo comercial entre
indivíduos, empresas e nações, surgiu a necessidade de controle das transações que envolvem
dinheiro e mercadorias, de forma muito mais intensa e rápida que em outros tempos. No
entanto, até mesmo nesses outros tempos, registros numéricos de operações contábeis foram
usados por diversas que alcançaram certo grau de desenvolvimento comercial.
Conforme Iudicibus (1990), a Contabilidade, de um ponto de vista mais técnico, é
então o sistema de contas e lançamentos que fornece aferição patrimonial e do fluxo de
transações, produção e renda de uma organização. Assim, o conjunto dessas informações
oferece um quadro da situação econômico-financeira de uma empresa, que com isso passa a
dispor dos dados necessários para tomar decisões referentes à produção. Assim, a
contabilidade não apenas registra o que ocorreu, mas oferece subsídios para previsões e
formulação de expectativas em bases seguras. Contabilidade é também a arte de planejar os
sistemas de contas e lançamentos, bem como de interpretar os registros.
1.2 Pequeno histórico da Contabilidade
Alguns estudiosos do assunto, situam o nascimento da Contabilidade em um tempo
bastante remoto, provavelmente quando os pastores de ovelhas tiveram a idéia de associar
cada um de seus animais a uma “pedrinha”, que podiam então serem guardadas na bolsa ou
mesmo em casa, e servir de instrumento tanto de simples controle da quantidade desses
animais, como também para negociações de trocas por outros animais, e assim por diante.
17
Mas talvez não seja necessário ir tão distante no tempo. Conforme verbete da Enciclopédia
Britannica2, registros numéricos e financeiros foram efetuados pelas civilizações antigas do
Extremo Oriente e do Egito e pelos povos comerciantes do Mediterrâneo, como os fenícios. O
desenvolvimento do comércio na Idade Média acarretou o emprego cada vez mais
generalizado do dinheiro, multiplicou as relações com intermediários e expandiu o crédito,
tornando necessário um sistema de notação mais aperfeiçoado, em que fossem registradas as
duas partidas - despesa e receita - que compõem uma operação.
A mesma fonte informa que um documento encontrado nos arquivos do Vaticano,
datado de 1279, registra as receitas e despesas do papa Nicolau III. Em 1340 já se empregava
na cidade italiana de Gênova o princípio das partidas dobradas. Os princípios fundamentais da
contabilidade foram estabelecidos em 1494 pelo frade Luca Pacioli, de Veneza, e são
absolutamente válidos para os conceitos mais atuais de controle de contas das empresas ou do
estado. Evidentemente, daqueles dias até os momentos atuais, muita coisa mudou e as
necessidades de controle assumiram complexidade maior, fazendo com que os métodos
empregados para a contabilização de bens e valores diversos também se modificasse, criando
e adotando novos meios que passaram a servir de instrumentos contábeis. Chega-se então ao
chamado “sistema contábil” – ou sistemática.
1.3. Sistemática: Princípios Contábeis Geralmente Aceitos
Existe uma conjunto de regras geralmente aceito nos meios contábeis que orienta a
atividade do contador: Princípios Contábeis Geralmente Aceitos. Segundo Iudicibus (1990) e
2
Barsa CD, 2000. Enciclopédia Barsa Multimídia. Verbete Contabilidade.
18
também Marion (1990 e 1996), estes princípios são, normalmente, criados e aperfeiçoados em
países mais desenvolvidos que empregam grandes montantes em pesquisas neste campo,
através das entidades profissionais. A aceitação dessas regras é, com raras exceções,
universal. Os princípios geralmente aceitos surgiram da necessidade de se apresentar uma
linguagem comum para se preparar e interpretar apropriadamente os relatórios contábeis.
Evidentemente que, se cada contador estabelecesse critérios próprios para elaboração dos
relatórios contábeis, não haveria condições de as pessoas interessadas na empresa - cliente,
governo, fornecedor, acionista, etc. - fazerem uma interpretação adequada e uniforme
daqueles relatórios. É importante ressaltar que estas normas, estes princípios não têm a mesma
autonomia que as leis naturais aplicadas na Física ou em outras ciências físicas. Os princípios
contábeis são guias que norteiam todo o processo contábil sem, contudo, ter a autoridade
daquelas leis naturais ou dos princípios universais.
Cada operação efetuada pela empresa produz modificações na propriedade, não
somente em seu valor mas também em sua composição. Assim, se um prédio é comprado,
eleva-se o valor do imobilizado, enquanto decresce o disponível, representado por dinheiro
em caixa ou crédito bancário. Tais mudanças se revelam no sistema de contas e lançamentos,
de acordo com o plano elaborado para os negócios da empresa. Há um princípio contábil
segundo o qual quem recebe deve - é debitado - e quem fornece tem a haver - é creditado.
Numa operação de compra de mercadorias, o almoxarife registra aumento no estoque ou
inventário que tem sob sua responsabilidade, enquanto o tesoureiro desembolsa a importância
correspondente ao valor da transação. Fazem-se dois lançamentos, um débito na conta de
mercadorias e outro a crédito da conta de caixa. Numa operação de venda, faz-se a notação
inversa.
Marion (1996) lembra que essas operações se registram nos livros contábeis substituídos por fichas e, mais atualmente, por arquivos eletrônicos -, surgindo daí a antiga
19
denominação de “guarda-livros”, dada aos técnicos em contabilidade. Os livros constituem o
borrador, no qual todas as operações são registradas à medida que ocorrem. Denomina-se
razão o livro no qual as contas são mantidas em páginas separadas e os lançamentos de
mesma natureza são agrupados. Dele se retiram os demonstrativos mais importantes, como o
balanço e os lucros e perdas. No livro-caixa registram-se todas as operações que envolvem
entrada ou saída de dinheiro, por qualquer motivo. O livro contas-correntes classificam
credores e devedores com quem a empresa mantém negócios a prazo. Letras a pagar é o livro
que registra os títulos de responsabilidade da empresa para com terceiros. Contas a receber
registra os títulos de crédito da empresa. Finalmente, o livro diário, sem maior expressão
técnica, segue ordem cronológica, isto é, seus registros são feitos à medida em que vão
ocorrendo as operações.
As contas do ativo são: imobilizado, para prédios e terrenos, móveis e utensílios;
realizável, para as mercadorias e estoques em geral, e disponível, para o que restar na caixa
em forma de dinheiro ou depósito à vista em bancos. A empresa pode vender uma parte das
mercadorias a crédito sem modificar a composição do realizável, transferindo da conta de
mercadorias para contas a receber. Quando o capital próprio é insuficiente e a empresa toma
emprestado, no passivo aparece, ao lado do capital - não-exigível -, a conta de credores exigível. Um valor equivalente aparece então como caixa, imobilizado, realizável ou como
qualquer outra conta de direitos. Se a empresa comprar a crédito e assinar letras, a conta do
passivo exigível se chamará letras a pagar.
As modificações evidenciadas pelo método contábil não mostram apenas mudança de
denominação, mas igualmente salientam oscilações decorrentes de lucro ou prejuízo. Desse
modo, quando o empresário vende seu produto por um preço superior ou inferior ao que
pagou por ele, modifica-se a relação entre ativo e passivo. Se vende por um preço superior ao
que pagou, ao capital se soma a diferença entre o decréscimo no estoque e o acréscimo na
20
caixa. Se, ao contrário, vende por preço inferior ao de compra, o decréscimo no valor do
estoque é mais elevado do que o acréscimo de caixa. Reduz-se em igual valor o capital,
registrado no passivo não-exigível. O capital cresce - passivo não-exigível - quando mais
recursos são injetados na empresa, registrados no ativo sob qualquer rubrica: dinheiro,
prédios, terrenos, máquinas, utensílios ou mercadorias.
O balanço - Os registros contábeis devem evidenciar todas as transações que afetam a
propriedade, os débitos e o patrimônio. O conhecimento das causas das variações permite aos
administradores da empresa um melhor planejamento e um uso mais eficiente da renda com o
objetivo de elevar o patrimônio. As instituições financeiras, antes de conceder créditos,
pesquisam a posição patrimonial do postulante da mesma forma que uma loja investiga a
ficha cadastral de quem quer comprar à prestação e um locador procura conhecer os
antecedentes do futuro locatário. O governo baseia sua ação fiscal nos demonstrativos
contábeis das empresas. Por isso, planos de contas uniformes são adotados por diversos
países, com idênticas categorias de contas, lançamentos, mesma terminologia e forma de
apresentação de resultados. Além dos objetivos tributários, o governo, para orientação de sua
política econômica, baseia seus planos e programas em dados de produção e atividade
econômica, por setor e por região. O trabalho de consolidação das contas de todas as empresas
de um mesmo naipe se torna muito mais fácil quando os planos de contas são padronizados. O
conhecimento da situação e da estrutura dos diversos setores da atividade econômica se torna
possível pela contabilidade, que estende assim sua função econômico-financeira para
objetivos sociais. A função básica da contabilidade é, portanto, dar a conhecer o efeito de
cada transação sobre o ativo, o passivo e o patrimônio, o que não se pode fazer a cada
operação dado o grande número delas. Assim, as transações são tomadas em bloco, conforme
sua natureza. Um dos demonstrativos levantados periodicamente é o balanço, que mostra de
que forma os recursos estão sendo investidos, se a empresa tem caixa suficiente para atender
21
às necessidades correntes e se há mercadorias bastantes para atender à demanda dos
consumidores.
Relatório contábil – É a exposição resumida e ordenada dos dados colhidos pela
contabilidade. Objetiva relatar às pessoas que se utilizam da contabilidade - usuários da
contabilidade - os principais fatos registrados pela contabilidade em determinado período. Os
relatórios contábeis são também conhecido por informes contábeis. Entre os relatórios
contábeis, os mais importantes são as demonstrações financeiras - terminologia utilizada pela
Lei das S.A. - ou demonstrações contábeis - terminologia preferida pelos contadores mais
conservadores.
1.4 Campo de Atuação da Contabilidade
A contabilidade, na qualidade de metodologia especialmente concebida para captar,
registar, resumir e interpretar os fenômenos que afetam as situações patrimoniais, financeiras
e econômicas seja de pessoa física, de entidade de finalidades não-lucrativas, de empresa, ou
mesmo de pessoa de Direito Público, tais como: Estado, Município, União, Autarquia, etc.,
tem um campo de atuação circunscrito às entidades supramencionadas, o que equivale a dizer,
muito amplo. Na verdade, o desenvolvimento inicial do método contábil esteve intimamente
associado ao surgimento do capitalismo, como forma de mensurar os acréscimos ou
decréscimos dos investimentos iniciais alocados a alguma exploração comercial ou industrial.
Não é menos verdade, todavia, que a economia de mercado e seu florescer foram, por sua vez,
fortemente amparados pelo surgimento e aperfeiçoamento das partidas dobradas, o que
equivale a dizer que se verificou uma interação entre os dois fenômenos. Hoje, o método tem
22
aplicação a qualquer tipo de pessoa, física ou jurídica, com finalidades lucrativas ou não, que
tenha necessidade de exercer atividades econômicas para alcançar suas finalidades mesmo
que tais atividades econômicas não sejam atividades-fim.
1.4.1. Interesses pelos dados contábeis
Os interesses pelos dados contábeis por pessoas que exercem funções de
administradores, diretores e executivos dos mais variados escalões, atingem um grau de
profundidade e análise, bem como de frequência muito maior do que para os demais grupos.
De fato, são eles os agentes responsáveis pelas tomadas de decisões dentro de cada entidade a
que pertencem. Tais decisões visam principalmente ao futuro, mas para se preparar para agir
no futuro é necessário não apenas conhecer detalhadamente o que aconteceu no passado,
como também o que está acontecendo no momento. As informações fornecidas pela
Contabilidade não se limitam ao Balanço Patrimonial e à demonstração de Resultados. Além
destes demonstrativos básicos e finais de um período contábil, a Contabilidade fornece aos
administradores um fluxo contínuo de informações sobre os mais variados aspectos da gestão
financeira e econômica das empresas. O administrador inteligente, que sabe usar a informação
contábil, e que conhece suas limitações, tem em seu poder um poderoso instrumental de
trabalho que lhe permite tomar decisões visando ao futuro com maior segurança, bem como
conhecer a situação atual e o grau de acerto ou desacerto de suas decisões passadas. É
possível, para alguns autores, distinguir dois grandes ramos ou ênfases pelos quais a
Contabilidade pode desempenhar seu papel informativo. A Contabilidade Financeira cujos
relatórios finais básicos são o Balanço Patrimonial, a Demonstração de Resultados e a
Demonstração de Origens e Aplicações de Recursos, teriam maior utilidade ou visaria mais
23
diretamente aos agentes econômicos externos à empresa, assim como aos sócios desligados da
direção, ao passo que a Contabilidade Gerencial, mais analítica, incluindo em seu campo de
atuação também a contabilidade de Custos visaria primariamente à administração da empresa.
1.4.2 Finalidades de usos para as informações contábeis
Embora as finalidades para as quais se usa a informação contábil possam ser
catalogadas de várias formas, existem duas finalidades que são básicas:
Finalidade de Controle. Controle pode ser conceituado como um processo pelo qual
a administração se certifica, na medida do possível, de que a organização está agindo de
conformidade com os planos e políticas traçados pelos donos de capital e pela própria alta
administração. Esta é uma conceituação bem ampla de controle, aceita pelos autores
modernos, em contraste com a definição restrita, que resumia o controle a uma função quase
policial dentro da empresa, única e exclusivamente. A informação contábil é útil ao processo
de controle como meio de comunicação, pois os relatórios podem ser de grande auxílio, ao
informar a organização a respeito dos planos e políticas da administração e, em geral, das
formas de comportamento ou ação que a administração deseja atribuir à organização.
Finalidade de Planejamento. É o processo de decidir que curso de ação deverá ser
tomado para o futuro. Normalmente, o processo de planejamento consiste em considerar
vários cursos alternativos de ação e decidir qual o melhor. Planejamento - que deve ser
diferenciado de simples previsão - pode abranger um segmento da empresa ou a empresa
como um todo. A informação contábil, principalmente no que se refere ao estabelecimento de
padrões ou standards e ao inter-relacionamento da Contabilidade com os planos
24
orçamentários, é de grande utilidade no planejamento empresarial. Mesmo em caso de
decisões isoladas sobre várias alternativas possíveis, normalmente utiliza-se grande
quantidade de informação contábil. O planejamento e o controle de resultados não pode ser
um substituto de uma boa administração; também não é capaz de corrigir os erros de uma
administração incompetente. O que importa é a qualidade dos administradores. O
planejamento e o controle de resultados, embora se apoie em conceitos importantes, constitui
basicamente um instrumento de administração e não pode ser superior ao indivíduo ou grupo
que o utiliza.
1.5. Limitações do Método Contábil
Algo precisa ser dito a respeito das limitações do método contábil, segundo autores
como Iudicibus (1990) e ainda outros. Em primeiro lugar, a Contabilidade não é e nem deve
ser entendida como um fim em si mesma. Isto quer dizer que as informações por ela
fornecidas só terão utilidade desde que satisfaçam às necessidades da administração ou de
outros interessados, e não apenas às do contador. Alguns sistemas contábeis ainda são
elaborados quase sem utilidade para a organização, quando não perniciosos.
Em segundo lugar, a Contabilidade só é capaz de registrar, normalmente, eventos
mensuráveis em moeda quando sabemos que, em quase todas as decisões muitos outros
elementos não – quantitativos devem ser levados em conta para uma decisão adequada. Em
terceiro lugar, muita discussão ainda existe entre Contadores, no que diz respeito a princípios,
a procedimentos de avaliação, bem como a terminologia.
25
O resultado de tais limitações é que os relatórios contábeis não expressam totalmente a
realidade econômica da entidade, mesmo que estaticamente concebida, como muitos possam
julgar, pela exuberante exatidão dos cálculos e somas que vão até centavos. Algumas vezes, a
Contabilidade fornece um retrato algo desfocado ou defasado de uma paisagem empresarial;
não nos devemos humilhar por isso, pois o mesmo acontece com outros métodos analíticos. O
importante é conhecer bem o grau de limitação inerente ao método para não nos iludirmos em
demasia, e, tampouco, iludir os outros com a aparente exatidão de nossos números que, no
fundo, são representações de uma realidade mais complexa.
1.6 Conclusões Sobre a Contabilidade
Supor que a Contabilidade serve apenas para avaliar a saúde financeira de uma
empresa, ou a quantidade de impostos que se deve pagar como carga pelo faturamento é uma
forma bastante simplista e completamente fora da realidade. Para pequenas empresas, ou
mesmo para negócios individuais ainda se pode ver a contabilidade dessa forma, mas paras as
grandes empresas ou organizações, ela tem funções muito mais amplas, dentre as quais uma
delas é a de funcionar como uma espécie de guia, quanto aos rumos a ser tomados pela
administração, no sentido de corrigir eventuais problemas ou mesmo de poder planejar
mudanças e estratégias para aprimorar ainda mais o seu desempenho. Portanto, o
administrador tem na Contabilidade, um instrumento que, se bem interpretado, lhe fornece
todas as condições necessárias para que esse avalie o passado e o presente da empresa e,
também, para que possa projetar seu futuro. Os dados de um balanço ou de um informe
contábil podem conter informações preciosas para um administrador que sabe tirar proveito
deles. Não há maneira de se pensar então, que a empresa caminha com ou sem Contabilidade,
26
embora possa até parecer que a Contabilidade não faz parte nem da produção, nem das
vendas. Mas uma empresa sem a Contabilidade, ou sem um bom administrador que saiba
interpretá-la corretamente, é como um barco à deriva; dificilmente alguém poderia prever seu
rumo.
27
CAPÍTULO II
RESPONSABILIDADE SOCIAL
Seguindo o mesmo procedimento adotado no capítulo anterior, este
capítulo tem como meta apresentar uma visão geral sobre o significado
da “responsabilidade social” para uma organização empresarial. Para
tanto, são apresentadas, ainda que de forma breve, questões
relacionados ao contexto mundial em geral – globalização, meio
ambiente, desigualdade social – como meio de se chegar a uma melhor
compreensão da necessidade que temos da prática de uma melhor
responsabilidade social por parte das empresas.
O que é e a quem cabe a responsabilidade social? Os projetos sociais, a preocupação
com a construção de uma sociedade menos desigual, a preservação do meio ambiente, são
tarefas do Estado, das organizações civis, das organizações empresariais, ou de entidades
especialmente criadas para essa tarefa?
De acordo com Neto e Froes (1999), o conceito empresarial mudou. Os consumidores
também. Respondendo aos anseios dos consumidores que preferem produtos e serviços
oferecidos por empresas socialmente responsáveis, as organizações modernas buscam com
maior frequência uma participação social mais ativa que levem benefícios às parcelas carentes
da sociedade. As empresas que investem em ações sociais também acabam agregando valor a
suas marcas e conquistando uma maior simpatia dos clientes e da sociedade em geral. E fazem
isso por meio de patrocínios, apoios a entidades beneficentes, doações, etc.
Mas para que se processasse essa mudança, um longo caminho precisou ser percorrido,
e o que esse trabalho pretende é exatamente percorrer um pouco desse caminho, buscando
entender as empresas, desde as suas origens até os dias de hoje. Mas não se trata de contar a
28
história ou da administração, como se pode supor, e sim procurar identificar desde quando,
onde e também porquê, as empresas começaram a ter essa preocupação um tanto maior com o
seu papel social, ou mais exatamente, com a sua responsabilidade social.
2.1. A Questão Ambiental
Neto e Froes (1999) chamam a atenção para o fato de que o impacto dos danos cada vez
maiores causados ao meio ambiente provoca um gradativo aumento da consciência ecológica
mundial com repercussões diretas nas empresas e na condução de seus negócios. Os efeitos do
desequilíbrio ecológico provocado por séculos de industrialização aumentam dia-a-dia,
trazendo consequências para toda cadeia de distribuição, que vão desde a extração de matériasprimas, passando pela elaboração dos produtos até a sua distribuição através dos canais. O
efeito estufa, o aquecimento do globo, a elevação dos níveis dos oceanos, a perda de espécies
de plantas e animais, a poluição do ar, da água e da terra, a escassez de energia e dos recursos
naturais, a contaminação dos alimentos e a crise do lixo são problemas que cada vez mais
desafiam e desafiarão empresas e sociedade na busca de soluções.
Desnecessário se faz então discorrer muito mais sobre esta questão, visto que é tema
recorrente em praticamente todas as formas ou meios de comunicação. Porém, faz-se
necessário ter em mente que esta é uma das questões fundamentais – juntamente com a
desigualdade social – que impele a sociedade a olhar com outros olhos as ações das empresas
em geral.
29
2.2. As Desigualdades Sociais
O mundo sempre foi dividido entre ricos e pobres, exceto, obviamente, nas sociedades
comunitárias onde não existe a noção de propriedade e tudo pertence a todos. A diferença
entre ricos e pobres, no entanto, parece nunca ter sido tamanha como a que se aprecia nos
últimos tempos. Diferenças entre países ricos e países pobres, entre homens ricos e homens
pobres. Porém, a pobreza vem aumentando em escala mundial. É um problema que está se
tornando tão grave que já obrigou até a um inédito reposicionamento de tradicionais entidades
financeiras, antes identificadas como as principais causadoras do agravamento da situação.
Um bom exemplo disso – conforme nota em www.focusocial.hpg.ig.com.br - foi dado em
agosto de 1999, pelo FMI - Fundo Monetário Internacional, com o lançamento de sua cartilha
contra a pobreza. Com o nome de "Os Sete Compromissos para o Desenvolvimento
Sustentável" o documento anunciava as novas diretrizes do organismo, que começava a
voltar-se para o combate à pobreza mundial, através de um pequeno roteiro de metas sociais a
serem atingidas no prazo máximo de 15 anos. Segundo a mesma nota, repetindo as palavras
de Michel Candessus, diretor-gerente do referido órgão, à época, "a prioridade agora é
humanizar a globalização (...) finanças e mercados têm a ver com as pessoas, são para as
pessoas, o FMI e os governos precisam ouvir o grito dos pobres". Seguindo a mesma linha,
em setembro de 1999, no lançamento do seu "lnforme de Desenvolvimento Mundial
1999/2000 - Entrando no Século 21" uma espécie de balanço de contas do século, o BIRD Banco Mundial, faz um surpreendente mea-culpa e reconhece que muitas políticas adotadas
nos últimos 50 anos para erradicar a pobreza foram equivocadas. Em muitos casos, reconhece
a entidade, em países da América Latina, como o Brasil, a Argentina e a Colômbia, ao invés
de contribuir para o aumento da produtividade e do crescimento, e a redução da pobreza e da
desigualdade social, aumentaram a vulnerabilidade externa e o desemprego. Na mesma
30
ocasião o Banco Mundial chama a atenção das autoridades públicas e pessoas com maiores
recursos para o perigo do caos social "Mesmo que não tenhamos interesse humano nessas
cifras de pobreza, é preciso dar maior atenção a elas por uma simples questão de interesse
próprio, de auto proteção. Altos índices de pobreza e uma pobreza crescente levam à agitação,
à instabilidade, ao caos – essa foi a conclusão das autoridades que respondem pelo órgão em
questão”.
A mesma fonte informa, ainda, que o BIRD externa também sua preocupação com o
crescimento das populações urbanas, pois, segundo estudos do órgão, nos próximos anos, 80%
das populações dos países em desenvolvimento estarão vivendo em centros urbanos. A
concentração das populações em grandes cidades, cada vez mais violentas, aumentará o fosso
entre as classes; pessoas das classes com renda mais elevada tenderão a se isolar dos problemas
urbanos e a não se interessar em exercer pressão por mudanças que beneficiem toda a
sociedade, segundo avaliação da entidade.
2.3. A Revolução Tecnológica
A revolução tecnológica, vivida principalmente na metade final do século XX, impacta
e transforma rapidamente a vida da humanidade e é uma das principais responsáveis pelo
surgimento de consumidores cada vez mais informados e exigentes. Assim, a ampliação do
acesso à informação com o surgimento das novas mídias - rádio, tv, tv a cabo, internet -; a
redução das distâncias através da sofisticação dos transportes e da melhoria das vias de acesso;
o aumento da expectativa de vida, com o controle e erradicação de doenças e novos processos
de melhoramento e armazenamento de alimentos e o consumo de mais recursos do que toda a
31
humanidade em sua história prévia, faz dos seres humanos da atualidade, consumidores sempre
mais difíceis de satisfazer.
Além de consumidores mais difíceis de satisfazer, são também mais conscientes – ao
menos para uma considerável parcela da população, que detém, de alguma forma, o poder de
decisão. Mas deve-se considerar também que essa parcela consciente, de um modo ou de outro,
acaba exercendo sua influência sobre a massa populacional em geral, canalizando a forma de
pensar e conduzindo assim a sociedade toda para um nível de conscientização e,
consequentemente, de cobrança, muito maior do que em épocas anteriores. Essa cobrança, no
entanto, nem sempre se dá nas formas esperadas ou consideradas normais, pois a violência e a
transmissão de uma sensação de insegurança generalizada, vivida nos grandes centros urbanos,
nada mais é que uma das formas de pressão – justamente a mais indesejada, porém
compreensível, dentro da tamanha desigualdade social criada pelo desenvolvimento
tecnológico mal distribuído em seus benefícios.
2.4. A Globalização
Paralelo à revolução tecnológica o fenômeno da globalização da economia acelera o
movimento de mercadorias, dinheiro e pessoas em todo o mundo, quebrando barreiras e
mercados, acirrando a competição e provocando a homogeneidade de hábitos e costumes; onde
- segundo informe em www.balancosocial.org.br -, as 100 maiores companhias do mundo tem
faturamentos anuais maiores do que o PIB de metade dos países do mundo; 359 companhias
respondem por 40% dos negócios mundiais; As 48 nações desenvolvidas, com 10% da
população mundial, detém 0,3% dos negócios mundiais.
Num ambiente tão desigual,
32
oportunidades e tensões entre empresas e sociedade podem surgir na mesma proporção
exigindo, além de rapidez e sagacidade, u ma atuação mais diferenciada e voltada para o
atendimento de mercados mais específicos.
2.5 A Força Crescente do Terceiro Setor
Conforme Neto e Froes (1999) e também Simone Coelho (2000), é crescente o número
de pessoas e de atividades voltadas para ações que não estão propriamente direcionadas para o
lado corporativo, ou seja, para as relações meramente empresariais com vistas à obtenção de
lucros e acumulação de capital. A cada dia, um número maior de indivíduos toma consciência
de que a sociedade que construímos não aponta para melhores dias, e que é necessário fazerse alguma coisa no sentido de corrigir os erros já cometidos. Instituições como a Igreja, entre
outras, formam um corpo social cujo clamor não se limita ao discurso apenas, mas, pelo
contrário, transforma-se em ações concretas, em cobranças, em tomada de consciência, e
assim por diante. E da mesma forma também que a Igreja, existe uma variedade de
instituições - às vezes grandes, de âmbito mundial, como o Greenpeace, por exemplo, às
vezes minúsculas como muitos lares para idosos ou abrigos para menores, com expressão
apenas local – que têm em comum pelo menos uma característica fundamental: pertencer ao
Terceiro Setor. Essas instituições, ou o Terceiro Setor propriamente dito, formam a força
crescente que vem ganhando cada vez mais espaço, até mesmo no círculo empresarial, ou
seja, nas entidades corporativas. Torna-se interessante, portanto, conhecer um pouco mais
sobre o significado que esta força representa.
33
2.5.1. O que são organizações do Terceiro Setor
Terceiro Setor é um termo normalmente utilizado sempre que se fala em
responsabilidade social e faz então necessário conhecer não apenas o que significam essas
palavras, ou sua junção, mas principalmente o que elas traduzem em termos de uma nova
tomada de consciência em relação aos rumos que se espera sejam dados à sociedade. Num
certo sentido, ou até muito especificamente. Conforme Sina e Souza (1999), o Terceiro Setor é
exatamente isso; uma resposta em termos de construção de uma nova sociedade, pois, tal como
ela está, não é preciso muito esforço para chegar-se à conclusão de que alguma coisa precisa
ser feita, e com urgência, e, talvez, nem seja mais o momento de discutir a quem cabe essa
responsabilidade de transformação social, mas, de modo concreto, averiguar quem, de fato,
está tomando a iniciativa.
Para Simone de Castro Coelho (2000), há algo de óbvio, e que todo mundo vê, qual
seja, a crise atual do Estado no que diz respeito, principalmente, ao seu papel no
desenvolvimento social, e, diante dessa situação em que a riqueza da maioria das nações não
consegue chegar às mãos - ou à mesa - da maioria da população, a autora consegue passar a
idéia de que "política é a arte de descobrir o que é possível, principalmente no que se refere às
soluções para os problemas sociais". E somos obrigados a convergir com ela, de que não
apenas neste, como também em outros aspectos, o Estado falhou, tem falhado, e pouco tem
feito para estreitar o fosso entre os muito ricos, e os que nada têm. Resta à iniciativa privada a
tarefa de se fazer alguma coisa.
Mas, além desses dois setores da sociedade "capazes" de agir em comunhão com o
interesse social de todos, emerge um outro setor que, ao menos na teoria, não tem nem a
"obrigação" imputada ao Estado, nem tampouco o interesse financeiro próprio das empresas. É
34
o chamado Terceiro Setor, organizações que, como diz Simone Coelho (2000), emergem no
seio da sociedade civil, sem ter nenhum fim lucrativo, compostas mormente por voluntários e
que, no Brasil, principalmente, recebem o nome genérico de ONG - Organização Não
Governamental.
Nomenclaturas à parte, o que interessa à autora, e também ao conteúdo deste estudo, é
saber quais das características mais gerais dessas organizações servem como meio para
enquadrá-las num mesmo grupo. Genericamente, a literatura agrupa nessas denominações
todas as organizações privadas, sem fins lucrativos, e que visam à produção de um bem
coletivo. Segundo Coelho (2000, p. 58) o termo "terceiro setor" foi utilizado pela primeira vez
por pesquisadores nos Estados Unidos, na década de 70, e a partir da década de 80 passou a ser
usado também pelos pesquisadores europeus. O termo, para esses pesquisadores, sugere
elementos amplamente relevantes e expressa uma alternativa para as desvantagens tanto do
mercado, associadas à maximização do lucro, quanto do governo, com sua burocracia
inoperante. A autora chama a atenção para que o termo não seja confundido com o setor
terciário da economia, tais como as atividades de serviço, transporte e comunicação, que são,
em suma, tudo aquilo que, na economia, não é indústria ou agricultura. Esse setor terciário é,
certamente, bem mais amplo do que o conjunto de organizações enquadradas como
pertencentes ao Terceiro Setor. Na verdade, diz a autora, Terceiro Setor é uma denominação
mais recente e menos utilizada e os autores que a ela recorrem consideram o mercado como o
primeiro setor e a área governamental como o segundo. Terceiro Setor seria - ou é - então as
organizações que têm características dos dois primeiros.
Na teoria, pelo menos, essas organizações se distinguem das entidades privadas
inseridas no mercado, pelo fato de que não objetivam lucros e, mais que isso ainda, por
responderem, em alguma medida, às necessidades coletivas. Mas, abrindo um parêntesis em
sua explanação, a autora mostra que nem todas as organizações pertencentes ao Terceiro Setor
35
têm fins públicos, ou visam atender às necessidades públicas. É preciso não confundir
"público" e "coletivo", diz ela, pois grande parte do setor é composta por organizações com
fins coletivos privados, como uma organização para observação de pássaros tropicais, por
exemplo. Neste exemplo e também em outros, os cidadãos se associam voluntariamente
também, mas visando objetivos próprios deles mesmos, não têm a pretensão ou mesmo a
obrigação de atender a qualquer interesse comum da sociedade que seja, não estando, então,
voltados para o bem comum, ou para a chamada utilidade pública. Fins públicos só podem ser
atribuídos então àquelas organizações do terceiro setor que produzem bens ou serviços de
caráter publico ou de interesse geral da sociedade. Assim, segundo esse critério, tem-se apenas
dois subgrupos entre as organizações do terceiros setor que cumpririam essa finalidade: as que
prestam serviços públicos e as que advogam direitos de interesse geral e da sociedade.
Essa distinção, por menos que pareça, é muito importante, ao menos quando se trata de
se conceder a essas organizações o título que as consideram de "utilidade pública" e, como
consequência, uma série de isenções fiscais federais, estaduais e municipais, conforme aponta a
autora. Diz ainda, que outros critérios ainda estariam em discussão para o enquadramento ou
não dessas organizações como prestadoras de um serviço público - ainda que em escala
limitada, ou seja, para um pequeno grupo, como o de homossexuais, por exemplo. Mas, em
todo caso, além de não pertencerem ao Estado e não terem fins lucrativos, mais alguns pontos
são importantes para defini-las como do Terceiro Setor, tais como: serem estruturadas; serem
autogovernadas, envolverem indivíduos num significativo esforço voluntário.
Organizações do Terceiro Setor são então aquelas cujas características já foram
apontadas, tais como: Não pertencerem ao setor público; Não pertencerem ao setor privado;
Não ter fins lucrativos; Serem estruturadas e baseadas no voluntariado; e prestarem algum
serviço ou se dedicarem a alguma causa que realmente seja do interesse da coletividade.
36
Fica aqui aberta apenas a questão quanto à classificação daquelas organizações que
atendem apenas uma parte específica da comunidade, e não o seu todo, como no exemplo da
luta pelos direitos dos homossexuais, por exemplo. Mas, apenas como sugestão, pode-se
adiantar que, poucas, ou mesmo nenhuma organização do Terceiro Setor consegue atender à
toda sociedade ao mesmo tempo, ainda que seja aberta e propícia a isso.
2.6. Definindo Responsabilidade Social
Pode-se tentar definir o que é responsabilidade social, perguntado, antes de mais nada,
quais seriam as razões ou as motivações para que uma organização assuma sua
responsabilidade social. O que pode, por exemplo, levar uma empresa fabricante de calçados a
adotar uma escola? Qual a razão estratégica de uma companhia ao destinar parte de seus
recursos para projetos sociais, ligados à educação, meio ambiente, saúde, lazer cultura?
Pelo crescimento de ações empresariais neste campo, chega-se à conclusão que os
motivos não se esgotam no aspecto humanitário. Para autores como Kotler (2000), e também
outros, não se trata apenas de responsabilidade social e sim de social accountability. O termo,
sem tradução direta para o português, é emprestado da Contabilidade e significa a obrigação de
se prestar contas dos resultados obtidos, em função das responsabilidades que decorrem de uma
delegação de poder. É uma prestação de contas ética, exigida pela sociedade. Tentando melhor
explicar, além da necessidade de oferecer bons produtos na forma de bens e/ou serviços, e
demostrar de forma inequívoca sua capacidade em assim proceder, as empresas vêm sendo
cobradas também no sentido de mostrar os resultados social do seu trabalho, ou seja, as
consequências positivas ou negativas da sua atuação para a sociedade. Os mesmos autores
37
atestam também que as corporações, historicamente, não se misturaram com os problemas
sociais, mas que agora têm um senso de um papel a desempenhar na sociedade e não apenas no
mercado. Durante todo o processo de desenvolvimento industrial as empresas têm agido como
que autônomas destacadas do universo social e do próprio ambiente onde atuam. Assim,
exploram os recursos naturais até a sua exaustão, devolvem os resíduos em forma de lixo,
apropriam-se de todo o processo produtivo, principalmente com base na exploração também da
mão-de-obra humana e não se sentem responsáveis por nada disso, nem ao menos com as
desigualdades sociais que tal processo de produção acaba gerando.
O novo papel das empresas vai, inclusive, em socorro delas mesmo, em função do
próprio ambiente que criaram. Assim, responsabilidade social, de forma alguma pode ser vista
apenas como questão de opção humanitária, mas sim de sobrevivência das próprias empresas.
Seria algo um tanto comparado com a relação entre o parasita e o hospedeiro. Se o parasita
mata o hospedeiro, ele acaba morrendo junto, a menos que ache rapidamente um novo
substrato para se manter. E ao que se sabe, ainda não existe tecnologia e nem mesmo condições
econômicas de se transportar empresas para outros planetas.
O termo “parasita” aqui não tem nenhuma conotação depreciativa em relação às
empresas. Serviu apenas como ilustração, para mostrar que as organizações, antes de mais
nada, necessitam manter um clima de boas relações, quer com a sociedade, que com o meio
ambiente. Praticar sua responsabilidade social é, portanto, a forma pela qual as empresas
podem ganhar o respeito do mercado, a dedicação dos funcionários, a satisfação dos
consumidores, os lucros e a perenidade da organização. Fazendo da comunidade um lugar
melhor para se viver, a empresa terá um lugar melhor para fazer negócios. Uma comunidade
saudável é um lugar melhor para vender seus produtos, para instalar seu escritório, para se
estabelecer, para sobreviver, enfim.
38
2.6.1 A espera pelo retorno sobre investimentos em projetos sociais
Que ninguém se anime a crer que as empresas pratiquem sua responsabilidade social
apenas e tão somente pelo senso de responsabilidade propriamente dito. Existe naturalmente
nos meios empresariais uma pergunta sobre qual o retorno que uma empresa pode ter ao
investir em projetos sociais. Como seria feita a medição de um projeto de marketing social, por
exemplo? Na verdade, isto parece ser uma resposta difícil de se obter e existe um consenso de
que fica muito trabalhoso, quando não impraticável, medir o retorno financeiro que uma
empresa teria ao resolver investir em responsabilidade social. Que retorno seria esse? Aumento
no volume de vendas? Aumento no valor de suas ações na bolsa? Ou possível aumento em seus
preços?
Contudo existe uma certeza entre as empresas e que se chama valor corporativo da
responsabilidade
social,
e
isto
pode
ser
medido,
tanto
qualitativamente
quanto
quantitativamente. Diversas empresas têm-se beneficiado de uma gama de resultados
financeiros, incluindo acesso a capital. Conforme Kotler (1998b), estudos recentes realizados
pela Universidade de Harvard apontam que empresas que são responsáveis socialmente
apresentam uma taxa de crescimento quatro vezes maior e um taxa de empregos oito vezes
maior do que as empresas unicamente voltadas para os interesses dos acionistas. Outro estudo,
citado pelo mesmo autor, feito pela University of Southwestern Lousiana chamado "O Efeito
de Relatórios de Conduta Antiética nos Preços das Ações" demonstra que a publicidade sobre
o comportamento antiético corporativo reduz os valores das ações em um prazo reduzido de
seis meses.
Outra razão, aparentemente bastante simples para a prática da responsabilidade social
está diretamente ligada ao meio ambiente. Para o próprio Kotler (1998a), algumas iniciativas
39
de responsabilidade social particularmente ambientais também, podem reduzir custos
drasticamente, cortando gastos e ineficiências, ou aumentando a produtividade. Como
exemplo, pode dizer muitas iniciativas para reduzir a emissão de gases que contribuem para a
mudança do clima do globo terrestre, também, reduziram o consumo de energia, reduzindo o
valor das contas a serem pagas. Muitos programas de reciclagem de materiais reduziram o
desperdício e geraram receita através da venda de material reciclado. Programas internos para
funcionários com objetivos de reduzir o absenteísmo e aumento da retenção de funcionários,
reduzem os custos de contratação e treinamento. Um ponto pacífico com relação às empresas
que têm um papel de responsabilidade social tem a ver com sua reputação e o valor da sua
imagem. O mercado sempre procura estar ao lado de empresas que têm um compromisso com
a sociedade. Uma empresa considerada socialmente responsável pode se beneficiar tanto de sua
boa reputação junto ao público consumidor quanto junto à comunidade financeira e de
negócios, aumentando sua capacidade de atrair investimentos e parceiros.
Um outro ponto destacado por vários estudos sugere que existe um mercado crescente
para as empresas que produzem serviços e produtos e são percebidas como engajadas com a
responsabilidade social. Não só os critérios de preço, qualidade, aparência, gosto,
disponibilidade, segurança e conveniência são atraentes, mas também, existe um desejo
crescente de obter-se produtos que atendam a critérios de produção de forma socialmente
responsável, tendo como consequência as vendas e a lealdade do consumidor. Da mesma
forma, empresas percebidas como compromissadas com o social geralmente têm facilidade
para recrutar empregados. Os índices de retenção também são altos, impactando positivamente
os custos de recursos humanos.
Responsabilidade social é, então, uma forma de ação que produz, no mínimo, duas
resultantes diferentes – mas que no final são uma só. De um lado, responsabilidade social é
contribuir para diminuir os problemas relacionados ao meio ambiente e às desigualdades
40
sociais. De outro lado, é investir na própria sobrevivência da empresa. Fechar os olhos para
esta questão, portanto – se é que alguma empresa ainda consegue fazê-lo em dias atuais – é não
dar a devida atenção a uma clientela cada vez mais consciente e exigente e, em último caso, é
correr o risco de perder essa clientela.
41
CAPÍTULO III
MARKETING SOCIAL E BALANÇO SOCIAL
Para fechar o trabalho, seguindo o mesmo projeto de apresentação, temse neste capítulo uma pequena visão sobre o significado do marketing
social, para então chegar ao objetivo final, que é conhecer um pouco
mais sobre o Balanço Social, com vistas a tentar encontrar a resposta
para o problema apresentado inicialmente, qual, seja, sobre a verdadeira
relação entre o Balanço Social e a responsabilidade social da empresa.
Podemos já ter uma idéia do que seja Contabilidade e de como ela se presta para as
práticas de uma boa administração. Da mesma forma, podemos também já tem uma idéia
sobre o que seja responsabilidade social por parte das organizações empresariais, ou seja, da
necessidade crescente das mesmas em “prestarem contas” dos benefícios sociais que
proporcionam.
A posse deste conhecimento não nos permite, no entanto, supor que já sabemos o
suficiente para associar a idéia de Contabilidade com Balanço Social.
As duas estão interligadas, mas para ir-se de uma à outra há ainda um pequeno
caminho ou, mais exatamente, a necessidade de compreender mais alguns elementos que
entram na composição do Balanço Social de uma empresa; elementos esses que têm a ver,
sobretudo, com as razões pelas quais uma empresa vê-se na contingência de assumir sua
responsabilidade social e também divulgar um “balanço” das suas ações. Esse pequeno
caminho é o que vamos percorrer agora.
42
3.1. Do Marketing ao Marketing Social; O Balanço Social
O marketing social vem ganhando espaço e importância cada vez maiores. Uma razão
para isso, e provavelmente a maior, senão a única, é que as empresas se vêem às voltas com
sérios problemas de sobrevivência no mercado, diante da crescente competitividade que se
acirra cada vez mais entre elas, principalmente em num mundo em que a globalização parece
mesmo ser um processo irreversível, empurrada que é pelos grandes centros econômicos, na
busca desenfreada de novos mercados. Mas como entender o que é marketing social, se a
própria definição ou concepção de marketing já nos ocupa um bom tempo, visto que ela é
bastante ampla e tende a se encaixar em conformidade com cada necessidade específica? É
conveniente, então, antes de adentrarmos na questão do marketing social propriamente dita,
nos determos um pouco a pincelar alguns conceitos de marketing que serão de muita valia para
a perfeita compreensão de todo o restante do trabalho.
3.1.1. Conceitos de marketing
Conforme nos coloca Kotler,
"muitas pessoas pensam em marketing apenas como vendas e promoção.
A razão desta confusão é que todos os dias somos bombardeados com
comerciais de televisão, anúncios em jornais, mala direta e telefonemas
de venda. Alguém está sempre tentando nos vender algo. Parece que não
podemos escapar da morte, dos impostos e das vendas (Kotler e
Amstrong, 1993; p. 2).
43
Mas, como esses mesmos autores sugerem, vender é apenas uma faceta do marketing,
nem sempre a mais importante. E se torna estranho pensar que o fator "vendas" não seja o mais
importante para uma empresa, uma vez que é dessa operação que ela retira as bases para a sua
sobrevivência. Mas esse estranhamento só acontece exatamente pela confusão feita, ou seja,
por se colocar a venda como uma função específica do marketing, ou vice-versa. Mas se fazer
marketing não é exatamente praticar a operação de venda, por outro lado, é exatamente fazendo
marketing que se impulsiona as vendas.
Não é difícil entender. Se uma empresa se ocupa em manter uma linha de bons produtos
ou serviços que satisfaçam adequadamente seus consumidores. Se essa mesma empresa mostra
uma imagem que inspire confiança e que conquiste a simpatia de um maior número possível de
pessoas. Se essa empresa se ocupa ainda de identificar as necessidades dos consumidores, tanto
em nível generalizado quanto específico, ou seja, buscando atender as necessidades especiais
de cada grupo social, de cada faixa etária, etc.
Enfim, se uma empresa se ocupa de manter-se o mais próxima possível do consumidor
e das suas necessidades, essa empresa terá muito mais facilidade que qualquer uma outra para
vender seu produto.
Isto que essa empresa está fazendo nada mais é do que o marketing, ou então, uma
estratégia de marketing que vai ajudá-la a colocar seu produto nas mãos do consumidor. A
operação de vendas, portanto, pode ser identificada como a linha de chegada de toda uma
operação ou estratégia desenvolvida pela empresa para tornar seu produto "vendável". Mas
essa também não é a verdade, pois que para uma empresa realmente empenhada em manter sua
imagem em alta, o seu marketing vai ainda muito além da venda, seja garantindo o produto, ou
seja, orientando o consumidor para a melhor forma de usá-lo, e assim por diante.
44
3.1.2 O marketing e a esfera social
O item anterior permitiu compreender que o marketing pode, em uma visão bastante
simplificada, ser entendido como tudo aquilo que a empresa faz para mostrar ao consumidor
que é muito mais vantajoso para ele consumir o seu produto e não outro. Mas essa é uma visão
muito simplificada e pode-se estender ainda muitas páginas em busca de outras definições,
outros autores e assim por diante. Mas isso não vem ao propósito deste trabalho. O que falta
entender agora é que há muito tempo as empresas já perceberam que as possibilidades de
marketing anteriormente descritas podem ser devidamente ampliadas. Explicando melhor, a
empresa não precisa - e nem mesmo deve - se limitar a ter um bom produto, uma boa imagem e
a garantir a satisfação do cliente mesmo após a operação de vendas. Ela pode ir, ainda, muito
além, identificando-se junto ao consumidor também em outras esferas que não às simples
transações comerciais que executam entre si. Assim, se o consumidor tem uma crença, defende
uma causa, ou luta por algum ideal, a empresa pode se predispor a um ato de comunhão com
esse consumidor, empunhando a mesma bandeira e conquistando de vez a sua simpatia.
Evidentemente que esse é um aspecto que precisa ser explorado com muito cuidado. Nenhuma
empresa pode se identificar com causas específicas que, se por um lado conquista o apoio
irrestrito de uma minoria, por outro se indispõe com a maioria. A idéia é a de que a empresa
pode e deve defender causas gerais e amplas, como aquelas ligadas à preservação do meio
ambiente, ao combate à miséria, ao analfabetismo, e tantas outras causas mais.
A empresa, não se pode esquecer, atua dentro de um contexto social. E se houve um
tempo em que nada delas era cobrado, vistas que eram como símbolos de modernidade e
progresso geral para a humanidade, atualmente muita coisa mudou. Hoje a empresa não pode
mais objetivar apenas o lucro, sem se responsabilizar por aquilo que retira e/ou devolve
45
sociedade, e até mesmo ao meio ambiente. Em vista disso é que muitas grandes corporações e
mesmo médias ou até pequenas empresas se empenham em demonstrar o seu valor social, ou
então a sua preocupação com as questões sociais mais eminentes. Aliando a responsabilidade
social com necessidade de criar e/ou manter uma imagem positiva perante a sociedade em
geral, a empresa começa a dar seus primeiros passos no desenvolvimento de um novo tipo de
marketing, que extrapola em muito, aquele marketing restrito às operações comerciais apenas;
o marketing social.
3.1.3 O marketing social
Em uma definição bastante simples, o marketing social nada mais é que uma resposta
das empresas a si mesmas, como forma de conciliar suas necessidades de marketing com as
cobranças impostas pela sociedade. A associação entre o marketing e o aspecto social apareceu
pela primeira vez em 1971, sendo que o conceito de marketing social foi introduzido por Philip
Kotler. Segundo esse autor, o marketing social "utiliza conceitos de segmentação de mercado,
de pesquisa de consumidores, de configuração de idéias, de comunicação, de facilitação de
incentivos e a teoria da troca, a fim de maximizar a reação do grupo-alvo" (Kotler, 1978).
Em outras palavras, sendo marketing uma forma de ação que parte da empresa, no
sentido de aproximá-la do seu público consumidor, visando obter uma melher aceitação do seu
produto ou serviço, Kotler reafirma então a importância de aplicar os princípios de marketing
também na área social. Em suas obras ou, melhor dizendo, no núcleo dos conceitos que elas
encerram, está a utilização dos métodos desenvolvidos pelo marketing para influenciar as
crenças, os valores e mesmo os comportamentos das pessoas, tudo, evidentemente, planejado e
46
realizado dentro do esquema tradicional do marketing, qual seja, o estabelecimento de
objetivos mensuráveis e a criação de demanda através da utilização das técnicas de
propaganda.
Porém, notadas algumas diferenças básicas entre o marketing tradicional e o marketing
social. Uma delas é que na definição de marketing social não há referência a nenhum dos
principais aspectos do conceito original: nada sobre necessidades ou desejos dos indivíduos ou
grupos. Na verdade, o marketing social começa a aparecer como algo aplicado ao "desejo" ou à
"necessidade" de uma "prática social", nada de produto, nem de empresa, tampouco de
mercado. Tentando traduzir o que isso significa, seria algo como a empresa praticar um tipo de
propaganda onde ela sequer fizesse menção ao seu produto ou serviço, mas sim ao "bem" que
propicia à sociedade. Qualquer simpatia, ou mesmo empatia naturalmente surgida por parte do
consumidor em relação à causa que a empresa está abraçando, e a também natural
predisposição a adquirir dos seus produtos ou serviço, seria mera identificação de idéias ou
ideais. Colocado desta forma, pode-se facilmente inferir que a técnica do marketing social pode
ser utilizada tanto por governos quanto por empresas ou ainda por entidades não
governamentais sem fins lucrativos ligadas ao Terceiro Setor.
Ainda hoje, o marketing social também é compreendido através de uma definição que o
aproxima muito do conceito tradicional de marketing. No livro "Princípios de Marketing",
Kotler afirma que:
"o conceito de marketing social que sustenta a organização deve
determinar as necessidades e desejos e interesses dos mercados-alvos, e
então proporcionar aos clientes um valor superior de forma a manter ou
melhorar o bem-estar da sociedade (...) Segundo este novo conceito de
marketing social, o conceito tradicional de marketing não percebe os
possíveis conflitos entre os desejos a curto prazo dos consumidores e
seu bem-estar a longo prazo (...) o conceito de marketing social exige
que os profissionais de marketing equilibrem três fatores ao definirem
sua política de mercado: os lucros da empresa, os desejos dos
consumidores e os interesses da sociedade" (Kotler, 1993).
47
A nova definição de marketing social, ou marketing societário é uma evolução do
conceito de marketing comercial que leva em conta apenas à empresa com suas metas de
lucratividade e os consumidores com seus desejos e necessidades. O bem-estar da sociedade é
o fator novo, e primordial, que entra em cena. Note-se que este novo conceito tem pouco em
comum com o marketing social tal como foi definido em 1971 por Kotler. Também estão
envolvidos os valores, comportamentos e práticas sociais, entretanto, neste caso, trata-se mais
da ação social da empresa como sujeito e do impacto de suas ações sobre a sociedade, diante de
um cenário de deterioração do meio ambiente, escassez de recursos naturais, excessivo
crescimento populacional, serviços sociais deficientes, aumento da violência e da miséria.
O bem-estar social refere-se à norma que rege as ações sociais das organizações, e à
relação recíproca que se estabelece entre as empresas e a sociedade como um todo.
Tendo ou não encontrado a definição correta para o que seja esse novo "marketing
social", a questão que pode ainda permanecer, entretanto, é até que ponto esse marketing se
aproxima ou se distancias do marketing tradicional, ou, para sermos mais exatos, o que mudou
realmente nas relações das empresas com a sociedade.
Para auxiliar nesse entendimento, convém dar uma "repassada" histórica sobre o
marketing em busca de elementos que nos ajude a caracterizá-lo melhor. Isso será feito no item
seguinte.
3.1.4 Marketing social: histórico
48
Como já adiantado, a primeira "aparição" do termo Marketing Social aconteceu em
1971 - através de Philip Kotler. Mas o princípio que permeia as ações de responsabilidade
social, de caridade e de filantropia, que é a preocupação com uma atuação na sociedade,
praticamente sempre existiu. Nos tempos mais remotos o grupo familiar cuidava dos membros
pequenos, enfermos, deficientes, velhos e órfãos, mas com o crescimento das primeiras vilas e
cidades, as pessoas foram se deslocando para longe de suas famílias e novas formas de auxílio
surgiram ao longo da história.
Em tempos mais recentes – conforme homepage www.balancosocial.org.br - tem-se
alguns fatos marcantes, tais como: No ano de 1982, a Câmara Americana do Comércio de São
Paulo institui o Prêmio ECO de Cidadania Empresarial. Neste mesmo ano, na França, a
obrigatoriedade do Balanço Social passou a valer para empresas com mais de 300 funcionários.
No ano de 1984, foi publicado o primeiro Balanço Social de uma empresa brasileira, a
Nitrofértil. No ano de 1989, Andrew Carnegie publicou o livro "O evangelho da Riqueza",
estabelecendo a abordagem clássica de responsabilidade social das grandes empresas com base
em dois princípios, o da caridade e o da custódia. Na década de 1990, Lester Thurow declarou
que o conhecimento, ou "capital intelectual", era o recurso mais importante de uma
comunidade. Mas era ainda uma visão limitada, pois é o "capital da sabedoria" que favorece o
bem-estar da comunidade com as pessoas se ajudando com esta finalidade. No ano de 1992, o
Banespa publica um relatório completo divulgando todas as suas ações sociais. Neste mesmo
ano, a ECO-92, no Rio de Janeiro, discutiu a importância do meio ambiente e o papel de todos
para preservá-lo. Em 1993, O sociólogo Herbert de Souza (Betinho) lança a campanha nacional
Ação Cidadania contra a Miséria e pela Vida, e conquista a adesão do PNBE - Pensamento
Nacional das Bases Empresariais, fato que marca a aproximação do empresariado brasileiro
com os movimentos sociais do país. No ano de 1997, Betinho introduz o "Balanço Social" e
49
junto com a Gazeta mercantil cria o Selo do Balanço Social para estimular a participação das
empresas. Neste ano ainda, as deputadas Marta Suplicy - atual prefeita de São Paulo -, Maria
da Conceição Tavares e Sandra Starling apresentaram projeto que se transformou na Lei nº
3.116/97, prevendo a obrigatoriedade do Balanço Social para as empresas privadas com 100 ou
mais funcionários e para as demais empresas. Neste ano também, o empresário brasileiro Oded
Grajew cria o "Instituto Ethos" para dedicar-se às causas sociais. Também neste ano, um
estudo realizado pela Walker Research descobriu que 76% dos clientes preferiam
seguir/adquirir marcas de uma empresa ligada a uma boa causa. No ano 1999, no Brasil, 69
empresas publicaram seu Balanço Social. A Câmara Municipal de São Paulo institui o Selo
Empresa Cidadã, premiando e reconhecendo as empresas que praticam responsabilidade social
e publicaram seu Balanço Social.
Além deste pequeno histórico recente, pode-se acrescentar também que com a evolução
dos anos vê-se os papéis do indivíduo, do Estado, da igreja e das empresas assumirem sua
função social. Em vários momentos, principalmente o Estado e a igreja tomam para si a
responsabilidade para com a sociedade e os indivíduos, muito mais como significado de poder
do que efetivamente preocupação social. A igreja católica no Brasil dominou as ações nas
obras sociais até o início do século, quando começaram a surgir as primeiras fundações e outras
entidades de benemerência. Mas a própria sociedade passou a cobrar uma nova postura ética
das empresas, as quais passaram a prestar constas de suas ações, justificando seu objetivo
social, procurando resgatar sua imagem junto aos consumidores e acionistas. Assim, a
sociedade começou a se organizar em associações, sindicatos, clube de investidores e,
consequentemente, as empresas responderam, publicando relatórios com informações de
caráter social - o que seria hoje o Balanço Social. No Brasil, todo este movimento começa a ser
discutido com a criação, nos anos 60, da Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas
50
(ADCE), baseada no princípio de que as organizações, além de produzir produtos e serviços,
possuem a função social em prol do bem-estar da comunidade.
Contudo, a discussão do papel social das organizações no Brasil somente ganhou
destaque na mídia e visibilidade nacional quando o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho,
lançou, em 1997, a campanha de divulgação do Balanço Social. A campanha ganhou força e
adesão com o apoio de lideranças empresariais, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) autarquia do Ministério da Fazenda que fiscaliza as bolsas de valores -, da Gazeta Mercantil e
de muitas outras empresas como a Xerox, Banco do Brasil, Banco do Nordeste, Glaxo
Wellcome, Usiminas, etc. e de suas instituições representativas.
3.2. O Cenário Atual e o Marketing Social
Em www.focusocial.hpg.ig.com.br, são encontradas algumas informações que
permitem construir uma imagem do cenário atual do marketing social. Assim, segundo matéria
disponibilizada na homepage, a rápida e radical mudança no relacionamento entre empresa e
sociedade está gerando um profundo impacto no modo como as empresas fazem e mantém seus
lucros. E muitos são os motivos para esta mudança. Se por um lado, hoje, os cidadãos, cada vez
mais informados e conscientes, esperam que as empresas tenham não só direitos, mas também
responsabilidades para com as sociedades onde e com quem atuam, por outro as empresas
começam a descobrir que ser socialmente responsável pode se tornar uma vantagem
competitiva no seio desta mesma esclarecida e exigente sociedade. Um dos aspectos que não
pode ser relevado é a transformação, em caráter mundial, da visão do papel do Estado. Se antes
o Estado tinha uma atuação interventora, com tentáculos atuando em praticamente todos os
51
aspectos sócio-político-econômicos em cada país, atualmente o que se encontra é uma
redefinição deste modelo intervencionista. O Estado assume, cada vez mais, um papel
regulador, fiscalizador, e menos agesnte, o que torna ainda mais necessária a ação das
empresas. Alguns teóricos, um pouco mais radicais, chegam a afirmar que caminhamos para
um mundo sem governos e sem Estados, liderados pelas empresas, estas sim as grandes
instâncias geradoras de desenvolvimento. Ao lado do encolhimento dos Estados, encontramos
também diversos motivos para a mudança do posicionamento corporativo quanto ao seu
envolvimento com as questões sociais.
Uma análise dos cenários, tanto no nível internacional quanto no nacional, que
influenciam estas relações e onde elas se processam e se inserem pode ajudar na compreensão
de sua dinâmica. No cenário nacional, apesar de, nas últimas décadas, o país ter apresentado
progressos em algumas áreas beneficiando-se da globalização dos conhecimentos, ter
perseguido o avanço da tecnologia e ter conseguido estabilizar a sua moeda, revertendo um
quadro de anos de inflação extremamente alta, no que diz respeito aos aspectos sociais, muito
pouco foi feito. Na verdade em reunião com dirigentes de vários países em 20 de Novembro de
1999, Fernando Henrique expressou que o Brasil é um país que apresenta quadros que sugerem
um grande avanço quando comparado aos países mais desenvolvidos, mas enfrenta graves
problemas sociais que há mais de vinte anos clamam por solução. Problemas como a miséria da
maior parte de sua população, o nível de escolaridade, analfabetismo - 34% da população
analfabeta (IBGE 1991) -, a saúde, a seca do nordeste. Isto, quando comparado ao acesso dos
mais modernos recursos a uma faixa da população cada vez menor, só aumenta o hiato entre
pobres e ricos, criando uma situação de extremos.
Além disso, aos antigos problemas ainda sem solução, juntam-se problemas de toda e
qualquer sociedade moderna avançada como o desemprego e a constante necessidade de
aperfeiçoamento para garantir a empregabilidade, as doenças modernas que consomem
52
dinheiro de pesquisa, a poluição ambiental, a flutuação de preços no mercado internacional de
produtos básicos que compõem a balança comercial da economia, como por exemplo, o
petróleo. A inabilidade dos políticos em resolver problemas tão antigos aponta para uma
profunda incompetência dessa classe que em geral governa segundo seus interesses e tem
sempre como forma de tentar corrigir o problema, o caminho curto de aumento da carga
tributária, mas, sem fechar os vários ralos por onde escoam os recursos públicos. A população
segue a tendência das sociedades mais modernas de envelhecimento e maior expectativa de
vida, aumentando o custo da previdência ao mesmo tempo em que necessita-se cada vez mais
de um menor número de jovens no mercado de trabalho agravado pela falta de especialização e
atividades intensivas em capital. Assim sendo, reduzem-se ainda mais a fonte de recursos da
previdência. Com o aumento da miséria e a falta de perspectiva da população crescem os
problemas sociais relacionados à violência urbana que cada vez mais se alastra para o campo e
cidades menores, antes berço de relativa calma. A falta de incentivo às regiões mais carentes e
improdutividade das terras, principalmente no nordeste, provoca o deslocamento dessa
população para os grandes centros na busca de melhores oportunidades, na maior parte das
vezes frustrada, levando esta população à marginalidade. Lares cada vez menos estruturados
expõem as crianças a ambientes miseráveis a muitas formas de violência. Aumentam os casos
de abusos e maus tratos às crianças.
Com a crescente globalização os problemas ficam cada vez mais expostos à mídia e
crescem os órgãos em defesa da criança, do meio ambiente e de outras minorias. Com a
constante exposição destes problemas e a inabilidade em resolver estes problemas, o Governo
tem, paulatinamente, transferido a solução dessas questões para outros setores. Aumenta o
número de brasileiros que utilizam sua experiência profissional e tempo para se dedicar a
alguma causa social a fim de promover a mudança social e também, movidos pela vontade de
se integrar a um ambiente coletivo. Além disso, a presença de artistas e figuras ilustres
53
favorece o aumento do voluntariado por parte da população em geral. As camadas mais ricas
da população começam, também, a ter consciência de que sua própria segurança está ameaçada
dia a dia pelo crescimento da miséria e a consequente violência, a impossibilidade de manter-se
todo o tempo encastelado e que grades e condomínios fechados não garantem total segurança.
Estima-se que no Brasil 68% das doações são feitas por indivíduos, enquanto 32% são de
pessoas jurídicas. No Brasil, cerca de 16% das pessoas com mais de 18 anos são voluntárias de
projetos sociais em todo o país, aproximadamente 12 milhões de pessoas. As empresas,
também, conscientes das consequências que estes problemas podem causar a seus mercados e
atingidas por todos os meios de comunicação passam a se mobilizar em ações politicamente
corretas.
Paralelamente a isso, cresce a profissionalização no terceiro setor por conta da
associação cada vez maior de empresas a causas sociais. Neste ambiente tornam-se cada vez
mais necessárias e oportunas no mundo e principalmente no Brasil as ações sociais, crescendo
as oportunidades no mercado a este tipo de iniciativa. As empresas atentas ao mercado e a
comunidade a que servem devem ver esta tendência como uma oportunidade de marketing.
3.3 Objetivos das Empresas com o Marketing Social
Ao adotarem comportamentos ou práticas de responsabilidade social, as empresas têm
como objetivos de marketing os seguintes aspectos:
Proteger e fortalecer a imagem da empresa/marca: Em uma economia global, imagem
de marca e reputação estão entre os ativos mais valiosos de uma empresa. Práticas de
marketing, por sua natureza, são altamente visíveis para os consumidores e têm o potencial de
54
fortalecer ou enfraquecer a identidade pública de uma empresa ou de uma marca. Ações de
marketing vistas de forma negativa podem comprometer a marca e sua reputação, mesmo para
uma empresa com mercadorias e serviços de alta qualidade.
- diferenciar a empresa/marca: As companhias utilizam estratégias mercadológicas para
se diferenciar dos competidores. Além dos modelos clássicos de diferenciação - como fornecer
alta qualidade, preços baixos ou serviço mais rápido - muitas empresas estão se voltando para
ações associadas com responsabilidade social corporativa. Outra forma de diferenciação vem
pelo uso crescente de apoio a campanhas de caridade ou a causas defendidas por consumidores.
- gerar uma mídia espontânea: As ações sociais das empresas costumam ter repercussão
na mídia, um espaço espontâneo que gera muito mais credibilidade do que campanhas de
publicidade, cujo alto custo nem sempre tem o retorno desejado.
- formar uma imagem positiva perante determinados grupos sociais: O desenvolvimento
de ações sociais ou o apoio a projetos ligados a causas sociais gera uma visão positiva da
empresa, principalmente em mercados-alvo, com uma eficácia maior do que a de outras ações
de marketing.
- formar um mercado futuro: Como muitas das ações sociais que as empresas
patrocinam estão relacionadas com a redução da pobreza e com a melhoria da qualidade de
vida das populações, elas também estão formando seu público consumidor, garantindo a sua
sobrevivência no longo prazo. Pobreza, instabilidade econômica e política podem interferir no
bom desempenho dos negócios.
- garantir o share no mercado: Uma vez que a utilização do marketing social traz
visibilidade, imagem positiva e mídia espontânea, esta ferramenta auxilia a manutenção do
55
share da marca ou da empresa. Em alguns casos, pode até alavancar este share, impedindo o
avanço dos concorrentes.
- assegurar o patrimônio: Algumas empresas, por estarem localizadas em áreas
extremamente pobres ou violentas, dominadas pelo narcotráfico, decidem investir na
comunidade local como maneira de resguardar a sua segurança patrimonial e a de seus
empregados.
- proteger-se contra ações negativas de consumidores: Consumidores podem acionar,
sozinhos ou em grupos, empresas que venham a ser consideradas irresponsáveis socialmente.
Boicotes são uma ferramenta comum para grupos organizados de consumidores para pressionar
empresas a mudar suas práticas de negócios. Um estudo de 1998 conduzido por cooperativas
de distribuidores baseados na Grã Bretanha apontou para o fato de que 60% dos consumidores
de alimentos evitaram uma loja ou produto que fosse associados com comportamento antiético.
- reduzir riscos e o passivo: Um enfoque pro ativo para produzir ações de marketing
socialmente responsáveis pode permitir à empresa economizar recursos no longo prazo por
evitar multas, recalls, e processos judiciais resultantes de práticas pouco éticas.
- atrair e reter clientes: Um grande número de pesquisas no mundo inteiro vem
revelando que há um crescente número de consumidores que dão preferência, no momento da
compra, a produtos e serviços de empresas vistas como socialmente responsáveis. Um estudo
de 1997, conduzido pela empresa norte-americana Walker Research descobriu que quando
preço e qualidade são iguais, 76% dos consumidores mudariam de marcas ou de varejistas se a
empresa for associada com uma boa causa. Critérios frequentemente citados pelos
consumidores pesquisados são responsabilidade ambiental, marketing social e o não-uso de
trabalho infantil ou de exploração de mão-de-obra.
56
- atrair e reter talentos: Cada vez mais os empregados valorizam empresas que têm
ações de marketing social e que apostam na sua responsabilidade social corporativa. As
pessoas preferem trabalhar em empresas com responsabilidade social porque se sentem mais
respeitadas e integram-se mais às metas do empreendimento.
- controle reduzido: Empresas que demonstram comportamento ético pro ativo no
mercado pode experimentar menos controle e auditoria. Nos Estados Unidos, por exemplo, o
Congresso e as agências administrativas encorajam as empresas a adotar práticas de marketing
social e mecanismos de auto-regulação antes de instituir vigilância regulatória.
- atrair investidores: Existem evidências que muitos investidores individuais e
institucionais são atraídos por empresas guiadas por estratégias de marketing social. Em 1997,
mais de US$ 1 trilhão dos ativos dos investidores americanos estavam em portfólios que
continham ações de empresas com valores éticos e responsabilidade corporativa social.
- dedução fiscal: Muito embora a maioria das empresas que realizam programas de
marketing social afirme que um tratamento mais ameno do fisco não é o seu objetivo ao
iniciar uma ação desta natureza, este aspecto não pode ser ignorado, principalmente num país
com uma carga tributária tão elevada quanto o Brasil. É preciso não nos esquecermos que, por
um bom tempo, a idéia de empresas adotando práticas de responsabilidade social era encarada
apenas como uma forma de fugir dos impostos. Ainda existe uma certa preocupação com a
"pilantropia" empresarial, como ficou conhecida a prática de usar o bem como escudo para
grossa sonegação de impostos.
Marketing social é, portanto:
57
- uma filosofia empresarial que orienta as atividades de negócios rumo a um
comportamento ético, de forma a responder às tensões geradas a partir da relação de
reciprocidade existente entre as empresas e a sociedade;
- um técnica, aplicada pelas empresas, que visa a satisfação das necessidades de seus
público internos e externos e também o bem-estar social, como meio de atingir os objetivos
empresariais, que são, em última análise, o lucro e a própria sobrevivência da empresa.
Retomando o pequeno histórico sobre o descrito no item anterior, e procedendo a uma
investigação sobre a trajetória das ações sociais através do tempo, talvez fique mais fácil
compreender porque o marketing social vem se tornando um termo tão corriqueiro quanto
polêmico nos dias de hoje.
Alguns exemplos de ação social
Alguns exemplos bastante atuais de como as empresas brasileiras praticam o marketing
social. Vejamos:
- A Azaléia mantém escola para seus funcionários e dependentes.
- A Varig estuda um projeto de Milhas para Caridade, no qual os passageiros doam as
milhas para projetos sociais. Além disso, a empresa já adota como prática comum ajudar
pessoas doentes que precisam de tratamento em outra cidade ou país, através da doação de
passagens, e também traz remédios do exterior sem o custo do transporte para pessoas que
dependem destes medicamentos.
- A Sadia patrocina, junto com a Fundação Ford e a Fundação David and Lucile
Packard, o projeto Prefeito Criança, de iniciativa da Fundação Abrinq em parceria com o
Unicef. Prefeito criança é o dirigente municipal que assumiu o compromisso de dar prioridade
58
à infância na sua gestão e está desenvolvendo um conjunto de ações voltadas à melhoria da
qualidade de vida e à construção dos direitos de cidadania das crianças em seu município. Até
o ano de 1999, nada menos que 737 prefeitos já haviam aderido a esse projeto.
- A C&A coloca como parte da sua missão e de sua visão estratégica ações como o
programa Capacitar, que atende a 100 entidades que reúnem 30 mil crianças e adolescentes de
São Paulo. Também fazem parte da estratégia ações como um programa voluntário que reúne
quase mil dos cerca de 7 mil empregados da empresa no Brasil, um código de conduta proíbe o
trabalho infantil entre os fornecedores e autonomia para os funcionários. Há alguns anos atrás a
empresa criou um instituto encarregado de desenvolver atividades sociais em todas as cidades
onde houvesse lojas da rede instaladas. O foco seria a educação de crianças e adolescentes de
baixa renda e o apoio às regiões atingidas por calamidades. A cada ano a C&A investe 4
milhões de dólares em cerca de 350 projetos diferentes.
- por um acordo firmado entre a Embratel e o Instituto Ayrton Senna, parte da tarifa
cobrada pelo DDD é deduzida e destinada a diversos programas do Instituto - entre os quais
estão aqueles que apoiam a educação dos jovens.
- O Boticário já financiou mais de 500 projetos ligados à preservação do meio ambiente
através da fundação O Boticário de Proteção à Natureza.
- A Natura desenvolveu o Crer para Ver, que destina parte das vendas de cosméticos
para a educação. Também "adotou" uma escola pública onde ajudou a treinar professores,
desenvolveu uma campanha de conscientização ambiental e criou uma biblioteca e uma
videoteca. Como resultado a taxa de evasão escolar caiu de 38 para 6,5%.
- A Latasa instituiu uma campanha que troca um certo número de latas de alumínio
vazias por equipamentos escolares.
59
- A Fiat desenvolve, no Rio de Janeiro, um projeto de profissionalização de menores
carentes na Favela do Cajú. O projeto se chama Escolinha Eletromecânica da Recofiat e
transforma meninos, entre 15 e 18 anos, recrutados na própria comunidade, em técnicos em
eletromecânica com o objetivo de formar mão-de-obra para a empresa. O índice de
empregabilidade após o curso chega a 99%. Os meninos são empregados não só nas
concessionárias Fiat como em outras da concorrência. A turma é de 30 alunos. As
concessionárias construíram o prédio da escola, a Fiat entrou com os equipamentos e os
professores são do SENAC e de outras instituições do gênero. Os funcionários se envolvem no
projeto dando aulas, levando palestrantes ilustres à escola, organizando visitas à montadora.
- A Fundação Bradesco destacou-se como a organização empresarial que mais recursos
destinou a projetos sociais, segundo informações da revista Veja. No ano de 1999, a fundação
alocou R$ 96 milhões para estas ações, centrada em educação. Com isso atendeu 103 mil
alunos com 98% de aprovação e um baixíssimo índice de evasão escolar: apenas 2,8%% de
seus alunos abandonam os bancos escolares antes de completarem o curso. A média brasileira é
de 11%.
- O Banco do Brasil desenvolveu em 1992 o BBG Educar, programa de alfabetização
de adultos, que começou com os funcionários alfabetizando o pessoal de apoio. Hoje este
incentivo é dado através do curso de formação de instrutores, que é ministrado pelo centro de
Treinamento do BB, fora do horário de expediente, e é aberto a todos os analfabetos das
comunidades onde o Banco do Brasil atua. Desde sua criação, até o ano de 1999, o projeto já
havia conseguido alfabetizar mais de 31.000 pessoas.
Com se pode ver, atualmente já é possível falar em Marketing Social como uma
responsabilidade social, e as empresas que investem nesta área consideram suas ações sociais
60
no planejamento e orçamento anual. O marketing social praticado pelas organizações ganha
espaço na mídia e se torna uma estratégia de conduta baseada em valores duráveis.
3.4 O Balanço Social
O que é, afinal, o Balanço Social?
"... é um instrumento colocado na mão de empresários para que possam
refletir, medir, sentir como vai tal empresa, o seu empreendimento no
campo social. Trata-se de uma avaliação para medir e julgar os fatos
sociais vinculados à empresa, internamente - empresa/empregados como externamente (empresa/comunidades). Assim, o Balanço Social
atende a todos. Para os dirigentes, oferece os elementos essenciais para
as decisões sobre programas e responsabilidades sociais que a empresa
venha a desenvolver, Os empregados têm a garantia de que as
expectativas cheguem até os patrões de uma maneira sistematizada e
quantificada. Os fornecedores e investidores passam a conhecer a
maneira como a empresa encara responsabilidades em relação ao quadro
humano, o que representa um indicador de como a instituição é
administrada. Todo esse processo chega até os consumidores, que
verificam a qualidade dos produtos. Há uma aproximação entre a
empresa e o mercado consumidor." SOUZA, Herbert de (Betinho).
Empresa pública e cidadã, Folha São Paulo, 26 mar 1997)
A idéia que Betinho lançou é que o Balanço Social funcione como uma radiografia de
como a empresa encara suas responsabilidades públicas. Este é o princípio da empresa-cidadã,
ou seja, aquela que é comprometida com a qualidade de vida da sociedade e que, através do seu
Balanço Social, apresenta os seus investimentos nos mais diversos projetos socioculturais. Ao
publicar o balanço, as empresas recebem um selo que pode ser utilizado em propaganda e
embalagens.
61
A Câmara Municipal de São Paulo instituiu o Selo Empresa Cidadã, um prêmio e uma
forma de reconhecimento às empresas que atuam de forma socialmente responsável na gestão
de seus negócios e a tornam pública através de um Balanço Social. Iniciativa da vereadora
Aldaiza Sposati (PT), o prêmio foi concedido pela primeira vez em outubro de 1999 a mais de
30 empresas, e será entregue a cada dois anos. As empresas vencedoras têm o direito de
estampar o selo em suas embalagens e propagandas.
3.4 Legislação do Balanço Social
Como exposto na página – site – do Ibase, são estes os projetos que circulam nas
esferas Federal, Estadual e Municipal. Conforme se pode verificar, são poucas as propostas de
legislação, o que não significa ausência de atenção a respeito.
Esfera Federal
Projeto de Lei (PL) 3.116/97
Marta Suplicy e outras duas deputadas (Maria da Conceição Tavares - PT/RJ e Sandra
Starling - PT/MG, que terminaram seus mandatos em 31 de janeiro de 1998) apresentaram o
Projeto de Lei (PL) 3.116/97, que criava e tornava obrigatório o balanço social para todas as
empresas públicas e para as empresas privadas com 100 ou mais empregados. Este PL chegou
até a Comissão do Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados em
19.06.1997 e foi arquivado em 01/02/98. O relator foi o deputado Jair Meneghelli (PT-SP).
Este PL foi arquivado de acordo com o artigo 105 do Regimento Interno da Câmara dos
Deputados, que determina que os projetos que não tenham sido aprovados por todas as
62
comissões temáticas (além da Comissão do Trabalho, o projeto do balanço social teria que
passar ainda pela Comissão de Economia, Indústria e Comércio e pela Comissão de
Constituição e Justiça) até o fim da legislatura, sejam automaticamente arquivados quando
inicia-se a próxima.
Projeto de Lei (PL) nº 0032 de 1999
Tramita atualmente na Câmara dos Deputados o PL 032/99, de autoria do deputado
Paulo Rocha - PT/PA. Foi apresentado no dia 03/02/99. Este PL é a reapresentação do PL da
deputada Marta Suplicy. Atualmente o projeto está na Comissão do Trabalho, Administração
e Serviço Público (onde foi apresentado no dia 21/06/99), e um novo relator está sendo
articulado. O relator anterior era o Deputado Roberto Argenta.
Esfera Estadual (Rio Grande do Sul)
PL 32/99 do Dep. Federal Paulo Rocha, que cria o Balanço Social, foi aprovado na
Comissão do Trabalho em 17/11/1999 e seguirá tramitando agora na Comissão de Finanças.
Posteriormente, se aprovada, seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça. Rio Grande
do Sul: Lei nº 11.440, de 18-01-2000 - Projeto de Lei sobre Responsabilidade Social, de
autoria do Deputado Estadual Cézar Buzatto, cujo texto contou com a contribuição deste
Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul, foi transformado na Lei nº
11.440. Esta institui o Balanço Social para empresas estabelecidas no Estado do Rio Grande
do Sul, o qual será assinado por Contador ou Técnico em Contabilidade devidamente
habilitado perante o CRC-RS ao exercício profissional.
Esfera Municipal
Município de São Paulo/SP:
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A Resolução nº 005/98 "Cria o Dia e o Selo da Empresa Cidadã às empresas que
apresentarem qualidade em seu balanço social e dá outras providências". A autoria é da
Vereadora Aldaiza Sposati. Esta Resolução está em vigor e já premiou diversas empresas na
Cidade de São Paulo.
Município de Santo Adré/SP:
O projeto de Lei 004/97, tornou-se a Lei nº 7.672, de 18 de junho de 1998, de autoria
do Vereador Carlinhos Augusto, "Cria o Selo Empresa-Cidadã às empresas que instituírem e
apresentarem qualidade em seu Balanço Social e dá outras providências".
Município de Porto Alegre/RS:
A Lei 8118/98 de autoria do Vereador Hélio Corbelini do PSB "Cria o Balanço Social
das Empresas estabelecidas no âmbito do Município de Porto Alegre e dá outras
providências". Esta lei foi sancionada em 05/01/98 e publicada em 09/01/98 no Diário Oficial.
Município de João Pessoa/PB:
O Projeto de Resolução nº 004/98 do Vereador Júlio Rafael, "Institui o Selo Herbert
de Souza às empresas que apresentarem qualidade em seu Balanço Social e dá outras
providências".
Município de Uberlândia/MG:
A Câmara Municipal de Uberlandia instituiu em novembro de 1999 o "Selo EmpresaCidadã". A proposta foi da vereadora Fátima Paiva - PHS. Decreto Legislativo nº 118 de
11/11/99.
64
3.5 Balanço Social: Uma Realidade?
Para responder à pergunta do título acima, o melhor meio é nomear aqui as empresas
que já publicam seu Balanço Social segundo os critérios sugeridos pelo Ibase. Uma cópia do
modelo do Balanço Social, conforme publicado pelo Ibase em sua homepage3 encontra-se no
Anexo 01, deste trabalho.
As empresas que publicaram seus balanços sociais em 2003 foram:
Acesita - www.acesita.com.br4
Banco do Brasil - www.bb.com.br
Banrisul - www.banrisul.com.br
Belcar Caminhões e Máquinas - www.belcartrucks.com.br
Caesb - www.caesb.df.gov.br
Calçados Azaléia - www.azaleia.com.br
Canguru Embalagens - www.canguru.com.br
Cedae - www.cedae.rj.gov.br
Cia Carris Porto Alegrense - www.carris.com.br
Cia Ind Cataguases - www.cataguases.com.br
Embratel - www.embratel.com.br
Gafisa - www.gafisa.com.br
Grupo Pão de Açúcar - www.grupopaodeacucar.com.br
3
www.balancosocial.org.br
Os endereços das homepages estão transcritos tal como publicados pelo Ibase, ou seja, com o objetivo mesmo
de divulgar as organizações que procuram praticar sua responsabilidade social.
4
65
Inepar - www.inepar.com.br
Intervias - www.intervias.com.br
Marcopolo - www.marcopolo.com.br
Multibrás da Amazônia - www.multibrasam.com.br
Petrobras - www.petrobras.com.br
Previ - www.previ.com.br
Saint-Gobain Canalização - www.saint-gobain-canalizacao.com.br
Samarco - www.samarco.com.br
Sercomtel Celular - www.sercomtelcelular.com.br
Sercomtel SA Telecomunicações - www.sercomtelfixa.com.br
Sul América Seguros - www.sulamerica.com.br
Unimed Ponta Grossa - www.unimedpontagrossa.com.br
Viação Campos Gerais - www.viacaocamposgerais.com.br
Votorantim Celulose e Papel - www.vcp.com.br
A maioria destas empresas receberam também o direito de utilizar o Selo Balanço
Social Ibase/Betinho 2001.
66
3.9 Considerações Finais
Parece ser esse o momento de tentar responder à questão que, de certa forma, serviu
como base para a orientação deste estudo, qual seja, a da verdadeira finalidade do Balanço
Social ou, mais precisamente, até que ponto seus desenvolvimentos e sua aplicação não passam
apenas de mais um instrumento mercadológico, ou seja, mais uma ferramenta de marketing.
De antemão, porém, pode-se adiantar que aqui não se tem a resposta, e tampouco seja
provável que alguém a tenha. Pelo menos não de forma concreta e objetiva, tal como pressupõe
as verdades expostas em um balanço. O Balanço Contábil de uma empresa pode traduzir seus
valores financeiros com extrema fidelidade, mas nem por isso pode-se dizer que é um retrato
fiel da empresa ou em que medida pode de fato situá-la em relação ao seu passado ou futuro.
Os números são fixos, mas as variáveis externas podem ser inúmeras. Um mesmo resultado
financeiro pode então significar uma possibilidade hoje, e outra amanhã. De qualquer forma,
porém, o Balanço Contábil apresenta números, ou seja, resultados palpáveis, tangíveis.
De uma certa forma, o Balanço Social faz a mesma coisa, muito embora os valores que
expressa possam não ser tão tangíveis ou, pelo menos, não serem tão absolutos, no sentido de
que suas análises dificilmente fogem à subjetividade de quem as faz. Assim, a expressão
numérica de uma ação social divulgada por uma empresa, pode significar para os seus
dirigentes algo extremamente positivo e digno, portanto, de funcionar como meio de destaque
para a referida empresa. Mas esse mesmo significado pode não ser apreendido pelos membros
de uma comunidade, para quem, por exemplo, o exemplo traz mais danos ambientais do que
benefícios sociais. Em nada essas interpretações subjetivas e diferentes tiram os mérito da
organização que se preocupa com sua responsabilidade social. Mas, por outro lado, se a
empresa não vê resultado naquilo que faz, também não se entusiasma a continuar fazendo. É
67
como se ela tivesse um excelente produto, mas que não conseguisse promover sua aceitação no
mercado.
E sabe-se muito bem que o simples fato de um produto ser bom não significa sucesso
de venda, nem tampouco boa conceituação no mercado. Para conseguir isso, a empresa
necessita investir na propaganda do mesmo, torná-lo conhecido no mercado, exaltar suas
qualidades, mostrar porque ele é melhor que o concorrente, e assim por diante. Ora, a mesma
coisa acontece então com a responsabilidade social. Se não for devidamente divulgada, não
adianta ser praticada – pelo menos não do ponto de vista da organização, que espera receber
algum retorno com essa prática.
Chega-se então à situação em que, ou a organização parte para a filantropia pura - qual
seja, a ação social pelo simples desejo ou o reconhecimento desse dever – sem esperar receber
nenhum provento em troca, ou então ela exercita a sua prática de responsabilidade social, mas
espera um retorno no mínimo à altura do que investiu. E nesse caso, esse retorno só poderá
realmente ser conseguido se a empresa souber trabalhar a divulgação daquilo que faz para o
benefício social.
A partir deste ponto já é possível perceber, no mínimo, dois caminhos diferentes - já
que poucas, ou talvez nenhuma empresa vai investir em ação social sem a contrapartida
divulgação desta ação; Em um dos caminhos a empresa trabalha o seu marketing social na
exata medida em que pratica a sua responsabilidade social. No outro caminho, ela pode querer
tirar vantagem da situação, e mais publica do que faz, procurando mostrar à sociedade uma
imagem que realmente não possui.
E pode haver ainda uma terceira possibilidade, não incluída entre as anteriores, pelo
desmerecimento que à mesma se deve dar. Trata-se dos casos em que as empresas apenas
“embarcam” na onda do marketing social, sem na verdade praticar nenhuma responsabilidade
68
social. Por mais odiosa que tal perspectiva possa parecer, deve, no entanto, ser vista como uma
possibilidade. Afinal, não são poucas as empresas que anunciam maravilhas sobre seus
produtos, quando sabe que os mesmos estão aquém da qualidade anunciada.
Por isso é que torna-se difícil responder à questão sobre a verdadeira – ou as
verdadeiras – faces do Balanço Social. Uma coisa é certa; o Balanço Social sempre será a
ponta do iceberg chamado marketing social – salvo exceções -, pois é com vista no seu
marketing que a empresa o publica, ainda que o faça sob os ditames ou imposições da lei. A
questão que resta então é determinar a exata relação entre o iceberg e o seu cume. Ou seja, até
que ponto a empresa pode ser “honesta” naquilo que faz em relação àquilo que procura mostrar
à sociedade.
Essa exata relação, por sua vez, poderia ser melhor estabelecida, por meio de uma
padronização do Balanço Social. Ou seja, assim como o Balanço Contábil deve seguir
determinados parâmetros, técnicas e normas para a sua elaboração e divulgação, também o
Balanço Social deveria fazê-lo, o que não acontece de fato, e isto por uma razão muito simples:
o Balanço Social se traduz mais por valores que são difíceis de serem interpretados senão sob a
subjetividade da qual já se falou.
Por outro lado, e para concluir, talvez seja também o momento de se dizer que não há
tanta necessidade de se encontrar uma resposta exata para esta questão. Na verdade, o que se
precisa, é conhecimento a respeito do assunto – tal como o procurado neste estudo, ainda que
apenas em nível superficial. É o conhecimento, ou seja, a conscientização cada vez maior por
parte da sociedade sobre o significado das ações das empresas, da sua contabilidade, da sua
responsabilidade social e, finalmente, do seu Balanço Social – que pode ou não ser apenas um
recurso de marketing –, que vai permitir à sociedade saber distinguir e repugnar toda e
qualquer ação contrária ao verdadeiro espírito da responsabilidade social.
69
E assim como as empresas sentem hoje que não podem mais operar sem a devida
prestação de contas da sua responsabilidade social à sociedade, logo saberão também que não
terão muito sucesso ao pretender mascarar essa prestação de contas.
70
CONCLUSÃO
Este trabalho teve a oportunidade de mostrar alguns aspectos essenciais que fazem
parte das preocupações cotidianas de uma empresa moderna.
O primeiro aspecto refere-se à Contabilidade propriamente dita, que embora não seja
exatamente algo novo na administração, tem, no entanto, recebido uma importância ainda
maior, em tempos de globalização, competitividade e outras questões mais que fazem parte do
contexto do mundo atual.
O segundo aspecto vem exatamente em decorrência deste contexto atual, qual seja, o
da responsabilidade social da empresa face ao ambiente de onde ela retira os seus recursos e
para o qual deve devolver seus benefícios. Este aspecto, uma cobrança relativamente nova por
parte da sociedade em relação às empresas, ganha, no entanto, um significado maior para a
própria organização no sentido de que a prática da responsabilidade social, ao invés de
funcionar como um empecilho ou um problema a mais, passa a ser, na verdade, mais uma
ferramenta de competitividade – e uma poderosa ferramenta, por sinal, na medida em que a
empresa pode se diferenciar das demais exatamente pela maior atenção que ao aspecto social
da sua existência.
O terceiro aspecto é, na verdade, uma junção dos dois anteriores. Com ou sem prática
de responsabilidade social, os objetivos primordiais de qualquer organização empresarial
estão, obviamente, voltados para a obtenção da lucratividade. Esta lucratividade deve ser
medida e mensurada para depois ser apresentada aos investidores como forma de
demonstração das atividades da organização – para essa tarefa existe a Contabilidade. O fato
de praticar sua responsabilidade social, entretanto, não exime a empresa de prestar contas,
71
tanto para seus acionistas e investidores como também para a própria sociedade. Pelo
contrário, é exatamente por meio da prestação de contas que a empresa pode mostrar o seu
esforço e os seus resultados quanto a esses objetivos. Resulta então o Balanço Social que, em
análise bastante simples, é a forma pela qual a empresa, juntando seus dados contábeis
financeiros com seus dados contábeis sociais, faz uma demonstração do quanto se beneficiou
do ambiente onde atua, e do quanto devolveu a esse ambiente em forma de benefícios sociais
– que incluem também os benefícios ambientais ou ecológicos propriamente dito.
Compreendido esses três aspectos, dá-se por alcançados os objetivos primeiros deste
trabalho, que era o de mostrar a Contabilidade, a Responsabilidade Social e o Balanço Social,
tal como são, instrumentos e meios de ação da empresa moderna, que se pretende em dia com
as novas exigências e/ou necessidades sociais.
Se o trabalho não se esmerou na apresentação de dados numéricos – tabelas, gráficos
etc. – como é bem a gosto de todos aqueles acostumados a lidar com questões contábeis e/ou
financeiras, é porque não foi pressentida essa necessidade, levando-se em conta que melhor
que mostrar números, julgou-se mais conveniente expor as razões pelas quais se faz
necessário para qualquer administrador, de qualquer empresa, ter como foco administrativo o
fim das desigualdades sociais, a preservação do meio ambiente, enfim, o bem-estar social
geral.
72
REFERÊNCIAS
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Books, 1993.
COELHO, Simone de Castro Tavares. Terceiro setor: um estudo comparado entre Brasil e
Estados Unidos. São Paulo: Senac, 2000.
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GASPARIAN, Paulo L. Às voltas com o FMI. www.focusocial.hpg.ig. com.br (acesso em
02/11/2003)
IUDICIBUS, Sérgio de (org.) e outros. Contabilidade introdutória 7 ed. São Paulo: Atlas,
1990.
KOTLER, Philip. Marketing para organizações que não visam o lucro. São Paulo: Atlas,
1978a.
KOTLER, Philip e ARMSTRONG, Gary, Princípios de marketing. São Paulo: Printice/Hall
do Brasil, 1993.
MARION, José Carlos. Contabilidade básica. 2 ed. São Paulo: Atlas, 1990.
MARION, José Carlos. Contabilidade Empresarial. 5 ed São Paulo: Atlas, 1996.
NETO, Francisco P. de M. e FROES, César. Responsabilidade Social & Cidadania
Empresarial: a administração do Terceiro Setor. Rio de Janeiro: Qualitymark Ed., 1999.
RIBEIRO, Osni Moura. Contabilidade básica. 16 ed. São Paulo: Saraiva, 1993.
ROSSETTI, José Paschoal. Introdução à economia. 15 ed. São Paulo: Atlas, 1991.
SINA, Amália; SOUZA, Paulo Sérgio Baptista. Marketing Social: uma oportunidade para
atuar e contribuir socialmente no Terceiro Setor. São Paulo: Crescente Editorial, 1999.
SNYDERS, Wilson. H. Caminhos da globalização. www.balancosocial.org.br (acesso em
02/11/2003)
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ANEXOS
Anexo 01 – Cópia do Balanço Social (modelo)
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