Seção de Análise de estruturas lingüísticas-S1 A TRANSITIVIDADE: DA VISÃO TRADICIONAL AO FUNCIONALISMO Lúcia Helena Peyroton da Rocha – UFES – [email protected] Aline Moraes Oliveira – [email protected] LÚCIA HELENA PEYROTON DA ROCHA, brasileira, formada em Licenciatura Plena de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Mestre em Lingüística e Língua Portuguesa pela UNESP, de São Paulo. Doutora em Lingüística e Língua Portuguesa pela UNESP, de São Paulo. Atua como Professora Adjunta, no Departamento de Línguas e Letras da UFES, desde 1990. Faz parte do quadro permanente de docentes do Curso de Pós-Graduação Stricto Sensu em Estudos Lingüísticos da UFES. Ministra disciplinas no Curso de Letras para Graduação, Especialização e Mestrado. As principais disciplinas ministradas são: Lingüística: Estudos Introdutórios; Lingüística – Estudos Sintáticos; Língua Portuguesa: Sintaxe; Variação Lingüística. É membro do Comitê Institucional de Iniciação Científica. Orienta Dissertação, Monografia e pesquisa de Iniciação Científica. ALINE MORAES OLIVEIRA nasceu em 1982, é brasileira. Cursou Licenciatura Plena de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Foi aluna de iniciação científica durante dois anos (2004-2006) da graduação. Atualmente, cursa Pós-Graduação Stricto Senso em Estudos Lingüísticos na mesma Universidade. Atua na área de educação e pesquisa. A TRANSITIVIDADE: DA VISÃO TRADICIONAL AO FUNCIONALISMO A transitividade verbal lato sensu é uma questão bastante controvertida em manuais de gramática da língua portuguesa. É um fenômeno rico e complexo, por isso continua sendo alvo de grandes reflexões ainda hoje. Os traços básicos da definição de verbo transitivo que se encontram em várias gramáticas enquadram-no como verbo de predicação incompleta, que necessita de um complemento para integralizar seu sentido (objeto). Há ainda outras definições arroladas: verbo transitivo é aquele que expressa uma ação que passa do sujeito para o objeto, ou uma ação que se exercita num objeto; ou, também, aquele verbo cuja forma e sentido podem transitar da voz ativa para a voz passiva. Alguns dos autores que assim conceituam o verbo transitivo são: Said Ali (1964), Cegalla (1979), Rocha Lima (1984), Cunha e Cintra (1985), Kury (1993), em gramáticas do português. É importante também ressaltar que o tratamento da língua a partir de frases soltas, descontextualizadas, em que se desconsidera o uso, torna o estudo da transitividade lacunar, vago e um pouco fora da realidade enunciativa. Como se sabe somente uma análise que tome como referência as orações em condições específicas de uso permite tratar dos verbos quanto à predicação. Não é nossa intenção nos colocar contra as proposições das gramáticas normativas, porque entendemos que elas ocuparam um respeitável espaço nas discussões lingüísticas, e ainda hoje são importantes fontes de pesquisa. Temos como objetivo analisar o fenômeno da transitividade, levando em consideração a abordagem funcional da linguagem, que defende os usos efetivos como determinadores de graus de transitividade. Nessa perspectiva, a classificação da transitividade, que na abordagem das Gramáticas Tradicionais (GTs) fica circunscrita aos verbos, passa a ser analisada a partir das cláusulas. Contrariamente à proposição das GTs, sob o viés funcionalista, a língua é concebida como um fenômeno interativo, social e dinâmico, que se adapta continuamente às necessidades comunicativas, e , inevitavelmente, sofre pressões de uso. O ponto de partida deste estudo é perspectiva abordada por Hopper e Thompson (1980), para quem a transitividade envolve uma série de componentes que estão relacionados à efetividade com a qual uma ação acontece. Por exemplo, a punctualidade e a telicidade (ação acabada) do verbo, a atividade consciente do agente (intencionalidade), a referencialidade e o grau de afetação do objeto. Esses componentes co-variam um com o outro, de língua para língua, o que sugere que a transitividade é uma propriedade central do uso da língua. A proeminência gramatical e semântica da transitividade é mostrada como derivada de sua função discursiva característica: a alta transitividade relaciona-se à figura (primeiro plano) e a baixa transitividade ao fundo (segundo plano). Neste artigo, faremos um levantamento das orientações presentes nas gramáticas normativas, faremos menção à abordagem da Teoria de Valências e por fim observaremos a proposta funcionalista para o fenômeno da transitividade. Observaremos a aplicabilidade dos parâmetros preconizados por Hopper e Thompson (1980) em relatos de opinião, que fazem parte do corpus coletado pelo Grupo de Estudos Discurso & Gramática (de agora em diante D&G). Apresentaremos apenas um relato analisado, em função do espaço de que dispomos. VERBO INTRANSITIVO EM GRAMÁTICAS DE LÍNGUA PORTUGUESA Said Ali (1964) considera intransitivos os verbos que não necessitam de outro termo, como viver, morrer, andar, e bem assim aqueles cujo sentido se completa com um substantivo regido sempre de preposição. Se este substantivo tiver a partícula a, usar-se-ão em seu lugar as formas pronominais lhe, lhes. Said Ali considera intransitivos, os verbos comumente classificados como transitivos indiretos, o que nos leva a crer que o que está subjacente a sua proposta é o conceito latino de transitividade (transitivus = que vai além). Nessa perspectiva, seriam classificados como intransitivos, os verbos assistir e obedecer, nos excertos a seguir: 1) O filme “Carlota Joaquina”, de Carla Camurati, ficou sete meses em cartaz e foi assistido por cerca de 100 mil pessoas. (Jornal Folha de S. Paulo). 2) A atual legislação não é obedecida por nenhum dos concorrentes, que organizam suas campanhas num ambiente de cumplicidade mútua e impunidade geral. (Revista Veja).1 Cegalla (1979) elenca como essencialmente intransitivos os verbos sonhar, morrer, amanhecer, durar, morar, viver, ir, vir, chegar, etc. Nessa abordagem, há pelo menos dois problemas: (i) não é boa técnica gramatical classificar o verbo quanto à predicação descontextualizado, ou seja, tal classificação só dever ser feita no contexto frasal; (ii) não é adequado também colocar no mesmo rol verbos de natureza tão diferente. Cegalla (1979) teria de, no mínimo, apresentar aqueles verbos dentro de frases e agrupá-los por semelhanças, assim: morar, vir e ir fariam parte do grupo que exige complemento locativo; e, sonhar, amanhecer, etc. fariam parte de um outro grupo. Cunha e Cintra (1985) consideram verbo intransitivo aquele cuja “ação não vai além do verbo”. Arrolam como exemplo: Sobe a névoa... A sombra desce... (CUNHA; CINTRA, 1985, p. 132). 1 Os exemplos 1 e 2 foram arrolados por Ignácio (2003, p. 51) Rocha Lima (1984) define o verbo intransitivo como aquele que “tem predicação completa”. Vale ressaltar que esse gramático acolhe os verbos ir e morar no capítulo sobre complemento circunstancial, apontando para o fato de esses verbos exigirem um complemento locativo. Tratamento semelhante ao de Rocha Lima (1984) é encontrado na abordagem de Kury (1993) de quem será transcrita a passagem a seguir: Certos verbos de movimento ou de situação (como chegar, ir, partir, seguir, vir, voltar, estar, ficar, morar, etc.), quando pedem um COMPLEMENTO ADVERBIAL DE LUGAR que lhes integre o sentido, embora tradicionalmente classificados como intransitivos, devem ser considerados transitivos, desde que se entende por TRANSITIVIDADE a necessidade de um complemento que vem acabar uma idéia insuficiente em si mesma (KURY, 1993, p. 32. grifos do autor). Kury (1993), ao tratar dos complementos verbais, define o complemento adverbial como o termo de valor circunstancial que completa a predicação de um verbo transitivo adverbial. É expresso por um advérbio, locução ou expressão adverbial. Tendo em vista a multiplicidade de abordagens sobre verbo intransitivo e a pouca abrangência desse estudo nas gramáticas de língua portuguesa, surgiu, para este trabalho, a necessidade de realizar um estudo que mostre com clareza e profundidade o fenômeno da transitividade. Parte-se da hipótese de que tais verbos se dividem em grupos que apresentam diferentes conjuntos de traços. Esses traços os diferenciam em graus de uma possível hierarquia de transitividade que deverá ser estabelecida, a partir da presença ou ausência de traços selecionados como básicos, determinados pela combinatória dentro de cláusulas. A busca da comprovação dessa hipótese será feita a partir da apreciação dos chamados verbos intransitivos dentro do referencial teórico do funcionalismo, “tomando-se a língua como uma atividade social enraizada no uso cotidiano e condicionada por pressões advindas de situações de interação variadas, e a gramática como uma estrutura dinâmica e maleável, que emerge da situações cotidianas de interação” (FURTADO DA CUNHA; SOUZA, 2007, p. 7). VERBO INTRANSITIVO: NA GRAMÁTICA DE VALÊNCIAS A teoria de valências funda-se no pressuposto de que o verbo é o elemento central da oração. Esse princípio da centralidade do verbo2 foi formulado pela primeira vez por Tesnière (1969)3 e se justifica na medida em que é o verbo que determina a estrutura base da oração, tanto no nível morfossintático, quanto semântico. É exatamente esse dinamismo que adquiriu a denominação de valência verbal. Borba (1996, p. 19) concorda com o fato de que As primeiras idéias sobre valência se devem a Tesniére, que é quem parte do verbo como núcleo oracional, tomando-o como uma espécie de pólo imantado, capaz de atrair pólo imantado, capaz de atrair um número (...) variável de pontos de atração capazes de manter esses actantes sob a sua dependência. Ignácio (2002, p. 11O) convida-nos a lembrar que Tesniére Propôs uma nova nomenclatura para os constituintes da oração, chamando ACTANTES os que, segundo ele, funcionam como complementos do verbo (Sujeito, Objeto Direto e Objeto Indireto), e de CIRCUNSTANTES aos Adjuntos Adverbiais. Ao agente da Passiva chamou Contra-Sujeito. Embora coloque o Sujeito4 no mesmo nível sintático do Objeto, reconhece a sua predominância semântica, por isso o denomina de actante de primeiro grau, seguido do Objeto Direto (Actante de segundo grau) e do Objeto Indireto (Actante de terceiro grau). Porém, a proposta de gramática de valências de Borba (1996), a ser usada como suporte para descrição sintático-semântica do léxico, diferencia-se da de Tesniére (1969) já na própria conceituação dada ao termo valência. Assim, valência é a propriedade que tem uma classe de elementos, de poder ligar-se com classes específicas de outros elementos, sendo que esta mesma classe se distingue de outras de mesmo nível sintagmático. Isso amplia o sentido da expressão gramática de valências abrangendo também o regime dos nomes, dos adjetivos e de alguns advérbios. A gramática de valências (de agora em diante GV) é uma gramática de dependências, que se 2 3 Cf. IGNÁCIO, Sebastião Expedito. Análise sintática em três dimensões. Franca: Ribeirão Gráfica, 2002. Cf. TÈSNIERE, L. Élements de syntaxe structurale. Paris, Klincksieck, 1969. baseia na relação estabelecida entre categorias de níveis diferentes, entre elementos básicos (palavras) ou categorias básicas correspondentes aos elementos básicos que (co) ocorrem num contexto. Uma GV se constrói considerando que os itens lexicais da língua ora têm valor absoluto, como caneta, gato e são semanticamente auto-suficentes, tendo necessidade de vinculação nula; ora têm valor relativo, como filho, saudade e são semanticamente incompletos necessitando, portanto, ligar-se a outros para que se realizem plenamente. Uma palavra como caneta vale por si mesma e tem um valor semântico específico; já uma palavra como filho implica outra que completa a expressão filho de. Por isso se diz que itens como filho, pai, genro, vizinho são semanticamente incompletos, por conter uma casa vazia destinada a ser preenchida por outro elemento. Dependendo do número de casas vazias (ou argumentos = As) exigido pelo significado de um item lexical, podemos ter itens avalentes (VØ), como é o caso de gato, ou ter itens de valências um, dois...n, como é o caso de filho que tem valência um (V1). Nesses termos, uma GV só atinge as palavras lexicais -nomes, verbos, adjetivos e alguns advérbios. Uma GV, na visão de Borba (1996), aplica-se também àquelas relações intrafrasais que, mesmo não fazendo parte matriz valencial, elas são necessárias para que os fatos de valência sejam mais bem compreendidos. A TRANSITIVIDADE SOB A PERSPECTIVA FUNCIONAL A transitividade é, tradicionalmente, compreendida como uma atividade transferida de um agente para um paciente, envolvendo, necessariamente, pelo menos dois participantes e uma ação que é tipicamente EFETIVA de algum modo. Como asseguram Furtado da Cunha e Souza (2007), “a transitividade tem sido investigada sob diferentes olhares teóricos, afiliados a correntes formalistas ou funcionalistas” (p. 7). As lingüistas discutem a transitividade, dentro da perspectiva funcionalista, porque “no âmago do funcionalismo está a defesa da posição de a estrutura reflete e é motivada pela função: formas desempenham papéis no discurso, fato que, para os funcionalistas, está subjacente à organização gramatical da língua” (p. 07). Acrescentam que “estudos que se filiam ao funcionalismo buscam identificar as múltiplas possibilidades de manifestação da transitividade em contextos variados de udo da língua, averiguando as motivações funcionais (semântico-pragmáticas, sociais, cognitivas)) subjacentes a cada situação” (FURTADO DA CUNHA; SOUZA, 2007, p. 07). Este estudo filia-se à Teoria funcionalista norte-americana, que vê o fenômeno da transitividade como “uma propriedade contínua, escalar (ou gradiente), da oração como um todo. É na oração que se podem observar as relações entre o verbo e seu(s) argumento(s) – a gramática da oração” (FURTADO DA CUNHA; SOUZA, 2007, p. 29). Por concordamos com essa perspectiva funcionalista, adotamos nessa investigação a proposição de Hopper e Thompson (1980) de que “a transitividade é um complexo de dez parâmetros sintáticosemânticos independentes, que focalizam diferentes ângulos da transferência da ação em uma porção diferente da oração” (FURTADO DA CUNHA; SOUZA, 2007, p. 37). Hopper e Thompson (1980) propõem isolar as partes do componente da noção de transitividade e estudar os modos nos quais eles são tipicamente codificados pelas línguas. Assim, identificam os seguintes parâmetros de transitividade, cada qual sugerindo uma escala de acordo com a qual as cláusulas podem ser ordenadas. Transitividade Alta Transitividade Baixa 01 participantes dois ou mais participantes A e O um participante 02 Cinese ação não-ação 03 aspecto do verbo perfectivo não-perfectivo 04 punctualidade do verbo punctual não-punctual 05 intencionalidade do sujeito intencional não-intencional 06 polaridade da oração afirmativa negativa 07 modalidade da oração realis irrealis 08 agentividade do sujeito agentivo não-agentivo 09 afetamento do objeto afetado não-afetado 10 individuação do objeto individuado não-individuado Quadro 1: Parâmetros de transitividade propostos por Hopper e Thompson (1980). Segundo os autores, cada componente da transitividade envolve uma faceta diferente da efetividade ou intensidade com que a ação é transferida de um participante a outro: 1. Participantes: refere-se à presença de participantes na cláusula (verbo e objeto). 2. Cinese: refere-se à possibilidade de transferência de ação do Agente para o Objeto. Assim algo acontece a Maria em Eu abracei Maria, mas não em Eu gosto de Maria. 3. Aspecto do verbo: relaciona-se à conclusão (verbo perfectivo = ação acabada) ou não de uma ação (verbo imperfectivo = ação inacabada). Em Eu comi o doce, a atividade é completa e a transferência é realizada em sua totalidade; mas em Eu estou comendo o doce, a transferência só é realizada parcialmente. 4. Punctualidade do verbo: refere-se à duração de uma ação, presente sobretudo na semântica do verbo (ação pontual = não-durativa, não-acabada; ação não-pontual = durativa, acabada) 5. Intencionalidade do sujeito: refere-se à volição do sujeito. 6. Polaridade da oração: refere-se ao fato das orações serem afirmativas ou negativas. 7. Modalidade da oração: refere-se ao modo realis (modo indicativo) e modo irrealis (modo subjuntivo). 8. Agentividade do sujeito: refere-se à realização ou não da transferência de uma ação feita pelo sujeito ao objeto. Assim, em George me assustou há um evento perceptível com conseqüências perceptíveis; mas em A pintura me assustou não. 9. Afetamento do objeto: relaciona-se diretamente ao fato do objeto ser afetado pela ação. 10. Individuação do objeto: uma ação pode ser transferida mais efetivamente para um objeto individuado (próprio, humano, animado, concreto, singular, contável e referencial) do que para um não individuado (comum, inanimado, abstrato, plural, massivo e não-referencial). O quadro a seguir especifica mais detalhadamente as propriedades da individuação do objeto. Individuado Não-individuado Próprio Comum Humano, animado Não-animado Concreto Abstrato Singular Plural Contável Massivo Referencial, definido Não-referencial Quadro 2 – Propriedades da individuação do objeto Para Hopper e Thompson (1980), a transitividade oracional relaciona-se a uma função pragmática. O falante/escritor, ao organizar seu texto, é guiado por seus objetivos comunicativos e pela percepção das necessidades de seu interlocutor. Desse modo, o texto apresenta uma distinção entre o que é central e o que é periférico. No processamento satisfatório da comunicação, o falante/escritor orienta o seu interlocutor quanto ao grau de centralidade e de perifericidade de seus enunciados, sejam orais ou escritos. No que se refere à estrutura textual ou aos planos discursivos, essa divisão entre o que é central e periférico compreende a distinção entre figura e fundo, respectivamente. O esquema a seguir evidencia a relação entre a transitividade e a função pragmática de figura e fundo. Transitividade oracional Planos discursivos Alta Figura (central) Baixa Fundo (periférico) A seguir, analisaremos dois relatos de opinião extraídos do D&G. A análise consiste na identificação dos planos discursivos (figura e fundo) e do grau de transitividade das cláusulas nos dois textos. O CORPUS EM ANÁLISE O corpus coletado pelo Grupo D&G, fundado em 1991, é composto de amostras de língua falada e escrita com informantes em quatro cidades brasileiras: Rio de Janeiro, Natal, Rio Grande e Juiz de Fora. Optamos por trabalhar com a amostra da cidade do Rio de Janeiro.A escolha desse material se justifica pela sua representatividade em termos nacionais e também pelos objetivos centrais do grupo. O corpus de análise se constitui de oito (8) relatos de opinião de Informantes de 3º grau e de dezesseis (16) relatos de opinião de Informantes de 2º grau. Desse universo de 24 relatos de opinião observados, mostraremos a análise de apenas um: Relato 1, do ponto de vista tradicional, do ponto de vista da Gramática de Valências, e, por fim, o analisaremos à luz do Funcionalismo. Relato 1 Dados do informante de segundo grau: Informante 12: Dario Sexo: masculino Idade: 20 anos Data da Coleta: oral- 11/93; escrita- sem registro PARTE ESCRITA Relato de opinião Os políticos não fazem nada só querem ganhar dinheiro na custa dos outros sem se preocupar com a situação do povo, pois so pensão em si proprio. Eu acho que isso não vai melhorar nunca se continuar no jeito que está. PROPOSTA DE ANÁLISE DO RELATO ANÁLISE DO PONTO DE VISTA TRADICIONAL Do ponto de vista das gramáticas tradicionais, que concebe a transitividade circunscrita ao verbo, a análise empreendida é a que se apresenta a seguir: Os políticos é o sujeito simples, não é adjunto adverbial de negação, fazer é verbo transitivo direto, nada é objeto direto. Só é adjunto adverbial de exclusão. Querem ganhar tem como sujeito simples: os políticos. Há quem possa analisar como sujeito elíptico. Dinheiro é o objeto direto. O sujeito do verbo preocupar é os políticos. Com a situação do povo é objeto indireto. Pensar tem como sujeito simples os políticos e como objeto indireto: em si próprio. O verbo achar tem como sujeito simples o pronome eu, e como objeto direto: que isso não vai melhorar nunca, que por sua vez é uma oração subordinada substantiva objetiva direta. Isso é o sujeito de vai melhorar. O verbo continuar tem como sujeito isso. ANÁLISE DO PONTO DE VISTA DA GRAMÁTICA DE VALÊNCIAS Dentro dessa perspectiva, a análise parte da centralidade do verbo e observa-se a natureza dos argumentos que com ele se relacionam. Sendo assim, o verbo fazer, no sentido de “efetuar executar” seleciona dois argumentos: um é o sujeito agente e o outro é um complemento, logo o verbo é bivalente. O verbo preocupar, empregado no relato de opinião no sentido de “inquietar-se” indica processo e é bivalente, seleciona os dois argumentos, a saber: os políticos e com a situação do povo. Pensar é um verbo de ação e nesse contexto significa “dirigir o pensamento”, seleciona os dois argumentos: os políticos e em si próprio. Achar é um verbo de ação cujo sentido é “supor, presumir”, seleciona dois argumentos. Neste relato predomina os verbos de valência dois ou bivalente. ANÁLISE DO PONTO DE VISTA FUNCIONAL A análise empreendida à luz do funcionalismo aborda o fenômeno da transitividade, a partir da observação da oração e não apenas do verbo. Na abordagem funcionalista, a transitividade é concebida não como uma característica inerente ao verbo, mas como um fenômeno que se manifesta em toda a oração, uma vez que emerge das relações estabelecidas entre os diversos elementos que a compõem. Informante de segundo grau ( I 12 – 2º grau) – relato 1 1. Os políticos não fazem nada 2. só querem5 ganhar dinheiro na custa dos outros 3. sem se preocupar com a situação do povo6, 4. pois so pensão em si proprio. “O verbo querer, assim como os verbos de cognição e sensação, está semanticamente mais próximo de um estado do que de uma ação: tem sujeito experiencial e seu objeto, mesmo não sendo um paciente afetado, é codificado como objeto prototípico de uma oração transitiva devido a um processo de extensão metafórica.” FURTADO DA CUNHA, M. A.; SOUZA, M. M. A transitividade e seus contextos de uso. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. 6 “uma ação que não ocorreu, ou que expressa um evento hipotético, ou ainda que é apresentada como tendo ocorrido em um mundo não-real, contingente, incerto, é obviamente menos eficaz do que uma ação cuja ocorrência é de fato asseverada como correspondendo a um mundo real. 5 5. Eu acho 6. que isso não vai melhorar nunca 7. se continuar no jeito que 8. está. Aplicação dos parâmetros Parâmetros Part. Cin. Asp.V Punct.V Int.Suj. Polar.Or. Mod.Or. Ag.Suj. Af.Obj. Ind.Obj. T 1 + + - - + - + + + - 6 2 + - - - + + + + - - 5 3 + + - - + - - + + - 5 4 - + - - + + + - - - 4 5 - - - - - - + - - - 1 6 - - - - - + - - - - 1 Amorin (2007) esclarece que Hopper (1991) entende que, a partir de uma perspectiva que leve em conta o estudo de mais de uma língua, pode-se chegar a regularidades emergentes que têm potencial para ser instâncias de gramaticalização: a) categorias como aspecto, número, tempo e caso, comumente morfologizadas em uma língua, podem, em outra língua, ser candidatas a construções gramaticais emergentes. Um exemplo é a gramaticalização de parentéticos epistêmicos, como a expressão I think (eu acho), que assume um estatuto quase gramatical; b) certos tipos de itens lexicais evoluem, tipicamente, para clíticos gramaticalizados e para afixos. Exemplos são os casos de verbos de cópula e de verbos de movimento que se tomam morfemas aspectuais, e casos de nomes locativos que se tornam, eventualmente, afixos casuais. Essas são generalizações que, obtidas a partir de estudos comparativos de mais de uma língua, podem guiar o estudo da gramaticalização numa língua particular. É também no estudo de Amorin (2007) que vimos que além de poder ocasionar mudança de um tipo de sentença complexa para outro, a gramaticalização pode fazer com que uma cláusula complexa se torne uma cláusula simples. Tal fenômeno tem sido observado no emprego dos chamados parentéticos epistêmicos. Hopper e Traugott (1993) fazem referência a esse fenômeno a partir do trabalho de Thompson e Mulac (1991), cujos resultados indicam que verbos de atitude proposicional, tais como think e guess, no contexto de primeira e segunda pessoas do singular, respectivamente, estão sendo usados como parentéticos epistêmicos no inglês. No português brasileiro, ocorre esse mesmo uso com alguns verbos, tais como achar e parecer, no contexto de primeira e terceira pessoas do singular, respectivamente (cf. GALVÃO, 1999; CEZARIO, 2004; GONÇALVES, 2003). Nesse uso, esses verbos têm exibido, tanto no inglês como no português, as mesmas características semânticas e sintáticas. Sobre esse uso, Tomasello (2000) citado por Amorin (2007), ao observar a fala de crianças, destaca que em quase todos os casos do uso dos verbos epistêmicos, as crianças usaram I think (“eu acho”), indicando a própria incerteza delas sobre algo, e elas não usaram a estrutura “achar algo”, nem exemplos como “ele acha”. Essa forma também não foi negada (nenhum exemplo como “eu não acho”), não houve uso de outro tempo senão o presente (nenhum exemplo como “eu achei”), e nenhuma ocorrência da forma com complementizador “eu acho que”. Tomasello (2000) sugere, então, que “eu acho” é relativamente uma frase fixa que significa algo como “talvez”. A criança combina essa frase fixa com alguma oração completa, mas esta combinação não equivale a uma “oração encaixada” como é tipicamente retratado em uma análise mais formal – é mais como uma concatenação, um encaixamento simples desde que o verbo principal (pensar) não esteja realmente agindo como um verbo. Para Amorin (2007), Lehmann (1988), assim como Hopper e Traugott (1993), acentua o papel da gramaticalização na mudança de estatuto de uma cláusula complexa para uma cláusula simples. Segundo o autor, existem dois modos de se reduzir uma sentença complexa a uma sentença simples: (a) a gramaticalização do verbo principal; (b) a dessentencialização da cláusula subordinada. É importante observar que esse processo de redução pode ocorrer tanto na cláusula principal como na subordinada. Nos termos de Lehmann (1988:204), a gramaticalização pode fazer com que o verbo da oração principal se transforme até em um afixo que modifica o significado do verbo da sentença subordinada; com a dessentencialização, a cláusula subordinada torna-se um simples constituinte da cláusula principal, uma vez que essa dessentencialização da subordinada implica perda de algumas das suas propriedades sentenciais (tais como tempo, aspecto, conjugação de pessoa, polaridade etc.) e aquisição de propriedades de sintagmas nominais, tanto morfológicas como distribucionais. Lehmann (1988) afirma que é por meio desse processo que verbos plenos tornam-se modais e auxiliares. O autor acredita que a gramaticalização ocorre nas palavras, por isso, afirma que a cláusula subordinada possui uma relação gramatical com apenas uma palavra da matriz. Salienta que, quando essa palavra é um verbo, a gramaticalização da palavra superordenada produz tipos de estruturas subordinadas especiais. “Hopper e Thompson associam a transitividade a uma função discursivo-comunicativa: o maior ou menor grau de transitividade de uma sentença reflete a maneira como o falante estrutura o seu discurso para atingir seus propósitos comunicativos” (FURTADO DA CUNHA; COSTA, 2003:38). A partir disso, fica evidente que a pragmática é um fator preponderante nesse tipo de trabalho, sobretudo quando se trata de transitividade oracional. Nesse sentido, a organização de um texto é determinada, em parte, pela percepção das necessidades de seu interlocutor, assim, aparece no texto tantos elementos centrais quanto periféricos. “Em termos de estrutura de texto, ou de planos discursivos, a divisão entre central e periférico corresponde à distinção entre figura e fundo” (FURTADO DA CUNHA; COSTA, 2003, p. 38). Trabalha-se com o pressuposto de que o grau de transitividade de uma oração reflete sua função discursiva característica. Dessa forma, as orações com transitividade alta correspondem a porções centrais do texto – figura e, conseqüentemente, as orações com transitividade baixa delimitam as idéias periféricas – fundo. Na análise empreendida, as orações que apresentam mais de cinco sinais (+) correspondem às orações que trazem as informações mais centrais - figura e as que apresentam mais de cinco sinais (-) correspondem aos trechos que carregam informações periféricas – fundo. Percebe-se que há uma correlação significativa entre a marcação dos parâmetros da transitividade e a distinção de figura e fundo, e ainda, que há uma estreita relação entre a representação sintática da sentença e intencionalidade discursiva. PRIMEIRAS CONCLUSÕES A (in)transitividade tem sido estudada sob várias perspectivas. Do ponto de vista tradicional, esse fenômeno é considerado apenas uma propriedade diretamente ligada ao verbo, conforme já falamos anteriormente. Posição um pouco diferente pode ser verificada na abordagem da Gramática de Valências, a partir da proposição de Tesnière, a quem se atribuem as primeiras noções de valência, visto que foi ele que difundiu, sistematicamente, o conceito de valência verbal, como sendo a relação entre o verbo e o número de elementos que preenchem suas casas vazias. É importante dizer que na perspectiva da Teoria de valências, os verbos auxiliares não foram considerados. Ignácio (2002, p. 120) assegura que o conceito de valência verbal se aproxima dos conceitos de regência e transitividade verbais, embora reconheça a maior abrangência no conceito de valência. Para ele, esse conceito permite rediscutir a nomenclatura tradicional dos elementos que completam o sentido do verbo. Na perspectiva valencial, além dos complementos obrigatórios na organização oracional, em que se tem objetos e sujeito, incluem-se os chamados complementos circunstanciais. Ressalta-se, ainda, que valência é uma propriedade que se detecta no funcionamento do verbo, em sua realização discursiva. Ou seja, não é uma propriedade dada aprioristicamente, mas que surge das e nas relações enunciativas. Diferentemente dessa visão, o modelo teórico norteador deste estudo, concebe a transitividade como uma propriedade que se manifesta ao longo do discurso. Logo, dentro desse pressuposto, cada elemento de uma frase exercerá um importante papel quanto à significação do todo. Assim, a transitividade é concebida como uma propriedade discursiva, conforme destaca Almeida (1999). Ao citar Cezario (2001), reforçamos a idéia de que A abordagem funcionalista estuda a estrutura gramatical inserida na situação real de comunicação, considerando o objetivo da interação, os participantes e o contexto discursivo. Procura nesses elementos a motivação para os fenômenos investigados. Dessa forma, os funcionalistas não concebem a língua como uma entidade autônoma, uma vez que fatores sociais, cognitivos, históricos, dentre outros, podem influenciar na forma de se codificar a informação. A partir da análise do relato de opinião, é possível observar que as cláusulas identificadas no plano da figura apresentam um alto grau de transitividade. Esses resultados comprovam, ainda, a proposição de Hopper e Thompson (1980) no que se refere à gradação da transitividade. Esta não se limita apenas ao verbo, mas estende-se a toda cláusula. Considerando o contexto pragmático em cada um dos textos, é possível observar que os planos discursivos destacam os enunciados centrais no plano da figura e os enunciados periféricos, no plano de fundo. Assim, as informações fundamentais aparecem em evidência, isto é, em primeiro plano, enquanto as informações complementares ficam em segundo plano. Vale ressaltar que este trabalho encontrar-se em andamento, por isso toda observação ou sugestão é muito bem vinda. Em função do espaço de que dispomos, apresentamos a análise de apenas um relato de opinião. Ainda assim, podemos destacar que os planos discursivos (figura e fundo), assim como a transitividade, também precisam ser concebidos em termos de um continuum, cujos pólos seriam a superfigura, do lado mais saliente ou relevante, e o superfundo, do lado mais difuso ou vago (TOMLIN, 1987; SILVEIRA, 1991). Referências ALMEIDA, M. J. A. de. Transitividade, ergatividade e a ordem verbo-sujeito no processo de aquisição do português. 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