A má gerência da crise econômica no Brasil MÁRCIO POCHMANN Desde a Grande Depressão, no final da década de 1920, o Brasil não apresentava sinais de crise tão largos e profundos. Com o fim do período conhecido por milagre econômico, na primeira metade dos anos 70, o país encerrou um dos mais exitosos ciclos de expansão produtiva ocorridos na periferia do capitalismo mundial. A evolução dos investimentos reflete, com exatidão, a presença de uma fase histórica de considerável expansão da produção nacional. Ainda que distintas composições do Produto Interno Bruto (PIB) -ao longo dos anos- possam obscurecer as diferentes realidades econômicas, percebe-se a existência de pelo menos dois períodos absolutamente distintos em termos de performance econômica brasileira (ver gráfico). O primeiro período de forte expansão econômica ocorreu entre as décadas de 1930 e 1970 e o segundo período de crise da economia nacional vem se desenvolvendo desde 1980. Em relação a isso, a desaceleração dos investimentos como proporção do PIB indica uma contínua perda do potencial de crescimento produtivo. Depois de chegar a representar mais de um quarto do PIB durante a primeira metade da década de 1970, o volume agregado dos investimentos passou a apresentar uma tendência de queda, somente contrabalançada por três curtos e circunstanciais momentos. O primeiro, entre 1977 e 1980, refletiu o esforço de realização do 2º PND pelo governo Geisel; o segundo momento, entre 1984 e 1986, ocorreu a partir da recuperação da economia conjugada com o Plano Cruzado; e o terceiro momento, entre 1993 e 1995, se deu por intermédio de uma nova recuperação das atividades econômicas até o início do Plano Real. Não é trivial lembrar que por meio do crescimento econômico sustentável há condições objetivas, não apenas para alcançar uma significativa melhora no padrão de vida da população, como também para tornar provisória a disparidade socioeconômica gerada -uma das principais metas do programa histórico da social democracia. Sem expansão dos investimentos e, por consequência, da produção, a estrutura do presente passa, cada vez mais, a impedir que o futuro melhor seja, de fato, concretizado para o conjunto da população. Para que 1999 não se torne o ano do desemprego e da consolidação da segunda década perdida, o Brasil precisaria contar com personalidades capacitadas para uma melhor administração da crise econômica, seja por meio da abertura de caminhos compensatórios aos segmentos mais frágeis, seja por meio de atalhos que resultem em alternativas para o desenvolvimento nacional. Em vez disso, as autoridades governamentais parecem preferir negar ao Brasil a sua condição privilegiada de liderança econômica latino-americana, em nome do atrelamento, cada vez mais passivo e subordinado, à desordem mundial. A realização de grande parte do receituário proveniente do Consenso de Washington (privatizações, abertura comercial, desregulamentação financeira e flexibilização do mercado de trabalho) no Brasil não interrompeu o continuado agravamento da crise econômica. Mesmo após a recente concretização de um vergonhoso acordo com o FMI e da aprovação de grande parte do pacote fiscal, não surgiram as tão esperadas melhoras no comportamento geral da economia nacional. Até agora, ao que parece, nem as metas acertadas com o Fundo são passíveis de ser totalmente alcançadas, tal é o nível de má gerência da crise econômica. Com o lançamento de mais um pacote fiscal, no feriado de fim de ano, tornaram-se ainda mais claros os sinais de fragilidade da economia e de seu encaminhamento para a recessão. A atual condução da política macroeconômica não cria sólidas condições para a superação da já longa crise da economia brasileira. Pelo contrário, contribui ainda mais para a sua manutenção. Exemplo disso é a própria recessão -a terceira desde 1980-, que tenderá a jogar papel considerável na desorganização do setor público, no desajuste do setor privado e no aprofundamento dos problemas socioeconômicos nacionais. Como pressuposto de superação da atual crise brasileira, se faz necessária, pelo menos, a sua melhor gestão. A defesa da produção nacional e a adoção de um programa mínimo de emprego poderiam ser um bom começo. Márcio Pochmann, 36, economista, é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais de Economia do Trabalho (Cesit) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). E-mail: [email protected]