RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA Nº ............../2016 CONSIDERANDO ser público e notório, pelos dados oficiais publicados no último Informativo Técnico da Secretaria de Estado da Saúde1, que na área de abrangência da ......ª Regional de Saúde (incluindo o município de ....................), há ...... casos suspeitos de dengue, já com ..... confirmados (.... autóctones e ..... importados); CONSIDERANDO que a expansão da circulação dos vírus da dengue, da “febre chikungunya” e da “Zika”, com a reprodução desenfreada do mosquito Aedes aegypti, fez com que hoje essas doenças já estejam presentes em 299 dos 399 municípios paranaenses, muitos dos quais nunca haviam tratado pessoas com tais moléstias – como aqueles situados na área de abrangência desta ª Regional de Saúde; CONSIDERANDO então ser natural que nessas regiões as equipes de assistência não sejam experientes no manejo clínico dos pacientes em suspeita dessas graves moléstias; CONSIDERANDO que o domínio e o uso do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do Ministério da Saúde (PCDT-MS), para Dengue, é a ferramenta mais importante para se evitar óbitos; CONSIDERANDO que no Paraná, de agosto de 2015 até hoje tivemos o lamentável recorde histórico de 31 mortes por dengue, cuja imensa maioria poderia ter sido evitada, se o PCDT tivesse sido devidamente adotado. CONSIDERANDAO ser então decisiva a capacitação técnica dos profissionais de saúde, em especial nos municípios desta Regional, sem experiência na assistência a casos de dengue; CONSIDERANDO que, se as equipes assistenciais não estiverem aptas para rápido e certeiro manejo clínico dos doentes em suspeita de dengue, esses pacientes, sempre em situação de urgência clínica, correm o sério risco de ver seu quadro piorar rapidamente e evoluir para o óbito – notadamente porque a dengue é uma doença aguda, cujo agravamento para morte pode ser muito rápido; CONSIDERANDO ter chegado ao conhecimento do Ministério Público, pelo ofício-circular n. 05/2016, do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção à Saúde, que, na promoção de eventos por parte da 1 Disponível em http://www.dengue.pr.gov.br/arquivos/File/DengueInformeTecnico18_2015_2016ateSE132016_ZIKA_CHI KUNGUNYA_2016_04_05.pdf: a tabela de n. 03 traz os números de dengue por município (páginas 08 a 14), e a tabela de n. 04 traz os números de da “febre chikungunya” e da “Zika de cada município (paginas 15 a 18) 1 Secretaria de Estado da Saúde, para treinamento e capacitação nesses municípios, tem havido deficiências, por Secretarias Municipais de Saúde, para exigir de seus profissionais de enfermagem e medicina (notadamente de unidades próprias) a participação nesses treinamentos para qualificação; CONSIDERANDO que, a Política Nacional de Urgências e Emergências, estatuída pela Portaria GM/MS n. 1600/2011, estabelece a capacitação permanente das equipes assistenciais como uma das suas diretrizes: Art. 2° Constituem-se diretrizes da Rede de Atenção às Urgências: (...) II - garantia da universalidade, equidade e integralidade no atendimento às urgências clínicas, cirúrgicas, gineco-obstétricas, psiquiátricas, pediátricas e às relacionadas a causas externas (traumatismos, violências e acidentes); (...) VIII - atuação profissional e gestora visando o aprimoramento da qualidade da atenção por meio do desenvolvimento de ações coordenadas, contínuas e que busquem a integralidade e longitudinalidade do cuidado em saúde; (...) XIV - qualificação da assistência por meio da educação permanente das equipes de saúde do SUS na Atenção às Urgências, em acordo com os princípios da integralidade e humanização. CONSIDERANDO que, pela mesma Política, no parágrafo 3º, do art. 3º desta Portaria, o acolhimento com classificação do risco, a qualidade e a resolutividade na atenção constituem a base do processo e dos fluxos assistenciais de toda Rede de Atenção às Urgências e devem ser requisitos de todos os pontos de atenção. CONSIDERANDO que todos os serviços de vigilância em saúde (notadamente epidemiológica) os equipamentos da atenção básica (unidades básicas de saúde e equipes de Estratégia Saúde da Família) e as unidades de pronto atendimento e o conjunto de serviços de urgência 24 horas, bem como os hospitais, são também pontos de atenção componentes da Rede de Atenção às Urgâncias, conforme art. 4º da mesma Portaria: Art. 4º A Rede de Atenção às Urgências é constituída pelos seguintes componentes: I - Promoção, Prevenção e Vigilância à Saúde; 2 II - Atenção Básica em Saúde; III - Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU 192) e suas Centrais de Regulação Médica das Urgências; IV - Sala de Estabilização; V - Força Nacional de Saúde do SUS; VI - Unidades de Pronto Atendimento (UPA 24h) e o conjunto de serviços de urgência 24 horas; VII - Hospitalar; e VIII - Atenção Domiciliar. CONSIDERANDO que o acolhimento em todos os pontos de atenção às urgências e emergências, sem que os profissionais estejam capacitados para prestar o atendimento técnico necessário, em especial na atenção à dengue, doença aguda de rápida evolução até o óbito, pode violar a integralidade da assistência, alçada como princípio no art. 7º da Lei Orgânica da Saúde (sem prejuízo de poder trazer resultados fatais ou de difícil reparação ao paciente): Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios: II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema; CONSIDERANDO que a integralidade, a partir do momento em que o paciente se encontra em situação clínica de urgência e emergência, em regra somente se atinge se for acolhido no serviço de saúde com equipe qualificada e treinada, para reconhecer e adotar com celeridade as providências para o socorro assistencial (que na suspeita de dengue precisa ser certeiro e imediato), o que poderá ser decisivo para a resolutividade do tratamento (e sobretudo para a vida do doente), princípio previsto no art. 7º, XII, da Lei n. 8080/90, como “capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência”) CONSIDERANDO a garantia de eficiente aplicação desse princípio da integralidade cabe aos gestores do Sistema Único de Saúde, nos termos do recente Decreto n. 7508, de 28 de junho de 2011: 3 Art. 13. Para assegurar ao usuário o acesso universal, igualitário e ordenado às ações e serviços de saúde do SUS, caberá aos entes federativos, além de outras atribuições que venham a ser pactuadas pelas Comissões Intergestores: I - garantir a transparência, a integralidade e a equidade no acesso às ações e aos serviços de saúde; CONSIDERANDO que, igualmente, a Portaria do Ministério da Saúde MS/GM n° 1378/2013, ao regulamentar as ações de vigilância epidemiológica, define as competências municipais estritamente de acordo com a Constituição Federal e a Lei Federal n° 8080/90: Art. 11. Compete às Secretarias Municipais de Saúde a coordenação do componente municipal dos Sistemas Nacionais de Vigilância em Saúde e de Vigilância Sanitária, no âmbito de seus limites territoriais, de acordo com a política, diretrizes e prioridades estabelecidas, compreendendo: (...) XI - promoção e execução da educação permanente em seu âmbito de atuação; CONSIDERANDO o disposto no artigo 127, da Constituição Federal da República, que dispõe que “o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis"; CONSIDERANDO o disposto nos artigos 129, II, da Magna Carta, e 120, II, da Constituição do Estado do Paraná, que atribuem ao Ministério Público a função institucional de “zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia”; CONSIDERANDO a disposição do art. 27, parágrafo único, inciso IV, da Lei Federal n.º 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, o qual faculta ao Ministério Público expedir recomendação administrativa aos órgãos da administração pública federal, estadual e municipal, requisitando ao destinatário adequada e imediata divulgação e a disposição do art. 6º, XX, da Lei Complementar Federal nº 73/93 combinado com o art. 200, da Lei Complementar Estadual nº 85/99, que salienta caber ao Ministério Público a expedição de recomendações visando a melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, no uso de suas atribuições legais, expede a presente 4 RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA Ao (à) senhor(a) ....................., Secretário(a) de Saúde do Município de .................., para que, em cumprimento às disposições legais acima mencionadas, e em vista das circunstâncias ora apuradas, determine imediatas providências administrativas para promoção de qualificação técnica de capacitação para diagnóstico, manejo clínico e tratamento de casos suspeitos de dengue, da “febre chikungunya” e da “Zika”, a todos os médicos e enfermeiros atuantes em todos os serviços de saúde da rede municipal, especialmente: vigilância epidemiológica, atenção básica (Unidades Básicas de Saúde e equipes da Estratégia Saúde da Família), serviços de pronto-atendimentos, unidades de pronto-atendimento 24h e hospitais, nos seguintes termos (sem prejuízo da educação permanente e qualificação própria da gestão municipal): a) possibilitar todos os meios para participação desses profissionais nos eventos de capacitação, a serem oferecidos pela Secretaria de Estado da Saúde (e também de quaisquer outro órgão público), para treinamento e qualificação para diagnóstico, manejo clínico e tratamento de dengue, zika e febre chikungunya, (com fornecimento de transporte e alimentação, se necessário for), inclusive exigindo tal participação de todos os servidores públicos municipais, sob pena de responsabilização por eventual descumprimento funcional, e b) em nenhuma hipótese acarretar prejuízo irreparável para a população, quando da participação das equipes assistenciais nessas atividades. Assina-se o prazo de 10 (dez) dias para que a autoridade mencionada comunique ao Ministério Público quanto à adoção das providências adotadas na espécie. Dê-se ciência, por ofício, ao Conselho Municipal de Saúde, à ..............ª Regional de Saúde, ao Conselho Regional de Enfermagem e ao Conselho Regional de Medicina. ............., .......... de ..................... de 2016. ....................... Promotor de Justiça 5