Texto Auxiliar :: Complemento-resumo dos Capítulos 3-9 Embora temos começado pela descrição microscópica das componentes do universo, precisaremos para o estudo da Cosmologia de descrever um grande número destas. Ou seja, conhecendo como interagem as partículas indivualmente, ser capaz de dizer o que vai acontecer com um gás delas. Esta passagem do microscópico ao macroscópico envolve somatórias de processos individuais, as vezes um pouco complicadas. Para temperaturas muito altas, um gás de partículas ordinárias (por exemplo, elétrons) se comportará como um gás de laboratório. Nesta descrição (assim como na do gás de laboratório) já está embutida a idéia das colisões muito frequentes que servem para repartir a energia entre as partículas. Desde um ponto de vista de um elétron, as colisões acontecem desde que outro elétron incida dentro de uma área efetiva chamada seção de choque. Dependendo da interação, a seção de choque muda, já que depende de cómo essas partículas se “enxergam” entre elas. Por exemplo, se em vez de incidir um outro elétron é um neutrino que colide com o primeiro elétron, a área onde a colisão tèm uma probabilidade de acontecer é muitíssimo menor, já que a colisão está determinada pelas interações fracas. A distância que uma partícula pode percorrer num gás de outras (alvos) de densidade n A é chamada de livre caminho médio e está definido como 1/ n A ( E ) ( E ) . Com este conceito podemos somar (integrar) para todas as partículas consideradas e conseguir a taxa de reações por unidade de tempo . Uma caraterística importante dos ambientes altamente energéticos, tais como o universo primordial, é que os quanta de radiação (por exemplo, fótons) podem dar origem a pares de partículaantipartícula, esta última a famosa antimatéria. As antipartículas elementares são tão “decentes” quanto suas parentes ordinárias, e só não as vemos com frequência porque a sua seção de choque de aniquilação (o processo inverso à criação de pares) é grande e as faz sumir rapidamente. Estes porcessos de criação e aniquilação de pares são observados há mais de meioséculo nos laboratórios. Evidentemente, todo o que nos rodeia, e até onde sabemos, todo o resto do universo, está formado de matéria e não de antimatéria. Assim, o universo inicialmente simétrico nas duas classes precisou se “desfazer” de toda a antimatéria então existente. Ou tal vez houve algum processo que criou mais matéria do que antimatéria muito cedo na sua história. Estes assuntos são tratados no Capítulo 14. As três interações elementares que dão forma às componentes do universo (átomos, moléculas, etc.) são a eletromagnética, a fraca e a forte. Uma grande quantidade (macroscópica) de matéria sente de forma ostensiva a atração gravitacional universal quarta força elementar (isto não quer dizer, por exemplo, que dois prótons não a sintam, só que a contribuição gravitacional para a interação total de partículas é miseravelmente pequena). O mundo macroscópico, aliás, não enxerga em absoluto as interações fracas e fortes (embora estas sejam a causa da existêcia dos núcleos, entre outras coisas fundamentais) e pode ser descrito com o conhecimento do eletromagnetismo e a gravitação. As caraterísticas observadas básicas das interações eletromagnéticas são A carga elétrica tem dois sinais, e a força entre elas é atrativa ou repulsiva segundo as cargas sejam diferentes ou iguais. A força produzida por uma carga estática cai como o quadrado da distância à carga (Lei de Gauss) A variação no tempo da corrente elétrica j pode gerar uma força magnética (Lei de Ampère). Existem cargas elétricas livres, mas não cargas magnêticas. Ou seja não há "monopolos" magnéticos, em contraste com o “monopolo elétrico” ou carga isolada. A teoria de Maxwell deu forma matemática às interações eletromagnéticas que sofrem partículas carregadas se movimentando a velocidades arbitrarias (ela é automaticamente relativística e pode ser utilizada para qualquer regime de energias) no regime clássico. A quantização da teoria de Maxwell permiteentender os processos elementares da natureza tal como ela se manifesta, já que as teorias clássicas são limitadas por não incluir processos como os de criação e aniquilação de pares, puramente quânticos, e imprescindíveis para estudar “laboratórios” de alta energia, como é o universo primordial. A versão quântica do eletromagnetismo, ou eletrodinâmica quântica, é a teoria mais exata construída pelo homem, já que prediz o resultado de processos elementares com dez ou mais casas decimais. No embalo da teoria eletromagnética, as pesquisas nos anos ’50 revelaram uma interação que (nos laboratórios) está restrita a dimensões da ordem do raio clássico de um próton, as chamadas interações fracas. As interações fracas são responsãveis pelo decaimento do nêutron e levaram a postular (e depois descobrir) uma nova e imprtante partícula no zoológico : o neutrino. Os neutrinos passam despercebidos no nosso arededor, já que a sua seçã de choque com a matéria ordinária é pequeníssima, mas tiveram um papel fundamental no universo primordial, quando o a densidade de alvos era gigantesca e seu livre caminho médio muito pequeno (Capítulo 16). Inicialmente, o neutrino surgiu como uma hipótese controvertida para restaurar a conservação da energia e do momento angular nas reações fracas (nenhum físico quis ou quer ouvir falar de violações à conservação da energia...), e mais tarde foi não só confirmado quanto medido em 3 “variedades” (Fig. 1.2). Recentemente, o neutrino é estudado em muito detalhe graças aos avanços tecnológicos e resultou ter uma massa diferente de zero, embora muito pequena (algo como 10 7 vezes a massa de um elétron). Essa massa pequena faz com que, embora muito abundante como “relíquia” do universo primordial (Capítulo 19), o neutrino esteja descartado como a componente dominante da matéria escura. Por volta da mesma época os físicos começaram a explorar em detalhe o núcleo atômico, e se perguntar como é que ele se mantém fortemente unido. Os experimentos originais identificaram primeiramente uma partícula responsável da ligação nuclear (o méson pi, ou píon) e outras mais do mesmo gênero. Alguns anos mais tarde, os próprios núcleons foram bombardeados para entender sua estrutura. Assim, descubriu-se que, tanto os núcleons quanto aqueles mésons estão formados por partículas elementares (quarks), trocando bósons mediadores próprios (glúons) como descrito na Tabela 1 do Capítulo 2. O mais estranho, mas hoje amplamente comprovado e aceito pela Física, é que estes quarks e glúons nunca aparecem isoladamente fora dos núcleons ou das regióes nas colisões que “suportam” sua presença. Diz-se que estão confinados, e sua “saída” acontece em pares quaksantiquark, de fato identificados com os mésons. Assim, as interações fortes originais são hoje interpreadas como “resíduos” desta troca fundamental de glúons pelos quarks. O mais interessante para nós é que a teoria que descreve as interações fortes modernas (chamada de QCD, ou Cromodinâmica Quântica) deve apresentar uma fase onde os quarks e glúons sim podem estar livres, desde que existam densidades e temperaturas altas o suficiente. Precisamente isto é o que indica a liberação dos quarks e glúons no universo primordial (Capítulo 15). Em toda esta discussão não houve necessidade de introduzirmos a gravitação. Como apontamos antes, ela é uma interação muito fraca, várias ordens de grandeza mais fraca do que as próprias interações fracas. Porém, sabemos que a gravitação clássica deveria ter uma versão quantizada, utilizável quando o regime de energias for grande o suficiente. Esta escala é a chamada escala de Planck, e nela não podemos ignorar nem o caráter fundamental da gravitação nem seu comportamento quântico. Ainda não sabemos construir uma teoria quântica da gravitação que seja tão bem-sucedida como é a eletrodinâmica quântica. Mas tal teoria é imprescindível para compreendermos o que aconteceu nos primórdos do universo (Capítulos 13 e 20)