Desenvolvimento do Sistema Sensorial De muitas formas, quase todas as ações motoras podem ser consideradas uma habilidade “perceptomotora”. O movimento humano é calçado na informação sobre o ambiente e a posição ou localização da pessoa dentro deste. Por exemplo, uma jogada infielder de softbol vê a localização do arremesso, o batedor rebatendo a bola e esta quicando no terreno; ouve a batida, talvez veja um corredor na trajetória da base; e sente a posição de seu corpo e de seus braços. A jogadora utiliza essa informação para decidir onde e quando interceptar a bola, aonde se mover e como posicionar seu corpo. Isso faz parecer que nem todos os movimentos são tão dependentes no sentir e perceber o ambiente. Até um saltador de plataforma experiente, com a visão bloqueada e utilizando protetores auriculares, deve sentir como a gravidade puxa seu corpo e saber onde seu tronco e seus membros estão inter-relacionados para executar seu mergulho. Como demonstra o efeito de enjôo de um filme, a informação sensorial e a perceptiva são altamente irrigadas. Tipicamente, experimentamos eventos em sistemas sensoriais múltiplos. Sentimo-nos desconfortáveis se a informação de outro – desestabilizamo-nos, caímos ou sentimo-nos enjoados. Se nos é negada a informação de um sentido, podemos compensá-la prestando atenção na informação de um outro; mas podemos não ser tão preciso em nossas percepções. Além disso, nossos próprios sistemas sensorial e perceptivo e o ambiente são sistemas interativos. Não recebemos simplesmente a informação do ambiente, mas agimos para obtê-la. Por exemplo, giramos nosso ouvido em direção a um som ou levamos a mão para tocar e sentir a textura de uma superfície. Assim, devemos ter em mente a natureza altamente integrativa da sensação, da percepção e do movimento, mesmo quando discutimos sistemas individuais ou tipos de discriminação perceptiva. Os sistemas sensorial e perceptivo são, certamente, restrições estruturais do indivíduo ao movimento e a outras atividades, tal como a leitura. Essa discussão do desenvolvimento do sistema sensorial é a base para a exploração do desenvolvimento perceptomotor e do equilíbrio. Sensação é a atividade neural disparada por um estímulo que ativa um receptor sensorial e que resulta em impulsos nervoso sensoriais que se deslocam através para o cérebro. Percepção é um processo de múltiplos estágios que ocorre no cérebro e que inclui seleção, processamento, organização e integração da informação recebida dos sentidos. O Desenvolvimento Visual: A visão desempenha um papel principal na maioria das performances de habilidades. Para entendermos melhor esse papel, precisamos examinar as mudanças em três aspectos da visão relacionadas à idade: Acuidade Acomodação Sensibilidade de contraste A acuidade, a acomodação e a sensibilidade de contraste indicam o quão detalhada a informação visual se apresenta. 1 Visão na Infância Durante o primeiro mês de vida, o sistema visual oferece à criança uma visão funcionalmente útil, mas não refinada, em um nível de aproximadamente 5% da eventual acuidade do adulto. A resolução de detalhe do recém-nascido permite que ele diferencie características faciais a 20 polegadas de distância (50,8 cm); além disso, ele provavelmente não pode ver objetos claramente. Esse nível de acuidade reflete o tamanho relativamente pequeno do olho da criança (resultando em uma imagem de tamanho pequeno), bem como a imaturidade da fóvea (sobretudo dos cones) e do córtex visual. Acuidade é a nitidez da visão. A Fóvea é a região central da retina que é repleta de cones. Cones são os fotorreceptores que proporcionam visão finamente detalhada e colorida. Os recém nascidos não controlam muito bem a acomodação, ainda assim, podem ajustar o foco na direção adequada para objetos próximos. Eles cometem mais erros do que os adultos, mas alcançam níveis adultos aos 3 ou 4 meses de idade e respondem como os adultos pelo 10º mês. Acomodação é a ação dos músculos ciliares para mudar a curvatura das lentes dos olhos (figura 10.1) para ver objetos a distâncias variadas. A acuidade visual trata da resolução de detalhe sob condições de alto contraste, enquanto a sensibilidade de contraste trata da resolução em vários níveis de iluminação. A sensibilidade de contraste em recém-nascidos é pobre se comparada à dos adultos, mas suficiente para detectar muitos objetos. A melhoria é rápida nos primeiros 6 meses. Sensibilidade de contraste é a capacidade para resolver visualmente estruturas espaciais, variando de refinada a bruta, em vários níveis de contraste. A acuidade visual, acomodação e sensibilidade de contraste são rapidamente aperfeiçoadas no início da infância. 2 Muitas crianças têm astigmatismo, ou visão deslocada, devido a uma curvatura imperfeita da córnea. Todavia, esse fenômeno parece ser passageiro, e sua incidência decai quando as crianças estão entre 6 e 18 meses de idade. Em torno de 6 meses, então, os sistemas motores da criança estão prontos para começar a locomoção auto-impulsionada, o sistema visual percebe detalhes adequados que o auxiliam nessa tarefa. Da perspectiva ecológica, a visão é um outro sistema que deve se desenvolver a um nível adequado para facilitar a locomoção. Miopia é a condição visual em que objetos mais próximos são claramente vistos, enquanto os mais distantes ficam desfocados. Hipermetropia é a condição visual em que objetos próximos ficam desfocados, enquanto os mais distantes são vistos de forma clara. Astigmatismo é uma curvatura desigual ao longo da córnea, resultando em visão desfocada. A visão atinge os níveis adultos em torno dos 10 anos, mas quaisquer erros refrativos resultantes de imperfeições no comprimento axial do olho podem ser corrigidos com lentes de contato ou óculos. Desenvolvimento Cinestésico O sistema cinestésico ou proprioceptivo é importante para a performance de habilidades porque produz informações sobre: A posição das partes do corpo relativas umas às outras; A posição do corpo no espaço; Os movimentos corporais; A natureza dos objetos com os quais o corpo estabelece contato. Diferentemente do sistema visual, que se baseia nos olhos como receptores sensoriais, a informação cinestésica vem de vários tipos de receptores espalhados pelo corpo, e denominados proprioceptores (tabela abaixo). Os proprioceptores localizados nos músculos, nas junções musculotendíneas, sob a pele nas cápsulas articulares e nos ligamentos são chamados de somatossensores, e aqueles localizados no ouvido interno são chamados de aparelho vestibular. Receptor Cinestésico Fusos musculares Órgãos tendíneos de Golgi Receptores das articulações Terminais de Ruffini tipo ramo receptores tipo Golgi Corpúsculo de Pacini modificado Canais semicirculares do vestibular Receptores cutâneos Localização Músculos Junções musculotendíneas Cápsulas articulares e ligamentos Ouvido interno Pele e tecidos subjacentes 3 Proprioceptor é o conjunto dos vários receptores cinestésicos localizados na periferia do corpo; os dois tipos de proprioceptores são os somatossensores e o aparelho vestibular. Os somatossensores incluem os fusos musculares, os quais estão localizados entre as células do músculo e medem o grau de tensão em um músculo. Os órgãos tendíneos de Golgi funcionam similarmente aos fusos musculares, respondendo a mudanças de tensão do músculo; são encontrados nas junções músculotendíneas (figura 10.3). Os três tipos de receptores nos tecidos da cápsula articular e nos ligamentos da articulação incluem os terminais de Rufini tipo ramo, os receptores tipo Golgi e os corpúsculos de Pacini modificados. Os terminais de ramo sinalizam direção, a taxa de amplitude do movimento da articulação mais a posição estável. Os receptores tipo Golgi e o corpúsculo de Pacini modificado fornecem informação sobre a posição estacionária da articulação. Os receptores cutâneos na pele e nos tecidos subjacentes proporcionam informação sobre toque, temperatura, dor e pressão. Alguns dos receptores cutâneos respondem à estimulação mecânica, outros, à estimulação térmica, e há os que respondem à inclinação dos pelos e à pressão sobre a pele. O aparelho vestibular oferece informações sobre a posição da cabeça. Os canais semicirculares abrigam receptores sensoriais para movimentos de rotação que julgam a aceleração ou a desaceleração da cabeça. O utrículo e o sáculo abrigam receptores para movimentos lineares, que oferecem informação sobre a posição a posição do corpo em relação à gravidade. 4 Cinestesia na Infância Muitos reflexos infantis são estimulados pelos receptores cinestésicos. Assim, o início de um reflexo indica que o receptor cinestésico envolvido está funcionando. O primeiro reflexo pré-natal que pode ser estimulado é o de flexão do pescoço do lado oposto pela estimulação tátil ao redor da boca apenas 7 semanas e meia após a concepção. Com isso, sabemos que receptores cutâneos estão presentes e funcionando em torno da boca nessa idade pré-natal. Os pesquisadores têm utilizado estimulação tátil em outras partes do corpo para determinar se o movimento dos receptores cutâneos procede em uma seqüência oral, genital-anal, palmar e plantar (sola do pé). Essa seqüência desenvolvimental segue as direções de crescimento céfalo-caudal e próximo-distal. Por volta de 12 semanas e meia pré-natais, os receptores cutâneos estão desenvolvendo-se nas mãos, assim como os receptores dos fusos musculares no bíceps braquial. Do 4º ao 6º mês pré-natal, os receptores cutâneos para toque e pressão continuam a se desenvolver, assim como os fusos musculares, os órgãos tendíneos de Golgi e os receptores das articulações. Talvez esses receptores funcionem bem antes do nascimento, mas a sensibilidade do feto à temperatura, via receptores cutâneos, não é refinada. No nascimento, as crianças claramente respondem ao toque. Eles podem também identificar a localização de toques, sobretudo na região da boca e da face. A questão sobre se as crianças sentem dor é um tanto quanto obscura porque é difícil saber o que elas interpretam como doloroso. Mesmo assim, os recém-nascidos comumente fazem caretas quando desinfetante é aplicado ao cordão umbilical. Crianças novas podem também obter informação sobre objetos por meio da exploração oral e manual. Sabemos, também, que o aparelho vestibular está anatomicamente completo entre 9 e 12 semanas de vida pré-natal; mas seu status funcional antes do nascimento não está claro. O reflexo de endireitamento aparece em torno do 2º mês pós-natal. Assim, sabemos que o aparelho vestibular está funcionando nessa idade. Portanto, o sistema para a sensação cinestésica funciona nas primeiras fases da vida. 5 Desenvolvimento Auditivo Apesar de não ser tão importante quanto a visão ou a cinestesia para a performance de habilidades, a informação auditiva ainda é valiosa para uma performance precisa. As pessoas geralmente utilizam sons como dicas importantes para iniciar ou cronometrar seus movimentos. Devemos distinguir entre sensação auditiva (meramente ouvindo o som) e percepção auditiva (realmente julgando o som). A seção seguinte discute o desenvolvimento da sensação auditiva. Audição na Infância O ouvido interno, o ouvido médio e a cóclea estão envolvidos na audição. O ouvido interno se desenvolve primeiro e está próximo da forma adulta pelo 3º mês pré-natal. No meado da vida fetal, o ouvido externo e o ouvido médio estão formados. Os fetos respondem a sons altos, mas talvez essa resposta se deva na verdade, ao estímulo tátil, isto é, a vibrações. A audição de um recém nascido é parcialmente imperfeita por causa do tecido gelatinoso que preenche o ouvido interno. O limiar absoluto fica em torno de 60 decibéis mais alto para um recém-nascido do que para um adulto. Assim, um recém nascido pode somente detectar uma voz falando em tom médio, enquanto um adulto pode detectar um sussurro. Os recém-nascidos também não discriminam mudanças na intensidade (limiar diferencial) nem na freqüência de sons tão bem quanto os adultos. O material gelatinoso no ouvido interno é reabsorvido durante a 1º semana pósnatal, de forma que a audição melhora rapidamente. Pelo 3º mês, os bebês ouvem sons de baixa freqüência muito bem, mas não ouvem sons de alta freqüência tão bem. O bebê pode ouvir vozes de baixo a meio tom melhor que vozes de alto tom. Limiar absoluto é o mínimo som detectável que um ouvinte pode sentir pelo menos durante a metade do tempo que um sinal é soado. Limiar diferencial é a maior proximidade que dois sons podem ter e ainda assim permitir que o ouvinte os distinga por, no mínimo, 75% do tempo. 6