os cnidarios no brasil

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FILO CNIDARIA
Por Carlos Daniel Pérez
SISTEMÁTICA E EVOLUÇÃO
May (1990) dizia que sem a taxonomia para dar forma aos tijolos e sem a
sistemática para dizer-nos como coloca-los junto, a grande casa das Ciências Biológicas
seria uma completa desordem. É verdade! No entanto, se bem que para alguns grupos os
tijolos estão claramente definidos, a ordenação dos mesmos ainda é uma completa
incógnita.
Determinar a posição dos táxons em uma estrutura mais ampla e entender suas
relações é algo bastante complicado. A pergunta mais óbvia a ficar sem uma resposta seria:
como estão relacionados os organismos viventes? Porém, por trás desta, inúmeras outras
perguntas pululam em busca de respostas: Que abordagem seria mais apropriada:
molecular, morfológica, embriológica, comportamental? Que ferramenta seria mais útil:
cladismo, gradismo? Quais caracteres devem ser considerados mais relevantes e de maior
peso em cada táxon? Como se não fosse pouco, a ausência de registros fósseis em alguns
grupos torna esta tarefa ainda mais árdua. Por estas razões, inúmeras teorias co-existem, na
tentativa de entender a intricada relação entre os seres vivos desde o ponto de vista de
parentesco quanto de evolução dos mesmos. Se tudo isso já parece muito complicado,
imaginem tentarmos aplicar aos invertebrados. Como entender a evolução ou as relações
filogenéticas dentro de um grupo que sequer pode ser considerado um clado, sob nenhum
ponto de vista existente. Um agrupamento totalmente artificial que, ao contrário do que se
esperaria em uma boa filogenia, reúne táxons que possuem em comum uma ausência. Pois
bem, a ausência de coluna vertebral define os invertebrados. Proposto por Lamarck em
1801, este termo, apesar de não constituir um clado ou um táxon nem representar qualquer
categoria hierárquica conhecida e/ou admitida, segue em uso na grande maioria dos livros
didáticos e nos programas de cursos de graduação e pós-graduação. Nenhuma característica
positiva é capaz de abranger todos os seus representantes. A diversidade de formas,
habitats, hábitos é tão grande que pode ser exemplificada quando consideramos seus
representantes. Os chamados Invertebrados são formados por 35 filos e mais dois subfilos
do Filo Chordata, o mesmo que contém os seres humanos e demais vertebrados. Ufa! Só de
imaginar, assusta! Mais ainda se considerarmos que os invertebrados constituem cerca de
97% dos organismos viventes!
Nos oceanos e mares há uma enorme variedade de formas de vida, e um número de
táxons superiores muito maior do que no ambiente terrestre. Segundo as estimativas, o mar
apresenta apenas 20% de todas as espécies animais, mas estas representam 90% ou mais de
todas as classes ou filos (MAY, 1988). Basta lembrar que a maioria dos filos conhecidos
são exclusivamente ou principalmente marinhos. Dos 35 filos de invertebrados não
cordados, 16 são exclusivamente marinhos, 6 predominantemente marinhos, 9 com
representantes marinhos, 2 com poucos representantes marinhos e apenas 2 sem
representantes marinhos (Pentastomida, parasita de vias respiratórias aéreas de vertebrados,
e Onychophora, exclusivamente terrestre).
Dentro deste contexto, um dos maiores desafios da ciência atual é entender a
sistemática e a evolução dos animais, em especial dos invertebrados e mais particularmente
dos invertebrados marinhos. Obviamente isto se torna ainda mais relevante quando
consideramos que a origem da vida se deu na água e que muitos dos filos hoje conhecidos
possuíam representantes nos mares Cambrianos e Pré-Cambrianos.
Classificar é uma atividade inerente do ser humano. Armários, arquivos, animais,
tudo separamos e agrupamos pelo que pensamos ser afinidades e cada peça nova que chega
sabemos onde colocar. E se não sabemos, logo criamos uma “pasta nova” em “Meus
documentos” para abrigar o novo item. Esta tarefa já era realizada pelos homens das
cavernas que separavam, pelo menos, alguns grupos com Plantas comestíveis X plantas não
comestíveis e Animais perigosos X animais não perigosos. È lógico que com o passar do
tempo os sistemas e os argumentos foram sofrendo mudanças. Na Grécia antiga, Aristóteles
(384-322 a.C.) já separava os animais em Enaima (com sangue) e Anaima (sem sangue),
numa divisão que se parece ao que hoje conhecemos como vertebrados e invertebrados.
Novas perspectivas foram surgindo com o advento da microscopia, a melhoria da mesma, a
microscopia eletrônica e o desenvolvimento de áreas como a histoquímica, bioquímica,
citogenética, genética molecular, entre outras. Era a possibilidade de acessar a um número
cada vez maior de caracteres. Se por um lado isto é positivo, por outro complica ainda mais
na hora de determinar as relações filogenéticas, ao mesmo tempo em que parecemos nos
aproximar de alguma verdade. A idéia de estabelecer parentesco ou relacionar os grupos
entre si, só aparece posteriormente com as idéias evolucionistas de Lamarck seguidas das
teorias de Darwin. Apesar de parecer óbvio agrupar os organismos segundo suas histórias
evolutivas, estabelecendo graus de parentesco, a execução desta idéia é extremamente
complicada. A determinação dos caracteres a serem utilizados, a escolha da ferramenta e a
falta de conhecimento sobre fósseis e/ou táxons intermediários em alguns casos, são
algumas das principais causas de dificuldade.
Parece, no entanto, que este desafio é tão importante que leva a milhares de pessoas
em todo o mundo a trabalharem de forma simultânea para tentar entender este mecanismo.
Compreender a origem, evolução e as relações entre diversos táxons animais é entender
nossas próprias origens. Os seres humanos, considerados atualmente no topo de uma linha
evolutiva de sucesso, poderiam ter muito mais em comum com organismos simples do que
poderia prever ou admitir nosso orgulho antropocêntrico. Exemplo disso é a recente
descoberta da semelhança entre os fotorreceptores dos anelídeos poliquetas e os presentes
no olho humano. Dessa forma, vamos pouco a pouco desvendando os mistérios que
envolvem a aparição/desaparição e a evolução dos animais e, assim, quem sabe, poderemos
entender a história evolutiva do nosso planeta o que contribuirá para a preservação da sua
Biodiversidade (utilizado aqui no seu conceito mais amplo).
Neste contexto, os cnidários adquirem grande importância por serem um grupo de
organismos altamente diversificados que estão ligados a origem dos metazoarios.
O filo CNIDARIA abrange um número elevado de formas que incluem as
anêmonas-do-mar, águas-vivas, caravelas-portuguesas, hidrozoários, corais e leques-domar. Embora os cnidários sejam, dos animais pluricelulares, os de construção mais simples,
são um filo muito bem sucedido. São conhecidas umas 11.000 espécies, a maioria de hábito
marinho e umas poucas de água doce, solitários ou coloniais. São abundantes no plâncton e
no bentos, desde a região entremarés ate as grandes profundidades abissais, do equador aos
pólos. A maior diversidade, entretanto, ocorre em águas tropicais rasas, onde se destacam
as águas vivas, os corais pétreos, os zoantídeos e os octocorais. Em águas mais frias, os
hidrozoários e as anêmonas-do-mar são os mais conspícuos representantes do filo. Muitos
são sésseis (pólipos) ou planctônicos (medusas), a maioria carnívoros, alguns utilizam as
partículas em suspensão como alimento, muitas espécies possuem algas simbióticas
intracelulares (zooxantelas e zooclorelas) e alguns grupos, como algumas narcomedusas,
são parasitas. Suas dimensões variam desde microscópicas, a exemplo dos pólipos da fauna
intersticial psamítica, até a medusa gigante Cyanea arctica do Atlântico Norte que chega a
2,5 m de comprimento e seus tentáculos podem atingir os 40 metros.
O plano corporal dos cnidários apresenta dois padrões básicos, o pólipo e a medusa.
A forma pólipo tem o eixo de simetria oral-aboral alongado, conferindo-lhe a forma coluna
ou cilíndrica. Os pólipos podem ser solitários ou formar extensa colônias, são de habito
sedentário e se encontram fixos ao substrato através de um disco aboral adesivo. Nas
medusas, o eixo oral-aboral é curto e o corpo alarga-se, tomando a forma de sino,
campânula ou cubo. As medusas são geralmente de vida livre (exceção das
estauromedusas) podendo ser planctônicas ou excelentes nadadoras pelágicas. Muitas
espécies de cnidários podem apresentar as duas formas em seu ciclo de vida, apresentando
uma alternância de gerações (metagenesis). Os pólipos podem ser de um único tipo que
desenvolve todas a funções vitais (alimentação, reprodução, defesa, etc) ou pode haver
vários tipos diferentes de pólipos em uma mesma colônia com funções especificas, isto se
denomina polimorfismo (gastrozooides com função alimentícia, dactilozooides para defesa,
gonozooides para reprodução, etc.).
Uma característica que distingue os cnidários dos outros animais é sua estrutura
simples, que, em principio, se diferencia pouco após da fase de gástrula. São animais
basicamente diploblásticos que apresentam simetria radial primaria e externa retida na
forma adulta. O eixo antero-posterior da larva se torna o eixo oral-aboral do adulto, e a
boca, única abertura corporal, é rodeada por tentáculos. A cavidade digestiva, ausente nos
poríferos, é uma novidade evolutiva dos eumetazoários já presente nos cnidários,
denominada cavidade gastrovascular ou celêntero, um saco simples ou dividido em
câmaras, bolsas ou canais.
Caracterizar o filo Cnidaria é uma tarefa por demais complicada, a vasta diversidade
é a principal característica do grupo. As principais sinapomorfias que marcam a monofilia
dos cnidários são a presencia das organelas urticantes denominadas cnidocistos, a evolução
de uma forma medusoide radial do corpo, a larva plânula e talvez o celêntero com uma
boca rodeada por tentáculos.
As características do Filo Cnidaria são:
1) Completamente aquáticos, alguns de água doce, a maioria marinhos.
2) Acelomados
3) Diploblásticos. Corpo com duas camadas, a ectoderme ou epiderme e a endoderme
ou gastroderme separadas por uma camada acelular ou parcialmente celular
denominada mesogléia.
4) Simetria radial ou radio-bilateral ao redor de um eixo longitudinal com
extremidades oral e aboral, sem cabeça definida.
5) Presencia de estruturas urticantes ou adesivas denominadas cnidocistos, localizadas
na epiderme, na gastroderme ou em ambas. O tipo mais comum de cnidocisto é o
nematocisto.
6) Cavidade gastrovascular ou celêntero com uma única abertura que serve tanto
como boca quanto como ânus. A cavidade pode estar septada ou não.
7) Tentáculos extensíveis rodeiam a boca ou a cavidade oral.
8) Presencia de esqueleto hidrostático, alguns com endoesqueleto ou exoesqueleto de
origem orgânico ou mineral.
9) Rede nervosa com sinapses simétricas e assimétricas; alguns com órgãos sensoriais
desenvolvidos, condução difusa.
10) Sistema muscular (do tipo epitélio-muscular) com uma camada externa de fibras
longitudinais na base da epiderme e uma camada interna de fibras circulares na base
da gastroderme.
11) Ausência de sistema respiratório, circulatório, excretor e reprodutor.
12) Reprodução assexuada e sexuada. Formas sexuais monóicas e dióicas. Larva
primaria plânula e alguns com larvas secundarias. Clivagem espiral indeterminada
holoblástica.
Como as esponjas, a natureza dos cnidários foi altamente debatida ao longo da historia.
Aristóteles nomeou a este grupo de animais como Acalephae (do grego akalephe, urtiga) ou
Cnidae (do grego knide, irritante) devido à natureza urticante dos mesmos e os considerou
intermediários entre plantas e animais, daí o nome Zoophyta (do grego zoon, animal, e
phyton, planta) aplicado a este grupo ate mediados do século 19. Dentro dos zoofitos estava
incluída uma grande variedade de animais de corpo mole, desde esponjas até ascídias. O
naturalista francês Jean-André Peyssonel, em 1723, descobriu a natureza animal dos corais,
através da observação da contração e expansão dos tentáculos; mais tarde Trembley
observou algo similar em hidras. Como resultado de tais pesquisas, Linné, Lamarck e
Cuvier colocaram os cnidários como animais dentro do grupo dos Radiata ou Zoophyta.
Cuvier incluiu muito dos invertebrados inferiores junto aos cnidários separados em dois
grupos: Acalephae (medusas, sifonóforos, anêmonas) e Polypos (hidrozoários, briozoários,
antozoários e esponjas). O grupo Radiata de Lamarck ficou limitado às medusas e os
equinodermes, e os cnidários polipoides foram chamados Polypos. Eschscholtz (1829)
dividiu aos Radiata em Zoophyta, Acalephae e Echinodermata, incluindo nos Acalephae
aos cnidários medusoides, reconhecendo os grupos Ctenophora, Siphonophora (criados por
ele mesmo) e as medusas propriamente ditas. Os estudos com os ciclos de vida dos
cnidários começaram com os trabalhos de Sars em 1829 e demonstraram a relação entre as
formas pólipo e medusa, previamente consideradas em grupos separados. Thompson
separou os briozoários dos Zoophyta. Finalmente, Leuckart em 1847 compreendeu as
diferencias fundamentais dos dois grandes grupos radiados, os cnidários e os
equinodermos, e os separou criando o nome Coelenterata (do grego koilos, cavidade,
enteron, intestino) que incluía, ainda, aos cnidários, esponjas e ctenóforos. A classificação
sugerida por Leuckart foi aperfeiçoada por Hatschek em 1888 reconhecendo três fila dentro
dos Coelenterata: Spongiaria, Cnidaria e Ctenophora. Muitos zoologistas retiveram a
combinação dos cnidários com os ctenóforos sob o filo Coelenterata, dividido em Cnidaria
e Acnidaria para os ctenóforos. Libbie Henrietta Hyman em seu livro Os invertebrados
publicado em 1940 recomenda utilizar o termo Cnidaria e Ctenophora para nomear ambos
filos, abandonando o termo Coelenterata introduzido por Leuckart. O nome Coelenterata
continua, ate hoje, sendo utilizado por vários autores como uma categoria acima de filo
(superfilo, infrareino) para se referir aos fila Cnidaria e Ctenophora (um bom exemplo é o
Systema Naturae 1989-2005). Este fato se deve a que antigamente se pensava em uma
ligação filogenética muito forte entre ctenóforos e cnidários, mas apesar de apresentar uma
natureza geral similar diferem em aspectos importantes, principalmente que os ctenóforos
no formam cnidocistos, apresentam placas de pentes e coloblastos exclusivos do filo, não
apresentam polimorfismo, nunca formam colônias e apresentam aberturas anais. As
evidencias moleculares apóiam estas diferencias e sugerem que os ctenóforos se
ramificaram da linhagem dos metazoários depois das esponjas, mas antes dos cnidários e
placozoários (Philippe et al, 1993). Trabalhos recentes de Collins (1998) e Podar et al
(2001) baseados no analise do RNA ribossomal colocam aos ctenóforos mais perto dos
poríferos que do grupo Cnidaria/Placozoa ou dos Bilatéria. Baseado em estas evidencias o
grupo Coelenterata se tornaria parafiletico, e os placozoários grupo irmão dos cnidários.
Por esta ração se sugere não utilizar o termo Coelenterata, e os livros didáticos modernos já
começaram a evitar seu uso (Brusca & Brusca, 2003; Hickmann et al, 2004).
A classificação dos cnidários se baseia basicamente na alternância entre as formas
pólipo e medusa (metagenesis). Assim temos o subfilo Anthozoa com ausência total de fase
medusoide e as três classes restantes: Hydrozoa, Cubozoa e Scyphozoa agrupadas segundo
Petersen (1979) no subfilo Medusozoa onde a fase medusa pode estar presente. Esta
classificação é muito utilizada atualmente por especialistas (Fautin & Romano, 1997;
Migotto et al, 2002; Marques et al, 2003; Amaral, et al, 2003 e Systema Naturae 19892005), e Rupert, Fox e Barnes na sua ultima edição de 2004. Mas alguns livros de texto
(Brusca & Brusca, 2003; Hickmann, et al, 2004) eliminam as categorias acima de classe e
conservam o filo com quatro classes: Hydrozoa, Cubozoa, Scyphozoa e Anthozoa;
Recentemente, Marques & Collins (2004) baseados em analises cladísticas criaram uma
nova classe, Staurozoa que agrupa a ordem de Scyphozoa de medusas sésseis,
Stauromedusae, e a extinta ordem Conulatae.
A continuação à classificação com mais consenso na atualidade, colocando as
sinapomorfias que definem cada grupo entre parêntesis:
FILO CNIDARIA
Subfilo Medusozoa (presencia de fase medusa)
Classe Hydrozoa (cavidade gástrica dos pólipos sem septos, medusas craspédotas
com quatro canais radiais, gônadas de origem ectodérmica, colônias com perissarco)
Classe Scyphozoa (presencia de estrobilação e medusa juvenil éfira).
Classe Cubozoa (ausência de estrobilação e éfira, metamorfose do pólipo em uma
única medusa, presencia de velário e corpo da medusa cúbico).
Classe Staurozoa (medusa séssil, larva plânula sem cílios)
Subfilo Anthozoa
Classe Anthozoa (ausência de fase medusa, presencia de faringe e sifonoglife,
filamentos mesenteriais).
Subclasse Hexacorallia (simetria hexámera, ausência de polimorfismo,
presencia de espirocistos).
Subclasse Octocorallia (simetria octámera, oito tentáculos e oito
mesentérios completos, músculos retratores no lado sulcal dos filamentos, tentáculos
pinnulados).
Dentro de cada subfilo e cada classe os problemas classificatórios aumentam devido
a grande diversidade e aparição de formas intermediárias. A continuação se listão as ordens
de cada classe com uma breve descrição e alguns representantes característicos de cada um
delas.
FILO CNIDARIA
Subfilo Medusozoa
Classe Hydrozoa
A classe Hydrozoa é a mais diversa em quanto a classificações, os sistemas utilizados
variam de acordo ao escopo do especialista, si trabalha com taxonomia de pólipos ou
hidromedusas, ou ciclos de vida. Basicamente as classificações tendem a separar os grupos
de hidrozoários que exibem um elevado grau de polimorfismo ou estádio medusa ausente
na Subclasse Hydroidomedusa (segundo Bouillon & Boero 2000) ou Hydroidolina
(segundo Marques & Collins, 2004) que inclui as ordens:
Ordem Anthomedusae ou Anthoathecata ou Athecata: inclui pólipos
solitários ou coloniais, e se caracteriza pela ausência de perissarco cobrindo os
hidrantes e gonozooides. Inclui as hidras, hidrocorais (Millepora, Stylaster),
condróforos (Velela e Porpita) e colonias atecadas como Tubularia e Eudendrium.
Ordem Leptomedusae ou Leptothecata ou Thecata: pólipos sempre
coloniais cobertos por perissarco (tecados). Inclui colônias tecadas como
Plumularia, Sertularia e Obelia.
Ordem Siphonophorae: colônias polimórficas como Physalia physalis,
Lensia e Agalma.
E o outro grupo ficaria conformado com os que não possuem o possuem a forma pólipo
reduzida Subclasse Trachylina (Marques & Collins, 2004, Schuchert, 2005) ou
Automedusa (Bouillon & Boero, 2000) que inclui as ordens:
Ordem Narcomedusae pólipos ausentes com medusas achatadas, e algumas
espécies parasitas externos de peixes. Cunina e Pegantha
Ordem Traquimedusae pólipos ausentes com medusas altas com véu bem
desenvolvido. Liriope e Rhopalonema
Ordem Actinulida cnidários medusoides componentes da fauna intersticial
arenosa. Halamohydra
Ordem Limnomedusae (a inclusão desta ordem nos Trachylina não tem o
consenso geral, Marques & Collins, 2004 a colocam separada das duas subclasses)
Forma pólipo reduzida com forma medusa dominante. Com representantes límnicos
como o gênero Craspedacusta e marinhos como Olindias sambaquiensis
Uma terceira subclasse é proposta por Bouillon et al (2004), Polypodiozoa, para incluir
unicamente à espécie Polypodium hydriforme parasita intracelular de peixes. Comumente
esta espécie era incluída na ordem Narcomedusae, mas alguns autores não a incluem por
seu relacionamento ainda confuso em relação ao mixozoários.
Classe Cubozoa
Ordem Cubomedusae. Medusas cúbicas com quatro prolongações
mesodérmicas denominadas pedalios que levam um ou vários longos tentáculos.
Chiropsalmus, Tripelalia e Chironex.
Classe Scyphozoa
Ordem Coronatae. Umbrela com um profundo sulco coronal circular.
Cifozoários de águas profundas. Nausithoe
Ordem Rhizostomae. Boca ausente, braços orais com profundas dobras
alimentícias. Cifozoários de águas rasas. Cassiopea
Ordem Semaeostomae. Quatro braços orais bem desenvolvidos, com
margem marcadamente lobulada. Aurelia aurita, Chrysaoura, Pelagia noctiluca e a
gigantesca Cyanea.
Classe Staurozoa
Ordem Stauromedusae. Medusas sésseis fixas através de um pedúnculo.
Kishinouyea corbini
Subfilo Anthozoa
Classe Anthozoa
Sub-classe Hexacorallia (= Zoantharia)
Segundo Fautin, 2005 em seu completo trabalho Hexacorallians of the World, a classe
Hexacorallia estaria dividida em seis ordens:
Ordem Actiniaria. Anêmonas-do-mar. Pólipos solitários ou clonais sem
esqueleto, nunca coloniais. Tentáculos geralmente em ciclos alternados, presencia
de dois sifonoglifes e mesentérios em pares completos e incompletos. Bunodosoma
cangicum, Telmatactis rufa, Alicia mirabilis.
Ordem Corallimorpharia. Pólipos solitários sem esqueleto, com curtos
tentáculos arranjados radialmente. Sem sifonoglife. Corynactis.
Ordem Scleractinia. Corais pétreos. Pólipos solitários ou coloniais com
exoesqueleto de aragonita. Sem sifonoglifes, nem lóbulos ciliados nos filamentos
mesenteriais. Associados geralmente com algas zooxantelas. Meandrina,
Siderastrea, Flabellum.
Ordem Zoanthiniaria (= Zoanthidea). Pólipos solitários ou coloniais. Sem
esqueleto. Apresentam um sifonoglife e tentáculos em ciclos não alternados.
Zoanthus, Palythoa, Isaurus.
Ordem Antipatharia. Corais negros. Organismos colônias com crescimento
vertical ramificado ou no. Eixo interno formado de material córneo, antipatina com
espinhos. Geralmente 6 tentáculos não retráteis. Tanacetipathes paula,
Schizopathes, Antipathes.
Ordem Ceriantharia. Anêmonas-tubo. Pólipos solitários que vivem
enterrados em tubos que eles secretam com os ptycocistos. Um sifonoglife e todos
os mesentérios completos. Cerianthus, Pachycerianthus.
Alguns autores (Hickmann et al, 2004) agrupam os antipatários com os ceriantários
(Subclasse Ceriantipatharia) baseados em que este grupo apresenta os mesentérios
simples, não em pares, a diferencia das outras quatro ordens.
Sub-classe Octocorallia (= Alcyonaria)
Kukenthal (1924) e Hickson (1930) realizaram a classificação basal dos octocorais, a qual
apresentava 7 ordens: Protoalcyonacea, Stolonifera, Telestacea, Helioporacea, Alcyonacea,
Gorgonacea e Pennatulacea. Bayer (1981) sugeriu que os únicos táxons realmente bem
definidos eram os corais azuis (ordem Helioporacea) por seu esqueleto maciço calcário e os
pennatuláceos (ordem Pennatulacea) pela presencia de um pedúnculo proximal para
ancorar-se ao substrato mole. Os demais táxons estavam ligados por muitas formas
intermediarias (que ele chamou de “link forms”) pelo qual recomendava agrupar-las na
ordem Alcyonacea, retirando as categorias de ordem e deixando as famílias. A classificação
utilizada hoje em dia pelos especialistas (Williams, Grasshoph, Alderslade, Sanchez,
Castro, Pérez) é:
Ordem Alcyonacea. Octocorais colônias com uma única espécie solitária
Taiaroa tauhou. Formas variadas estoloniais (Carijoa riisei), digitiformes
(Alcyonium paessleri), arborescentes (Pacifigorgia elegans, Phillogorgia dilatata)
Esqueletos axiais córneos ou calcários e presencia de escleritas calcárias.
Geralmente pólipos monomorficos.
Ordem Coenothecalia (= Helioporacea). Corais azuis. Octocorais
coloniais zooxantelados que formam um exoesqueleto calcário (não espicular)
basal. Únicos octocorais formadores de recifes. Heliopora.
Ordem Pennatulacea. Penas-do-mar. Únicos octocorais adaptados a viver
no substrato mole. Possuem um pedúnculo com um bulbo para se ancorar e um
ráquis onde ficam os pólipos. Polimorfismo presente (autozooides e sifonozooides).
Esqueleto axial as vezes presente e escleritas calcarias no ráquis e pedúnculo.
Renilla, Umbellula, Stylastula, Pennatula.
Filogenia dos cnidários
Os cnidários têm uma das mais longas historias evolutivas dentro dos metazoários
com representantes fósseis na fauna de Ediacara ao sul de Austrália do período précambriano tardio, os quais contem vários tipos de medusas e pennatuláceos em torno de
600 milhões de anos (Fautin & Romano, 1997). Por esta ração a origem dos cnidários está
intimamente relacionada com a origem dos metazoários. Hoje não existem duvidas sobre o
monofiletismo dos metazoários suportado por dados moleculares (Miller et al, 1997).
Porem, dentro dos metazoários os animais diploblásticos provavelmente não conformam
um grupo monofilético. Um analise completo da subunidade 18S do RNA ribossômico
feito por Wainwright et al em 1993 revelou que o grupo dos diploblásticos era parafiletico,
e os coanoflagelados conformariam o grupo irmão dos metazoários. Segundo este estudo os
cnidários formariam uma linha evolutiva conjunta com os placozoários que se separou apos
a separação dos ctenóforos. Analises moleculares recentes (Ender & Schienwater, 2003)
contrariam esta hipótese, distanciando os placozoários dos cnidários.
As principais teorias sobre a origem dos metazoários são: Colonial, na qual os
metazoários se originaram de flagelados coloniais pôr progressiva especialização e
independência
celular;
Sincicial,
onde
ciliados
multinucleados
se
tornaram
compartimentalizados ou celularizados originando assim os primeiros metazoários, e
Polifilética, ou seja, origem a partir de diferentes grupos unicelulares. A teoria colonial foi
apresentada inicialmente por Haeckel e difundida pôr Hyman, em 1940. Hadzi, em 1953 e
Hanson, em 1977 foram os principais proponentes da teoria sincicial, enquanto Greenberg,
em 1959 defendia o ponto de vista polifilético. As duas primeiras naturalmente têm uma
concepção monofilética, assim como a teoria mais recente, chamada Trochaea (Nielsen,
1985). Para os colonialistas, a evolução dos metazoários se inicia com a blastea
(semelhante à blástula), passando pela gastrea (semelhante à gástrula), e o ancestral
hipotético dos metazoários seria muito parecido com a larva plânula dos cnidários, da qual
os metazoários inferiores teriam se originado. Assim, a simetria radial teria surgido
diretamente deste ancestral e uma modificação posterior desta, em simetria bilateral, como
a apresentada pelos platelmintos. Os poríferos e os cnidários viventes seriam os mais
primitivos dos metazoários. Para os defensores da teoria sincicial, os ancestrais hipotéticos
dos metazoários seriam ciliados primitivos, multinucleados e bilaterais (muitos ciliados
recentes apresentam esta simetria). Estes assumiram um estilo de vida bentônico com sua
abertura oral voltada para o substrato e ao longo de sua evolução formou-se uma membrana
celular envolvendo uma massa interna sincicial. Estas e outras modificações teriam
originado os platelmintos acelos. Os platelmintos seriam então, os mais primitivos dos
metazoários. Com a recente aquisição da informação de que o interior dos acelos é celular e
não sincicial, esta hipótese sobre a origem dos metazoários tem apenas um valor histórico.
Para Greenberg, esponjas e cnidários teriam surgido de flagelados coloniais, enquanto
platelmintos e ctenóforos teriam seguido a via dos ciliados ou dos mesozoários. Em 1985,
Nielsen propôs uma teoria chamada Trochaea, uma ampliação daquela conhecida como
Gastrea apresentada por Haeckel. Na teoria trochaea a evolução inicial dos filos animais
teria comportado uma série de ancestrais holoplanctônicos, baseado no fato de que
estruturas ciliadas para alimentação estão presentes em larvas de muitos invertebrados e
certos animais adultos.
Os cnidários formam um grupo solidamente definido pela presencia dos cnidocistos,
com monofilia confirmada molecularmente (Collins, 2002), que poderiam ter evoluído a
partir de um estádio gastraea ou de uma plânula (como ocorre na sua ontogenia). Por
qualquer caminho podemos chegar a um estádio primário de medusa ou larva. E aqui a
pergunta quase tão antiga como a do Ovo e da Galinha, quem foi primeiro a medusa ou o
pólipo? Se a teoria colonial da gastraea/plânula fosse correta, um ancestral radiado seria
necessário e a evolução deveria ter ocorrido desde grupos radiados ate formas bilaterais,
porem se a teoria sincicial fosse a válida, os bilaterais seriam os ancestrais.
Os cnidários estão representados basicamente por dois subfilos: Medusozoa e
Anthozoa. Os antozoários apresentam simetria bilateral na sua disposição dos mesentérios,
músculos e sifonoglifes, podendo ser hexarradiados (Hexacorallia) ou octorradiados
(Octocorallia). Os grupos restantes oferecem uma evidente simetria radial, essencialmente
tetrarradial. Assim desde o ponto de vista de Hyman (1940) os hidrozoários foram os
cnidários primitivos e os antozoários os mais avançados, com a medusa precedendo ao
pólipo; porem, Hadzi (1953) sugere ao inverso, com os antozoários (inteiramente
polipoides) como os cnidários mais primitivos, confirmando-se nos hidrozoários derivados.
Aqui as duas teorias que dão volta ao mundo faz quase 70 anos.
As diferentes classes de cnidários são identificáveis desde o inicio do período
Ordoviciano, mas as relações entre elas ainda são causa de debate. O subfilo Anthozoa é
alternativamente considerado o grupo mais basal ou o mais derivado. A primeira hipótese
posiciona aos pólipos como forma original e a medusa (e a metagênese) como forma
derivada (Fig. 1A). A segunda teoria indica que no típico ciclo de vida metagenico, a
medusa é gametogenica e constitui o estádio definitivo ou adulto com um pólipo que atua
como uma larva persistente. Assim é razoável que o pólipo evoluiu secundariamente e
perdeu a forma original do corpo, a medusa, localizando aos antozoários como o táxon mais
derivado (Fig. 1B).
Fig. 1 A
Fig. 1B
Fig. 1. Teorias alternativas da evolução do ciclo de vida dos cnidários e suas relações
sistemáticas. (Bridge et al., 1995.).
Willmer (1991) sugeriu que os antozoários e sua condição bilateral representariam o
estado primitivo do filo Cnidaria, baseado em evidencias dos organismos viventes e fosseis.
Os antozoários têm um ciclo de vida simples e uma menor plasticidade ante condições
ambientais adversas. Alem disso, têm uma menor complexidade e variedade de
nematocistos, hidrozoários tem 24 tipos com 17 exclusivos da classe. Os hidrozoários têm
uma musculatura mais complexa, glândulas ectodermicas e sistema nervoso mais
desenvolvido, indicando um elevado grau de diferenciação secundária. Analisando os
registros fosseis é impossível predizer quem é mais primitivo se o pólipo ou a medusa,
ambas formas foram encontradas em depósitos pré-cambrianos (Glaessner, 1984). Os
grupos melhor representados nos depósitos são os hidrozoários e os antozoários
pennatúlidos, associados com formas muito primitivas de escifozoários, o que sugeriria
uma origem posterior desta classe. As formas antozoárias primitivas têm uma simetria
bilateral mais marcada que as formas recentes, como pode ser observado nos corais da
ordem extinta Rugosa nos períodos Cambriano-Permico onde se observa um forte eixo de
simetria bilateral. Isto estaria sugerindo uma tendência desde uma pronunciada
bilateralidade primitiva para uma secundaria condição radial nos antozoários, e em
conseqüência uma origem bilateral para o filo todo (Willmer, 1991).
A evidencia de uma condição bilateral primitiva esta associada à Teoria Sincicial de
Hadzi (1953). Porem esta teoria requereria que um complexo platelminto adulto fosse
transformado em um cnidário, o caminho desde um ancestral turbelário acelo envolveria
inúmeras regressões evolutivas. Salvini-Plawen (1978) combinou a teoria planuloidea de
Hymam com os conceitos evolutivos dos cnidários, e incorporou um ancestral planuloideo
bentônico e séssil com dois tentáculos iniciais, incorporando uma progressão antozoáriohidrozoário (bilateral-radial) na evolução dos cnidários. Esta teoria é a mais aceitada, ou
melhor, a menos problemática hoje em dia. Mais um ponto importante a ser levado a conta,
se a evolução ocorreu a partir de ancestrais antozoários, é a grande quantidade de células na
mesogléia dos antozoários e sua quase ausência nos hidrozoários, isto estaria indicando um
estádio triploblástico primitivo, o qual era parcialmente suportado pela Teoria Sincicial de
Hadzi. Porem, os pólipos dos hidrozoários são sempre muito pequenos, e sua quase
ausência de células mesogleiais poderia não estar relacionado com a filogenia do grupo.
Os trabalhos de Bridge et al (1992, 1995) apóiam a idéia dos antozoários como
grupo mais primitivo. Uma das características-chave dos metazoários é a presencia de um
genoma mitocôndrial compacto e circular. Todos os cnidários antozoários e os ctenóforos
são tipicamente metazoários, em quanto que as demais classes de cnidários são
caracterizados por possuir genoma mitocôndrial linear. O tipo linear se assume como um
caráter de estado derivado, assim, este simples caráter molecular implicaria a localização
basal dos antozoários dentro do filo Cnidaria.
Analises morfológicos, com DNA mitocôndrial e com a subunidade 18S do RNA
ribossômico realizados em forma separada ou conjunta suportam a posição basal dos
antozoários dentro dos cnidários, mas não resolve as relações entre Scyphozoa, Cubozoa e
Hydrozoa (Bridge et al. 1995).
O dendrograma representado a continuação apresenta as relações filogenéticas entre
as classes do filo Cnidaria, baseado em dados morfológicos (Bridge et al. 1995) e
moleculares (Bridge et al. 1995; Collins 2002). O mesmo mostra que 1) todos os cnidários
estão mais fortemente relacionados entre sim que com outros animais multicelulares, 2)
que hidrozoários, cubozoários e escifozoários (os Medusozoa em seu conjunto) estão mais
fortemente relacionados entre si que com os antozoários, e 3) que os hidrozoários formam o
grupo irmão do grupo Cubozoa+Scyphozoa. Estudos do DNA de cubozoários realizados
por Ender & Shierwater (2003) demonstraram que a classe Cubozoa seria a mais derivada
dentro dos cnidários, já que as cubomedusas possuem quatro moléculas lineares de DNA.
Anthozoa
Cubozoa
Scyphozoa
Hydrozoa
Outros
Animais
multicelulares
No ano 2002, Collins realizou um estudo da filogenia dos medusozoários,
descrevendo claramente a monofilia das classes Cubozoa e Hydrozoa, e conjeturando o
parafiletismo da classe Scyphozoa baseado em que a ordem Stauromedusae possivelmente
seria o grupo irmão da classe Cubozoa ou de todos os medusozoarios. Alem disso, os
resultados filogenéticos deste trabalho sugerem que a forma pólipo possivelmente precedeu
a forma medusa na evolução dos cnidários; e dentro dos Trachylina, a forma pólipo foi
perdida e subseqüentemente recuperada nas narcomedusas parasitas. Finalmente, Marques
& Collins (2004) fizeram uma analise cladística dos caracteres morfológicos e
comportamentais dos cnidários medusozoários. Os resultados foram congruentes com os
estudos moleculares de Collins (2002), o qual fortaleceu a proposta de uma nova
classificação filogenética para o subfilo Medusozoa. Como primeiro passo, resolveram o
parafiletismo da classe Scyphozoa e criaram a nova classe Staurozoa, que agrupa medusas
sésseis (ordem Stauromedusae) e o grupo fóssil Conulatae. Desta forma a classe Scyphozoa
quedou caracterizada pela estrobilação e as éfiras (sinapomorfias) em um grupo
monofilético. Outra conclusão retirada do analise cladístico foi a inferência de que o
cnidário ancestral seria um animal séssil com forma polipoide, possivelmente septado com
simetria birradial. Se o ancestral foi um pólipo, então a adição da fase medusoide ao ciclo
de vida ocorreu na linhagem dos medusozoarios. Isto sugere que a medusa é um caráter
sinapomórfico do grupo Medusozoa.
A ultima teoria da possível origem dos cnidários foi publicada, faz horas apenas, por
Seipel & Schmidt (2005) baseada em estudos moleculares da musculatura e na ontogenia
da formação da medusa. O trabalho conclui que o ancestral dos cnidários seria um
organismo triploblástico móvel. Em conseqüência, a condição diploblástica teria evoluído
secundariamente nas larvas e pólipos dos cnidários, qual era suportado pela Teoria Sincicial
de Hadzi em 1953. Parece que voltamos ao inicio, um ciclo, metagénico também, pólipo e
medusa, medusa e pólipo, e uma carreira morfológica, cladística e molecular que parece ser
interminável.
ESTUDO DE UM CASO: MYXOZOA
Um bom exemplo sobre tudo o que nos falta por aprender da enorme diversidade
dos metazoários é o status dos Myxozoa. Parece incrível que no século XXI ainda fiquemos
com dúvidas sobre a natureza de alguns animais. Os myxozoarios são endoparasitas
microscópicos de peixes e invertebrados com corpo amorfo e plasmodial. Sempre foram
considerados protozoários, ate que em 1970 ganharam a condição de filo pela descoberta da
multicelularidade de seus esporos infectantes. Sidall et al (1995) baseados em analises
morfológicos e moleculares da subunidade 18S do DNA ribossômico concluíram que os
myxozoarios eram na realidade cnidários. A grande similaridade dos nematocistos com as
cápsulas polares dos myxozoarios suportava esta afinidade. Sidall et al, ainda, sugeriram
uma estreita relação com as narcomedusas parasitas, principalmente com Polypodium
hydriforme. Trabalhos posteriores não suportaram esta nova posição filogenética (Kim et
al, 1999). Somado a isto, Anderson et al, 1998 e Ferrier & Holland, 2001 demonstraram
que os myxozoarios possuiam Hox genes, um tipo de genes totalmente ausentes dentro dos
diploblásticos. Então começaram muitas discussões morfo-moleculares de fogo cruzado.
Ate que uma luz apareceu no caminho. No ultimo Congresso Internacional de Biologia de
Celenterados (7th ICCB) realizado em Lawrence (Kansas, USA) no ano 2003, Okamura &
Canning apresentaram um trabalho que confirma que os myxozoarios não são cnidários. E
foi um verme órfão o que desvendou o problema.
Schroeder (1910, 1912) descreveu a espécie Buddenbronckia plumatellae, uma
forma vermiforme parasita de briozoários coloniais de água doce. Esta espécie nunca foi
lotada em nenhum filo, uma espécie enigmática, órfã. A presencia de blocos de músculos
longitudinais sugeriam uma posição dentro dos Bilateria, talvez relacionada com os
nematódeos, porém Buddenbronckia não possuia boca ou aparelho digestivo, nem sistema
nervoso central. Em contraste, os myxozoarios formam formas plasmodiais ou de sacos
ocos onde os esporos são produzidos. Analises moleculares do DNA ribossômico de
Buddenbronckia de diferentes localidades resultaram de grande afinidade com os realizados
previamente com outras espécies de myxozoarios (Monteiro et all, 2002; Okamura et al
2002), concluindo que Buddenbronckia era, na realidade, um myxozoario. Okamura et al
(2002) sugeriram que algumas espécies de myxozoarios possuiam duas formas
morfológicas alternativas, uma vermiforme e outra plasmodial. Desta maneira, o DNA
ribossômico, os Hox genes e os dados estruturais de Buddenbronckia considerados em seu
conjunto, indicariam que os myxozoarios não são cnidários e que formariam parte da
linhagem dos Bilateria no reino animal (Okamura & Canning, 2003).
Zrzavy & Hypsa (2003) sugerem que o gênero Polypodium não pertenceria ao filo
Cnidaria e os reúne junto com os myxozoarios no novo clado Endocnidizoa dentro do clado
Bilateria. Dada a comprovada existência de cnidocistos em Polypodium, Bouillon et al
(2004) e que ditas estruturas são umas das mais complexas no reino animal, seria muito
difícil que tenham aparecido duas vezes na evolução em clados diferentes de animais, uma
vez nos os Acelomados (Cnidaria) e outra vez nos Bilateria (Endocnidozoa).
OS CNIDARIOS NO BRASIL
Segundo o estudo da Avaliação do estado do conhecimento da diversidade biológica
do Brasil de Invertebrados Marinhos (Migotto & Marques, 2003) Brasil tem umas 560
espécies de cnidários marinhos. Segundo a Base de Dados Tropicas para os cnidários
registrados no litoral brasileiro (Migotto et al, 2000) e os trabalhos realizados por Migotto
et al (2002) e Marques et al (2003) sobre o conhecimento dos Medusozoa do Brasil, o
grupo mais bem representado é dos hidrozoários com 348 espécies descritas, depois
antozoários com 108 espécies (56 de octocorais e 52 de hexacorais), as escifomedusas com
23, as cubomedusas com três espécies e a nova classe Staurozoa com uma única espécie
descrita. Se compararmos estes registros com os mundiais concluiremos que o
conhecimento dos cnidários brasileiros é muito pobre: Hydrozoa, 3300 espécies mundiais
contra 348 brasileiras, Scyphozoa 200 contra 23, Cubozoa 16 contra 3, Staurozoa 50 contra
1 e Anthozoa 6500 contra 108. Este baixo conhecimento deves-se em grande parte a falta
de especialistas, e de políticas que incluam aos cnidários nos programas de levantamento da
biodiversidade marinha brasileira. Os pólos de pesquisa estão concentrados em São Paulo
(IBUSP, USP e CEBIMAR) e em Rio de Janeiro (UFRJ e Museu Nacional). No Nordeste
tem a Prof. Fernanda Amaral (corais) e a Prof. Paula Braga Gomes (anêmonas) na
Universidade Rural Federal de Pernambuco, a Prof. Elga Mayal (hidrozoários e corais) e o
G.P.A. (Grupo de Pesquisa em Antozoários) grupo que coordeno desde 2001 e que tem nas
suas linhas de pesquisa a sistemática, ecologia e farmacologia dos cnidários antozoários
não escleractínios, na UFPE.
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