mestrado em missiologia

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FACULDADE TEOLÓGICA SUL AMERICANA
“Preparando Vidas para Servir o Reino de Deus”
MESTRADO EM MISSIOLOGIA
A AÇÃO DE DEUS NO MUNDO:
O HOMEM, A IGREJA E A TEOLOGIA PRÁTICA
Alexandre Ferreira Pevidor
Junho/2000
1
ÍNDICE
1. Introdução...............................................................................................................02
2. A Criação de Deus como Expressão do Seu Amor................................................04
3. O Mundo Pecador amado por Deus.......................................................................07
4. O Homem Como Agente do Amor de Deus no Mundo..........................................11
5. Minhas Testemunhas.............................................................................................14
6. A Teologia Prática Como Agente de Deus no Mundo............................................16
7. Conclusão...............................................................................................................19
Bibliografia..................................................................................................................21
2
INTRODUÇÃO
“Se Deus criou o mundo e ‘desapareceu do mapa’, então Ele é um
alienado”. Este foi o comentário de um jovem, logo após ouvir um estudo a respeito
da doutrina deísta.
Desde a idade média já se discutia sobre a ação de Deus na Sua criação.
Discussão sobre a evolução, dualismo, emanação em suas várias formas e outras
teorias surgiram com a finalidade de defender ou mesmo de se chegar a uma idéia
concreta concernente ao ato criador de Deus.
Quando olhamos para a Bíblia, com nossos olhos limpos de todo conceito
ou preconceito teológico, deparamos com vários textos que iluminam o assunto da
criação de Deus de forma simples, racional e verdadeira. Em Gn 1 encontramos um
termo peculiar durante toda a extensão da criação: “Disse Deus: haja...” aqui vemos
o ato soberano, santo e eterno de Deus manifestado desde a eternidade (Sl 139) na
Sua obra física e espiritual.
A criação de Deus é algo incontestável para os biblicistas e para quem é
dirigido pela fé. Contudo, não é meu objetivo defender a criação de Deus na sua
forma abrangente, e para isso pergunto: como a teologia influencia o mundo hoje?
Precisamos apresentar um Cristo conhecido pelo mundo inteiro? O mundo hoje
3
clama pelo ensino de Jesus, ou pela Sua vida prática no meio do povo?. Neste
trabalho tratarei da criação de Deus como obra do Seu amor, da Sua satisfação,
tanto do seu povo como daqueles que estão perdidos nas trevas, da natureza
vegetal e animal. Estudaremos também a tarefa do homem no plano criador de
Deus, Sua teologia, ensinada e praticada por Ele através de Seus Filho, e veremos
uma teologia que seja capaz de agradar ao Criador, e à luz da vontade divina atingir
toda a humanidade.
4
A CRIAÇÃO DE DEUS COMO EXPRESSÃO DO SEU AMOR
“ No princípio, criou Deus os céus e a terra. A terra, porém, estava sem
forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava por
sobre as águas.” (Gn 1.1-2) (conf. At 17.24, Jo 1.3, Sl 8).
A criação do cosmos por Deus é algo maravilhoso e ao mesmo tempo
assombroso. Um PhD em física nuclear, discutindo com seus colegas de profissão
numa das salas da NASA, nos EUA, argumentava sobre o início do mundo. Ele,
cristão, dissertava sobre a teoria bíblica da criação efetuada por Deus. Seus
colegas, contudo, argumentavam que o mundo surgiu de uma grande explosão,
ocasionada por um acúmulo de Neutrons, Átomos, e outros componentes químicos.
“Concordo com essa teoria!”, disse o físico cristão. “Todavia, como vocês explicam o
surgimento desses Neutrons e Átomos que, acumulando, ocasionaram a grande
explosão que deu origem ao universo?”. Eles responderam: “Aqui a ciência pára!”. O
físico cristão disse: “Então, onde a ciência não explica eu resumo numa única
palavra: DEUS”.
A criação de todo cosmo e tudo que nele está percebemos como obra da
soberana vontade de Deus e como a manifestação do Seu tremendo poder.
Encontramos uma descrição dessa maravilha em Isaías 40.26: “Levantai ao alto os
olhos e vede. Quem criou estas coisas? Aquele que faz sair o seu exército de
5
estrelas, todas bem contadas, as quais ele chama pelo nome; por ser ele grande em
força e forte em poder, nem uma só vem a faltar.” (cf Is 42.5, 45.18, 51.13, Ne 9.6,
Ef 3.9, Ap 10.6). A incontestabilidade do amor de Deus na criação envolve de toda
forma Sua criação e Seus atos pelos séculos dos séculos.
Dentro dessa perspectiva da criação de Deus, encontramos na
diversidade do mundo criado uma imensurável gama de existências: umas maiores,
outras menores; uma de mais importância, outras de menos importância; algumas
inteligentes, com capacidade de raciocinar para decidir, para tomar decisões, outras
inteligentes sem essas mesmas capacidades; seres vivos vegetais, animais, nos
céus, na terra e em todos os lugares.
“A igreja cristã, desde o começo, ensinava a doutrina da criação ex nihilo
e como um ato livre de Deus”1. Na posição de um Ser livre, auto suficiente,
onipotente, onisciente e todo poderoso, Deus criou o mundo para a justiça e para a
calamidade. Aqui entra o homem, que, como conseqüência da criação de Deus, veio
ao mundo com a finalidade de cumprir piamente os propósitos de Deus
estabelecidos desde a eternidade. O apóstolo Paulo, falando aos coríntios, define
esses propósitos de Deus como algo estabelecido anteriormente e realizado pela
Sua soberana vontade, através de cada ser humano e cada criatura do próprio
Deus: “mas falamos a sabedoria de Deus em mistério, outrora oculta, a qual Deus
preordenou desde a eternidade para a nossa glória” (1Co 2.7).
1
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática, Editora Luz para o Caminho, 1994, pg 127.
6
Dentro dessa ótica da criação de Deus, encontramos algumas criações de
Deus que tem sua tarefa específica, seu objetivo de ser criado, sua missão ativa a
se realizar neste mundo.
7
O MUNDO PECADOR AMADO POR DEUS
Em Jo 3.16 encontramos a síntese da expressão amorosa de Deus pela
Sua criação. O mundo está perdido, dessa forma “a responsabilidade do homem
pelo mundo é a própria essência do evangelho”2. Assim, a “missio Dei é obra de
Deus. Ele é o Senhor, o doador da tarefa, o proprietário, o executante. Ele é o
sujeito ativo da missão”3 salvífica no mundo. Exercendo Ele mesmo essa obra,
primariamente através de seu Filho Jesus Cristo, Deus encarrega seus súditos a
continuarem cuidando do mundo. Como uma entidade ‘religiosa’ fixada no mundo,
“a igreja, surge naturalmente, mas com características sobrenaturais; é uma
entidade sociológica com uma natureza espiritual”4, cujo objetivo é lutar no mundo e
pelo mundo.
Deus levantou pessoas no passado e sempre as levantará para
encarregá-las do cuidado de Deus pelo mundo, o que é expressado pelos
evangelhos. Essa foi a razão de Jesus Cristo instituir Sua igreja (Mt 28.18-20)*.
“Nosso objetivo como igreja é dar nossa vida, proclamar, viver e praticar o evangelho
no meio dos problemas e dores da cidade, pobreza e ganância”5. Assim, Deus não
somente criou, mas também se preocupa intensamente e trabalha para o bem do
2
PADILHA, René. Missão Integral, Editora Temática publicações, 1992, pg 26.
VICEDOM, Georg. Missão como Obra de Deus, Editora Sinodal, 1996, pg 16.
4
VANENGEN,Charles. Povo Missionário Povo de Deus, Editora Vida Nova, 1991, pg 50.
* “Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto,
fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os
a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do
século”.
5
LINTHICUM, Robert C. . Revitalizando a Igreja, Editora Bom Pastor, 1996, pg 49.
3
8
próprio mundo. Um mundo que Ele criou, que deu Seu único Filho para morrer por
esse mundo que, por causa do pecado, se degenerou, se tornando destruído,
destruidor e quase sem esperanças. Assim, vemos a ação divina num mundo
pecador, amado por Deus, na qual Ele não só trouxe a salvação, como providenciou
meios para que esse mesmo mundo tivesse acesso a ela.
Os Meios e os Fins de Deus para o Mundo
Como alguém que ama e deseja preservar sua criação, o Senhor proveu
meios, instrumentos no mundo para que a Sua ação fosse contínua até o fim dos
tempos.
A Igreja como entidade de Deus no mundo
O livro de Atos dos Apóstolos narra o início da igreja cristã, logo após a
ascensão do Senhor Jesus Cristo. Sua missão no mundo entre os humanos estava
encerrada. Aquilo que o homem jamais teria condições de realizar por si só agora
estava ”consumado”, e a missão do Filho realizada. Contudo, havia ainda milhares
de vidas contemporâneas e em centenas de anos no futuro, que precisariam ouvir o
testemunho do Salvador e a mensagem de vida eterna. Assim, surge a igreja,
encarregada de ser uma agência de salvação, no sentido de anunciar os propósitos
do Pai através de Seu Filho. Dessa forma, “o Reino de Deus que está parcialmente
presente na prática de Jesus é esperado como alvo escatológico. Os seus
protagonistas eram os pobres, e os que precisam de justiça”6 social, ou seja, pão,
curas, identidade, liberdade, razão de existência.
6
SCHNEIDER, Christoph - Harpprecht. Teologia Prática no Contexto da América Latina, Editora Sinodal,
1998, pgs 54-55.
9
A igreja, desde então, se tornou uma mensageira do reino de Deus e
também uma agência que luta por uma cultura mais digna, uma humanização justa,
os deveres serem cumpridos e para termos um mundo cada vez mais humano.
Nossa realidade hoje é bem oposta àquela proposta inicial. Scherer aponta essa
realidade quando diz que “em muitos países as igrejas estavam identificadas com o
status quo, alienada dos pobres devido a valores de classe média, e cheia de
pessoas satisfeitas e enfatuadas que não estão dispostas a olhar para o Lázaro à
soleira de sua porta”7.
Anunciar o evangelho, portanto, não se limita, na ótica de Jesus, a falar
palavras de salvação, mas providenciar meios para que as pessoas perdidas na
escuridão das trevas tenham, mesmo que não salvas, uma vida melhor e mais justa.
A Igreja é uma entidade com multiplicidade de naturezas; ela, “a igreja é sem dúvida
chamada para pregar todo o evangelho do reino, um evangelho que tem implicações
de justiça social para toda a sociedade”8. Desta forma, “ a missão global não é
simplesmente a tarefa da igreja, mas a causa do próprio Deus”9, conseqüência do
Seu imensurável amor pela Sua criação, por isso “a igreja em missão não pode
existir sem olhar para o mundo com os olhos de Deus. Ela não consegue deixar de
questionar os principais problemas que afligem
a
humanidade
(pobreza,
discriminação, fome, violência, guerra)10”.
A igreja possui uma missão no mundo, que é a de representar todas as
ações de Deus, como se Ele estivesse atuando no mundo ainda
7
SCHERER, James A. Evangelho, Igreja e Reino, Editora Sinodal, 1991, pg 100.
VANENGEN, Charles. pg 147.
9
SCHERER, James A., pg 39.
10
SCHNAIDER, Christoph - Harpprecht, pg 216;
8
na pessoa do
10
Senhor Jesus Cristo.
“A essência da igreja é sua própria tarefa. Ou ela é missionária
ou deixa de ser igreja. Porque o próprio Deus é missionário.
Por isso o lema para a igreja não é: fazer crescer a igreja
aumentando o número de seus membros, mas é: serviço ao
mundo em favor do shalom de Deus. Por isso, uma
comunidade não deve visar, em primeiro lugar, a si mesma,
mas deve estar voltada para as necessidades do mundo. E
nessa tarefa ela pode e deve colaborar com todas as demais
instâncias que têm em vista um mundo mais sadio, mais
fraterno, mais humano”11.
Assim, a igreja jamais pode negligenciar sua responsabilidade diante do
mundo, da sociedade, diante das pessoas e diante do próprio Deus que a
arregimentou para o cuidado com o mundo e com tudo que nele há. Concluímos,
diante disso, que “missão significa participar da ação de Deus, do cumprimento de
Seu plano para a vida de Seu Reino produzindo entre as nações a obediência da fé
em Jesus Cristo, nosso Senhor”12.
11
12
Ibd, pg 182.
SCHERER, James A. pg 77.
11
O HOMEM COMO AGENTE DO AMOR DE DEUS NO MUNDO
O mundo como criação de Deus foi entregue à humanidade, não para a
sua destruição, mas para a preservação e o cuidado, visando o próprio bem dela.
Essa realidade é bem diferente quando olhamos para a destruição da matas; a
matança de animais silvestres; a poluição do ar e de todo meio ambiente;
a
contaminação dos lagos, rios e mares; sem contar os testes atômicos e produtos
químicos que pulverizam do sistema ecológico um ambiente tão puro, belo e
necessário para a humanidade, e que foi criado por Deus para o cultivo, felicidade e
sobrevivência do homem.
Em Gênesis 2.15 encontramos a mensagem da preservação do cosmo
quando diz: “Tomou, pois, o SENHOR Deus ao homem e o colocou no jardim do
Éden para o cultivar e o guardar.” Essa missão englobava não somente o cuidado
por parte do homem com a natureza e animais, como principalmente o cuidado em
preservar a integridade e a santidade de Deus manifestada nelas (Sl 19) e o zelo
com a coroação de toda criação de Deus: o homem, feito a Sua imagem e
semelhança. Dessa forma, todo homem, indistintamente de sua religiosidade, tem a
responsabilidade do zelo e cuidado com a natureza e com seu próximo. O maior
mandamento que encontramos nas Escrituras está no evangelho de Mateus 22.3739: “Amar a Deus sobre todas as cousas”. Isto implica em não destruirmos sua
criação e respeitá-la como se ao próprio Deus. “O povo de Deus deve praticar a
12
caridade com o pobre (Dt 15.10-11); deve estar preocupado com a deterioração das
condições humanas entre os pobres (Is 61.1-9); e deve advogar a causa do
desamparado perante os sistemas de poder (Jr 22.12-27)”13.
Uma das providências que Deus tomou para que o homem não ficasse só
nessa luta foi a descida do Espírito Santo para os auxiliar durante todo o período da
militância. Uma vez chegando a plenitude do tempo para a conversão do indivíduo,
há a operação espiritual do Espírito na pessoa, que, pelo processo da conversão,
passa a fazer parte do Reino de Deus como filho adotivo. Consequentemente, ela
passa a ter uma responsabilidade aumentada no que diz respeito à atuação de
Deus, através dela, no mundo. VanEngen afirma que “a conversão plena, no sentido
bíblico, é um processo tríplice que implica: 1)a conversão a Deus em Cristo; 2) A
conversão à igreja; 3) A conversão ao ministério no mundo pelo qual Cristo
morreu”14.
Deixando de lado a idéia “institucionalizada” de igreja, o que torna
subjetivo a responsabilidade individual de cada um na missão de Deus ordenada por
Deus, precisamos olhar para a missão como uma obra individual e não coletiva.
Scherer anuncia essa idéia quando afirma que “ o verdadeiro contexto para a missão
era o mundo, e não a igreja”15. Deus trabalha com o ser humano a “varejo”, e não a
“atacado”; ou seja, quando falamos do Deus Criador, falamos de um Ser que se
envolve pessoalmente, e na pessoalidade individual de cada pessoa. Dessa forma,
quando Ele ordena, Sua ordem pode até parecer, nas Escrituras, generalizada, mas
13
LINTHICUM, Robert C. pg 210.
VANENGEN, Charles, pg 195.
15
SCHERER, James A. pg 73.
14
13
é puramente pessoal e individual. Claramente vemos essa pessoalidade em
Apocalipse 20.13, quando encontramos na visão de João um por um, pessoa por
pessoa, sendo julgada pelos seus atos ou suas desobediências.
14
MINHAS TESTEMUNHAS
Ser testemunha de Deus no mundo implica em ir muito além da pregação
do evangelho. Todavia, quando olhamos para a ordem de Deus para sermos Sua
testemunha,
chegamos
a
algumas
conclusões
importantes.
Nos
textos
Veterotestamentários em que aparece a expressão “minhas testemunhas” (Is 43.10,
43.12; 44.8), a construção hebraica é sempre a mesma; ou seja: “de (ed)”
presenciar, testemunhar, evidenciar alguma cousa. A testemunha de Deus não é
meramente aquela pessoa que sabe do que fala, que conhece o que é verdadeiro,
mas é uma testemunha evidente, como um documento ambulante de Deus. No Novo
Testamento (At 1.8) essa mesma expressão aparece na forma grega “martuv
(martîus)” que nos transmite a idéia de que a testemunha de Deus é aquela que
apresenta um juízo legal, histórico, alguém que não fala despropositadamente, mas
que foi ou é espectador daquilo que anuncia e evidencia às outras criaturas. Desta
forma podemos perceber que “o cristianismo consiste mais numa prática do que
numa teoria”16.
A missão de Deus no mundo, e consequentemente a ação dEle próprio
neste mundo em todas as épocas, pode ser percebida nas mais diversas ações dos
Seus súditos e de toda a humanidade em geral (Sl 139.16). Todavia, no que
concerne a manifestação das bem-aventuranças e do juízo de Deus no mundo ,
16
SCHERER, James A. pg 55.
15
vemos Sua ação somente através do Seu povo, ou seja, dos membros da Sua
igreja. “A igreja é uma função do apostolado, a serva da missio Dei, [...] que abarca a
esta e ao mundo; [...] A igreja serve a missio Dei no mundo ao aportar para o Deus
que age na história do mundo e ao nomeá-lo ali”17. Cada cristão que reconhece seu
lugar no Reino e o chamado de Deus para si jamais se tornará infrutífero, alienado,
descompromissado ou desobediente; e nesse “serviço da igreja realiza-se a missio
Dei”18.
Cada cristão deve se identificar no Reino e a sua ação nele, para que o
mundo desfrute das bem-aventuranças de Deus, bem como seja anunciado Seu
juízo, e o mundo veja o Deus que o criou, que cuida dele, que lhe providenciou
salvação da sua perdição momentânea e eterna. Somente alcançarão essa visão
aqueles que de fora do Reino tenham perto de si, dentro do ‘seu’ mundo,
testemunhas vivas, reais e presentes lhes anunciando essa salvação e lhes
mostrando o caminho de uma vida com o Criador; pois “Missão como causa de Deus
significa que Ele reivindica o direito de dispor sobre todos os seus crentes da mesma
forma como é Seu desejo compartilhar com todos os seres humanos Seu amor
através de Seus crentes”19. “Quando a comunidade testemunha a verdade, ela tem
que ter consciência de que, ao confrontar o mundo com a verdade, ela própria está
sendo colocada perante a pergunta existencial”20; qual a razão da sua existência,
qual é a sua missão; e para isso temos a garantia de nunca sermos abandonados,
mas resguardados de todo mal e desânimo até a consumação dos séculos (Mt
28.18-20).
17
Ibd, pg 86
VICEDOM, Georg. pg 39
19
Ibd, pg 16
20
Ibd, pg 94.
18
16
A TEOLOGIA PRÁTICA COMO AGENTE DE DEUS NO MUNDO
Já vimos que Deus age no mundo através das suas criaturas. Vimos
também que a esfera principal, através da qual age e manifesta-se no mundo, é Sua
igreja. Agora, analisaremos a teologia prática como um agente aliado de Deus para
a Sua ação no mundo, principalmente no que concerne à Sua manifestação
salvífica, abençoadora, redentora e presencial entre as pessoas e o cosmo em geral.
A teologia, desde que há teologia sempre foi a mesma. Contudo, não
podemos afirmar o mesmo com respeito à sua prática, pois com o passar dos
tempos o cristianismo, influenciado pela ‘sua’ teologia, se tornou puramente teórico
desprovido de pragmátismo, mais uma ideologia filosófica do que uma verdade
transformadora. São vários os textos bíblicos em que encontramos o Senhor Jesus
Cristo distribuindo teologia fora dos templos, das sinagogas, em meio ao ‘povão’,
ensinando a teoria da Sua teologia e praticando-a ao mesmo tempo (Mt 4.17, 23;
5.1; 8.1-4; 8.11-13; 8.14; 8.18; 9.1; 9.10; 9.27-28; 9.35; 11.1 etc). Scherer entende
essa realidade da teologia fora dos portões da igreja, quando afirma que “Um Cristo
terreno, que foi deitado numa manjedoura, dirigiu-se aos que estavam à margem da
vida, afirmou seu senhorio renunciando ao mesmo e acabou sendo crucificado fora
dos muros da cidade”21; e ainda, ”Jesus , crucificado fora dos muros da cidade,
21
Scherer, James A., pg 104.
17
passa do centro à periferia para estar com os pobres, os desprezados, os
marginalizados e os oprimidos”22.
Nas Escrituras Sagradas contemplamos, numa ótica espiritualista e real,
o quanto Jesus deixou bem forte o exemplo de uma verdadeira teologia divina, que
para ser tal, e ter de Deus o aval, necessita antes de ser um anúncio, ser prática.
Desta forma, “a teologia prática é a teologia do servir da igreja” 23. Em Mc 1.22 o
evangelista diz: “Maravilhavam-se da sua doutrina, porque os ensinava como quem
tem autoridade e não como os escribas”. Sua exousia (exousia) significava para
os judeus um poder nas palavras; plena autoridade de quem fala do assunto que
domina, e por isso influenciava com grande facilidade Seu público.
O ensino de Jesus se diferenciava dos demais rabinos, judeus, pastores
e evangelistas contemporâneo Seu. Todavia, isso não se dava na esfera das
palavras ensinadas, pois elas eram as mesmas dos outros, mas percebemos essa
grande diferença entre Ele e os outros no fato de Jesus, antes de pregar palavra
como teologia, Ele pregava vida. Jamais podemos destituir da teologia sua tarefa de
libertação, pois “a teologia prática tem como seu objetivo a libertação dos sujeitos,
baseada na fé cristã, numa sociedade livre e justa, a edificação de uma igreja
solidária”24. Jesus falava como de si mesmo, como alguém que fala da boca de
Deus, que de Deus tem a autoridade, uma procuração para falar por Ele próprio.
Agindo assim, Ele demonstrava que Sua autoridade era independente do homem,
sendo essa a grande diferença que O separava dos outros pregadores (cf Mt 7.28-
22
Ibd. pg 106.
Schneider, Christoph - Harpprecht. pg 27.
24
Ibd pg 54.
23
18
29). A teologia pode negligenciar sua prática, mas nuca perderá sua essência
prática. Schneider descreve essa realidade de uma vida útil e prática da real teologia
dizendo que:
“a tarefa da teologia prática será redescobrir a comunidade cristã
como espaço de comunicação, cultivar a pastoral de convivência
em pequenos grupos e o culto como celebração da esperança
do povo de Deus, povo a caminho do Reino. A valorização da
experiência particular do sujeito, de sua biografia, das suas
emoções e anseios, de sua busca pôr sentido e felicidade terá a
mesma importância que o compromisso ético e profético de
solidariedade com os excluídos, as vítimas das sociedades no
Terceiro Mundo.”25
A teologia sem a sua prática, é uma teologia morta, sem a mínima
capacidade de transmitir a vida em abundância que Jesus Cristo anuncia nos
evangelhos. Sua vida, entretanto, está sujeita à sua ação no mundo amado por
Deus, e pelo qual Cristo morreu. Assim, vemos que a humanização é o grande
clamor do terceiro milênio, e nele,
as pessoas não precisam mais que lhes
apresentemos e preguemos as palavras um Cristo muito bem conhecido, mas sim,
que pratiquemos a Sua vida e Seu testemunho ao mundo, e no mundo.
25
Ibd, pg 331.
19
CONCLUSÃO
Deus se manifesta de diversas formas no mundo e na sua história. Desde
o princípio de toda a criação, até o seu fim a ação de Deus é ativa e real. No
decorrer da história Deus agiu no mundo de forma maravilhosa e percebemos Sua
Teofania em diversas passagens bíblicas. Contudo, no pleroma de Deus Ele se
manifestou de forma humana irrefutável no mundo e em meio à Sua obra criada
através do Seu Filho Jesus Cristo. Ele realizou a missão do Pai, que era também a
Sua missão como Filho.
Ao completar Sua missão no mundo, o Filho voltou para o Pai, e à Sua
igreja derramou-lhe Seu Santo Espírito para os guardar e lhes conduzir na
continuidade da obra redentora e de preservação de Deus no mundo. A igreja tem
uma responsabilidade de ser agente ativo de Deus, anunciando todos os planos,
vontades, ações e teologia de Deus no mundo e para o mundo.
A toda a humanidade o Senhor deu a ordem de cuidado e preservação do
cosmo criado por Ele para o deleite e sobrevivência dos que nele habitam. A cada
servo em específico, Deus lhes chama das trevas para anunciar aos que perdidos
estão, uma luz redentora e transformadora. Este anúncio jamais obterá de Deus
aprovação, ou mesmo um resultado satisfatório se ele não for pragmático, se não
seguir fielmente as palavras e os passos de Jesus que fazia teologia com as mãos e
20
não somente com dissertações teológicas. A teologia prática é a voz encarnada de
Deus no mundo criado e amado por Ele.
21
BIBLIOGRAFIA
VANENGEN Charles. Povo Missionário povo de Deus. São Paulo: Ed. Vida Nova,
1991.
LINTHICUM, Robert C. Revitalizando a Igreja. São Paulo: Ed. Bom Pastor, 1996.
PADILHA, René C. Missão Integral. São Paulo: Ed. FTLB Temática Publicações,
1992.
SCHNEIDER, Christoph-Harpprecht. Teologia Prática no Contexto da América
Latina. São Leopoldo: Ed. Sinodal, 1998.
SCHERER, James A. Evangelho, Igreja e Reino. São Leopoldo: Ed. Sinodal, 1991.
VICEDOM, Georg. A Missão como Obra de Deus. São Leopoldo: Ed. Sinodal,
1996.
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