A Tecnologia como uma Propedêutica no Diagnóstico Médico Prof. Dr. Sigisfredo Luís Brenelli Depto Clínica Médica FCM - UNICAMP 1 • Hipócrates foi o primeiro a usar a palavra diagnóstico, que significa discernimento, formada do prefixo dia, através de, em meio de + gnosis, conhecimento. • Inicialmente, o médico só dispunha de seus sentidos para exame do paciente. Com a visão, observava o enfermo, com o tato realizava a palpação e a tomada do pulso; com a audição ouvia as suas queixas e ruídos anormais; com o olfato podia sentir odores característicos. • Exame dos excretas, especialmente a urina. O exame macroscópico da urina, chamado uroscopia, foi largamente utilizado até o século XVIII. Dava-se muita importância ao exame do pulso e Galeno, no século II d.C. chegou a descrever 27 variedades de pulso. • Instrumentalização do médico teve início no século XIX com a invenção do estetoscópio por Laennec em 18l6. • Embora o termômetro fosse conhecido desde o século XVII, seu emprego como instrumento para medir a temperatura corporal data de 1852, quando Traube e, a seguir, Wunderlich, na Alemanha, introduziram o gráfico de temperatura ou curva térmica, que permitiu a caracterização dos vários tipos de febre. • 1880, von Basch, na Alemanha, idealizou o primeiro aparelho, uma bolsa de borracha cheia de água e ligada a uma coluna de mercúrio ou a um manômetro. • Em 1896, o italiano, Riva-Rocci, substituiu a bolsa por um manguito de borracha e a água pelo ar. A medida da pressão diastólica teve que esperar por mais 9 anos, até que um jovem médico russo, Nikolai Korotkov descobrisse os sons produzidos durante a descompressão da artéria. 2 • Ao final do século XIX o médico já dispunha dos três instrumentos básicos utilizados no exame do paciente. Além desses três instrumentos, outros acessórios foram adicionados à maleta do médico, como o oftalmoscópio, abaixador de língua, otoscópio, rinoscópio, martelo de reflexo, etc •. A microscopia trouxe ainda a revelação da estrutura celular dos seres vivos e a identificação das alterações patológicas dos tecidos produzidas pelas doenças. Após os trabalhos de Virchow, publicados em 1864, a teoria da patologia humoral que orientou o pensamento médico por mais de 2.000 anos foi substituída pela patologia celular. • A cirurgia, que se limitava à patologia externa, após a descoberta da anestesia geral em 1846 e da prática da antissepsia e da assepsia teve um contínuo progresso. • Como marco inicial da era tecnológica podemos considerar a descoberta por Roentgen, dos raios-X, em 1895 • A tecnologia médica propriamente dita só se desenvolveu no decorrer do século XX, com o diagnóstico por imagens, endoscopia, métodos gráficos, exames de laboratório e provas funcionais •Outra grande conquista foi a da endoscopia. A história da endoscopia compreende 4 períodos: o das válvulas e espéculos, até o século XVIII; o dos endoscópios rígidos, de 1805 a 1932; o dos endoscópios semiflexíveis, de 1932 a 1957, e o dos endoscópios flexíveis, a partir de então. •Nos últimos anos assistimos, maravilhados, as novas conquistas da tecnologia médica, com a introdução dos raios Laser, dos computadores, da robótica, da 3 manipulação genética, da clonagem de seres vivos. Dois notáveis fatores : a tecnologia e o humanismo Humanismo = é o avanço da descoberta do homem enquanto homem. •humanismo religioso Maritain •humanismo materialista Marx •humanismo existencialista Sartre •humanismo tecnológico indústria moderna. 4 A tecnologia, na medicina, de outro lado, constitui o esforço racional e científico em desvendar os mistérios e os fenômenos das coisas e encontrar processos mais seguros e eficazes para a solução dos males da nossa terrível fragilidade física e mental. 5 Melhor evolução da medicina : A conjugação, a conciliação e a ampliação da visão humanísta do paciente, objetivando analisá-lo na sua integralidade física, mental, comportamental, social, familiar, cultural, genética, de onde pode, de alguma forma, provir a moléstia, ou os obstáculos que impedem a sua cura, aplicando-lhe após, com mais convicção e segurança, os recursos tecnológicos disponíveis. É muito urgente a humanização da clínica médica, restabelecendo-lhe a credibilidade, que é historicamente o seu maior atributo. 6 Conflito entre o humanismo e a tecnologia, o relacionamento médico-paciente vem perdendo progressivamente a condição básica da pessoalidade, como seu requisito de maior relevância, e passa a prevalecer, na ordem dos valores, não mais o paciente, como ser humano, que quer ser curado, mas, sim, isoladamente a doença, como inimigo a ser combatido. Despessoalizado o relacionamento médico-paciente, mercantilizado o atendimento na medicina de grupo e pacotes, a doença passa a ser encarada como um desafio autônomo, alheio ao paciente, que o médico quer superar, separado do homem que padece com toda as dramáticas conseqüências pessoais, familiares e profissionais da doença A tecnologia não veio substituir a íntima e pessoal relação médico-paciente. Ela veio subsidiar as conclusões diagnósticas, fortalecendo-lhes a certeza dos prognósticos. O humanismo é a mais sublime das virtudes do homem e o melhor instrumento de trabalho das profissões destinadas a lidar com o sofrimento, 7 com a dor e com a angústia humana. Osler: “ a medicina deve começar com o paciente, continuar com o paciente e terminar com o paciente” 8 É indiscutível o fascínio que a tecnologia provoca nos seres humanos, sejam eles médicos, pacientes ou membros da sociedade em geral. A tecnologia tem características próprias cuja sedução é imediata e inequívoca, e afasta-nos do incerto (ainda que aparentemente) e outorga poder a quem a datem. 9 “Não se pode dividir a história de um paciente examinando-o em componentes físicos e mentais, pois são profundamente interligados na sua essência; nem separar reações da causa orgânica ou disfunção que as provocou” 10 “A boa medicina é o casamento do conhecimento científico e calor humano: O médico excelente é aquele que trata as doenças examinando as coisas, desde o começo, de maneira científica e ganha a confiança do paciente, e procura tenazmente proporcionar a restauração completa da saúde... 11 Platão, Livro IV das Leis “O médico que pretenda compreender o paciente e a sua doença, deverá considerar fatores mentais à enfermidade, traçando um perfil psicológico para não ser conduzido ao mesmo erro que incorrerá o psiquiatra se não considerar achados físicos de 12 um quadro” A METAFÍSICA DO CORPO Mulher planta brisa mar, A metafísica do corpo se entremostra Nas imagens. A alma do corpo Modula em cada fragmento sua música De esferas e de essências O ser telúrico, espontâneo, Como se um galho fosse da infinita Árvore que condensa O mel, o sol, o sal, o sopro acre da vida Além da simples carne e simples unhas. Em cada silêncio do corpo identifica-se De êxtase e tremor banha-se a vista A linha do sentido universal que à forma breve e transitiva imprime Ante a luminosa nádega opalescente, A solene marca dos deuses E do sonho. A coxa, o sacro ventre, prometido Ao ofício de existir, e tudo mais que o corpo Resume de outra vida, mais florente, Entre folhas, surpreende-se Em que todos fomos terra, seiva e amor. Na última ninfa O que na mulher ainda é ramo e orvalho Eis que se revela o ser, na transparência E,mais que na natureza, pensamento Do invólucro perfeito Da unidade inicial do mundo: 13 Carlos Drummond de Andrade