ECONOMIA COMPORTAMENTAL: MISSÃO, HISTÓRICO, PRECURSORES, IMPASSES EAE 350 Leituras Orientadas Profa. Ana Maria Bianchi 2016 – 2º semestre Aula 1: Introdução à Economia Comportamental “Missão” Breve histórico Precursores Direção e impasses da pesquisa atual “Missão” Economia Comportamental Conferir maior realismo à teoria econômica para melhorar seus insights teóricos, capacidade preditiva e competência para orientar políticas. Busca de maior realismo descritivo. A maioria das escolhas humanas não é feita de forma deliberada e consciente, a partir da ponderação e avaliação de todas as possíveis variáveis e trade-offs. EC é revolução científica na Economia? Ao longo do tempo, não. Modifica um subconjunto dos pressupostos da teoria neoclássica. “Missão” (cont.) EC questiona “santíssima trindade”: autointeresse, racionalidade e equilíbrio. EC relaxa alguns pressupostos neoclássicos: como o futuro é descontado, escolhas em situações de risco, limitações da capacidade computacional, considerações de justiça etc. Como qualquer teoria, EC deve ser julgada pelos critérios de congruência com a realidade, generalidade e tratabilidade. Pressuposto de otimização não é realista, nem mesmo plausível. Para alguns autores, deveria ser economia cognitiva. Mas ciência cognitiva não leva em conta emoções, humores e sentimentos. “Missão” (cont.) Friedman e o método “as if” – jogador de bilhar experiente. Mas.. >ia das decisões econômicas tomadas por amadores. É certamente + fácil começar com modelos irrealistas... mas para enviar espaçonave para a lua é melhor considerar o impacto da atmosfera. (Thaler) Humanos não são Econs. Mistura de Dr. Spock com Homer Simpson, reagem muitas vezes com o sistema automático. Erros previsíveis – “previsivelmente irracionais” (Ariely). Problemas de auto-controle – como humanos descontam o tempo em decisões sobre o futuro. Procrastinação. “Missão” (cont.) Crenças são viesadas, percepções afetadas por seu enquadramento. EC estuda escolhas que envolvem julgamentos probabilísticos e situações de risco. EC é interdisciplinar, característica que se acentuou com o tempo. Nasceu do casamento da economia com a psicologia, mas logo estendeu-se de forma transdisciplinar, sendo hoje enquadrada no domínio amplo da neurociência. Campo de atuação muito grande, por ser disciplina aplicada. Investiga papel do conhecimento e estados afetivos (emoções, humores, sentimentos) no julgamento e na tomada de decisão. Na psicologia 1913, emergência do behaviorismo, em oposição à psicanálise e à introspecção. Pavlov, Skinner. Meta = previsão e controle do comportamento. Para behavioristas estados mentais são disposições comportamentais, acionadas por estímulos puramente externos (reforços positivos e negativos). Para Skinner, ausência de livre arbítrio. Na psicologia (cont.) Década de 1970, Behavioral Decision Research (BDR) na Universidade de Michigan. George Katona, Ward Edwards. Incorporam noções da psicologia cognitiva: Muitos aspectos do pensamento humano podem ser capturados com modelos computacionais, q registram representações mentais. Propriedades de nosso aparato cognitivo desempenham papel crucial no julgamento e na decisão (capacidade limitada da memória). Psicologia cognitiva substitui concepção do cérebro como máquina de estímulo-resposta dos behavioristas por mecanismo de processamento de informação. Enquanto isso, na economia... Primeiros neoclássicos (Jevons): fundamento hedônico da economia. Esse hedonismo foi posteriormente deixado de lado, assim como utilitarismo. 2ª geração de neoclássicos (pós-guerra) repudiou psicologia e hedonismo. Ordinalismo. Ótimo de Pareto. Também passaram a desconfiar da introspecção. Agnósticos em relação a motivação e formação de preferências. Noção de utilidade é substituída por preferência. Utilidade = medida da satisfação de preferências. Único método válido para coletar informação sobre preferências é estudar transações de mercado e outras escolhas observáveis. Preferência = preferência revelada. Ótimo de Pareto Na situação pareto-ótima, nenhum agente pode aumentar sua utilidade sem reduzir a de outro agente. Um resultado é pareto-eficiente (pareto-ótimo) se não existe nenhum resultado que seja melhor para pelo menos um agente e não pior para outro agente. Para q uma economia seja pareto-eficiente, 3 condições: eficiência nas trocas, na produção e no mix de produtos. (No entanto, segundo Pareto, o fundamento da Economia Política e em geral de toda ciência social é, “evidentemente”, a psicologia.) Precursores na Economia 1) Adam Smith (1723-1790) Auto-determinação da conduta humana, aliada aos dois princípios gêmeos: auto-interesse (self love) e simpatia. Viés de excesso de confiança – “... the over-weaning conceit that the greater part of men have of their own abilities.” (WN) Aversão à perda – “Pain ... is, in almost all cases, a more pungent sensation that the opposite and correspondent pleasure.” (TMS) Utilidade descontada – “The pleasure which we are to enjoy ten years hence, interest us so little in comparison with that we may enjoy today.” (TMS) Precursores na Economia (cont.) 2) Amartya Sen Rational Fools - teoria ortodoxa (da escolha racional) só requer consistência interna. Basta que escolha seja explicável em termos de uma relação de preferências consistente com a definição. Ora, escolhas humanas podem ser movidas por simpatia e compromisso. Precursores na Economia (cont.) Choice is seen as solid information, whereas introspection is not open to observation. ... Much of economic theory seems to be concerned with strong, silent men who never speak! One has to sneak in behind them to see what they are doing in the market, and deduce from it what they prefer, what makes them better off, what they think is right, and so on. Much of the empirical work on preference patterns (and therefore welfare) seems to be based on the conviction that non-verbal behaviour is the only source of information on a person´s preferences. Amartya Sen Precursores na Economia (cont.) Sen e as Metapreferências Wantons (no Museu de Viena) Precursores na Economia (cont.) 3) Herbert Simon (1916-2001) Como humanos processam informação e decidem. Teoria da racionalidade limitada. Satisficing – satisfy + suffice. Mente humana não tem acesso a toda a informação disponível e, mesmo que tivesse, não conseguiria processá-la inteiramente. Em diferentes situações, humanos buscam algo que consideram aceitável, “bom o suficiente”. (Vale para indivíduos e organizações.) Humanos usam regras de bolso (rules of thumb), que não impõem demandas impossíveis a sua capacidade cognitiva. The human being striving for rationality and restricted within the limits of his knowledge has developed some working procedures that partially overcome these difficulties. These procedures consist in assuming that he can isolate from the rest of the world a closed system containing a limited number of variables and a limited range of consequences. Herbert Simon Precursores na Economia (cont.) Ainda: Institucionalistas: Veblen, Mitchell, Clark – críticos do behaviorismo, mas pensam instituições em termos psíquicos, hábitos de pensamento e ação. Macroeconomistas: Fisher (ilusão monetária), Keynes (espíritos animais). Keynes considerado inventor das finançcas comportamentais. Tibor Scitovsky – bem-estar depende de excitação (arousal) proporcionada pelos bens. Superar o tédio trazido pela abundância de bens. Países afluentes, a sedução do conforto. Precursores na Economia (cont.) People´s tastes, the way they spend their money and arrange their lives, are matters economists have always regarded as something they should observe, but must not poke their noses into. They seem to feel that analyzing peoples´s tastes and their motivation would be an invasion of privacy and an abrogation of consumer sovereignty, and that it might expose them to the charge of pretending to know better than the consumer himself what is good for him. Tibor Scitovsky, The Joyless Economy, 1976 Precursores na Economia (cont.) Deficiências do estilo de vida consumista (american way of life). Humanos buscam qualidade de vida, não apenas conforto. Abundância não gera necessariamente satisfação, mais não é necessariam/ melhor. Humanos precisam de bens de estimulação (uma paisagem bonita) e relacionais (encontrar-se com os amigos). Cura da sociedade infeliz é educar o consumo dos cidadãos. Tibor Scitovsky, The Joyless Economy, 1976 Precursores na Economia (cont.) Mais recentemente: Maurice Allais distinguiu duas definições de comportamento racional: na sua forma lógica (critérios abstratos de consistência e não contradição) e na sua forma experimental (observação). Em 1952 polemizou com Savage (teoria da utilidade esperada), que, frente a um problema de decisão, errou! Decisão foi irracional ou a teoria está errada? 1986, Russell Sage Foundation reuniu um grupo de psicólogos e economistas em programa voltado para a aplicação de BDR na economia: Tversky, Kahneman, Thaler, Shiller, Lawrence Summers etc. Mais recentemente: D. Kahnemann e A. Tversky, Prospect Theory, Econometrica, 1979. Embora teoria da utilidade esperada como padrão, consideravam que economistas deveriam prestar + atenção e canalizar + energia para descrições empíricas do processo decisório. Psicólogos, divulgaram BDR entre economistas. Efeitos de enquadramento, moldura (framing) ocasionam mudanças significativas nas escolhas. Estruturas de decisão diferentes em face de ganhos ou perdas potenciais. > aversão ao risco em relação a ganhos do que a perdas. Mais recentemente: Kahneman e Tversky, teoria do prospecto: ser humano toma decisão evitar o risco no domínio do de um ponto de ganho referência determinado pelo contexto para... buscar o risco no domínio da perda. Portanto, diferentes comportamentos diante de perdas e ganhos em contextos que envolvem riscos. Mais recentemente: Framing (enquadramento) das decisões com frequência não é neutro. Decisão 1 – Escolher entre: a) Um ganho certo de $ 240. b) 25% probabilidade de ganhar $ 1000 e 75% de não ganhar nada. (84%) (16%) a) não maximiza UE, mas evita risco. Decisão 2 – Escolher entre: c) Perda certa de $ 750. d) 75% probabilidade de perder $ 1000 e 25% de não perder nada. d) maximiza UE, mas envolve risco. (13%) (87%) Mais recentemente: Outra versão Qual das apostas abaixo vc prefere? Allais vs. Savage, A moldura das escolhas Decisão 1 a) Um ganho certo de 100 milhões . b) 89% de chance de 100 milhões 1% de chance de zero 10% de chance de 500 milhões. Decisão 2 c) 89% de chance de zero 11% de chance de 100 milhões. d) 90% de chance de zero 10% de chance de 500 milhões. (Escolhas de 1a e 2d quebram consistência, portanto violam princípio de independência das escolhas.) Mais recentemente: Crise que ameaça 600 mil postos de trabalho Programa A - 200 mil empregos serão salvos com certeza Programa B - 1/3 de probabilidade de salvar os 600 mil empregos. 72% preferiram Programa A Programa C - 400 mil pessoas perderão seus empregos com certeza Programa D - 2/3 de probabilidade de perda de 600 mil empregos. 78% preferiram Programa D (enquadramento das escolhas, reversão de preferência) Médico tenta convencer paciente de doença grave a fazer uma cirurgia: Dos 100 que fizeram a cirurgia, 90 estão ainda vivos depois de 5 anos da intervenção. Dos 100 que fizeram a cirurgia, 10 morreram no intervalo de 5 anos depois da intervenção. Richard Thaler, The Winner´s Curse, 1992 (posteriorm/ tb Loewenstein) Coluna de “anomalias” no JEP: vários experimentos mentais, “The List”, em geral com amigos. Publicar? Impossível! “Dumb stuff people do.” Subestimação dos custos de oportunidade e a fundo perdido, considerações de culpa, problemas de auto-controle etc. Para economistas tradicionais, pessoas fazem erros, mas são imprevisíveis e aleatórios (cancelam-se uns aos outros). Inspirado por Kahneman e Tversy, Thaler estuda heurísticas, e não considera que comportamento guiado por elas é necessariamente irracional. Direção atual da pesquisa em EC Escopo em forte expansão com “guarda chuva de abordagens”. Para além das anomalias. Busca acomodar processos psicológicos relevantes para explicar e prever comportamento humano. Estudo de campo Bases cerebrais Simulações Política/ Regulação 3 grandes domínios: aversão à perda (efeito dotação, decisão sob risco); escolha intertemporal e políticas sociais. Escolha Intertemporal W.S. Jevons To secure a maximum benefit in life, all future events, all future pleasures or pains, should act upon with us the same force as if they were present, allowance being made for uncertainty…But no human mind is constituted in this perfect way: a future feeling is always less influential than a present one. Fazer previsões é muito difícil, principalmente sobre o futuro. Nicholas Bohr Impasses atuais Limitações do formato experimental. Dificuldade de ir além do individualismo metodológico. Pouco se conhece ainda sobre o processo de formação de preferências. Fisicalismo e outros impasses gerados pela interdisciplinaridade. Compatibilidade com a teoria mainstream ou afastamento da mesma. Questões éticas envolvidas. Apoio bibliográfico (parcial) Angner, E. e Loewenstein, G. Behavioral economics, in: U. Maski, Handbook of the philosophy of science. Philosophy of Economics. Elsevier, 2008. Heukelom, F. Kahnemann and Tversky on the origins of behavioral economics. Max Planck Institute for Human Development, 2006. Smith, A. Theory of Moral Sentiments, 1759. Smith, A. Wealth of Nations, 1776. Sen, A. Choice, Welfare and Measurement. Harvard University Press, 1982. Simon, H. A. Administrative Behavior. MacMillan, 1947 [1957). Scitovsky, T. The Joyless Economy. Oxford University Press, 1976.