Encontro Nacional Mulheres, Agroecologia e Plantas Medicinais 16 a 18 de outubro de 2010 Campina Grande – Paraíba RELATÓRIO O Encontro teve como objetivos principais dar visibilidade e fortalecer o trabalho das mulheres no cultivo,preparo e uso das plantas medicinais , como também identificar, mapear as conhecedoras das plantas medicinais, o intercâmbio de experiências e os debates sobre as implicações do modelo de desenvolvimento e do programa nacional de plantas medicinais na vida das mulheres, com a perspectiva de desencadear ações de articulação em torno do tema e dinamizar os grupos e redes na perspectiva da auto organização das mulheres. Para realização desse encontro foi formada uma comissão de mulheres indicadas pelos Grupos de Trabalho de Mulheres (GT Mulheres) e Biodiversidade (GT Biodiversidade) da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA). Para a construção da programação, objetivos e estrutura de execução realizamos uma reunião de dois dias em Lagoa Seca/PB e algumas reuniões via internet, assim elaboramos a programação,com temas e debatedoras, como também dividimos tarefas. Participaram do encontro 104 mulheres de várias identidades, como quilombolas, ribeirinhas, camponesas, indígenas, agricultoras, benzedeiras representando 24 estados das cinco regiões do Brasil. Iniciamos o encontro com uma mística de apresentação construída pelas mulheres de cada região(Norte, Nordeste, Centro oeste, Sudeste e Sul), onde através de falas, danças e cantos apresentaram as mulheres e o seu contexto regional. Em seguida demos início ao primeiro debate sobre “O Modelo de Desenvolvimento e as implicações na Vida das Mulheres e Plantas Medicinais”, tendo como palestrantes Maria Emília Pacheco da FASE/ANA e Noemi Krefta do Movimento de mulheres Campesinas-MMC . Noemi iniciou sua fala destacando que o atual modelo de desenvolvimento transferiu o modelo utilizado nas guerras para a agricultura através da Revolução Verde que é baseado no latifúndio, monocultura e no uso de venenos, conhecidos como herbicidas. Os tanques e canhões utilizados nas guerras transformaram-se em tratores e máquinas que causaram a destruição das flores, arvores plantas que faziam parte do nosso dia-a-dia, para que esse modelo de agricultura avançasse sobre as unidades de produção. O Mais grave, segundo ela, é que o discurso de implementação da Revolução Verde foi estimulado pelas políticas públicas de financiamento e de Assistência Técnica, indo na contramão do conhecimento e da lógica camponesa de sustentabilidade da vida e preservação da natureza. Esse modelo de assistência técnica contribuiu para a desvalorização do conhecimento popular em relação a agricultura e a saúde que passam a ser vistos como meras mercadorias que podem gerar muito lucro, sendo importante, portanto, gerar dependência da população em relação a esse mercado. Há uma intensa valorização pela mídia da segurança biológica e da praticidade do uso de substâncias sintéticas na alimentação de forma a dar maior dinamismo ao dia-dia corrido. Também há o estimulo a produção de uma cultura única para que haja maior dependência da aquisição de alimentos dos supermercados. Não podemos esquecer que por trás disso estão as grandes empresas transnacionais que dominam desde o mercado de sementes, agrotóxicos, alimentos e também de medicamentos. Esse modelo tem gerado para as pessoas um circulo vicioso de endividamento, doenças e isolamento social. Segundo Noemi, as mulheres questionam esse rumo e resiste a esse modelo que é reforçado pela cultura patriarcal que explora o trabalho e o corpo das mulheres. A medicalização do corpo das mulheres e a criminalização de seus conhecimentos de medicina caseira fazem parte desse modelo. É por isso que precisamos resistir e lutar por uma Política Nacional de Plantas Medicinais que garantam as plantas em nossas mãos, assim como as sementes. Cada povo deve ter o direito de manter a cultura de uso e conhecimento sobre as plantas medicinais dentro de um projeto de agricultura popular camponesa baseada na agroecologia. As plantas medicinais são muito importantes no fortalecimento e construção da agroecologia. Defendemos que o cultivo das plantas medicinais e do conhecimento se dê a partir da agroecologia valorizando a soberania alimentar, diversificação e a autoorganização das mulheres. Maria Emilia Pacheco reforçou os principais elementos do modelo de desenvolvimento que não queremos: homogeneidade e simplificação. Para ela, a monocultura é a simplificação da ação humana na natureza. Por outro lado, as mulheres da agroecologia querem garantir a diversidade e a complexidade quando falamos em plantas medicinais. Cada povo tem visões e conhecimentos próprios sobre a natureza que faz parte da biodiversidade. A diversidade cultural e biológica precisa ser vista de forma articulada, pois há vários sentidos atribuídos às plantas medicinais, seja como remédio, como alimento ou como rito sagrado. Maria Emilia chama a atenção para que tenhamos esse olhar sobre as experiências a serem visitadas, buscando observar os vários sentidos e as normas culturais que explicam a permanência de uma determinada espécie de plantas. Esses sentidos se explicam pela forma de viver e de se organizar dessas populações. Se por um lado esses saberes são desvalorizados e criminalizados, ao mesmo tempo, são a fonte de apropriação das grandes empresas interessados nesse conhecimento. A dominação dessas empresas se dá pela desvalorização e pela propriedade intelectual, que é o domínio do conhecimento. O que estamos tratando nesse seminário vai na contramão, pois o direito dos agricultores e agricultoras ao livre acesso a biodiversidade se manifesta na luta. As mulheres são parte fundamental dessa luta. Para ela, o diálogo com as plantas medicinais pode fortalecer a compreensão da agreocologia no seu conjunto, trazendo a visão sobre o que significa a agroecologia para a alimentação e a saúde. Precisamos refletir aqui se há de fato uma relação entre a luta das mulheres pelo direito à prática da medicina caseira com as políticas existentes. Em que medida elas respondem aos anseios? Após as exposições abrimos para o debate onde as participantes deram seus depoimentos e colocaram suas questões,foi um momento muito rico e intenso pois foi muito grande o numero de inscrições e de muita qualidade o conteúdo das falas,estas traziam informações sobre a problemática das mulheres e as plantas medicinais do Brasil e suas particularidades regionais. Como mostram a seguir as falas: O Melhoramento genético até que ponto isso é positivo para as tradições locais; Precisamos fortalecer essa luta das Mulheres e Plantas medicinais Temos um papel importante na sociedade; Que nós possamos nos garantir na segurança alimentar; 2007 foi descoberta uma área de quilombo. As mulheres quilombolas começaram a fazer e preparar os remédios caseiros, isso na verdade já acontecia há 40 anos atrás. Teve inicio a visibilidade; Beth coloca a questão do Dráuzio varela, ele tem sido uma ferramenta para desmobilizar a fitoterapia e remédios caseiros, que na verdade isso já acontece há muitos anos, ele só esta engrossando o caldo; O modelo não reconhece os valores das lutas das mulheres e de seu conhecimento das plantas medicinais, e ao mesmo tempo o modelo quer se apropriar desses conhecimentos tradicionais; Há a necessidade de debater as questões de nossas vidas, as nossas dificuldades, nossos espaços dentro da família; Não se esquecer de valorizar e fazer o diagnóstico do conhecimento que já existem nas comunidades; (Maria da paz /ceará) diz que formou o primeiro grupo de mulheres da pastoral da criança e relata seus desafios da época, e diz ainda que até hoje não recebeu nenhuma verba para apoio ao grupo, também tem planos de trabalhos com cozinha industrial e manipulação das ervas; Os plantios do agronegócio são para exportação, gerando o êxodo rural, gerando fome; Há muitos desmatamentos em áreas de grande riqueza medicinal, após o desmatamento querem arborizar com espécies diferentes e que não se adaptam na região; Problemas com plantas que não se adaptam no solo, cana, arroz irrigado; Olhar as regiões com suas peculiaridades; Adriana Tremembé: temos que falar sobre nossa mãe terra, e temos que cuidar de tudo que há nela. Coloca a dificuldade de que uma rede turística esta ameaçando sua comunidade indígena-Tremembé, 127 famílias reconhecidas como indígenas (E vem dividindo sua tribo com propostas diferenciadas da aldeia); Infelizmente os grandes movimentos estão inseridos em partidos e a mando deles (política); Política nacional de fitoterápicos não esta nas mãos dos trabalhadores e sim na mão de grandes corporações e tai nosso papel de debater essa questão; Crianças morreram em comunidades quilombolas por causa do manejo da Aracruz com venenos fortes. A ação da Aracruz no espírito Santo só rendeu fome, miséria e desvalorização do povo; Como nos vamos fazer com o debate que vamos gerar aqui no seminário tenha voz para a população; Existe uma relação de dominação nos espaços; Temos que desenvolver um modelo que traz vida e solidariedade e não morte e individualidade. Constatamos a necessidade e importância de espaços como estes para as mulheres socializarem seus conhecimentos, se colocando como desafio para o GT Mulheres da ANA e outros movimentos de darem continuidade na luta das mulheres e a agroecologia. A segunda atividade foi o “Carrossel de Experiências”. O carrossel é uma metodologia participativa na qual foram organizadas 6 estações, tendo cada uma, experiências sobre plantas medicinais para serem apresentadas. As participantes foram divididas em grupo e a cada 30 minutos trocavam de estação de forma a ouvirem os relatos e conhecerem as seis experiências. Participaram do carrossel as seguintes experiências: 1 - As índias Tremembé/CE e as plantas medicinais – Índias Tremembé 2 – Mulheres da Amazônia, conhecimento tradicional e as plantas medicinais – Marcha Mundial das Mulheres; CONTAG 3 – Patrimônio Imaterial – Rede Fitovida 4 – Autoregulação e Farmacopéia – Articulação Pacari 5 – Política Municipal de Plantas Medicinais – CENEP/PB (Centro de Educação Popular) 6 – Mulheres e Plantas Medicinais no Rio Grande do Sul – Movimento de Mulheres Camponesas A noite fizemos nossa Feira de Saberes e Sabores, onde estavam expostos remédios caseiros, alimentos , produtos de beleza tudo feito de plantas medicinais , como também artesanato. No dia seguinte fomos visitar cinco experiências, a seguir o resumo de cada uma: 1- Oficina Espinho de Cigano: Uma experiência com as plantas medicinais. (Campina Grande, Solânea ) A Oficina Espinho de Ciganos, está localizada no bairro do Catolé a 3km do centro de Campina Grande. O foco do trabalho é com a produção de remédios caseiros e a valorização das plantas medicinais. A oficina é fruto do nosso esforço e do nosso trabalho. Hoje somos um grupo reconhecido e temos credibilidade, diz Isa Leal, liderança da comunidade e integrante da oficina. Tudo começou como um trabalho de cunho religioso, no qual as Irmãs ensinavam para algumas mães da comunidade como fazer chás e alguns xaropes. Mais tarde, as famílias foram incentivadas a plantar suas próprias mudas em um espaço cedido pela igreja. Assim teve início a horta de plantas medicinais. O trabalho do grupo está associado ao cultivo e resgate das plantas, a formação sobre a Segurança Alimentar e Nutricional, a luta pelas políticas públicas de saúde junto ao fórum popular de saúde e a formação religiosa junto a Pastoral da saúde. 2- Plantas Medicinais: Uma experiência que deu certo. (Nova Palmeira ) O trabalho com plantas medicinais na cidade de Nova Palmeira teve início no ano de 1995, a partir das necessidades das crianças carentes com as quais já estava sendo feito um trabalho educativo e social desde o ano de 1993. Começamos introduzindo práticas alternativas de alimentação, seguindo o exemplo da pastoral da criança. Preocupados com a educação, optamos também por um método libertador, seguindo a teoria de Paulo Freire, onde a criança torna-se sujeito de sua própria história, sendo capaz de resgatar seus direitos e sua cidadania. Nessa época, atendimento médico era raro em nossa cidade, levando a uma prática de automedicação que causava muitos danos à saúde. As crianças do CENEP e suas famílias começaram a se utilizar de remédios para tosse, coceira, piolhos, calmantes etc. produzidos pelo grupo. Aos poucos as ações relativas a essas áreas foram se intensificando. Em 2004, a Oficina de Remédios caseiros foi legalizada pela Agência de Vigilância Sanitária (AGEVISA) e pelo Conselho Regional de Farmácias (CRF) e passou a ser a primeira experiência do gênero na Paraíba, já que a legislação brasileira é omissa em criar e regulamentar leis que favorecem as práticas integrativas e complementares, inclusive, as plantas medicinais de forma popular. 3- A conquista do conhecimento e da liberdade por meio do amor às plantas medicinais (Sítio Bom Sucesso, Solânea ) A criatividade e a dedicação de dona Irene ao trabalho no arredor de sua casa já são conhecidas em todo o semiárido. É com muito zelo e uma incessante curiosidade que dona Irene transformou as poucas plantas que tinha na época de seu casamento numa enorme diversidade de espécies e num quintal de beleza tamanha que salta aos olhos. Em 2010, foram contadas mais de 40 plantas medicinais e um sem número de plantas ornamentais que são vendidas todas as semanas nas feiras de Solânea. Ao passear por suas plantas, dona Irene partilhará seu conhecimento e como conquistou a sua liberdade pelo amor que sente às suas plantas. Dona Irene ainda faz parte da Comissão de Saúde e Alimentação do Polo da Borborema, que também apresentará o desenvolvimento de seu trabalho na região. 4- Os sonhos e as conquistas de Maria Isabel (Sítio Pedra Grande, Solânea ) Maria Isabel desde pequena e incentivada pelos seus pais, sempre participou dos trabalhos da igreja. Foi a dedicação ao trabalho que decidiu casar-se mais tarde. Mas a vida não foi muito fácil após o casamento. Foi o interesse em adquirir novos conhecimentos sobre as plantas medicinais que a poeta Maria Isabel decidiu reescrever sua vida. Das 3 plantinhas que tinha em seu quintal, hoje ela cuida com muito amor e muito zelo de mais de 120 plantas medicinais. E se orgulha em falar que conhece o uso de cada uma delas. Adquirir novos conhecimentos foi tudo para mim. Foi vida, foi tudo, revela. Maria Isabel é hoje diretora do sindicato de Solânea, vice-presidente da associação de sua comunidade, é catequista, faz parte da coordenação da paróquia da comunidade e da Comissão de Saúde e Alimentação do Polo da Borborema, que também se fará presente e apresentará o desenvolvimento de seu trabalho na região. 5- Experiência de dona Socorro, Comunidade Lajedo de Timbaúba, Soledade (Sítio Lajedo de Timbaúba, Soledade ) Dona Socorro mora a 20 anos no Sítio Lajedo de Timbaúba, local onde criou seus 11 filhos, mas também cuida de um arredor de casa muito diverso. Socorro sempre teve o desejo de ter várias plantas, mas tinha muita dificuldade por falta de água. Socorro mora no Cariri da Paraíba. A partir da organização e participação na associação comunitária, do grupo de mulheres e do coletivo, a família adquiriu uma cisterna adaptada para a roça. Foi a possibilidade de Socorro concretizar seu desejo. Hoje é com muito orgulho que dona Socorro apresenta uma diversidade grande de plantas medicinais, mas também fruteiras e forrageiras. Todos os dias, dona Socorro se levanta bem cedo e antes de tomar o café da manhã vai regar e conversar com suas plantinhas. Sua experiência vem ajudando muito na construção da segurança alimentar, na saúde e na melhoria de vida da família. Na parte da tarde do dia 17/10 realizamos o segundo debate sobre “Política nacional de Plantas Medicinas e acesso a biodiversidade”com a participação de Ana Carolina Brollo da Terra de Direitos; ; Ana Barros da Rede Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (Rede) e da Articulação Metropolitana de Agricultura Urbana (AMAU); e Diana Mores do Centro Nordestino de Medicina Popular (CNMP) Ana Carolina abordou a questão do Direito dos Agricultores e Agricultoras ao Livre Acesso à Agrobiodiversidade como um direito reconhecido em diversos Tratados Internacionais assinados pelo Brasil e a própria Constituição Federal que em seu art. 216 define: “Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: (...) II - os modos de criar, fazer e viver”. Ana destaca que o Direito é uma construção histórica e fruto do amadurecimento das sociedades ao eleger determinados bens da vida como indispensáveis à produção e reprodução da vida concreta, dos homens de carne e osso. Segundo ela, o modo de vida da agricultura familiar camponesa e dos povos e comunidades tradicionais não só possibilita a sobrevivência familiar ou comunitária local, mas vêm realizando a conservação do meio ambiente e disponibilizando recursos biológicos silvestres e cultivados para a alimentação e agricultura dos povos do mundo. As práticas de conservação nos territórios e uso próprio de sementes (armazenar e replantar nas safras seguintes) não só garantem os direitos coletivos dos agricultores e agricultoras à sua existência e resistência física, social e cultural em todo o mundo, como propiciam a conservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado e o acesso ao direito humano à alimentação adequada das sociedades. Com o objetivo de regulamentar e incentivar a conservação da agrobiodiversidade foi criado em 2004 o Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para Alimentação e Agricultura (TIRFAA) da FAO. Ana Carolina destaca a existência de uma grande contradição, pois ao mesmo tempo em que se avança no reconhecimento desse direito pelo TIRFAA, vem ocorrendo uma verdadeira privatização da biodiversidade pelas empresas transnacionais, sendo a diversidade biológica cultivada e silvestre considerada como recurso genético apto a se tornar mercadoria. Os transgênicos é um dos principais exemplos dessa privatização. Já há estudos no Brasil, sobretudo no estado do Paraná, que comprovam a altíssima capacidade de contaminação das sementes crioulas pelos transgênicos. Essa lógica reproduz a divisão social e internacional do trabalho, onde países megadiversos em desenvolvimento são fornecedores de mão de obra barata e recursos biológicos com baixo valor agregado e consumidores de tecnologias dos países desenvolvidos. As plantas medicinais também entram nessa disputa desigual, pois estima-se que 25% dos medicamentos hoje disponíveis no mercado farmacêutico foram desenvolvidos, direta ou indiretamente, a partir de plantas medicinais. Isso explica, por exemplo, as pressões feitas pelas transnacionais e pelos grandes laboratórios no sentido de restringir e desqualificar o uso popular das plantas medicinais, implantando mecanismos de propriedade intelectual e registro de patentes e inibindo a valorização do uso popular das plantas medicinais e dos remédios caseiros por programas de políticas públicas. Ana destaca que diversas organizações da sociedade civil têm trabalhado de forma articulada na exigibilidade e na afirmação do direito dos agricultores e agricultoras ao livre acesso à agrobiodiversidade. Em seguida, Ana Barros da Rede falou sobre o acesso à biodiversidade na perspectiva dos territórios de coleta sustentável de plantas medicinais. Ela destaca a existência de inúmeras experiências de plantas medicinais nos territórios rurais e urbanos. Em Minas Gerais, diversas iniciativas de cultivo e coleta de plantas medicinais em áreas urbanas fazem parte da Articulação Metropolitana de Agricultura Urbana (AMAU). No entanto, é preciso destacar a existência de conflitos e dificuldades na coleta das plantas medicinais nos territórios. As principais ameaças nos territórios são: Agronegócio, gado, eucalipto, parques; especulação imobiliária, empreendimento turístico, venenos na produção; Ao final da fala, Ana Barros apresenta algumas propostas de mobilização e resistência: a) fortalecer a luta pela Função Social da Propriedade tanto no campo quando na cidade conforme garante a nossa Constituição Federal; continuar propiciando espaço para troca de experiências; criar um grupo de estudo para influenciar legislação; fortalecer a pauta das plantas medicinais e a organização das mulheres no GT Biodiversidade. Diana Mores do Centro Nordestino de Medicina Popular (CNMP) falou que o Brasil é o país que detém a maior parcela da biodiversidade, em torno de 15 a 20% do total mundial, com destaque para as plantas superiores, nas quais detém aproximadamente 24% da biodiversidade, com cerca de 55 mil espécies de plantas superiores que são conhecidas e usadas como fonte de alimento, matéria-prima para construção, no uso de aromatizantes, cosméticos ou medicamentos para cura de enfermidades. Segundo Diana, o Brasil vem sendo alvo de um processo de usurpação de conhecimento tradicional que grupos étnicos e comunidades tradicionais possuem no uso das plantas medicinais; a retirada das plantas medicinais do país para o exterior, as quais retornam na forma de produtos patenteados, nos leva a pagar caro por uma riqueza nacional. Por conta disso, urge resgatar o conhecimento tradicional de grupos sociais que fazem uso das plantas que são as fontes essenciais para a descoberta dos princípios ativos- substâncias capazes de exercer uma ação de cura responsáveis no combate de doenças. Diana destaca que o uso das plantas medicinais envolve os seguintes aspectos: antropológicos - resgate do saber e da identidade das mulheres; pedagógicos - A planta medicinal é o núcleo pedagógico de educação popular para a saúde; econômico – redução de custos das famílias com alguns medicamentos básicos, assim como, pode representar redução de custos para a saúde pública no que se refere a atenção primária à saúde; ecológico – conservação das espécies de plantas que fazem parte da diversidade biológica e são patrimônio imaterial; terapêutico – as plantas tem um importante valor medicinal, sendo importante agregar ao saber empírico os conhecimentos produzidos cientificamente. A questão das plantas medicinais e medicina popular esta presente em varias políticas do governo federal : Medida Provisória Nº 2.186-16, DE 23 DE AGOSTO DE 2001 : Legislação de Acesso a Recursos Genéticos ,Conhecimentos Tradicionais e Repartição de Benefícios ; Decreto N 6.040\07 Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais ; Decreto IPHAN\MINC 3531 Programa de Bens Culturais de Natureza Imaterial;Portaria 971\06 Política Nacional de Praticas Integrativas e Complementares no SUS - PNPIC; Decreto 5813 de 22 junho 2006: Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos; Lei 11.326;06: Política Nacional de Agricultura Familiar;Decreto 4.339 \02 :Política Nacional de Biodiversidade Desde as primeiras conferencias nacionais de saúde a questão das plantas medicinais era colocada como proposta para ser utilizada no SUS. A 10a Conferência Nacional de Saúde 1996 recomenda a incorporação no SUS, das práticas de saúde como a fitoterapia, acupuntura e homeopatia, contemplando as terapias alternativas e práticas populares. Esta recomendação se concretiza no ano 2006 com a aprovação da Política Nacional de Medicina Natural e Práticas Complementares no SUS que propõe a inclusão da fitoterapia, homeopatia, acupuntura e medicina antroposófica como opções terapêuticas no sistema público de saúde No mesmo ano o presidente Lula assina o Decreto 5813 de 22 junho 2006 da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterapicos. Esta política foi o resultado de cinco anos de discussão entre as áreas do governo, a comunidade científica e a sociedade civil que tem como objetivo geral: Garantir à população brasileira o acesso seguro e o uso racional de plantas medicinais e fitoterápicos, promovendo o uso sustentável da biodiversidade, o desenvolvimento da cadeia produtiva e da indústria nacional A participação da Agricultura Familiar nas cadeias e nos arranjos produtivos de plantas medicinais e fitoterápicos é estratégia fundamental para garantir insumos e produtos, pois apresenta como vantagens a disponibilidade de terra, experiência acumulada com a biodiversidade, detenção de conhecimentos tradicionais e práticas agroecológicas voltadas ao atendimento dos mercados locais e regionais. A Portaria Interministerial n 2960 de 9 de dezembro de 2008 aprova o Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos e cria em 2009 o Comitê Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos para a regulamentação da política, enfrentando muitos problemas com lobby das grandes multinacionais de medicamentos e dos grandes laboratórios de fitoterápicos. A regulamentação se refere, por enquanto, aos fitoterápicos. Há uma processo de articulação e mobilização em curso no Comitê para que se crie outra legislação para a medicina tradicional da qual os remédios caseiros fazem parte ,ou seja a regulamentação das plantas na Atenção Primaria no SUS. A lei existe mas sem regulamentação não pode ser posta em pratica e ai esta o estrangulamento porque ela depende dos órgãos técnicos. Diana considera fundamental que ocupemos esse espaço do comitê para fortalecer a necessidade de uma regulamentação especifica para a medicina/conhecimento tradicional e também para inserir a reflexão das plantas medicinais a partir dos biomas brasileiros. Outra questão importante é o enfrentamento da biopirataria. Há várias denuncias de biopirataria por parte de empresas transnacionais e até universidades. Como então podemos avançar na legislação e ao mesmo tempo proteger o conhecimento tradicional da biopirataria? Após as exposições, houve tempo para o debate em plenária. A seguir os depoimentos e as questões trazidas pelas participantes: O conhecimento popular tem que andar conjunto com o cientifico; Relato de um abuso da universidade que roubou os conhecimentos tradicionais de uma comunidade; Não adianta trabalhar as plantas medicinais se não trabalhar os outros elementos; Ou agente cuida do todo ou não cuida de nada, pois os processos são complexos; Temos que ser protagonistas no processo de luta pela preservação do conhecimento tradicional e das plantas medicinais. Estão arrasando todo meio ambiente e o Estado é um dos maiores responsáveis; Amazônia: propões uma reunião de estados para debater a questão dos laboratórios. (PAE Projeto agroextrativista). As universidades se aproveitam dos conhecimentos tradicionais e depois desvaloriza os camponeses. Relato de Beth: Caso da natura na apropriação da andiroba relata que uma mulher que trabalhava na natura mentiu para conseguir os produtos da comunidade de minas e que foram buscar em outro lugar onde não teve muita dificuldade; Por trás das universidades sempre tem uma empresa; A importância do uso de APP para agricultura familiar; As comunidades não podem ficar dependentes dos advogados populares; Temos que denunciar para o ministério público, ele tem que tomar consciência dessas problemáticas; Temos que lutar pela segurança das sementes crioulas; Grande problema é a falta de informação para as pessoas; Temos que nos apropriar das políticas publicas, temos que ser mais capacitadas nas leis; A política é uma faca de dois gumes, dá e tira ao mesmo tempo. . À noite demos continuidade a Feira de Saberes e Sabores e realizamos a nossa noite cultural com apresentação de quadrilha. No ultimo dia, iniciamos a manhã com uma socialização das visitas das experiências do dia anterior, onde representantes dos grupos fizeram um relato. Uma questão comum a todas as experiências, que foi bastante ressaltada, foi o trabalho das mulheres e os preconceitos e discriminações que sofreram para a realização de suas atividades, afirmando ai a necessidade de enfrentar o machismo e trabalhar a auto-organização das mulheres. Outra questão observada foi o manejo e as tecnologias usadas das mulheres no trato com as plantas que tem a perspectiva de convivência com semiárido e de base agroecológica.Numa das experiências foi feita uma denuncia a uma prática da Universidade Local quando do aproveitamento de informações da experiência para uso próprio sem o acordo com os sujeitos da experiências.Essa atividade foi um sucesso e as mulheres voltaram cheias de energia e reflexões que buscavam relacionar com suas realidades. Em seguida fizemos um trabalho em grupo em que as mulheres se dividiram por região, e discutiram e apresentaram propostas de continuidade as ações das mulheres e plantas medicinais nas suas regiões e localidades. Os resultados foram os seguintes: 1) REGIÃO SUL O que levamos do encontro para minha experiência/organização local estímulo; diversidade de experiências (diferentes ações, diferentes objetivos) importância diálogo entre organizações O que levamos do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais? ampliar a ação política para o cuprimento das ações do estado; criar espaços de convergência entre diferentes atores sociais 2) REGIÃO NORTE O que levo do encontro para a minha experiência/organização local ? coragem, conhecimento, perseverança, informação, solidariedade, criatividade, modas sustentávies de vida, exemplo de luta, superação das mulheres contra o patriarcado, ensaio para à construção de um outro mundo possível respeitando as diversidades. O que levo do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais? incluir na grade de formação da contag a temática agroecologia e ervas medicinais. incluir na pauta da rmera e outros espaços à temática do direito dos/as agricultores/as ao uso da biodiversidade. desburocratização do acesso a recursos publicos. que o “gt. mulheres” pudessem sistematizar experiencias de/com plantas medicinais nas diversas regiões do brasil. que a temática da violência contra a mulher seja pautada em todos os espaços e articulações de agroecologia. 3) REGIÃO CENTRO-OESTE O que levo do encontro para a minha experiência/organização local ? levar exp: reflexões feitas aqui; resgatar os grupos, que já existiam. articular-se com os g.r. extrativista com plantas medicinais. registrar-sistematizar as exp. locais. reproduzir este encontro na região centro oeste...! O que levo do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais? Que a ANA articule um Encontro No Centro- Oeste onde as experiências dos estados possam se articular Aprofundar mais o tema do feminismo junto às organizações que trabalham com plantas medicinais 4) REGIÃO SUDESTE O que levo do encontro para a minha experiência/organização local ? auto-estima; coragem; organização; batalha para enfrentamento; resistência; vontade de despertar mulheres adormecidas; a questão segurança alimentar; divisão do trabalho; fortalecimento; conhecimento/direitos; determinação; cuidado com o conhecomento – como? prar quem? entender as complexidades; partir para as praticas; capacitar outras mulheres; acesso á políticas; mudanças nas atitudes; inserir em mov. sociais; organização começar refletir no debate gênero; socializar o conhecimento; segurança alimentar; ocupar os espaços; valorização das mulheres; provocar a discussão; experiência de trocas; decobrir talento; visão do todo. O que levo do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais? trocar contatos; debate das políticas públicas; os materiais; aproximação das articulações sudeste e pensar nas mulheres nesses espaços. (que já vão ocorrer); participação (garantir) das mulhers nos espaços; tentar uma pauta esratégica; aproximar gt generos p/ as art/ sudeste; debater as politicas de plantas medicinais; ações entre os gt/biod. mulheres; visibilidade dos desafios; trabalhar de forma não isolada; estratégias enfrentamentos; construir materias pedagógicos; organizar grupos mulheres (iniciar); dar visibilidade ao nosso encontro a nível nacional 5) REGIÃO NORDESTE O que levo do encontro para a minha experiência/organização local ? resistências das mulheres em relação ao machismo e a seca; reconhecer e visibilizar as mulheres como um todo (trabalho doméstico, trabalho produtivo, ação política); superação de limites nos conflitos familiares e comunitários; abertura das mulheres para experimentar novas tecnologias; o tema das plantas medicinais está promovendo a organização e autonomia financeira das mulheres; o compromisso e a força de vontade para transformar a realidade O que levo do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais? Divulgar e socializar as experiências adquiridas no Encontro; Reconhecimento e valorização dos costumes e cultivos das plantas medicinais; Desenvolver capacitações e desencadear processos de formação; Dar continuidade do conhecimento e das mulheres enquanto guardiãs das plantas medicinais; Fortalecer a diversidade de plantas, mesmo em um clima de semi-árido; Elaborar documentos de denúncia e reivindicação para os governos. Fortalecer e criar articulações locais em torno das mulheres e plantas medicinais. Fortalecer o conhecimento das mulheres sobre programas e políticas públicas. Trabalhar a agroecologia como porta de entrada para as mulheres e de superação. PRINCIPAIS ENCAMINHAMENTOS Elaboração de uma carta política do Encontro, valorizando o papel das mulheres como guardiãs da biodiversidade e das plantas medicinais para a sustentabilidade da vida, preservação da biodiversidade, melhoria da saúde, soberania alimentar e fortalecimento das mulheres. A carta deverá valorizar também as plantas medicinais enquanto política pública. Comissão: Diana, Lea, Giselda, Nega Lurdes, Adriana Gondim e Beth Cardoso Elaboração de um boletim apresentando as principais questões debatidas no encontro. Comissão: Adriana Galvão, Vanessa, Silvana, Noemi, Ana barros Fortalecer a participação das mulheres e de suas organizações e movimentos sociais no processo preparatório e no Encontro de Diálogos e Convergências que será realizado em 2011 pela Articulação Nacional de Agroecologia em conjunto com outras redes e fóruns da sociedade civil. Indicação de experiência sobre plantas medicinais para o Seminário sobre biodiversidade a ser organizado no Encontro de Diálogos. Foram levantadas 4 experiências para posteriormente ser indicada pela comissão organizadora: Pólo da Borborema, coletivo cariri, PACARI, CENEP Encerramos a atividade com uma avaliação, a qual foi bastante positiva com a possibilidade de termos dois debates que trouxeram elementos para uma reflexão crítica da realidade das mulheres e plantas medicinais,como também oportunidade para conhecer e trocar de experiências. A comissão organizadora conseguiu realizar esse seminário de uma forma participativa e descentralizada. As mulheres e entidades da Paraíba fizeram uma recepção muito calorosa e cuidadosa de todas as participantes,como também na organização das experiências visitadas. Em seguida fizemos uma mística de encerramento. Relatoria: Adriana Gondim;Adriana Galvão; Fernanda Ribeiro e Vanessa Schottz