Relatório do Seminário Nacional de Mulheres e Plantas Medicinais

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Encontro Nacional
Mulheres, Agroecologia
e Plantas Medicinais
16 a 18 de outubro de 2010
Campina Grande – Paraíba
RELATÓRIO
O Encontro teve como objetivos principais dar visibilidade e fortalecer o
trabalho das mulheres no cultivo,preparo e uso das plantas medicinais , como
também identificar, mapear as conhecedoras das plantas medicinais, o
intercâmbio de experiências e os debates sobre as implicações do modelo de
desenvolvimento e do programa nacional de plantas medicinais na vida das
mulheres, com a perspectiva de desencadear ações de articulação em torno do
tema e dinamizar os grupos e redes na perspectiva da auto organização das
mulheres.
Para realização desse encontro foi formada uma comissão de mulheres
indicadas pelos Grupos de Trabalho de Mulheres (GT Mulheres) e
Biodiversidade (GT Biodiversidade) da Articulação Nacional de Agroecologia
(ANA). Para a construção da programação, objetivos e estrutura de execução
realizamos uma reunião de dois dias em Lagoa Seca/PB e algumas reuniões
via internet, assim elaboramos a programação,com temas e debatedoras, como
também dividimos tarefas.
Participaram do encontro 104 mulheres de várias identidades, como
quilombolas, ribeirinhas, camponesas, indígenas, agricultoras, benzedeiras
representando 24 estados das cinco regiões do Brasil. Iniciamos o encontro
com uma mística de apresentação construída pelas mulheres de cada
região(Norte, Nordeste, Centro oeste, Sudeste e Sul), onde através de falas,
danças e cantos apresentaram as mulheres e o seu contexto regional.
Em seguida demos início ao primeiro debate sobre “O Modelo de
Desenvolvimento e as implicações na Vida das Mulheres e Plantas
Medicinais”, tendo como palestrantes Maria Emília Pacheco da FASE/ANA e
Noemi Krefta do Movimento de mulheres Campesinas-MMC .
Noemi iniciou sua fala destacando que o atual modelo de
desenvolvimento transferiu o modelo utilizado nas guerras para a agricultura
através da Revolução Verde que é baseado no latifúndio, monocultura e no uso
de venenos, conhecidos como herbicidas. Os tanques e canhões utilizados
nas guerras transformaram-se em tratores e máquinas que causaram a
destruição das flores, arvores plantas que faziam parte do nosso dia-a-dia, para
que esse modelo de agricultura avançasse sobre as unidades de produção. O
Mais grave, segundo ela, é que o discurso de implementação da Revolução
Verde foi estimulado pelas políticas públicas de financiamento e de Assistência
Técnica, indo na contramão do conhecimento e da lógica camponesa de
sustentabilidade da vida e preservação da natureza.
Esse modelo de assistência técnica contribuiu para a desvalorização do
conhecimento popular em relação a agricultura e a saúde que passam a ser
vistos como meras mercadorias que podem gerar muito lucro, sendo
importante, portanto, gerar dependência da população em relação a esse
mercado.
Há uma intensa valorização pela mídia da segurança biológica e da
praticidade do uso de substâncias sintéticas na alimentação de forma a dar
maior dinamismo ao dia-dia corrido. Também há o estimulo a produção de uma
cultura única para que haja maior dependência da aquisição de alimentos dos
supermercados. Não podemos esquecer que por trás disso estão as grandes
empresas transnacionais que dominam desde o mercado de sementes,
agrotóxicos, alimentos e também de medicamentos. Esse modelo tem gerado
para as pessoas um circulo vicioso de endividamento, doenças e isolamento
social.
Segundo Noemi, as mulheres questionam esse rumo e resiste a esse
modelo que é reforçado pela cultura patriarcal que explora o trabalho e o corpo
das mulheres. A medicalização do corpo das mulheres e a criminalização de
seus conhecimentos de medicina caseira fazem parte desse modelo.
É por isso que precisamos resistir e lutar por uma Política Nacional de
Plantas Medicinais que garantam as plantas em nossas mãos, assim como as
sementes. Cada povo deve ter o direito de manter a cultura de uso e
conhecimento sobre as plantas medicinais dentro de um projeto de agricultura
popular camponesa baseada na agroecologia. As plantas medicinais são muito
importantes no fortalecimento e construção da agroecologia. Defendemos que
o cultivo das plantas medicinais e do conhecimento se dê a partir da
agroecologia valorizando a soberania alimentar, diversificação e a autoorganização das mulheres.
Maria Emilia Pacheco reforçou os principais elementos do modelo de
desenvolvimento que não queremos: homogeneidade e simplificação. Para ela,
a monocultura é a simplificação da ação humana na natureza. Por outro lado,
as mulheres da agroecologia querem garantir a diversidade e a complexidade
quando falamos em plantas medicinais. Cada povo tem visões e
conhecimentos próprios sobre a natureza que faz parte da biodiversidade. A
diversidade cultural e biológica precisa ser vista de forma articulada, pois há
vários sentidos atribuídos às plantas medicinais, seja como remédio, como
alimento ou como rito sagrado.
Maria Emilia chama a atenção para que tenhamos esse olhar sobre as
experiências a serem visitadas, buscando observar os vários sentidos e as
normas culturais que explicam a permanência de uma determinada espécie de
plantas. Esses sentidos se explicam pela forma de viver e de se organizar
dessas populações. Se por um lado esses saberes são desvalorizados e
criminalizados, ao mesmo tempo, são a fonte de apropriação das grandes
empresas interessados nesse conhecimento. A dominação dessas empresas
se dá pela desvalorização e pela propriedade intelectual, que é o domínio do
conhecimento. O que estamos tratando nesse seminário vai na contramão, pois
o direito dos agricultores e agricultoras ao livre acesso a biodiversidade se
manifesta na luta. As mulheres são parte fundamental dessa luta.
Para ela, o diálogo com as plantas medicinais pode fortalecer a
compreensão da agreocologia no seu conjunto, trazendo a visão sobre o que
significa a agroecologia para a alimentação e a saúde. Precisamos refletir aqui
se há de fato uma relação entre a luta das mulheres pelo direito à prática da
medicina caseira com as políticas existentes. Em que medida elas respondem
aos anseios?
Após as exposições abrimos para o debate onde as participantes deram
seus depoimentos e colocaram suas questões,foi um momento muito rico e
intenso pois foi muito grande o numero de inscrições e de muita qualidade o
conteúdo das falas,estas traziam informações sobre a problemática das
mulheres e as plantas medicinais do Brasil e suas particularidades regionais.
Como mostram a seguir as falas:
 O Melhoramento genético até que ponto isso é positivo para as tradições
locais;
 Precisamos fortalecer essa luta das Mulheres e Plantas medicinais
 Temos um papel importante na sociedade;
 Que nós possamos nos garantir na segurança alimentar;
 2007 foi descoberta uma área de quilombo. As mulheres quilombolas
começaram a fazer e preparar os remédios caseiros, isso na verdade já
acontecia há 40 anos atrás. Teve inicio a visibilidade;
 Beth coloca a questão do Dráuzio varela, ele tem sido uma ferramenta
para desmobilizar a fitoterapia e remédios caseiros, que na verdade isso
já acontece há muitos anos, ele só esta engrossando o caldo;
 O modelo não reconhece os valores das lutas das mulheres e de seu
conhecimento das plantas medicinais, e ao mesmo tempo o modelo quer
se apropriar desses conhecimentos tradicionais;
 Há a necessidade de debater as questões de nossas vidas, as nossas
dificuldades, nossos espaços dentro da família;
 Não se esquecer de valorizar e fazer o diagnóstico do conhecimento que
já existem nas comunidades;
 (Maria da paz /ceará) diz que formou o primeiro grupo de mulheres da
pastoral da criança e relata seus desafios da época, e diz ainda que até
hoje não recebeu nenhuma verba para apoio ao grupo, também tem
planos de trabalhos com cozinha industrial e manipulação das ervas;
 Os plantios do agronegócio são para exportação, gerando o êxodo rural,
gerando fome;
 Há muitos desmatamentos em áreas de grande riqueza medicinal, após
o desmatamento querem arborizar com espécies diferentes e que não
se adaptam na região;
 Problemas com plantas que não se adaptam no solo, cana, arroz
irrigado;
 Olhar as regiões com suas peculiaridades;
 Adriana Tremembé: temos que falar sobre nossa mãe terra, e temos que
cuidar de tudo que há nela. Coloca a dificuldade de que uma rede
turística esta ameaçando sua comunidade indígena-Tremembé, 127
famílias reconhecidas como indígenas (E vem dividindo sua tribo com
propostas diferenciadas da aldeia);
 Infelizmente os grandes movimentos estão inseridos em partidos e a
mando deles (política);
 Política nacional de fitoterápicos não esta nas mãos dos trabalhadores
e sim na mão de grandes corporações e tai nosso papel de debater essa
questão;
 Crianças morreram em comunidades quilombolas por causa do manejo
da Aracruz com venenos fortes. A ação da Aracruz no espírito Santo só
rendeu fome, miséria e desvalorização do povo;
 Como nos vamos fazer com o debate que vamos gerar aqui no
seminário tenha voz para a população;
 Existe uma relação de dominação nos espaços;
 Temos que desenvolver um modelo que traz vida e solidariedade e não
morte e individualidade.
Constatamos a necessidade e importância de espaços como estes para
as mulheres socializarem seus conhecimentos, se colocando como desafio
para o GT Mulheres da ANA e outros movimentos de darem continuidade na
luta das mulheres e a agroecologia.
A segunda atividade foi o “Carrossel de Experiências”. O carrossel é
uma metodologia participativa na qual foram organizadas 6 estações, tendo
cada uma, experiências sobre plantas medicinais para serem apresentadas. As
participantes foram divididas em grupo e a cada 30 minutos trocavam de
estação de forma a ouvirem os relatos e conhecerem as seis experiências.
Participaram do carrossel as seguintes experiências:
1 - As índias Tremembé/CE e as plantas medicinais – Índias Tremembé
2 – Mulheres da Amazônia, conhecimento tradicional e as plantas medicinais –
Marcha Mundial das Mulheres; CONTAG
3 – Patrimônio Imaterial – Rede Fitovida
4 – Autoregulação e Farmacopéia – Articulação Pacari
5 – Política Municipal de Plantas Medicinais – CENEP/PB (Centro de Educação
Popular)
6 – Mulheres e Plantas Medicinais no Rio Grande do Sul – Movimento de
Mulheres Camponesas
A noite fizemos nossa Feira de Saberes e Sabores, onde estavam
expostos remédios caseiros, alimentos , produtos de beleza tudo feito de
plantas medicinais , como também artesanato.
No dia seguinte fomos visitar cinco experiências, a seguir o resumo de
cada uma:
1- Oficina Espinho de Cigano: Uma experiência com as plantas medicinais.
(Campina Grande, Solânea )
A Oficina Espinho de Ciganos, está localizada no bairro do Catolé a 3km do centro de Campina
Grande. O foco do trabalho é com a produção de remédios caseiros e a valorização das
plantas medicinais. A oficina é fruto do nosso esforço e do nosso trabalho. Hoje somos um
grupo reconhecido e temos credibilidade, diz Isa Leal, liderança da comunidade e integrante da
oficina.
Tudo começou como um trabalho de cunho religioso, no qual as Irmãs ensinavam para
algumas mães da comunidade como fazer chás e alguns xaropes. Mais tarde, as famílias foram
incentivadas a plantar suas próprias mudas em um espaço cedido pela igreja. Assim teve início
a horta de plantas medicinais.
O trabalho do grupo está associado ao cultivo e resgate das plantas, a formação sobre a
Segurança Alimentar e Nutricional, a luta pelas políticas públicas de saúde junto ao fórum
popular de saúde e a formação religiosa junto a Pastoral da saúde.
2- Plantas Medicinais: Uma experiência que deu certo.
(Nova Palmeira )
O trabalho com plantas medicinais na cidade de Nova Palmeira teve início no ano de 1995, a
partir das necessidades das crianças carentes com as quais já estava sendo feito um trabalho
educativo e social desde o ano de 1993.
Começamos introduzindo práticas alternativas de alimentação, seguindo o exemplo da pastoral
da criança. Preocupados com a educação, optamos também por um método libertador,
seguindo a teoria de Paulo Freire, onde a criança torna-se sujeito de sua própria história,
sendo capaz de resgatar seus direitos e sua cidadania.
Nessa época, atendimento médico era raro em nossa cidade, levando a uma prática de
automedicação que causava muitos danos à saúde. As crianças do CENEP e suas famílias
começaram a se utilizar de remédios para tosse, coceira, piolhos, calmantes etc. produzidos
pelo grupo. Aos poucos as ações relativas a essas áreas foram se intensificando.
Em 2004, a Oficina de Remédios caseiros foi legalizada pela Agência de Vigilância Sanitária
(AGEVISA) e pelo Conselho Regional de Farmácias (CRF) e passou a ser a primeira
experiência do gênero na Paraíba, já que a legislação brasileira é omissa em criar e
regulamentar leis que favorecem as práticas integrativas e complementares, inclusive, as
plantas medicinais de forma popular.
3- A conquista do conhecimento e da liberdade por meio do amor às plantas medicinais
(Sítio Bom Sucesso, Solânea )
A criatividade e a dedicação de dona Irene ao trabalho no arredor de sua casa já são
conhecidas em todo o semiárido. É com muito zelo e uma incessante curiosidade que dona
Irene transformou as poucas plantas que tinha na época de seu casamento numa enorme
diversidade de espécies e num quintal de beleza tamanha que salta aos olhos. Em 2010, foram
contadas mais de 40 plantas medicinais e um sem número de plantas ornamentais que são
vendidas todas as semanas nas feiras de Solânea.
Ao passear por suas plantas, dona Irene partilhará seu conhecimento e como conquistou a sua
liberdade pelo amor que sente às suas plantas. Dona Irene ainda faz parte da Comissão de
Saúde e Alimentação do Polo da Borborema, que também apresentará o desenvolvimento de
seu trabalho na região.
4- Os sonhos e as conquistas de Maria Isabel
(Sítio Pedra Grande, Solânea )
Maria Isabel desde pequena e incentivada pelos seus pais, sempre participou dos trabalhos da
igreja. Foi a dedicação ao trabalho que decidiu casar-se mais tarde. Mas a vida não foi muito
fácil após o casamento. Foi o interesse em adquirir novos conhecimentos sobre as plantas
medicinais que a poeta Maria Isabel decidiu reescrever sua vida. Das 3 plantinhas que tinha em
seu quintal, hoje ela cuida com muito amor e muito zelo de mais de 120 plantas medicinais. E
se orgulha em falar que conhece o uso de cada uma delas. Adquirir novos conhecimentos foi
tudo para mim. Foi vida, foi tudo, revela.
Maria Isabel é hoje diretora do sindicato de Solânea, vice-presidente da associação de sua
comunidade, é catequista, faz parte da coordenação da paróquia da comunidade e da
Comissão de Saúde e Alimentação do Polo da Borborema, que também se fará presente e
apresentará o desenvolvimento de seu trabalho na região.
5- Experiência de dona Socorro, Comunidade Lajedo de Timbaúba, Soledade
(Sítio Lajedo de Timbaúba, Soledade )
Dona Socorro mora a 20 anos no Sítio Lajedo de Timbaúba, local onde criou seus 11 filhos,
mas também cuida de um arredor de casa muito diverso. Socorro sempre teve o desejo de ter
várias plantas, mas tinha muita dificuldade por falta de água. Socorro mora no Cariri da
Paraíba. A partir da organização e participação na associação comunitária, do grupo de
mulheres e do coletivo, a família adquiriu uma cisterna adaptada para a roça. Foi a
possibilidade de Socorro concretizar seu desejo. Hoje é com muito orgulho que dona Socorro
apresenta uma diversidade grande de plantas medicinais, mas também fruteiras e forrageiras.
Todos os dias, dona Socorro se levanta bem cedo e antes de tomar o café da manhã vai regar
e conversar com suas plantinhas. Sua experiência vem ajudando muito na construção da
segurança alimentar, na saúde e na melhoria de vida da família.
Na parte da tarde do dia 17/10 realizamos o segundo debate sobre
“Política nacional de Plantas Medicinas e acesso a biodiversidade”com a
participação de Ana Carolina Brollo da Terra de Direitos; ; Ana Barros da Rede
Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (Rede) e da Articulação Metropolitana
de Agricultura Urbana (AMAU); e Diana Mores do Centro Nordestino de
Medicina Popular (CNMP)
Ana Carolina abordou a questão do Direito dos Agricultores e
Agricultoras ao Livre Acesso à Agrobiodiversidade como um direito reconhecido
em diversos Tratados Internacionais assinados pelo Brasil e a própria
Constituição Federal que em seu art. 216 define: “Constituem patrimônio
cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados
individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação,
à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais
se incluem: (...) II - os modos de criar, fazer e viver”.
Ana destaca que o Direito é uma construção histórica e fruto do
amadurecimento das sociedades ao eleger determinados bens da vida como
indispensáveis à produção e reprodução da vida concreta, dos homens de
carne e osso. Segundo ela, o modo de vida da agricultura familiar camponesa e
dos povos e comunidades tradicionais não só possibilita a sobrevivência
familiar ou comunitária local, mas vêm realizando a conservação do meio
ambiente e disponibilizando recursos biológicos silvestres e cultivados para a
alimentação e agricultura dos povos do mundo.
As práticas de conservação nos territórios e uso próprio de sementes
(armazenar e replantar nas safras seguintes) não só garantem os direitos
coletivos dos agricultores e agricultoras à sua existência e resistência física,
social e cultural em todo o mundo, como propiciam a conservação do meio
ambiente ecologicamente equilibrado e o acesso ao direito humano à
alimentação adequada das sociedades.
Com o objetivo de regulamentar e incentivar a conservação da
agrobiodiversidade foi criado em 2004 o Tratado Internacional sobre os
Recursos Fitogenéticos para Alimentação e Agricultura (TIRFAA) da FAO.
Ana Carolina destaca a existência de uma grande contradição, pois ao mesmo
tempo em que se avança no reconhecimento desse direito pelo TIRFAA, vem
ocorrendo uma verdadeira privatização da biodiversidade pelas empresas
transnacionais, sendo a diversidade biológica cultivada e silvestre considerada
como recurso genético apto a se tornar mercadoria. Os transgênicos é um dos
principais exemplos dessa privatização. Já há estudos no Brasil, sobretudo no
estado do Paraná, que comprovam a altíssima capacidade de contaminação
das sementes crioulas pelos transgênicos. Essa lógica reproduz a divisão
social e internacional do trabalho, onde países megadiversos em
desenvolvimento são fornecedores de mão de obra barata e recursos
biológicos com baixo valor agregado e consumidores de tecnologias dos países
desenvolvidos.
As plantas medicinais também entram nessa disputa desigual, pois
estima-se que 25% dos medicamentos hoje disponíveis no mercado
farmacêutico foram desenvolvidos, direta ou indiretamente, a partir de plantas
medicinais. Isso explica, por exemplo, as pressões feitas pelas transnacionais e
pelos grandes laboratórios no sentido de restringir e desqualificar o uso popular
das plantas medicinais, implantando mecanismos de propriedade intelectual e
registro de patentes e inibindo a valorização do uso popular das plantas
medicinais e dos remédios caseiros por programas de políticas públicas.
Ana destaca que diversas organizações da sociedade civil têm
trabalhado de forma articulada na exigibilidade e na afirmação do direito dos
agricultores e agricultoras ao livre acesso à agrobiodiversidade.
Em seguida,
Ana Barros da Rede falou sobre o acesso à
biodiversidade na perspectiva dos territórios de coleta sustentável de plantas
medicinais. Ela destaca a existência de inúmeras experiências de plantas
medicinais nos territórios rurais e urbanos. Em Minas Gerais, diversas
iniciativas de cultivo e coleta de plantas medicinais em áreas urbanas fazem
parte da Articulação Metropolitana de Agricultura Urbana (AMAU). No entanto,
é preciso destacar a existência de conflitos e dificuldades na coleta das plantas
medicinais nos territórios. As principais ameaças nos territórios são:
Agronegócio,
gado,
eucalipto,
parques;
especulação
imobiliária,
empreendimento turístico, venenos na produção;
Ao final da fala, Ana Barros apresenta algumas propostas de
mobilização e resistência: a) fortalecer a luta pela Função Social da
Propriedade tanto no campo quando na cidade conforme garante a nossa
Constituição Federal; continuar propiciando espaço para troca de experiências;
criar um grupo de estudo para influenciar legislação; fortalecer a pauta das
plantas medicinais e a organização das mulheres no GT Biodiversidade.
Diana Mores do Centro Nordestino de Medicina Popular (CNMP) falou
que o Brasil é o país que detém a maior parcela da biodiversidade, em torno de
15 a 20% do total mundial, com destaque para as plantas superiores, nas quais
detém aproximadamente 24% da biodiversidade, com cerca de 55 mil espécies
de plantas superiores que são conhecidas e usadas como fonte de alimento,
matéria-prima para construção, no uso de aromatizantes, cosméticos ou
medicamentos para cura de enfermidades. Segundo Diana, o Brasil vem sendo
alvo de um processo de usurpação de conhecimento tradicional que grupos
étnicos e comunidades tradicionais possuem no uso das plantas medicinais; a
retirada das plantas medicinais do país para o exterior, as quais retornam na
forma de produtos patenteados, nos leva a pagar caro por uma riqueza
nacional.
Por conta disso, urge resgatar o conhecimento tradicional de grupos
sociais que fazem uso das plantas que são as fontes essenciais para a
descoberta dos princípios ativos- substâncias capazes de exercer uma ação de
cura responsáveis no combate de doenças.
Diana destaca que o uso das plantas medicinais envolve os seguintes
aspectos: antropológicos - resgate do saber e da identidade das mulheres;
pedagógicos - A planta medicinal é o núcleo pedagógico de educação popular
para a saúde; econômico – redução de custos das famílias com alguns
medicamentos básicos, assim como, pode representar redução de custos para
a saúde pública no que se refere a atenção primária à saúde; ecológico –
conservação das espécies de plantas que fazem parte da diversidade biológica
e são patrimônio imaterial; terapêutico – as plantas tem um importante valor
medicinal, sendo importante agregar ao saber empírico os conhecimentos
produzidos cientificamente.
A questão das plantas medicinais e medicina popular esta presente em
varias políticas do governo federal : Medida Provisória Nº 2.186-16, DE 23 DE
AGOSTO DE 2001 : Legislação de Acesso a Recursos Genéticos
,Conhecimentos Tradicionais e Repartição de Benefícios ; Decreto N 6.040\07
Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades
Tradicionais ; Decreto IPHAN\MINC 3531 Programa de Bens Culturais de
Natureza Imaterial;Portaria 971\06 Política Nacional de Praticas Integrativas e
Complementares no SUS - PNPIC; Decreto 5813 de 22 junho 2006: Política
Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos; Lei 11.326;06: Política Nacional
de Agricultura Familiar;Decreto 4.339 \02 :Política Nacional de Biodiversidade
Desde as primeiras conferencias nacionais de saúde a questão das
plantas medicinais era colocada como proposta para ser utilizada no SUS. A
10a Conferência Nacional de Saúde 1996 recomenda a incorporação no SUS,
das práticas de saúde como a fitoterapia, acupuntura e homeopatia,
contemplando as terapias alternativas e práticas populares. Esta
recomendação se concretiza no ano 2006 com a aprovação da Política
Nacional de Medicina Natural e Práticas Complementares no SUS que
propõe a inclusão da fitoterapia, homeopatia, acupuntura e medicina
antroposófica como opções terapêuticas no sistema público de saúde
No mesmo ano o presidente Lula assina o Decreto 5813 de 22 junho
2006 da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterapicos. Esta
política foi o resultado de cinco anos de discussão entre as áreas do governo,
a comunidade científica e a sociedade civil que tem como objetivo geral:
Garantir à população brasileira o acesso seguro e o uso racional de plantas
medicinais e fitoterápicos, promovendo o uso sustentável da biodiversidade, o
desenvolvimento da cadeia produtiva e da indústria nacional
A participação da Agricultura Familiar nas cadeias e nos arranjos
produtivos de plantas medicinais e fitoterápicos é estratégia fundamental para
garantir insumos e produtos, pois apresenta como vantagens a disponibilidade
de terra, experiência acumulada com a biodiversidade, detenção de
conhecimentos tradicionais e práticas agroecológicas voltadas ao atendimento
dos mercados locais e regionais.
A Portaria Interministerial n 2960 de 9 de dezembro de 2008 aprova o
Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos e cria em 2009 o
Comitê Nacional
de Plantas Medicinais
e Fitoterápicos
para a
regulamentação da política, enfrentando muitos problemas com lobby das
grandes multinacionais de medicamentos e dos grandes laboratórios de
fitoterápicos.
A regulamentação se refere, por enquanto, aos fitoterápicos. Há uma
processo de articulação e mobilização em curso no Comitê para que se crie
outra legislação para a medicina tradicional da qual os remédios caseiros
fazem parte ,ou seja a regulamentação das plantas na Atenção Primaria no
SUS. A lei existe mas sem regulamentação não pode ser posta em pratica e ai
esta o estrangulamento porque ela depende dos órgãos técnicos. Diana
considera fundamental que ocupemos esse espaço do comitê para fortalecer a
necessidade de uma regulamentação especifica para a medicina/conhecimento
tradicional e também para inserir a reflexão das plantas medicinais a partir dos
biomas brasileiros. Outra questão importante é o enfrentamento da biopirataria.
Há várias denuncias de biopirataria por parte de empresas transnacionais e até
universidades. Como então podemos avançar na legislação e ao mesmo tempo
proteger o conhecimento tradicional da biopirataria?
Após as exposições, houve tempo para o debate em plenária. A seguir
os depoimentos e as questões trazidas pelas participantes:
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O conhecimento popular tem que andar conjunto com o cientifico;
Relato de um abuso da universidade que roubou os conhecimentos
tradicionais de uma comunidade;
Não adianta trabalhar as plantas medicinais se não trabalhar os outros
elementos;
Ou agente cuida do todo ou não cuida de nada, pois os processos são
complexos;
Temos que ser protagonistas no processo de luta pela preservação do
conhecimento tradicional e das plantas medicinais.
Estão arrasando todo meio ambiente e o Estado é um dos maiores
responsáveis;
Amazônia: propões uma reunião de estados para debater a questão dos
laboratórios. (PAE Projeto agroextrativista).
As universidades se aproveitam dos conhecimentos tradicionais e
depois desvaloriza os camponeses.
Relato de Beth: Caso da natura na apropriação da andiroba relata que
uma mulher que trabalhava na natura mentiu para conseguir os produtos
da comunidade de minas e que foram buscar em outro lugar onde não
teve muita dificuldade;
Por trás das universidades sempre tem uma empresa;
A importância do uso de APP para agricultura familiar;
As comunidades não podem ficar dependentes dos advogados
populares;
Temos que denunciar para o ministério público, ele tem que tomar
consciência dessas problemáticas;
Temos que lutar pela segurança das sementes crioulas;
Grande problema é a falta de informação para as pessoas;
Temos que nos apropriar das políticas publicas, temos que ser mais
capacitadas nas leis;
A política é uma faca de dois gumes, dá e tira ao mesmo tempo.
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À noite demos continuidade a Feira de Saberes e Sabores e realizamos
a nossa noite cultural com apresentação de quadrilha.
No ultimo dia, iniciamos a manhã com uma socialização das visitas das
experiências do dia anterior, onde representantes dos grupos fizeram um
relato. Uma questão comum a todas as experiências, que foi bastante
ressaltada, foi o trabalho das mulheres e os preconceitos e discriminações que
sofreram para a realização de suas atividades, afirmando ai a necessidade de
enfrentar o machismo e trabalhar a auto-organização das mulheres. Outra
questão observada foi o manejo e as tecnologias usadas das mulheres no trato
com as plantas que tem a perspectiva de convivência com semiárido e de base
agroecológica.Numa das experiências foi feita uma denuncia a uma prática da
Universidade Local quando do aproveitamento de informações da experiência
para uso próprio sem o acordo com os sujeitos da experiências.Essa atividade
foi um sucesso e as mulheres voltaram cheias de energia e reflexões que
buscavam relacionar com suas realidades.
Em seguida fizemos um trabalho em grupo em que as mulheres se
dividiram por região, e discutiram e apresentaram propostas de continuidade as
ações das mulheres e plantas medicinais nas suas regiões e localidades. Os
resultados foram os seguintes:
1) REGIÃO SUL
O que levamos do encontro para minha experiência/organização local
 estímulo;
 diversidade de experiências (diferentes ações, diferentes objetivos)
 importância diálogo entre organizações
O que levamos do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais?
 ampliar a ação política para o cuprimento das ações do estado;
 criar espaços de convergência entre diferentes atores sociais
2) REGIÃO NORTE
O que levo do encontro para a minha experiência/organização local ?
 coragem, conhecimento, perseverança, informação, solidariedade, criatividade, modas
sustentávies de vida, exemplo de luta, superação das mulheres contra o patriarcado,
ensaio para à construção de um outro mundo possível respeitando as diversidades.
O que levo do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais?
 incluir na grade de formação da contag a temática agroecologia e ervas medicinais.
 incluir na pauta da rmera e outros espaços à temática do direito dos/as agricultores/as
ao uso da biodiversidade.
 desburocratização do acesso a recursos publicos.
 que o “gt. mulheres” pudessem sistematizar experiencias de/com plantas medicinais
nas diversas regiões do brasil.
 que a temática da violência contra a mulher seja pautada em todos os espaços e
articulações de agroecologia.
3) REGIÃO CENTRO-OESTE
O que levo do encontro para a minha experiência/organização local ?
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levar exp: reflexões feitas aqui;
resgatar os grupos, que já existiam.
articular-se com os g.r. extrativista com plantas medicinais.
registrar-sistematizar as exp. locais.
reproduzir este encontro na região centro oeste...!
O que levo do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais?
 Que a ANA articule um Encontro No Centro- Oeste onde as experiências dos estados
possam se articular
 Aprofundar mais o tema do feminismo junto às organizações que trabalham com
plantas medicinais
4) REGIÃO SUDESTE
O que levo do encontro para a minha experiência/organização local ?
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auto-estima;
coragem;
organização;
batalha para enfrentamento;
resistência;
vontade de despertar mulheres adormecidas;
a questão segurança alimentar;
divisão do trabalho;
fortalecimento;
conhecimento/direitos;
determinação;
cuidado com o conhecomento – como? prar quem?
entender as complexidades;
partir para as praticas;
capacitar outras mulheres;
acesso á políticas;
mudanças nas atitudes;
inserir em mov. sociais;
organização começar refletir no debate gênero;
socializar o conhecimento;
segurança alimentar;
ocupar os espaços;
valorização das mulheres;
provocar a discussão;
experiência de trocas;
decobrir talento;
visão do todo.
O que levo do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais?
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trocar contatos;
debate das políticas públicas;
os materiais;
aproximação das articulações sudeste e pensar nas mulheres nesses espaços. (que já
vão ocorrer);
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participação (garantir) das mulhers nos espaços;
tentar uma pauta esratégica;
aproximar gt generos p/ as art/ sudeste;
debater as politicas de plantas medicinais;
ações entre os gt/biod. mulheres;
visibilidade dos desafios;
trabalhar de forma não isolada;
estratégias enfrentamentos;
construir materias pedagógicos;
organizar grupos mulheres (iniciar);
dar visibilidade ao nosso encontro a nível nacional
5) REGIÃO NORDESTE
O que levo do encontro para a minha experiência/organização local ?
 resistências das mulheres em relação ao machismo e a seca;
 reconhecer e visibilizar as mulheres como um todo (trabalho doméstico, trabalho
produtivo, ação política);
 superação de limites nos conflitos familiares e comunitários;
 abertura das mulheres para experimentar novas tecnologias;
 o tema das plantas medicinais está promovendo a organização e autonomia financeira
das mulheres;
 o compromisso e a força de vontade para transformar a realidade
O que levo do encontro para as articulações estaduais, regionais, nacionais?
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Divulgar e socializar as experiências adquiridas no Encontro;
Reconhecimento e valorização dos costumes e cultivos das plantas medicinais;
Desenvolver capacitações e desencadear processos de formação;
Dar continuidade do conhecimento e das mulheres enquanto guardiãs das plantas
medicinais;
Fortalecer a diversidade de plantas, mesmo em um clima de semi-árido;
Elaborar documentos de denúncia e reivindicação para os governos.
Fortalecer e criar articulações locais em torno das mulheres e plantas medicinais.
Fortalecer o conhecimento das mulheres sobre programas e políticas públicas.
Trabalhar a agroecologia como porta de entrada para as mulheres e de superação.
PRINCIPAIS ENCAMINHAMENTOS
 Elaboração de uma carta política do Encontro, valorizando o papel das
mulheres como guardiãs da biodiversidade e das plantas medicinais
para a sustentabilidade da vida, preservação da biodiversidade, melhoria
da saúde, soberania alimentar e fortalecimento das mulheres. A carta
deverá valorizar também as plantas medicinais enquanto política
pública. Comissão: Diana, Lea, Giselda, Nega Lurdes, Adriana Gondim e
Beth Cardoso
 Elaboração de um boletim apresentando as principais questões
debatidas no encontro. Comissão: Adriana Galvão, Vanessa, Silvana,
Noemi, Ana barros
 Fortalecer a participação das mulheres e de suas organizações e
movimentos sociais no processo preparatório e no Encontro de Diálogos
e Convergências que será realizado em 2011 pela Articulação Nacional
de Agroecologia em conjunto com outras redes e fóruns da sociedade
civil.
 Indicação de experiência sobre plantas medicinais para o Seminário
sobre biodiversidade a ser organizado no Encontro de Diálogos. Foram
levantadas 4 experiências para posteriormente ser indicada pela
comissão organizadora: Pólo da Borborema, coletivo cariri, PACARI,
CENEP
Encerramos a atividade com uma avaliação, a qual foi bastante positiva com a
possibilidade de termos dois debates que trouxeram elementos para uma
reflexão crítica da realidade das mulheres e plantas medicinais,como também
oportunidade para
conhecer e trocar de experiências. A comissão
organizadora conseguiu realizar esse seminário de uma forma participativa e
descentralizada. As mulheres e entidades da Paraíba fizeram uma recepção
muito calorosa e cuidadosa de todas as participantes,como também na
organização das experiências visitadas.
Em seguida fizemos uma mística de
encerramento.
Relatoria: Adriana Gondim;Adriana Galvão; Fernanda Ribeiro e Vanessa
Schottz
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