ATRIBUIÇÃO DOS DESLOCAMENTOS QUÍMICOS DOS ÁTOMOS DE 1H E 13C DA 4’,2,3,4-TETRAMETÓXI-CHALCONA Heriberto R. Bitencourt1 e Antônio Pedro da Silva Souza Filho2 1 2 UFPA/ICEN/FAC QUÍMICA ([email protected]) Embrapa Amazônia Oriental ([email protected]) RESUMO: As chalconas, substâncias pertencentes à classe dos flavonoides, são consideradas como intermediárias essenciais na biossíntese dos flavonoides, sendo largamente encontradas na natureza em plantas rasteiras ou arbóreas. Diferentemente dos flavonóides, as chalconas não possuem o anel pirânico, que é formado pela ciclização da hidroxila localizada na posição 2’ das chalconas. Estruturalmente possui um sistema conjugado formado por uma cetona ,-insaturada (enona de 3 carbonos) ligada a dois anéis aromáticos substituídos ou não. Várias atividades biológicas são atribuídas às chalconas e derivados, entre elas destacam-se algumas como, a atividade antiviral, anticancerígena, atividades antiprotozoários, tanto para a forma epimastigota (forma flagelada encontrada na corrente sanguínea do hospedeiro, responsável pelo processo de reprodução), quanto para a forma promastigota (forma flagelada infectante, responsável pela reprodução parasitária), leishmanicida, anti-inflamatórias, etc. Neste trabalho descreve-se a síntese para ensaios biológicos e a análise de dados espectrométricos de RMN 1H e 13C (1D e 2D) que permitiram estabelecer a completa atríbuiçaõ dos deslocamentos químicos dos átomos de hidrogênio e de Carbono-13 da substância 4’,2,3,4-tetrametóxi-chalcona, utilizando as técnicas de Dept, hetcor, hmbc e noedif. PALAVRAS-CHAVE: Deslocamento químico. Chalcona. Síntese. PRODUTOS NATURAIS (PNAT) 1 INTRODUÇÃO: As chalconas, representadas pela estrutura I (Figura 1), pertencentes à classe dos flavonóides (DEWICK, 2001) são consideradas como intermediárias essenciais na biossíntese dos flavonóides sendo largamente encontradas na natureza em plantas rasteiras ou arbóreas (DIXON & STEEL, 1999). Diferentemente dos flavonóides, as chalconas não possuem o anel pirânico, que é formado pela ciclização da hidroxila localizada na posição 2` das chalconas (Figura 2) (NAKANISHI et al., 1975). 6` 5 6 4` A 2` 8 3 7 1 O B 3` 2 2` A 2 5` 4 6 6` 4` 5` 4 B 3` 3 5 O I chalcona O O Flavanona diidrochalcona 626 O O O OH OH O O O Flavonol flavona flavanolol O O O OH O flavana Catequina aurona Figura 1: Estrutura química geral da classe dos flavonóides. O OH - H2O2 O KOH O O 1 O H2O2 O OH O OH O Figura 2: Esquema da equação química da síntese de Flavonóides Do ponto de vista químico, as modificações que podem ser realizadas nas chalconas são as seguintes: substituições nos anéis A e B (ALSTON & FRY, 2004; CESARIN-SOBRINHO et al., 2001; YAMIN et al., 1998); mudança dos anéis para piperidinas (LIU & GO, 2006), quinolina (DE LEON et al., 2003) e adamantano (ANDERSON & KAMAIMARI, 2005); preparação de oximas (TSANG et al., 2005); fotodimerizações (CESARIN-SOBRINHO & NETTO-FERREIRA, 2002); epoxidação (AMARESH & PERUMAL, 1995; BERKESSEL et al., 2006; BERNINI et al., 2004; PATONAY et al., 1993), adição de hidrogênio (KROHN et al., 2002) e halogênio (KIM et al., 1993) na dupla ligação carbono-carbono; e as isomerizações E/Z, também são relatados (BOWDEN et al., 1991). Várias atividades biológicas são atribuídas às chalconas e derivados, entre elas destacam-se algumas como, a atividade antiviral de 4´-etóxi-2´-hidróxi-4,6´-dimetóxichalcona a qual é bastante ativa contra cepas do rinovírus, que estão associadas aos resfriados (ISHITSUKA et al., 1982a). Tal chalcona foi obtida após modificações na estrutura química da flavona 4’,5-di-hidróxi-3,3’,7trimetóxiflavona, isolada de Agastache rugosa KUNTZE, que apresenta potente atividade contra o 627 picornavírus (ISHITSUKA et al., 1982b). Já a 2´,4´-di-hidróxi-6-metóxi-chalcona, isolada de Boesenberg rotunda (L.) (Zongiberaceae) possui a capacidade de inibir a protease NS3 do vírus da dengue (DEN-2) (KIAT et al., 2006). Para as chalconas isoladas de Millettia leucantha (Leguminosae) foi relatada atividade moderada contra o vírus do herpes simples (PHRUTIVORAPONGKUL et al., 2003). A inibição da replicação de HIV-1 em linfócitos-H9 de camundongos foi obtida com a 2-metóxi-3-metil-4,6-diidróxi-5-(3´-hidróxi)cinamoil-benzaldeído (WU e cols., 2003) e com a 2-hidróxi-3-metóxi-chalcona (DENG et al., 2006) que também possui atividade contra o vírus da influenza (Infl A) (LALL et al., 2006). 2 OBJETIVO Atribuir os deslocamentos químicos dos hidrogênios e dos carbonos-13 da 4’,2,3,4tetrametóxi-chalcona utilizando técnicas de Ressonância magnética nuclear unidimensional e bidimensional. 3 METODOLOGIA: Os espectros de RMN foram feitos em um Espectrômetro de ressonância magnética nuclear Varian Mercury DX-300 (Pós-Graduação em Química/ UFPA), utilizando como solvente o CDCl3 e TMS como padrão interno. A substância 4’,2,3,4-tetrametóxi-chalcona foi sintetizada utilizando o procedimento geral, em balão de fundo chato e boca esmerilhada (125mL), colocado em banho de gelo, foram adicionados na seqüência: o solvente (15mL; EtOH ou MeOH), a cetona (~10mmol), o catalisador (15mL de solução de NaOH 10%) e o aldeído (com excesso de 10%). A mistura de reação foi mantida em agitação magnética à 40ºC por 40min. Posteriormente, foi resfriada e deixada em freezer durante 48h. Após esse período foi feito uma decantação e o produto sólido foi filtrado à vácuo. O produto obtido foi então lavado e recristalizado. A 4’,2,3,4-tetrametóxi-chalcona, foi sintetizada utilizando 4-metóxi-acetofenona (11mmol; 1,6g) e 2,3,4-trimetóxi-benzaldeído (12mmol; 2,3g) como materiais de partida. Os cristais amarelos (NG et al., 2006) da substância foram obtidos com rendimentos de 59%. RMN-1H (300MHz; CDCl3) ppm: 7,37 (d, 1H, J=9Hz; H-6), 6,71 (d, 1H, J=9Hz; H-5), 7,97 (d, 1H, J=16Hz; H-7), 7,56 (d, 1H, J=16Hz; H-8, 8,02 (d, 2H, J=9Hz; H-2´ e H-6´), 6,96 (d, 2H, J=9Hz; H-3´ e H-5´), 3,94 (s, 3H; C2-OCH3), 3,88 (s, 3H; C3-OCH3), 3,90 (s, 3H; C4-OCH3), 3,87 (s, 3H; C4´-OCH3). RMN-13C (75MHz; CDCl3) ppm: 122,1 (C1), 153,6 (C2), 142,4 (C3), 155,5 (C4), 107,5 (C5), 123,8 (C6), 139,2 (C7), 121,1 (C8), 189,1 (C9), 131,3 (C1`), 130,6 (C2`), 113,7 (C3`), 163,1 (C4`), 113,7 (C5`), 130,6 (C-6`), 61,3 (C2-OCH3), 60,8 (C3-OCH3), 56,0 (C4-OCH3), 55,4 (C4´OCH3). IV (KBr) cm-1: 3078, 2839, 1649, 1587, 1569, 1492, 1460, 1337, 1299, 1089, 831, 806. OCH3 CH3O OCH3 OCH3 O 628 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Nos espectros de RMN1H (300MHz; CDCl3) foram identificados os sinais relativos aos hidrogênios H-8 e H-7 como um sistema do tipo AB, como um dupleto de constante de acoplamento de J~16Hz caracterizando a conformação trans das chalconas. Foram identificados, também, os sinais relativos aos hidrogênios aromáticos e aqueles relativos aos hidrogênios das metoxilas. Nos espectros de RMN13C (75MHz; CDCl3) foram identificados os sinais relativos aos carbonos aromáticos, aos carbonos olefínicos (C7 e C8), aquele relativo ao carbono carbonílico (C9) e aos carbonos das metoxilas. No espectro de DEPT observam-se os sinais relativos aos carbonos metílicos (OCH3) e aqueles relativos aos carbonos metínicos (CH) para as substâncias. No espectro de NOE diferencial, quando irradiado a 6,71ppm (Figura 3) verificam-se as intensificações dos sinais relativos aos hidrogênios da metoxila (3,90ppm, C4) e ao dupleto (7,37ppm) sendo então atribuído aquele sinal ao hidrogênio H-5 e este ao H-6, conseqüentemente quando irradiado em 7,37 (H-6) verificam-se as intensificações dos sinais relativos aos hidrogênios H-5 (6,71ppm), H-7 (7,97ppm) e H-8 (7,56ppm). No espectro de COSY, verificam-se as correlações de H-4 com H-5 e de H-5 com H-6, verificam-se também as correlações relativas aos sinais de H-3`e 5` com H-4` e H-2` e 6` e de H-7 com H-8. No espectro de HETCOR foram observadas as correlações dos sinais relativos aos hidrogênios com os sinais relativos aos carbonos correspondentes. Os sinais relativo aos carbonos não hidrogenados foram atribuídos com base no espectro de HMBC devido as correlações de J 3, dessa maneira pode-se atribuir os sinais relativos a todos os carbonos das substâncias. 629 5 CONCLUSÕES Os métodos físicos de RMN são de grande importância para a identificação estrutural, bem como para a completa atribuição dos deslocamentos químicos dos átomos de hidrogênios e de carbono da substância. Tais dados são de grande importância pois podem auxiliar em cálculos químico-quânticos, nos mapas de potencial eletrostáticos e em outros parâmetros físico-químicos da molécula. REFERÊNCIAS ALSTON, J.; and FRY, A. J. 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