Biblioteca da

Propaganda
Historia Económica Social
Apontamentos de: Mafalda Diogo
E-mail: [email protected]
Data: Outubro 2006
Livro:
Nota:
Este documento é um texto de apoio gentilmente disponibilizado pelo seu autor, para que possa auxiliar ao estudo dos colegas.
O autor não pode de forma alguma ser responsabilizado por eventuais erros ou lacunas existentes. Este documento não pretende
substituir o estudo dos manuais adoptados para a disciplina em questão.
A Universidade Aberta não tem quaisquer responsabilidades no conteúdo, criação e distribuição deste documento, não sendo
possível imputar-lhe quaisquer responsabilidades.
Copyright: O conteúdo deste documento é propriedade do seu autor, não podendo ser publicado e distribuído fora do site da
Associação Académica da Universidade Aberta sem o seu consentimento prévio, expresso por escrito.
HISTÓRIA ECONÓMICA E SOCIAL
Cap. I
Introdução: história económica e desenvolvimento económico
Se algumas nações são ricas e outras pobres, porque não adoptam as pobres os métodos e
políticas que tornaram as outras ricas?
Na verdade essas tentativas foram feitas, mas, na maior parte dos casos, sem grande
sucesso:
1. Não há acordo generalizado sobre os métodos responsáveis pelos rendimentos
mais elevados das nações mais ricas.
2. Mesmo que esse acordo existisse, não é de forma alguma certo que os métodos
e políticas semelhantes produzam os mesmos resultados nas diferentes
circunstâncias geográficas, culturais e históricas das nações com parcos
recursos.
3. Embora tenham sido feitas muitas investigações sobre o problema, os
estudiosos e cientistas ainda não elaboraram uma teoria de desenvolvimento
económico que seja operacionalmente útil e aplicável na generalidade
A análise histórica pode focar, duma forma que as outras abordagens não podem, as
origens dos níveis de desenvolvimento desiguais que existem presentemente.
Ao concentrar-se em momentos de crescimento e declínio no passado, a abordagem
histórica isola os fundamentos do desenvolvimento económico. É uma ajuda à
objectividade e clareza do pensamento.
A posição de alguns perante a observação de que a situação contemporânea é única, e por
isso, a história é irrelevante para os seus interesses, estão a cometer 2 erros:
1. Aqueles que ignoram o passado não são qualificados, para sobre ele
generalizar.
2. Nega implicitamente a uniformidade da natureza, incluindo o comportamento
humano e o comportamento das instituições sociais – uma presunção sobre
que se funda qualquer pesquisa científica.
Tais atitudes revelam como é fácil, sem perspectiva histórica, confundir os sintomas
de um problema com as suas causas.
Crescimento, desenvolvimento e progresso
Crescimento económico – é um aumento sustentado da produção total de bens e
serviços produzidos por uma dada sociedade. Esta produção total tem sido medida
como rendimento nacional, ou produto nacional bruto (PNB).
O crescimento económico só é significativo se for medido em termos de produção per
capita.
2
Produto interno bruto (PIB) – é normalmente um valor intermédio entre o PNB e o
rendimento nacional.
Desenvolvimento económico – é o crescimento económico acompanhado por uma
mudança estrutural ou organizacional substanciais na economia. A mudança estrutural
ou organizacional pode ser a causa de crescimento, mas não necessariamente; por
vezes a sequência causal segue na direcção oposta, as 2 mudanças podem ser ainda o
produto comum de outras mudanças; dentro ou fora da economia.
Crescimento económico – é um processo reversível – isto é, pode ser seguido de
declínio, assim como o desenvolvimento económico.
Tanto o crescimento como o desenvolvimento são, em princípio termos isentos de
valor, na medida em que podem ser calculados e descritos sem referências a normas
éticas. Tal não é obviamente, o caso com o termo progresso económico, a não ser que
se lhe dê uma definição altamente restritiva.
Na ética secular moderna, crescimento e desenvolvimento são frequentemente
equacionados com progresso, mas não existe necessariamente uma ligação entre eles.
Determinantes do desenvolvimento económico
Factores de produção:
- terra
- mão-de-obra
- capital
- dinâmica empresarial (opcional)
A produção total duma economia é determinada pela quantidade de empregados. Esta
classificação e diversas fórmulas que dela se podem extrair, são indispensáveis para a
análise económica moderna e também extremamente úteis no estudo da história
económica.
Ao passar-se da análise económica a curto prazo para o estudo do desenvolvimento
económico, os parâmetros tornam-se as variáveis mais importantes. Uma classificação
mais alargada dos determinantes da produção é, necessária para analisar a mudança
económica no tempo histórico.
Uma classificação deste tipo considera a produção total num dado período de tempo e
a sua taxa de mudança através do tempo como funções da «mistura» de populações,
recursos, tecnologia e instituições sociais. Estes 4 factores não são variáveis únicas;
cada um é um aglomerado de variáveis.
Os recursos são a vasta «terra» dos ditames da economia clássica. O termo abarca não
apenas a quantidade de terra, a fertilidade do solo e os recursos naturais convencionais,
mas também o clima, a topografia, a disponibilidade de água e outras características do
ambiente natural, incluindo a localização.
Em séculos recentes, a inovação tecnológica tem sido a fonte mais dinâmica de mudança e
desenvolvimento económicos.
3
O inter-relacionamento da população, recursos e tecnologia na economia é condicionado
por instituições sociais, incluindo valores e atitudes. Este conjunto de variáveis é por
vezes, também chamado contexto sociocultural ou matriz institucional da actividade
económica.
Instituições mais frequentemente relevantes:
- Estrutura social (nº, dimensão relativa, base económica e fluidez das classes
sociais).
- A natureza do Estado ou regime político.
- Propensões religiosas ou ideológicas dos grupos ou classes dominantes.
Teoria institucionalista – considera que o desenvolvimento económico é o produto duma
tensão ou luta permanente entre a mudança tecnológica e as instituições sociais. Segundo
esta teoria, a tecnologia é o elemento dinâmico e progressivo, enquanto as instituições
resistem uniformemente às mudanças.
Produção e produtividade
Produção - é o processo pelo qual os factores de produção são combinados para produzir
os bens e serviços desejados pelas populações humanas. A produção pode ser medida em
unidades físicas ou em termos de valor (monetários).
Produtividade – é a relação entre o resultado útil dum processo produtivo e a utilização
dos factores de produção. Pode ser medida em unidades físicas ou em termos de valor.
Para medir a produtividade de factor total – isto é, a produtividade combinada de todos
os factores – são necessários termos de valor.
O capital humano (não escravos) resulta de investimento em conhecimento e capacidade
ou especialização. O investimento pode assumir a forma de ensino normal ou formativo, de
estágio, de aprendizagem do ofício. Embora o capital humano seja adquirido, as
diferenças nos níveis de capital humano per capita entre as economias mais ou menos
avançadas fazem parte dos factores mais notáveis e importantes a serem analisados.
A produtividade de todos os factores de produção aumentou consideravelmente ao longo
dos tempos. A que se deve tal aumento?
Entre as determinantes mais importantes estão:
- Os avanços em tecnologia
- Melhorias na organização tanto a macro como a micronível
- Em especial, maiores investimentos em capital humano.
Lei dos rendimentos decrescentes – um único trabalhador, utilizando uma determinada
tecnologia, seja ela simples ou complexa, é capaz de realizar alguma produção. À medida
que vão sendo acrescentados trabalhadores, até um certo ponto, o produto marginal
aumenta. Todavia, à medida que vão sendo acrescentados trabalhadores, estes poderão
imiscuir-se no trabalho uns dos outros, pisar a colheita, etc. – e o produto marginal
diminui: é este o conceito da lei dos rendimentos decrescentes.
Produto marginal – é a diferença entre o trabalho realizado por ex: entre um trabalhador
que produz 10 alqueires, ao juntar-se outro trabalhador produzem 25 alqueires, o produto
marginal é de 15 (25-10=15).
4
Estrutura económica e mudança estrutural
Estrutura económica – (não confundir com estrutura social, embora ambas se relacionem)
trata as relações entre os vários sectores da economia, especialmente os 3 sectores
principais: primário, secundário e terciário.
Como podem ser explicada as mudanças estruturais?
A mudança da agricultura para actividades secundárias implicou 2 processos principais:
1. No âmbito da oferta, o aumento da produtividade, tornou possível conseguir a
mesma quantidade de produção com menos mão-de-obra. No âmbito da procura,
entrou em jogo uma regularidade do comportamento humano, chamada lei de Engel
– baseada em inúmeros estudos de orçamentos familiares, a lei de Engel diz que à
medida que o rendimento do consumidor aumenta, a proporção desse rendimento
que é gasta na alimentação diminui. (Isto, por sua vez pode ser relacionado com a
lei da utilidade marginal decrescente; nomeadamente quanto mais se tem de um
dado bem menos se valoriza uma sua qualquer unidade).
2. Com produtividade acrescida, os gostos são basicamente responsáveis por tais
mudanças estruturais, mas a força motivadora imediata das mudanças é,
normalmente a mudança nos preços (e salários) relativos. Isto é igualmente
verdadeiro para muitas outras mudanças económicas, como o aumento de novas
indústrias e o declínio de antigas ou a mudança de produção de uma área
geográfica para outra. Os preços de bens e serviços são determinados pela
interacção de oferta e procura.
A logística do crescimento económico
O uso vulgar do termo logística aplica-se à organização de provisões para um grande grupo
de pessoas. Mas logística é também uma fórmula matemática. A curva logística que dela
deriva tem a forma dum S e é, por vezes, designada por curva em S:
Pág 35
A curva tem 2 fases, uma de crescimento acelerado seguida por uma fase de
desaceleração; matematicamente, no seu limite a curva aproxima-se assimptoticamente
duma linha horizontal que é paralela à assimptota de origem.
Tem-se observado que as curvas logísticas podem igualmente descrever com algum rigor
muitos fenómenos sociais, especialmente o crescimento das populações humanas.
Y= rendimento nacional (ou produção)
P = população; R = recursos; T = tecnologia; X = instituições sociais (o grande
desconhecido)
Y= f (P,R,T,X)
5
A taxa de mudança ao longo do tempo é:
dy : dt = df :dt
Cap. II
Desenvolvimento económico nos tempos antigos
Os humanos do final do Paleolítico tinham alcançado um estado relativamente
avançado de desenvolvimento tecnológico e provável também social. Fizeram uma
grande variedade de ferramentas de pedra cinzelada e lascada. Como armas, tinham
lanças, harpões, fundas, arcos e flechas. Nesta época os humanos eram principalmente
caçadores carnívoros, pelo menos na Eurásia, na América do Norte e na África do
Norte, entre as suas presas favoritas contavam-se os cavalos selvagens, os bisontes, as
renas e os mamutes, que abundavam naqueles tempos. Há muito que conheciam e
utilizavam o fogo.
A unidade da organização social era o bando, ou tribo, consistindo em cerca de meia dúzia
de famílias. Era essencialmente migratório, perseguindo a caça, mas limitava normalmente
as suas migrações a uma área geográfica restrita e podia regressar, a intervalos
periódicos, a um centro cerimonial como um bosque ou gruta sagrados.
O contacto entre bandos ou tribos era provavelmente raro, mas não tão raro que
evitasse a difusão de características sociais e técnicas, e talvez algum comércio de
troca primitivo, onde se incluiria a troca de mulheres.
As regras do casamento e do parentesco tinham evoluído e o incesto era universalmente
interdito. Crenças animistas pressagiavam a religião assim como o calendário primitivo
prognosticava a ciência. Algumas indicações do nível do desenvolvimento cultural são
dadas pelas magníficas pinturas rupestres do norte de Espanha e do sudoeste de França.
Não apenas mostram um alto nível artístico, como reflectem aspectos das actividades
económicas dos seus criadores e, provavelmente, os seus conceitos religiosos. Os temas
mais comuns são os animais que caçavam; as pinturas podem ter sido feitas com o
objectivo de comemorar caçadas particularmente bem sucedidas, ou poderão ter sido
evocações aos espíritos para que lhes dessem caça abundante.
A partir de restos de esqueletos, calcula-se que a duração média de vida era de não
mais de cerca de 20 anos.
Dada a natureza da sua economia, os humanos do período do paleolítico estavam
sujeitos a ciclos periódicos de abundância e carestia, dependendo do movimento da
caça e da sorte da caçada. Apesar destes contratempos, os humanos do Paleolítico
estavam distribuídos por toda a face da Terra. As densidades populacionais variavam,
sem dúvida, em função da flora e da fauna que eram os seus meios de subsistência,
com as densidades mais elevadas nas zonas tropicais e subtropicais; mas pelos
padrões modernos, as densidades não eram altas em região alguma.
Dinâmica económica e a emergência da civilização
6
Estivessem ou não relacionadas com as mudanças climáticas, importantes mudanças
tecnológicas ocorreram também no quarto ou quinto milénio que se seguiu ao recuo
dos glaciares, especialmente no Próximo e Médio Oriente. As ferramentas de pedra (e
também objectos artísticos e religiosos) tornaram-se mais complexos e sofisticados.
Afiar e polir a pedra substitui os velhos métodos de raspar e lascar. Tinha chegado o
período do neolítico, ou Idade da Nova Pedra.
Os novos processos mais importantes foram:
- A invenção da agricultura
- A domesticação de animais
O período e localização exactos destas últimas realizações são ainda discutidos. Nem
sequer é certo que tenham ocorrido em conjunção uma com a outra embora pareça
provável que tal tenha acontecido, pelo menos quanto a alguns animais. O local mais
provável é algures denominado Crescente Fértil, a faixa de terra que se estende ao
longo do extremo oriental do Mediterrâneo, atravessando as colinas do norte da Síria e
do Iraque, descendo os vales do Tigre e do Eufrates até ao Golfo Pérsico.
Uma hipótese, é que a domesticação de plantas era trabalho de mulheres nas colinas
do norte do Iraque, ou Curdistão.
Por volta de 6.000 a. C., a agricultura organizada, que envolvia o cultivo de trigo e
cevada e a criação de carneiros, cabras, porcos estava bem enraizada em toda a região
que se estende desde o Irão Ocidental até ao Mediterrâneo e ao longo das terras altas
da Anatólia a ambos os lados do mar Egeu.
Os utensílios usados pelos primeiros agricultores eram duma simplicidade extrema. O
primeiro foi uma rudimentar foice ou faca segadeira – usada na colheita de sementes
de ervas silvestres e, eventualmente, dos cereais cultivados.
Uma das principais consequências da invenção da agricultura foi a maior capacidade
de determinar áreas para sustentar as suas populações. Assim, a população cresceu
onde quer que a população neolítica se difundisse. À medida que era difundida iam
sendo introduzidas modificações devido a diferenças de recursos e clima.
A unidade básica da organização económica e social nas primeiras comunidades
agrícolas era a aldeia de camponeses, cuja composição variava entre 10 e 50 famílias
com uma população total de 50 a 300 pessoas. As aldeias de camponeses podem ser
vistas como sucessoras lógicas, e talvez nalguns casos as reais, dos bandos de
caçadores do final do período do Paleolítico, embora em média fossem
susbstancialmente maiores devido à sua melhor adaptação ao ambiente. As condições
de vida melhoraram ligeiramente em relação às das comunidades de caçadores. A
duração média de vida não excedia, provavelmente os 25 anos.
A Baixa Mesoptâmia- região entre os rios Tigre e Eufrates, mesmo a norte do golfo
Pérsico – região pouco promissora, tornou-se alicerce da primeira grande civilização
conhecida da História, a da Suméria, com grandes concentrações de pessoas, cidades
7
agitadas, arquitectura monumental e uma profusão de tradições religiosas, artísticas e
literárias que influenciaram outras civilizações antigas durante milhares de anos.
A base económica desta primeira civilização assenta numa agricultura altamente
produtiva.
O progresso da civilização acarretou uma divisão muito mais complexa do trabalho e
do sistema de organização económica.
Nasceram entre outras, as profissões ligadas à arquitectura, à engenharia, à medicina.
Foram sistematizados pesos e medidas, a matemática foi inventada emergiram formas
primitivas de ciência. Uma vez que a Suméria era praticamente desprovida de recursos
naturais além do seu rico solo, negociava com outros povos, menos avançados, assim
contribuindo para a difusão da sua civilização.
A escassez de pedra, tanto para utensílios como para construção, acelerou
provavelmente a adopção de cobre e do bronze. Consequentemente a metalurgia foi
considerada um dos pilares da civilização.
As primeiras cidades, como Eridu, Ur, Uruk e Lagash, eram
organização económica e a religião centravam-se no templo da
representada por uma hierarquia sacerdotal. Eram membros da
trabalhos de irrigação, drenagem e a agricultura em geral
cobrança das receitas como tributo ou imposto.
cidades-templo, isto é, a
divindade padroeira local,
hierarquia que dirigiam os
e que supervisionavam a
A necessidade de manter registos das fontes e do destino deste tributo levou ao
emprego de pictogramas simples em tabuinhas de barro, ainda antes de 3.000 a. C. Por
volta de 2.800 a. C., os pictogramas tinham sido estilizados no sistema cuneiforme de
escrita, uma característica distintiva da civilização mesoptâmica. É um dos poucos
exemplos na História duma inovação significativa proveniente duma organização
formalista.
Embora a escrita tivesse sido criada como resposta à necessidade de manter registos
administrativos, em breve passou a ter muitas outras utilizações: religiosas, literárias,
económicas.
Da sua primeira localização no topo do golfo Pérsico, a civilização mesoptâmica
espalhou-se para norte, para a Acádia, cujo principal centro foi a cidade da Babilónia,
e, subsequentemente, para as regiões mais altas dos vales do Tigre e Eufrates.
As fundações económicas do império
Antes da ascensão das primeiras grandes civilizações urbanas, a estrutura social das
aldeias neolíticas de camponeses parece ter sido relativamente simples e uniforme. O
costume e tradição, interpretados por um conselho de anciãos, regiam as relações entre
os membros da comunidade.
Nas primeiras cidades-templo da Suméria, por contraste, a estrutura social era
definitivamente hierárquica. As massas de camponeses e trabalhadores não
8
especializados, que provavelmente ascendiam a 90% da população total, viviam num
estado de servidão, senão de pura escravidão.
A terra pertencia ao templo (ou à sua divindade) e era administrada pelos
representantes da divindade, os sacerdotes.
Mais provavelmente, a raiz da diferenciação de classes e da organização política
formal eram as diferenças étnicas ou tribais.
Á medida que as primeiras cidades-Estado se expandiram aproximando-se uma das
outras, disputas de fronteiras e direitos sobre água tornaram-se fontes adicionais de
conflito e conquista.
Comércio e desenvolvimento no mundo mediterrânico
Os Fenícios foram os primeiros marinheiros e mercadores especializados, segundo as
suas próprias tradições, vieram para o mediterrâneo do golfo Pérsico ou do mar
Vermelho, o que levanta a possibilidade de eles (ou os seus antepassados) poderem ter
sido os primeiros intermediários entre a Suméria e o Alto Egipto através do Índico.
Simultaneamente com o comércio, os Fenícios também desenvolveram várias
indústrias de transformação, incluindo a manufactura da sua famosa tinta púrpura.
Os Fenícios organizaram-se em cidades-Estado autónomas, das quais as mais famosas
foram Sídon e Tiro. Fizeram parte dos povos mercantis mais proeminentes da civilização
antiga. As suas actividades comerciais levaram-nos a desenvolver o alfabeto, que os
Gregos e os Romanos adoptaram, como um substituto mais eficaz da escrita hieroglífica
ou cuneiforme, a par de outras das suas técnicas comerciais.
Os outros grandes comerciantes marítimos do Mediterrâneo forma os Gregos. Ao
contrário dos Fenícios, os Gregos eram originalmente cultivadores mas o carácter
rochoso e montanhoso da pátria que adoptaram depressa os levou ao mar, para
complementar o escasso produto da sua agricultura. Os seus excelentes portos naturais
e as inúmeras ilhas do mar Egeu adjacente também encorajaram esta partida.
Os progressos comerciais e financeiros foram facilitados por uma inovação, de
pequeno significado técnico mas de grande importância económica – a introdução da
moeda cunhada. Dinheiro e cunhagem, não são idênticos.
O comércio de troca e as transações a crédito tinham surgido muito antes da moeda
cunhada. Esta porém, simplificou extraordinariamente as transacções comerciais e
permitiu a extensão do sistema de mercado para muitos indivíduos e grupos que de outra
forma teriam permanecido isolados numa economia fechada de subsistência.
As primeiras moedas eram aparentemente feitas de electro, uma liga natural de ouro e
prata que foi descoberta nos vales aluviais da Anatólia, mas devido à variabilidade
proporcional dos 2 metais em electro, os metais puros eram os preferidos.
Embora fossem cunhadas moedas de ouro e prata, a prata era mais abundante e mais
prática para o comércio. O papel dominante de Atenas no comércio e na cultura do séc. V
contribui também para a predominância da prata, pelo menos entre os Gregos; na verdade,
os 2 fenómenos estavam intimamente relacionados.
9
A Idade de Ouro Ateniense foi tornada possível pela prata de Láurio.
Empreendimentos económicos e limites da civilização antiga
O apogeu da civilização clássica, pelo menos nos seus aspectos económicos, ocorreu
durante o primeiro e segundo século da Era Cristã, sob o domínio de Roma.
Os Romanos eram, originalmente, um povo agrícola, sobretudo pequenos camponeses
com um grande respeito pelos direitos de propriedade. No decurso da sua expansão,
tornaram-se progressivamente mais preocupados com os assuntos militares e
administrativos, mas a sua ligação tradicional ao solo manteve-se. O comércio, por
outro lado, não era muito importante no sistema de valores romano; era deixado nas
mãos de classes sociais inferiores, de estrangeiros e mesmo de escravos.
O sistema jurídico romano inicialmente, adaptado a um regime agrário mas
gradualmente modificado pela incorporação de elementos gregos, permitiu uma
liberdade de iniciativa considerável e não penalizou as actividades comerciais. Em
especial, permitiu o cumprimento rigoroso de contratos e de direitos de propriedade e
o julgamento rápido (e normalmente justo) de litígios.
O maior contributo de Roma para o desenvolvimento económico foi a pax romana, o
longo período de paz e ordem na Bacia Mediterrânica que possibilitou o
desenvolvimento do comércio sob as condições mais favoráveis. Uma consequência
da maior importância da pax romana foi o crescimento populacional.
Economicamente os pilares gémeos do Império Romano eram a agricultura e o comércio.
A queda do Império Romano e o declínio (ou retrocesso) da economia clássica não
foram idênticos, apesar de estarem intimamente relacionados
Uma razão ainda mais fundamental para os limites, e derradeira falha, da economia
clássica transcende as causas imediatas do declínio de Roma: a falta de criatividade
tecnológica. Esta esterilidade tecnológica contrasta vivamente com o brilho cultural de
pelo menos alguns períodos da civilização antiga.
A explicação parece residir na estrutura socioeconómica e na natureza das atitudes e
incentivos que ela gerou. O trabalho muito produtivo era feito quer por escravos quer
por camponeses servis, cujo estatuto diferia pouco do dos escravos. Mesmo que
tivessem tido a oportunidade de melhorar a tecnologia, teriam colhido poucos
benefícios, se é que algum, quer em termos de rendimentos mais elevados, quer em
termos de redução da mão-de-obra.
Uma sociedade baseada na escravatura pode produzir grandes obras de arte e
literatura, mas não pode produzir um crescimento económico sustentado.
10
Cap. III
Desenvolvimento económico na Europa Medieval
Para enfrentarem as ameaças dos outros povos, os reis francos criaram um sistema de
relações militares e políticas, mais tarde chamado feudalismo, que moldaram ao
sistema económico em evolução.
Os grandes nobres – duques, condes, marqueses – tinham muitas propriedades que
abarcavam inúmeras aldeias; cediam algumas a fidalgos ou cavaleiros menos importantes,
seus vassalos, em troca de um juramento de homenagem e fidelidade, semelhante ao que
eles próprios tinham prestado ao Rei; a este processo dava-se o nome de subenfeudação.
Subjacente ao sistema feudal, mas com origens mais antigas e bastante diferentes,
estava a forma de organização económica e social chamada senhorialismo. O
senhorialismo começou a tomar forma no fim do Império Romano, quando os
latifundia (‘grandes quintas’) de nobres romanos foram transformados em
propriedades auto-suficientes e os agricultores forma vinculados ao solo por
legislação ou por pressões económicas e sociais mais directas e imediatas. As invasões
bárbaras modificaram o sistema, principalmente através da introdução de chefes
militares e de guerreiros nas classes governantes, e o senhorialismo recebeu o seu
cunho definitivo nos séc. VIII e IX, durante as invasões sarracenas, viquingues e
magiares, quando se tornava base económica do sistema feudal.
Modelo típico de senhorio era coisa que não existia. As variações geográficas e
cronológicas eram demasiado numerosas. Todavia, é útil criar um senhorio idealizado,
hipotético.
Enquanto unidade organizacional e administrativa, o senhorio compunha-se de terra,
edifícios e gente que cultivava a primeira e habitava os últimos. Funcionalmente a
terra estava dividida em :
11
-
Arável
Pastagem ou prado
Pinhal
Floresta ou terra inculta
Eram normalmente propriedade comum, embora
o senhor supervisionasse a sua utilização e
mantivesse privilégios especiais nas florestas
Juridicamente estava divida em :
- Domínio senhorial - incluía a
casa senhorial, celeiros, estábulos, oficinas, jardins e talvez vinhas e pomares.
- Possessões camponesas – a terra que os camponeses cultivavam para si
próprios estendia-se a grandes campos abertos em torno da casa senhorial e da
aldeia.
- Baldios – tanto no sentido de terreno ou pastagem comunitário, sem dono
preciso ou singular, como de terreno inculto.
Sociedade rural
A sociedade compunha-se de 3 ordens:
1. os nobres – davam protecção e mantinham a ordem.
2. o clero – cuidava do bem estar espiritual da sociedade
3. os camponeses – trabalhavam para sustentar as 2 ordens superiores.
A ordem clerical possuía várias gerações sociais:
- Clero regular – que se retirava da vida normal para comunidades separadas.
- Clero secular – padres e bispos, que participavam mais directamente na vida
da comunidade.
Havia distinções internas tanto no clero regular como no clero secular, baseadas no
estatuto social dos indivíduos que ingressavam na vida religiosa. Os filhos mais novos
das famílias nobres estavam frequentemente destinados, com ou sem formação
apropriada, a tornarem-se bispos ou abades.
Na população camponesa havia diferenças de estatuto. Em termos mais gerais havia 2
categorias: livres e servis; mas estas categorias nem sempre eram distintas, e havia
nelas diferentes graus de servidão e liberdade.
Padrões de estabilidade
A organização do trabalho no senhorio envolvia um misto de cooperação e coerção
costumeiras, com muito pouco espaço para a iniciativa individual. As operações mais
importantes eram: lavrar, semear e colher.
A importância do gado na economia medieval agrária variava consideravelmente de
região para região. A sua maior importância era como animais de tiro:
- Os bovinos existiam em toda a Europa
- Os cavalos usados no noroeste da Europa e na Rússia
- Os burros e as mulas, utilizados principalmente no sul de França e Espanha
- Os búfalos-da-índia usados nalgumas regiões de Itália
Forças de mudança
12
A inovação mais importante da prática agrícola medieval foi a substituição duma
rotação trienal de culturas pela clássica rotação bienal da agricultura mediterrânica.
Estava intimamente associada a 2 outras inovações significativas, a introdução da
charrua de corte profundo e a utilização de cavalos como animais de tiro. Esta última
dependia de outras inovações nos arreios e aprestos dos cavalos.
A acrescentar a estas importantes inovações e melhoramentos mais discretos. Em
resultado das novas fontes de abastecimento e evolução na metalurgia, o ferro passou a
ser mais abundante e mais barato na Europa Medieval que no antigo Mediterrâneo; além
da sua utilização para armadura dos cavaleiros e armamento, começou a ser usado em
utensílios agrícolas: enxadas, forquilhas, machados, foices, ancinhos, etc.
O valor do estrume animal para fertilizar o solo era há muito conhecido, mas foram
levados a cabo esforços mais intensos para o recolher e conservar. A prática da
margagem (acrescentando greda ou cal ao solo) aumentou a fertilidade de certos tipos
de solos, como adição de turfa a outros.
Pode também falar-se de inovações em termos de culturas desenvolvidas e gado
criado.
A Europa expande-se
Os resultados económicos globais da expansão podem resumir-se numa difusão de
tecnologia mais avançada, num aumento significativo da população devido tanto ao
crescimento natural quanto à imigração, numa grande extensão da área cultivada
(novos recursos) e numa intensificação da actividade económica.
As Cruzadas, ao contrário da expansão alemã para o Oriente, não resultaram numa
expansão geográfica permanente da civilização europeia; a sua causa era mais
complexa, pois as suas motivações religiosas e políticas eram muito mais fortes que as
motivações económicas. A era das Cruzadas terminou com a longa depressão secular
do séc. XIV.
O renascimento da vida urbana
A única região que podia comparar-se ao norte de Itália, em termos de
desenvolvimento urbano, era o sul dos Países Baixos, especialmente Flandres e o
Brabante. Não só as 2 regiões tinham as maiores populações urbanas, como as suas
densidades totais eram igualmente as maiores na Europa. A sua agricultura era a mais
avançada e intensiva e tinham os centros comerciais e industriais mais importantes.
O facto de a agricultura ser sempre mais intensiva e produtiva nos arredores das
cidades que no campo sugere um papel importante para a procura urbana e para os
mercados.
Correntes e técnicas comerciais
13
O comércio mais prestigiado e lucrativo foi, sem dúvida, o que estimulou o
reflorescimento comercial entre a Itália e o Levante.
As feiras da Champanha emergiram no séc. XII como o local de reunião mais
importante na Europa para os mercadores do Norte e do Sul. Sob a protecção dos
condes da Champanha, que disponibilizavam instalações para o comércio e tribunais
comerciais especiais, bem como protecção na estrada para os mercadores em viagem,
as feiras rodavam quase continuamente ao longo do ano entre as 4 cidades: Provins,
Troyes, Lagny e Bar-sur-Aube. Localizadas sensivelmente a meio caminho entre as 2
regiões económicas mais altamente desenvolvidas da Europa, o norte da Itália e os
Países Baixos.
As práticas e técnicas comerciais que se desenvolveram nestas cidades – por exemplo,
as «cartas de feira» e outros instrumentos de crédito e os antecessores dos seus
tribunais comerciais – exerceram uma influência muito mais alargada e duradoura que
as próprias feiras. Mesmo após o seu declínio como centros de troca de mercadorias,
continuaram por muitos anos a ser centros financeiros.
Na segunda década do séc. XIV, tanto Veneza como Génova organizavam comboios
anuais regulares, as famosas esquadras de Flandres. Estas caravanas de mar alto
levavam mercadorias dos portos mediterrânicos directamente para o grande mercado
permanente de Bruges (e daí para a Antuérpia), assumindo, assim, algumas das
funções das feiras da Champanha.
Na época carlovíngia, os mercadores eram normalmente estrangeiros – sírios e judeus.
Commenda (uma forma de sociedade) – um mercador, talvez demasiado idoso para os
rigores da viagem, disponibilizava o capital a outro, que fazia a viagem. Os lucros
eram divididos normalmente três quartos para o capitalista sedentário e um quarto
para o sócio activo. Tais contratos eram frequentes no comércio marítimo do
Mediterrâneo, mas eram igualmente usados no comércio terrestre; estavam
normalmente, limitados a um só empreendimento (viagem ida e volta).
Á medida que o volume do comércio se expandiu e as práticas comerciais se tornaram
padronizadas, surgiu uma nova forma de organização empresarial – a vera società, ou
verdadeira companhia – que rivalizava, e por vezes suplantava, a commenda. Tinha
vários sócios, por vezes em grande número, e frequentemente operava em muitas
cidades por toda a Europa. Os Italianos eram, de longe, os mais destacados neste
género de organização.
No fim do séc. XIII, o seguro marítimo era prática comum.
A banca e o crédito estavam intimamente relacionado com o comércio medieval. Os
primeiros bancos de depósitos estabeleceram-se em Veneza e Génova logo no início
do séc. XII. Originalmente criados como meros cofres de segurança, depressa
começaram a transferir somas duma conta para outra sob ordem oral e, menos
frequentemente , sob ordem escrita. Embora estivessem juridicamente proibidos de
fazer empréstimos sobre fundos divisionários, os bancos concediam facilidades de
14
saques a descoberto aos melhores depositantes, assim criando novos meios de
pagamento.
Todo o negócio das feiras da Champanha era, na prática efectuado a crédito; no fim
duma feira, os lucros não concretizados eram transferidos para a feira seguinte, por
meio de cartas de feira, uma espécie de letra de câmbio. Embora as letras de câmbio
se tenham desenvolvido em relação com o comércio de mercadorias, eram por vezes
usadas como puros instrumentos financeiros, sem ligação directa às próprias
mercadorias.
Os cambistas – cuja tarefa era distinguir os valores dos diferentes tipos de moedas,
desempenhavam um papel muito importante nas feiras e nos burgos mercantis. Das
suas fileiras saíram muitos banqueiros. Só depois da segunda metade do séc. XIII é
que a Europa obteve, por fim, uma moeda realmente estável, o famoso florim de ouro
emitido pela primeira vez em Florença em 1252.
Tecnologia industrial e as origens da força mecânica
Embora largamente inferior à agricultura em termos de números envolvidos, a
indústria não era de forma alguma um sector desprezível da economia medieval.
A maior e mais disseminada indústria era, sem dúvida, o fabrico de tecidos, embora a
indústria de construção, no seu todo, talvez estivesse num muito próximo segundo lugar.
A produtividade da mão-de-obra, comparada com a dos tempos antigos, aumentou em
muito, em resultado dum trio de inovações técnicas inter-relacionadas: o tear a pedal,
que veio substituir a simples estrutura de tecer, a roda de fiar que substituiu o fuso; e o
moinho pisoador a água. Custos de produção mais baixos são, sem dúvida, um motivo
suficiente para a sua difusão, mas também reduziram o tédio do trabalho. (Princípio
do séc. XII).
Mais pequenas que as indústrias têxteis, mas estrategicamente mais importantes para o
desenvolvimento económico, as indústrias metalúrgicas e afins tiveram um progresso
notável em finais da Idade Média.
A maior abundância e preço mais reduzido do ferro foram, em parte, resultado duma
maior acessibilidade do minério de ferro e, principalmente de combustível (carvão
vegetal ), na Europa a norte dos Alpes. Melhorias na tecnologia, nomeadamente a
utilização da força da água para mover foles e grandes martinetes, foram, contudo
também elas importantes. Ao aproximar-se o princípio do séc. XIV, os primeiros
percursores do alto-forno moderno, que vieram substituir a chamada forja catalã,
fizeram a sua aparição. A organização de mineiros e trabalhadores metalúrgicos em
comunidades livres de artesãos, em contraste com os bandos de escravos dos tempos
romanos, facilitou, sem dúvida, a mudança tecnológica.
Outra indústria de grande utilidade prática que se expandiu apreciavelmente além das
dimensões clássicas foi a de curtumes e o trabalho em peles.
15
É aos pensadores medievais, não aos filósofos clássicos, que devemos invenções tão
úteis como as lunetas e os relógios mecânicos.
O astrolábio e a bússola começaram a ser usados na Europa durante a Idade Média, a
par dos progressos significativos na técnica de navegação e na concepção dos navios
que ajudam a distinguir a Idade Medieval da Moderna. De forma semelhante, a
pólvora e as armas de fogo foram invenções medievais, embora o seu período de
eficácia viesse mais tarde.
A crise da economia medieval
A Peste Negra foi o episódio mais dramático na crise da economia medieval, mas não
foi de forma alguma a origem ou a causa dessa crise.
A Grande Fome de 1315-17 afectou todo o norte da Europa, dos Pirinéus à Rússia; na
Flandres, a região mais densamente povoada, a taxa de mortalidade saltou para dez vezes
mais que o seu valor normal. Há alguns indícios de deterioração climática do séc. XIV. Por
muito sérios que fossem estes problemas, não é provável que expliquem inteiramente a
estagnação e o declínio de toda a economia. Uma explicação mais geral é a sobrepopulação
face aos recursos e tecnologia disponíveis.
Na segunda metade do séc. XIV ocorreram revoltas, revoluções e guerras civis por
toda a Europa. Nem todas foram inspiradas por contenções de salários, mas estavam
todas relacionadas, duma forma ou doutra, com a mudança súbita das condições
económicas ocasionadas pela fome, peste e pela guerra.
Cap. IV
Economias não ocidentais nas vésperas da expansão ocidental.
A Europa, especialmente a Europa Ocidental, foi a região do mundo que, desde o séc. XVI
até ao séc. XX, sofreu um crescimento e uma mudança mais dinâmicos. Foi em larga
medida, responsável pela criação da economia do mundo moderno, e a sua interacção com
outras regiões mundiais determina o modo e o momento da participação dessas regiões
nessa economia.
O mundo do Islão
O Islão, a mais recente das grandes religiões do mundo, teve origem na Arábia no séc.
VII d.C. O seu fundador, o profeta Maomé, tinha sido mercador antes de se tornar um
guia religioso e político. Por alturas da sua morte, em 632 d.C. tinha unido sob o seu
governo praticamente toda a península Arábica.
16
Os Árabes originais eram, antes de mais, nómadas, embora alguns praticassem a
agricultura de oásis e tivessem alguns centros urbanos, como Meca. As terras que
conquistaram eram no seu todo, apenas ligeiramente menos áridas que a Arábia, mas
continham os dois berços da civilização, o vale do Tigre – Eufrates e o vale do Nilo.
O Islão acabou por se desenvolver como uma civilização predominantemente urbana,
embora muitos muçulmanos, árabes e outros tivessem permanecido nómadas,
pastoreando carneiros, cabras, cavalos ou camelos – raramente gado bovino e nunca
porcos, pois Maomé proibira o consumo desta carne.
O potencial agrícola deste território era muito limitado, mas a sua localização
conferia-lhe grandes possibilidades comerciais.
Como o próprio Maomé fora mercador, o Islão não considerava os negócios mercantis
actividades inferiores; pelo contrário, os mercadores eram encarados com honra e
estima.
Durante centenas de anos, os Árabes e os seus irmãos na fé foram os principais
intermediários no comércio entre a Europa e a Ásia. Nesse processo facilitaram a
difusão de tecnologia. Muitos elementos da tecnologia chinesa, incluindo a bússola
magnética e a arte de fazer papel, chegaram à Europa por intermédio dos Árabes.
Também introduziram novas culturas, como o arroz, a cana-de-açúcar, o algodão, os
citrinos, as melancias, entre outros frutos e vegetais.
Um dos princípios do Islão era a Jihad, ou guerra santa contra os pagãos. Justifica em
parte, o notável sucesso dos Muçulmanos em obter conversões, uma vez que aos
inimigos era dada a opção entre se converterem ou serem mortos. Em relação aos
Judeus e aos Cristãos, os Muçulmanos tinham uma política diferente. Como também
eles eram monoteístas, os Muçulmanos tributavam-nos mas toleravam-nos (talvez
outra razão para o sucesso das conversões conseguidas nessas comunidades).
Os Judeus, em particular, gozavam de grande liberdade no Islão.
Grande parte do nosso conhecimento sobre o Islão Medieval vem do Genizah do
Cairo, um grande arquivo onde se depositava qualquer pedaço de papel que se tivesses
escrito o nome de Deus – e as cartas mesmo as cartas comerciais entre mercadores
Judeus, invocavam normalmente as bençãos de Deus.
Em resultado das suas conquistas no Império Romano Oriental, de língua grega, os Árabes
apoderaram-se de muitos ensinamentos da Grécia Clássica. Durante a Idade Média
Europeia, tornaram-se juntamente com os Chineses, os guias mundiais do pensamento
científico e filosófico. Muitos dos autores gregos antigos chegaram até nós apenas
através de traduções arábicas. A matemática moderna baseia-se no sistema arábico de
notação, e a álgebra foi uma invenção árabe.
Durante o renascimento intelectual da Europa Ocidental, nos séc. XI e XII, muitos
estudiosos cristãos foram para Córdova e para outros centros, intelectuais
muçulmanos estudar filosofia e ciência clássicas. Ao mesmo tempo, mercadores
cristãos aprenderam práticas e técnicas comerciais muçulmanas. Embora o Papa
17
tivesses proibido oficialmente o comércio com os Muçulmanos, os mercadores
cristãos – especialmente os venezianos – prestaram pouca atenção a essa resolução.
O Império Otamano
Entre os povos que aceitaram o Islão como sua religião contavam-se uma série de
tribos nómadas turcas da Ásia Central. Atraídos para sul e oeste pela riqueza do
Califado Árabe, vieram primeiro como assaltantes e saqueadores, mas acabaram por
se instalar como conquistadores. Tamerlão conhecido pela sua ferocidade impiedosa,
conquistou a Pérsia em finais do séc. XIV. O império de Tamerlão foi de curta
duração, mas no princípio do séc. XVI, outro conquistador, Ismaíl, fundou a dinastia
dos Sefévidas, que governou a Pérsia até ao séc. XVIII.
Os mais bem sucedidos dos conquistadores turcos foram os Otomanos, cujas origens
remontam ao sultão Osman (1259-1326).
Este vasto império dominado pelos Turcos não constitui uma economia unificada ou
um mercado comum. Cada região do Império continuou as actividades económicas
que praticava antes da conquista, com pouca especialização regional. A agricultura era
a ocupação principal da grande maioria dos súbitos dos Sultões.
O Império perdurou, ao contrário da maioria dos seus antecessores, porque os Turcos
criaram um sistema fiscal relativamente equitativo, que fornecia amplos rendimentos para
apoiar o funcionalismo do governo central e o exército. A dominação e a ordem eram
mantidas por funcionários turcos estacionados nas províncias e a quem eram pagas rendas
de determinadas parcelas de terra, de modo semelhante, nalguns aspectos, ao feudalismo
europeu medieval.
Ásia Oriental
A civilização da China, data dos primórdios do segundo milénio a.C.; tem um dos
desenvolvimentos mias fechados de qualquer civilização.
O Confucionismo é a base filosófica da civilização chinesa.
O berço original da civilização chinesa foi a faixa central do rio Amarelo, onde o fértil
solo de loess depositado pelos ventos da Ásia Central permitia um fácil cultivo.
A agricultura chinesa foi sempre uma agricultura de mão-de-obra extremamente
intensiva, quase «tipo jardim», recorrendo à utilização extensiva da irrigação. Os
animais de tiro só foram introduzidos mais tarde.
A manufactura dos tecidos em seda teve origem na China, numa época muito remota.
A porcelana é igualmente uma invenção chinesa, como o são o papel e a impressão.
(Os chineses já utilizavam papel-moeda quando Carlos Magno cunhou os primeiros
dinheiros de prata). Em geral, os Chineses alcançaram um nível bastante elevado de
desenvolvimento científico e técnico muito antes do Ocidente.
18
Apesar da sua precocidade tecnológica e científica , o desenvolvimento económico
não levou a uma era industrial. Os produtos eram destinados ao uso do governo, a
Corte Imperial, e ao restrito nº de aristocratas proprietários de terras.
As massas de camponeses eram demasiado pobres para constituírem um mercado para
artigos tão exóticos. Mesmo o ferro, em cuja produção os Chineses também se
distinguiram, era utilizado unicamente para armas e arte decorativa, não para
utensílios.
Os comerciantes e o comércio tinham um estatuto muito baixo na filosofia
confuciana.
No séc. XIII deu-se uma série de factos que afectaram profundamente não só a China
como praticamente toda a massa continental eurasiana, incluindo a Europa Ocidental.
Foi a irrupção dos Mongóis, sob o comando de Gengiscão, da sua pátria da Mongólia,
a norte da China. Em pouco mais de meio século, Gengis e os seus sucessores criaram
o maior império terrestre contínuo que o mundo jamais viu, estendendo-se desde o
Oceano Pacífico, a oriente, até à Polónia e à Hungria, no Ocidente. Embora o nome
deles seja quase sinónimo de rapinagem e violência, os Mongóis fizeram o que os
conquistadores bárbaros faziam normalmente: instalaram-se e adaptaram a civilização
dos seus hospedeiros conquistados.
A dinastia Ming (1368 – 1644) – restabeleceu os costumes chineses tradicionais, em
especial o Confucionismo e o sistema mandarim. A primeira metade da época Ming
também testemunhou um crescimento económico e demográfico considerável.
Durante os últimos anos do poder mongol e durante a revolta contra os Cãs, as
estradas e os canais tinham-se deteriorado e a população diminuíra em resultado de
cheias, secas e guerras. O governo agiu energicamente para restabelecer as ligações de
transporte e, numa situação de paz relativa, a população começou a crescer
novamente. Em 1421, os Ming mudaram a capital de Nanquim (Nanjin) para Pequim
(Beijing), no Extremo Norte, estimulando assim o comércio norte – sul.
Ásia Meridional
A religião teve um impacto maior na economia que no governo. A religião primitiva
original era o Hinduísmo, que se desenvolveu em muitas variantes e seitas
heterodoxas, incluindo os Jainas e os Siques, ainda hoje activos. O Budismo, cuja
origem foi sensivelmente contemporânea do nascimento do Confucionismo na China,
na Coreia e no Japão, tendo praticamente desaparecido da Índia antes da Idade
Moderna.
No princípio do séc. XVI, Babur, que afirmava descender de Gengiscão, criou o
Império Mongol, ou Mogol, no norte da Índia, que o seu neto Acbar, engrandeceu
imensamente.
A inimizade entre os reinos muçulmanos do Decão, no sul da Índia, e o império hindu
de Vijayanagar facilitou a instalação de bases pelos Portugueses no princípio do séc.
XVI.
19
Uma forma através da qual a religião colidiu com a economia foi o sistema de castas
dos Hindus. As castas foram em primeiro lugar determinadas pela ocupação, mas
originalmente parece ter havido também, um elemento étnico. No começo havia
apenas 4 varnas, ou ordens de casta:
1. os Brâmanes, ou a ordem sacerdotal
2. uma ordem de guerreiros e governantes
3. uma de agricultores, artesãos e comerciantes
4. e uma ordem inferior de criados.
Embora o sistema de castas não fosses tão rígido como por vezes é descrito, deve ter
sido uma barreira à mobilidade social e à distribuição eficaz dos recursos. Outro
elemento da religião hindu inimigo do crescimento económico foi a veneração do
gado – as «vacas sagradas» que deambulavam livremente pelo campo e não podima
ser mortas nem consumidas.
A cultura autenticamente nativa na Índia era o algodão, que é mencionado no Rigveda,
o livro sagrado hindu.
A maioria da população devotava o seu tempo e energia à agricultura, mas a Índia não
tinha falta de bons artesãos. Prova disso são as sofisticadas obras de arte, estatuária a
arquitectura monumental, todas elas ao nível do melhor da arte grega e romana. Porém,
estes artesãos trabalhavam para os ricos e poderosos; as massas não tinham poder de
compra e não existia uma classe média digna de nota. O pequeno comércio estava nas mãos
dos árabes.
O sudeste da Ásia desde a Birmânia, a noroeste, ao Vietname, a leste e à península da
Malaia, a sul, é igualmente conhecido por Indochina, a sua cultura é um misto das
tradições culturais chinesas e indianas.
África
A história do norte de África está intimamente relacionadas com s história da Europa,
especialmente com a da Europa Mediterrânica, desde tempos remotos até ao presente. A
economia do norte de África era semelhante à da Europa Mediterrânica. A cultura
cerealífera predominava onde a queda de chuva era adequada (por vezes complementada
pela irrigação), e nos demais locais imperava o pastoreio nómada. O comércio era vigoroso,
mas a indústria era de tipo caseiro.
A economia da África Subsariana é tão variada como o seu clima, topografia e
vegetação. A população era ainda mais variada que a paisagem. Embora todos os
habitantes originais fossem de tez escura ou negra, existia uma enorme variedade
étnica racial e linguística. A tribo era o grupo social acima da família.
A economia ia da mais primitiva caça e colheita até uma agricultura relativamente
sofisticada e à criação de gado na savana e noutros espaços abertos. Dada a
disseminação por toda a África Central da mosca tsé-tsé, que transmite uma doença
fatal a grandes animais domésticos, os agricultores não tinham animais de tiro; assim,
praticavam uma cultura de enxada, utilizando alfaias de madeira ou ferro.
20
As Américas
A população nativa das Américas (os Ameríndios) descendeu de um povo mongolóide
(ou pré-mongolóide) que, numa qualquer altura do passado distante, atravessou uma
ponte terrestre da Ásia para a América do Norte, onde é hoje o estrito de Bering.
Os Ameríndios tinham descoberto a agricultura independentemente da do Velho
Mundo, mas nem todos a praticavam. A cultura principal era o maís (milho índio),
que era complementada com tomate, abóbora e feijão, e, nas terras altas andinas, a
batata.
Ao Ameríndios não tinham animais domesticados anão ser o cão e, nos Andes, o
lama, que podia ser utilizado como animal de carga mas não como animal de tiro. A
tecnologia agrícola era, a cultura da enxada. Os Ameríndios tinham poucos metais –
algum ouro aluvial usado para ornamentos, prata e cobre, mas não ferro. As suas
ferramentas eram feitas de madeira, osso, pedra e especialmente obsidiana, um vidro
vulcânico natural usado para cortar e esculpir. Apesar desta tecnologia aparentemente
primitiva, produziram algumas obras de arte sofisticadas, como seja arquitectura
ornamental.
Também existiram mercados e comércio destes tempos remotos. A prova
arqueológica do comércio a longa distância data de meados do segundo milénio a. C.
Entre os séc. VIII e IV a. C., a cultura olmeca, situada ao longo da costa do golfo do
México, comercializava com as terras altas da região Central do México. Deste
comércio faziam parte estatuetas elaboradamente esculpidas e outros objectos de arte
feitos de jade e da muito cara obsidiana, bem como grãos de cacau, que tanto eram
utilizados como uma espécie de moeda de consumo.
A civilização maia da moderna Guatemala e do Iucatão, tinha como característica
mais marcante as grandes pirâmides, não muito diferentes das do Egipto, mas no cimo
das quais se erguiam templos. Os Maias tinham um calendário e uma forma de escrita
que só recentemente foram decifrados. Pouco se sabe da organização da sociedade de
economia, mas, como outros locais, o maís era a cultura principal e os mercados eram
frequentes. A sociedade deverá de ter sido organizada hierarquicamente para produzir
a sua arquitectura monumental, e os excedentes alimentares terão sido substanciais –
para permitirem uma força de trabalho de construtores e artesãos especializados. A
civilização maia atingiu o seu auge nos séc. IV e IX da Era Cristã. Aparentemente, a
população revoltou-se contra os seus governantes sacerdotais, possivelmente auxiliada
por invasores do Norte. Os templos, abandonados pelos crentes, ficaram em ruínas e
foram engolidos pela selva circundante.
A seguir aos Maias, várias outras culturas das terras altas do México alcançaram
níveis bastante avançados de desenvolvimento. É o caso dos Toltecas, dos
Chichimecas e dos Mixetecas. Por volta de meados do séc. XIV, os Aztecas, uma
tribo feroz e guerreira cuja cidade principal foi Tenochtitlán, onde se localiza
actualmente a Cidade do México, começaram a conquistar e a explorar os seus
vizinhos. Como os Aztecas praticavam sacrifícios humanos, escolhendo as vítimas
entre a população subjugada, não é surpreendente que os Espanhóis , sob o comando
21
de Cortés, tenham encontrado aliados quando empreenderam a conquista de
Tenochtitlán, em 1519.
Quando a civilização maia estava no seu auge, os nativos ao longo da costa do Peru
praticavam uma agricultura de irrigação usando água dos Andes, uma técnica
desconhecida em todas as demais regiões das Américas. Evidentemente, a sua
população era grande, porque permitia o crescimento de densas populações urbanas
que comercializavam entre si.
Algum tempo depois de 12oo a. C., os Incas, uma tribo das terras altas, com a sua
capital em Cuzco, iniciaram uma conquista militar de toda a região montanhosa e
costeira desde o Equador, a norte, até ao Chile, a sul. Os Incas não tinham uma
linguagem escrita, mas conseguiam manter registos, e mesmo enviar mensagens a
grandes distâncias, por meio de cordas com nós. Impuseram aos seus súbditos um
formalismo estatal altamente centralizado, incluindo armazéns do Estado para
conservação e distribuição de cereais; mas os mercados privados coexistiram com o
sistema de distribuição governamental.
Os Índios Pueblo, do sudoeste dos Estados Unidos, também praticavam a agricultura e
construíram colónias urbanas que merecem a designação de cidades. Os índios da
região florestal oriental, que habitavam a zona leste do rio Mississipi desde o rio S.
Lourenço, a norte, até ao golfo do México a sul, dedicavam-se à agricultura, a par da
caça e da pesca, mas viviam em aldeias, e não em cidades. Segundo a lenda, os Índios
ensinaram os Puritanos, da Nova Inglaterra a fertilizar o milho enterrando peixe com
as sementes, processo que em muito aumentava a produção.
22
23
Cap. V
A segunda logística europeia
No princípio do séc. XVI, o crescimento demográfico era generalizado. Continuou
imparável ao longo do séc. XVI, tendo possivelmente acelerado nas últimas décadas.
Contudo, no princípio do séc. XVII, este vigoroso crescimento deparou-se com os
usuais surtos de fome, pragas e guerras, especialmente a Guerra dos Trinta Anos, que
dizimou a população da Europa Central. Em meados do séc. XVII, com algumas
excepções, nomeadamente a Holanda, o crescimento populacional tinha cessado, e
nalgumas regiões tinha inclusivamente regredido. Estes marcos – sensivelmente o
meio do séc. XV e o meio do séc. XVII – delimitam a segunda logística europeia.
Depois deles, ocorreram outras mudanças importantes, algumas provavelmente
fortuitas e outras intimamente relacionadas com fenómenos demográficos. Na última
data a economia europeia e as economias mundiais eram completamente diferentes do
que tinham sido no séc. XV.
A diferença mais óbvia foram os horizontes enormemente expandidos.
Outra diferença importante foi uma mudança acentuada na localização dos principais
centros de actividade económica na Europa. No séc. XV, as cidades do norte de Itália
mantinham o comando dos assuntos económicos que tinham exercido por toda a Idade
Média. Porém, as descobertas portuguesas privaram-nos do monopólio do comércio
das especiarias.
O declínio da Itália foi provavelmente mais relativo que absoluto, devido ao grande
aumento de volume do comércio europeu. No entanto, nos meados do séc. XVII, a
Itália tinha mergulhado na rectaguarda da economia europeia, de onde não emergiu
completamente até ao séc. XX.
Espanha e Portugal viveram uma glória passageira, como os principais poderes económicos
da Europa. Lisboa substitui Veneza como grande entreposto do comércio de especiarias, e
os Habsburgos espanhóis, financiados em parte pelo ouro e prata do seu império
americano, tonaram-se os monarcas mais poderosos na Europa. Apesar de as duas nações
terem mantido os seus extensos impérios ultramarinos até aos séc. XIX e XX
respectivamente, estes já estavam em completo declínio, económica, política e
militarmente, em meados do séc. XVII.
A Europa Central, Oriental e Setentrional não participou significativamente na
prosperidade comercial do séc. XVI. A Hansa Alemã floresceu no séc. XV, mas depois
definhou. Embora as causas principais do seu declínio tenham sido independentes das
descobertas, estas últimas aceleraram provavelmente o declínio ao fortalecer o poder
comercial das cidades holandesas e inglesas.
A região que mais beneficiou com as mudanças económicas associadas às grandes
descobertas foi a região que faz fronteira com o mar do Norte e como Canal da Mancha::
os Países Baixos, a Inglaterra e o norte da França.
24
Na época das grandes descobertas, a Inglaterra estava precisamente a emergir de um
estatuto de região atrasada e produtora de matérias-primas para um país que começava a
industrializar-se.
A Guerra das Rosas dizimaram as fileiras da grande nobreza, mas deixaram a classe
média urbana e os camponeses quase incólumes. O declínio da grande nobreza intensificou
a importância da baixa aristocracia, a pequena nobreza. A nova dinastia dos Tudors, que
subiu ao trono em 14485, dependia profundamente do apoio da pequena nobreza.
Flandres, a região economicamente mais avançada no norte da Europa, recuperou
lentamente da grande depressão da Idade Média. Bruges declinou gradualmente como
entreposto principal do comércio com o sul da Europa e Antuérpia desenvolveu-se até se
tornar o porto mais importante e a maior cidade mercantil da Europa na primeira metade
do séc. XVI.
Os Holandeses, que dominavam as desembocaduras do rio Escalda, impediam os navios de
ir para Antuérpia. O comércio desviou-se para norte, e Amesterdão tornou-se a grande
metrópole comercial e financeira do séc. XVII.
Mudanças tecnológicas nas artes da navegação e da construção de navios foram vitais
para o sucesso da exploração e da descoberta. A introdução da pólvora e a sua aplicação
pelos Europeus em armas de fogo foram de igual modo vitais para o sucesso das
conquistas europeias no ultramar. Houve melhoramentos simultâneos nas artes da
metalurgia e em alguns outros processos industriais. Globalmente, o período não se
notabilizou pelo progresso tecnológico.
População e níveis de vida
O crescimento na população do séc. XVI, embora geral, não foi de modo algum uniforme.
Começando com densidades desiguais e crescendo a níveis diferentes, as populações das
diversas regiões da Europa variavam consideravelmente em densidade no fim do séc. XVI.
É possível falar da sobrepopulação até nas regiões montanhosas e inférteis na última
parte do séc. XVI. Fluxos de migrantes dessas regiões para as já densamente povoadas
mas mais prósperas planícies e terras baixas são disso prova.- mas as planícies e as terras
mais baixas estavam também sobrepovoadas.
Uma consequência dessas migrações foi que a população urbana cresceu mais rapidamente
que a população total . Em alguns casos, um aumento da população urbana podes ser
encarado como um factor favorável de desenvolvimento económico, mas não foi
necessariamente o que aconteceu no séc. XVI.
Nessa época, as cidades funcionavam principalmente como centros comerciais e
administrativos, e não como centros industriais. Muitas actividades industriais, como foi o
caso das indústrias têxtil e metalúrgica, estavam sediadas no campo. As artes manuais
praticadas nas cidades estavam normalmente organizadas em grémios, coma exigência de
longas aprendizagens e doutras restrições à entrada. Os migrantes rurais raramente
tinham a habilidade ou aptidões necessária para ocupações urbanas. Nas cidades, eles
formavam um lumpenprletariat , uma gremiação de mão-de-obra eventual e não
especializada.
25
Exploração e descoberta
As descobertas afectaram profundamente o curso da mudança económica na Europa.
Verificou-se no fim da Idade Média um progresso tecnológico notável na concepção e
construção de navios e os instrumentos de navegação tornaram-se
muito mais
sofisticados. Navios de três, quatro e cinco mastros, com combinações de velas quadradas
e latinas, capazes de navegar contra o vento substituíram as galeras a remos com velas
auxiliares que tinham servido para o comércio medieval. O leme articulado de popa
substitui o remo de direcção. Combinadas estas mudanças proporcionaram uma mobilidade
e um domínio direccional muito maiores e dispensaram os remadores.
Os navios tornaram-se maiores, mais fáceis de manobrar, mais adequados ao mar alto, e
passaram a ter maior capacidade de carga e a poder efectuar viagens mais longas. A
bússola magnética, trazida da China pelos Árabes, reduziu significativamente a conjectura
própria da navegação. Progressos na cartografia permitiram a feitura de mapas e cartas
muito mais perfeitos.
Os Italianos tinham sido expoentes na arte da navegação, mas como eram muito
conservadores na concepção de navios, a primazia foi rapidamente assumida por aqueles
que navegavam em mar alto, especialmente os Flamengos, os Holandeses e os Portugueses.
Os Portugueses em especial, agarraram a iniciativa em todos os aspectos da arte do
marinheiro, concepção de navios, navegação e exploração. A visão e a energia de um
homem, o príncipe D. Henrique, cognominado o navegador, foram responsáveis em primeira
linha pelo grande progresso na descoberta e conhecimentos geográficos obtidos pelos
Europeus no séc. XV.
D. Henrique (1394-1460) – devotou-se ao encorajamento da exploração da Costa Africana
com o objectivo principal de alcançar o oceano Índico. No seu forte, no promontório de
Sagres, criou uma espécie de instituto de estudos aprofundados para onde levou
astrónomos, geógrafos, cartógrafos e navegadores de todas as nacionalidades. Desde
1418 até à sua morte enviou expedições quase anualmente. D. Henrique não viveu o
suficiente para realizar a sua maior ambição. Na verdade, por altura da sua morte, os
seus marinheiros tinham ultrapassado em pouco Cabo Verde, mas o trabalho científico e
de exploração efectuado sob o seu patrocínio lançou as fundações de descobertas
posteriores.
Após a morte de D. Henrique, a actividade exploratória afrouxou um pouco por falta de
auxílio régio e por causa do lucrativo comércio de marfim, ouro e escravos que os
mercadores portugueses efectuavam com o reino nativo do Gana.
O rei D. João II que subiu ao trono em 1481, recomeçou a exploração a um ritmo
acelerado. Em apenas alguns anos, os seus navegadores chegaram praticamente ao
extremo de África. Apercebendo-se que estava à beira do sucesso, D. João enviou duas
expedições em 1487:
1. Bartolomeu Dias desceu ao longo da Costa e cruzou o cabo da Boa Esperança (a
que deu o nome de Cabo das Tormentas) em 1488;
26
2. Pêro da Covilhã seguiu pelo Mediterrâneo e por terra para o mar vermelho,
tendo feito o reconhecimento das margens ocidentais do oceano Índico desde
Moçambique, em África, até à costa do Malabar, na Índia.
Estava aberto o caminho para a próxima e maior viagem, a de Vasco da Gama, de 1497
a1499, em torno da África até Calecut na Índia. Devido a doenças, motins e tempestades,
Vasco da Gama perdeu dois dos seus quatro navios e quase dois terços da sua tripulação.
Não obstante, o carregamento de especiarias com que regressou foi o suficiente para
pagar muitas vezes o custo da sua viagem.
Vendo proventos tais, os Portugueses não perderam tempo a capitalizar a sua vantagem.
Numa dúzia de anos tinham rechaçado os Árabes do Oceano Índico e estabelecido
feitorias fortificadas de Moçambique e do golfo Pérsico às lendárias Ilhas das
Especiarias, ou Molucas. Em 1513, um dos seus navios atracou em Cantão, no sul da China,
e em meados do século tinham encetado relações comerciais e diplomáticas com o Japão.
Em 1483 ou 1484, enquanto as tripulações de D. João II continuavam a progredir na Costa
Africana, um genovês que navegara ao serviço dos Portugueses e desposara uma
portuguesa pediu ao rei de Portugal que financiasse uma viagem pelo Atlântico para atingir
o Oriente navegando por Ocidente. Como este negou o seu pedido, Cristovão Colombo, o
Genovês, pediu auxilio aos reis de Espanha, como estes finalmente acederam ao seu
pedido. Colombo partiu a 3 de Agosto de 1492 e em 12 de Outubro avistou as ilhas mais
tarde conhecidas como Índias Ocidentais. Embora consternado coma a sua pobreza óbvia,
denominou os habitantes de índios.
Ao todo, Colombo fez 4 viagens aos mares ocidentais, e manteve até ao fim a crença de
que descobrira uma rota directa para a Ásia.
Na sequência do regresso da primeira expedição, Fernando e Isabel pediram
imediatamente ao Papa uma «linha de demarcação» para confirmar o direito de Espanha
às terras recentemente descobertas. Esta linha, que ia dum pólo ao outro numa longitude
de cem léguas a ocidente dos Açores e das ilhas de Cabo Verde, dividiu o mundo não
cristão em duas metades com o fim de mais explorações ficando a parte ocidental
reservada aos Espanhóis e a metade oriental aos Portugueses.
No ano seguinte, 1494, pelo Tratado de Tordesilhas, o rei português persuadiu os
governantes espanhóis a estabelecer a linha a cerca de 210 milhas naúticas mais para
ocidente que a linha de 1493. isto sugere que os Portugueses talvez tivessem já
conhecimento da existência do Novo Mundo, pois a nova linha colocava o arqueamento da
América do Sul – a faixa de terra que mais tarde se tornaria o Brasil – dentro dos limites
do Hemisfério Português. Em 1500, na maior viagem comercial portuguesa após o regresso
de Gama, Pedro Álvares Cabral navegou directamente para esse estremo e reclamou-o
para Portugal, antes de prosseguir para a Índia.
Tornou-se cada vez mais evidente que Colombo não só não tinha descoberto as Índias,
como também não havia nenhuma passagem fácil através do centro do Novo Continente.
Em 1519, Fernão Magalhães, um português que navegara no Oceano Índico, persuadiu o rei
de Espanha a deixá-lo conduzir uma expedição de 5 navios às Ilhas das Especiarias pelo
mar do Sul. Magalhães não pensava circum-navegar o globo, pois esperava encontrar a
27
Ásia após alguns dias de viagem para lá do Panamá, dentro da órbita espanhola tal como
estava demarcada pelo Tratado de Tordesilhas. O seu principal problema, assim o
considerava, seria descobrir uma passagem através da América do Sul ou em torno dela.
Foi o que fez, e o estreito tempestuoso e traiçoeiro que descobriu ainda tem o seu nome.
O «mar pacífico» em que viria a entrar acarretou-lhe, longos meses de fome, doenças e
por fim a morte, dele próprio e da maior parte da sua tripulação. O que restou da sua
frota vagueou à deriva nas Índias Orientais durante vários meses. Por fim, um dos
tenentes de Magalhães, Sebastián de Elcano, conduziu o único navio sobrevivente e a sua
tripulação debilitada através do oceano Índico e de volta a Espanha volvidos 3 anos,
tornando-se o primeiro homem a completar a viagem por mar à volta da Terra.
A expansão ultramarina e a sua repercussão na Europa
O primeiro século da expansão ultramarina e conquista colonial – isto é, o séc. XVI –
pertenceu quase exclusivamente a Espanha e Portugal. A eminência que estas duas nações
alcançaram na História é principalmente o resultado do seu pioneirismo na descoberta,
exploração e aproveitamento do mundo não europeu. Antes do séc. XVI tinham estado
fora da civilização europeia; depois o seu poder e prestígio declinaram rapidamente até
que no princípio do séc. XIX, tinham mergulhado num estado de sonolência próximo da
síncope. No séc. XVI, contudo, os seus domínios foram os mais extensos e a sua riqueza e
poder os maiores no mundo.
Cerca de 1515, os Portugueses tinham-se tornado senhores do oceano Índico. Em 1505,
Francisco de Almeida foi nomeado 1º vice-rei da Índia. Capturou ou criou várias cidades e
fortes nas costas da África Oriental e da Índia e, em 1509, destruiu completamente uma
grande frota muçulmana na batalha de Diu. Nesse mesmo ano, Afonso de Albuquerque, o
maior dos vice-reis portugueses, assumiu as suas funções e completou a subjugação do
oceano Índico. Conquistou Ormuz, à entrada do golfo Pérsico, e estabeleceu um forte em
Malaca, no apertado estreito entre a península da Malaia e Samatra, um posto que
dominava a passagem para as Ilhas Celebes e Molucas, de onde provinham as especiarias
mais valiosas. Por fim, em 1515, capturou Ceilão, chave do domínio do oceano Índico.
Albuquerque estabeleceu a sua capital em Goa, na costa do Malabar, Goa e Diu
mantiveram-se na posse dos Portugueses até 1961. os Portugueses também encetaram
relações comerciais com o Sião e o Japão.
A princípio o Império Espanhol parecia menos promissor, mas acabou por se revelar
ainda mais lucrativo que o português. Decepcionados coma busca de especiarias e
estimulados por alguns adornos roubados aos selvagens das ilhas das Caraíbas, os
Espanhóis voltaram-se rapidamente para uma procura de ouro e prata. Os seus
continuados esforços para encontrar uma passagem para a Índia cedo revelaram a
existência de civilizações ricas no continente do México e na região norte da América
do Sul. Entre 1519 e 1521, Hernán Cortés conquistou o Império Azteca, no México.
Francisco Pizarro conquistou o Império Inca, no Peru na década de 1530. em finais do
séc. XVI, os Espanhóis detinham um poder efectivo sobre todo o hemisfério, da
Florida e do sul da Califórnia, a norte, ao Chile e ao rio da Prata, a sul (exceptuando o
Brasil). A princípio limitaram-se a privar os nativos da sua riqueza móvel; quando
esta fonte rapidamente exauriu, introduziram os métodos europeus de extracção de
minério nas ricas minas de prata do México e dos Andes.
28
Os Espanhóis, ao contrário dos Portugueses, optaram por colonizar e instalar-se nas
regiões que conquistaram. Levaram as técnicas, equipamentos e instituições europeus
(incluindo a sua religião), que impuseram pela força à população indígena. Os índios
pré-colombianos da América não tinham animais domesticados, a não ser cães e lamas. Os
Espanhóis introduziram os cavalos, o gado bovino, os burros, as cabras, os porcos e a
maioria das aves domesticadas.
Algumas outras características da civilização europeia que foram introduzidas na
América, como as armas de fogo, o álcool e as doenças europeias da varicela, do sarampo
e do tifo, espalharam-se rapidamente, e com um efeito letal.
Para remediar a falta de mão-de-obra, os Espanhóis introduziram escravos africanos
no Hemisfério Ocidental logo em 1501. Em 1600, a maioria da população das Índias
Ocidentais era composta por africanos e por pessoas de raças mestiças; os escravos
não eram tão importantes no continente, a não ser no Brasil e no norte da América do
Sul.
Do ponto de vista económico, a expansão resultou num maior aumento dom volume e
variedade de bens transaccionados. No séc. XVI, as especiarias do Oriente e o ouro e a
prata do Ocidente representaram uma proporção assombrosa de importações do
mundo colonial.
Outros bens foram introduzidos no fluxo de tráfico, expandiram-se gradualmente em
volume e, nos séc. XVII e XVIII, ofuscaram as exportações ultramarinas originais para a
Europa. Tintas exóticas como o índigo e o carmim acrescentaram cor aos tecidos europeus
e tornaram-nos mais alegres e vendáveis, tanto na Europa como noutros continentes. O
café de África, o cacau da América e o chá da Ásia tornaram-se as principais bebidas na
Europa. Quando a cana-de-açúcar foi transplantada para a América, a produção de açúcar
aumentou enormemente, tornando aquela doçura acessível aos europeus comuns.
Muitos géneros alimentares anteriormente desconhecidos na Europa, foram
introduzidos e aclimatados, vindo a tornar-se elementos importantes do regime
alimentar. Da América vieram batatas, tomates, feijões-verdes, abóboras,
pimentos-vermelhos, abóboras-meninas e milho. Do México veio o peru domesticado.
O arroz, originário da Ásia, passou a ser cultivado tanto na Europa como na América.
A revolução dos preços
O fluxo de ouro e, em particular, de prata das colónias espanholas aumentou muito as
reservas europeias dos metais monetários, no mínimo triplicando-os durante o séc.
XVI. O governo espanhol tentou proibir a exportação de ouro e prata, o que se revelou
impossível. De qualquer maneira, o próprio governo era o pior transgressor. Os metais
preciosos espalharam-se pela Europa. O resultado mais imediato e óbvio foi uma
espectacular e prolongada (mas irregular) subida de preços. No fim do séc. XVI, os
preços eram, em regra, 3 ou 4 vezes mais elevados que no princípio do século. O
preço dos produtos alimentares, especialmente os cereais, a farinha e o pão, subiu
mais do que os da maior parte dos outros alimentos. Em geral, o aumento dos salários
em dinheiro ficou muito aquém da subida do preço das mercadorias, resultando um
declínio drástico dos salários reais.
29
As consequências atribuídas à revolução dos preços variam entre o empobrecimento do
campesinato e da nobreza e a «ascensão do capitalismo».
O que é indubitável é que a revolução dos preços, como qualquer inflação, redistribuiu
o rendimento e a riqueza, quer dos grupos individuais quer de grupos sociais.
A causa principal do declínio dos salários reais não foi um problema monetário; foi
antes, um resultado de inter-relações entre o comportamento demográfico e a
produtividade agrícola.
Tecnologia e produtividade agrícola
Na periferia setentrional e ocidental da Europa, predominava a agricultura de
subsistência. As terras eram escassamente povoadas, especialmente nas regiões a
norte, que tinham enormes extensões de florestas virgens. As técnicas primitivas de
corte e queima eram ainda aplicadas, se bem que em regiões mais organizadas se
praticasse um método menos devastador, o sistema de arroteamento. A criação de
gado dum modo primitivo foi importante, especialmente nas regiões montanhosas. As
principais culturas de campo eram: o centeio, a cevada e a aveia; o linho e o cânhamo
eram cultivados por causa das suas fibras, que eram transformadas em toscos tecidos
fabricados em casa. A organização social era hierárquica, mas sem dependência ou
laços de servidão.
Na Europa a leste do Elba e a norte do Danúbio (incluindo a Rússia Europeia), pelo
contrário, os laços pessoais de servidão eram o traço característico das relações sociais
no princípio do período, e foram aumentando, mais ou menos continuamente, à
medida que os poderosos senhores feudais se apoderavam firmemente das terras e da
liberdade dos poucos camponeses que ainda se mantinham livres, por meios legais e
ilegais. Esta era a região do Gutscherrschaft, isto é, do sistema de exploração directa
de grandes propriedades em benefício dos senhores territoriais. A tecnologia agrícola
era relativamente primitiva, recorrendo-se ao sistema de 2 ou 3 campo. Nas terras
adjacentes ao mar Báltico, ou em rios navegáveis que nele desaguavam, a produção
para exportação para os mercados da Europa Oriental, a produção estava
principalmente vocacionada para a auto-suficiência local.
A região mediterrânica, apear dum clima relativamente uniforme e tipos de solos
semelhantes, era tão diversa desafia a generalização. A Itália tinha a agricultura mais
diversificada da Europa. Não obstante esta diversificação, a produção agrícola italiana
não conseguiu acompanhar o crescimento populacional; a exaustão da terra devido a
cultura muito intensas e o excesso de pastagens tiveram os seus custos, com a
desflorestação e a erosão do solo, entre outras consequências.
Espanha apresentava quase tanta variedade quanto Itália, com regiões costeiras férteis
a leste e a sul, cadeias montanhosa a norte noutras zonas e o aspecto mais
característico da geografia espanhola o grande planalto, ou meseta, que se estende ao
longo da parte central da Península Ibérica. A agricultura espanhola recebeu uma rica
herança dos seus antepassados muçulmanos. No mesmo ano em que conquistaram o
reino de Granada e em que Colombo descobriu a América, os monarcas decretaram a
expulsão de todos os judeus do reino. Com a queda de Granada, muitos súbditos
30
mouros também partiram. Aqueles que se converteram, os chamados «mouriscos»,
continuaram a ser a espinha dorsal e os impulsionadores da economia agrícola na
Espanha Meridional por mais um século, antes de, também serem expulsos em 1609.
Os cristãos que os substituíram foram incapazes de manter os intrincados sistemas de
irrigação e outras características de extremamente produtiva agricultura mourisca.
Com a subida de preços resultante da entrada de ouro e prata americanos, muita terra,
quer nos vales férteis quer na meseta árida, foi utilizada para o cultivo de cereais.
Mesmo assim, a produção cerealífera não era suficiente para alimentar a população, e
Espanha passou a depender cada vez mais da importação de trigo e outros cereais.
Outro importante obstáculo para a agricultura espanhola foi a rivalidade entre
camponeses e proprietários de ovelhas. Os pastores de ovelhas praticavam a
transumância, isto é, o movimento dos rebanhos entre as pastagens montanhosas do
Verão e os pastos de Inverno nas terras baixas. A transumância não era uma prática
exclusiva de Espanha. Era praticada em todas as regiões da Europa que tinham áreas
montanhosas desadequadas às culturas aráveis.
Mas o sistema espanhol era invulgar, quer pela extensão das caminhadas das ovelhas
quer pela sua organização. Os donos dos rebanhos, organizados num grémio ou
associação comercial chamado Mesta, constituíam um poderoso grupo de influências
na Corte.
As ovelhas transumantes eram facilmente tributada em postos de portagem
estrategicamente posicionados, a sua lã era valiosa, produziam rendimentos líquidos
(ao contrário de muitas culturas agrícolas) e eram facilmente tributadas na exportação.
Os monarcas sempre gananciosos na percepção de impostos, concederam privilégios
especiais à Mesta – como seja a pastagem ilimitada em terras comuns, medida que se
revelou muito prejudicial para a agricultura – em troca de taxas mais elevadas. Os
privilégios da Mesta, a par doutras políticas governamentais insensatas, como a
tentativa de estabelecer preços máximos para o trigo durante a grande inflação
conhecida como «revolução dos preços», não contribuíram em nada para encorajar
melhores processos técnicos num sistema de exploração da terra que já os
desencorajava. A produtividade agrícola espanhola foi provavelmente a mais baixa da
Europa Ocidental. No séc. XVII, com a população a diminuir, muitas quintas foram
completamente abandonadas.
No resto da Europa Ocidental prevaleceu o sistema de campos abertos, uma herança
do sistema senhorial da Idade Média. Terá havido excepções nas regiões altas e
montanhosas e em grandes extensões do ocidente da França, onde pequenos campos
murados (bocage) alternavam com campos abertos.
Os senhores territoriais tinham-se transformado em meros senhorios; recebiam rendas
em dinheiro ou espécies, mas os serviços de mão-de-obra, já em desuso no final da
Idade Média, foram extintos, embora os senhores continuassem a ter direitos e
privilégios especiais nalgumas áreas. A transferência da posse da terra tornou-se mais
comum e o nº de camponeses que se tornaram pequenos proprietários aumentou, bem
como os agricultores que arrendavam as terras.
31
A região agrícola mais progressista da Europa foi a dos Países Baixos, especialmente
a norte, com o seu centro na província da Holanda. No fim do séc. XV, a agricultura
holandesa e flamenga era já mais produtiva que a média europeia, graças à
oportunidade dada pelo fornecimento às cidades vizinhas e aos trabalhadores da
indústria têxtil. Devido ao seu método de colonização na Idade Média, a população
rural holandesa também possuía maior liberdade que a de regiões anteriormente
feudalizadas. Durante os séc. XVI e XVII, a agricultura holandesa sofreu uma
transformação notável que merece a sua descrição como a primeira economia agrícola
«moderna». A modernização da agricultura estava intimamente associada à
igualmente notável manifestação da superioridade comercial holandesa; sem uma, a
outra não poderia ter ocorrido.
A chave para o sucesso da transformação da agricultura holandesa foi a
especialização. Em vez de tentarem produzir o mais possível de produtos (tanto
agrícolas como não agrícolas) necessários ao seu próprio consumo, os agricultores
holandeses tentaram produzir tanto quanto possível para o mercado, comprando
também no mercado muitos bens de consumo, assim como bens de capital e
intermédios.
A maior parte dos agricultores holandeses especializou-se em produtos de valor
relativamente elevado, principalmente animais domésticos e produtos leiteiros. A
especialização na criação de gado também significou maiores quantidades de estrume
para fertilização; porém, a natureza intensiva da agricultura holandesa exigia ainda
mais fertilizante. Tão grande era a necessidade que alguns empresários concluíram
ser lucrativo especializarem-se na recolha de resíduos de fossa urbanas e excrementos
de pombos, por exemplo, que vendiam em embarcações ou carroças – uma actividade
que acabou por tornar as cidades holandesas mais limpas e saudáveis que as outras.
O desempenho da agricultura holandesa é atestado pelos esforços prementes e
continuados para criar nova terra reclamando-a ao mar, drenando lagos e pântanos e
plantando turfeiras, depois de a turfa ter sido extraída para combustível. Esta actividade
tinha começado na Idade Média, mas aumentou substancialmente nos séc. XVI e XVII, e
foi particularmente intensa em períodos de subida de preços dos produtos agrícolas. E os
agricultores não eram os únicos envolvidos. Os diques e as drenagens necessitavam de
grandes investimentos de capital; comerciantes urbanos e outros investidores formaram
companhias para resgatar terra, e depois vendiam-na ou arrendavam-na a agricultores que
a trabalhavam.
Tecnologia e produtividade industriais
Na indústria, como na agricultura, não ocorreu nenhuma mudança brusca entre a Idade
Média e o início da Idade Moderna. Todavia, ao contrário de que aconteceu com a
agricultura, a inovação decorreu de forma mais ou menos contínua, embora a um
ritmo muito lento.
A orientação de mercado da economia europeia, maior na indústria que na agricultura,
encorajou os empresários, que podiam reduzir os custos de produção e reagira
rapidamente às alterações da procura dos consumidores. Mas a inovação também se
deparou com enormes obstáculos. Um dos mais omnipresentes foi a oposição das
32
autoridades, que receavam o desemprego em resultado de inovações que dispensassem
mão-de-obra, e dos grémios monopolistas e companhias que receavam a concorrência.
Os negócios têxteis continuaram a ser, colectivamente, os maiores empregadores
industriais, seguidos de perto pelos negócios de construção. Isto é compreensível quando
nos lembramos de que numa economia pobre e praticamente de subsistência, como a
Europa Pré-Industrial, as necessidades básicas eram a alimentação, o abrigo e o
vestuário.
A indústria de lanifícios espanhola expandiu-se vivamente na primeira metade do séc.
XVI, mas sobrecarregada por impostos excessivos e pela interferência do governo, daí
em diante, estagnou e declinou. Durante os primeiros dois terços do século, as maiores
indústrias têxteis, de lãs e linhos, localizavam-se no sul dos Países Baixos, em
particular nas províncias de Flandres e do Brabante.
A indústria inglesa expandiu-se prodigiosamente. Na Idade Média, a lã em bruto tinha
sido o principal produto de exportação em Inglaterra. No séc. XVI predominou a
exportação de tecido por acabar. Por volta de 1660, os tecidos de algodão e de lã
penteada representavam dois terços do valor de todas as exportações inglesas. Muito
antes do surgimento da indústria moderna, a Inglaterra já se tinha tornado o maior
exportador da maior indústria da Europa.
A construção naval nos Países Baixos Holandeses passou por uma transformação
profunda. Graças à rápida expansão do comércio holandês, a frota mercantil holandesa
decuplicou em número e teve um aumento ainda maior na tonelagem entre o princípio
do séc. XVI e meados do séc. XVII. Nessa época, era, de longe, a maior da Europa, e
provavelmente maior que todas as outras juntas. Considerando a vida relativamente
curta dos navios de madeira, isto traduz-se numa grande procura da indústria naval,
uma procura à qual os construtores navais holandeses reagiram racionalizando os seus
estaleiros e introduzindo técnicas elementares de produção em massa. Utilizaram
serras mecânicas e guindastes accionados por moinhos de vento e mantinham
armazéns de peças sobressalentes. Devido à sua eficiência, forneciam não só a frota
do seu próprio país como também a dos seus rivais.
A inovação mais significativa dos Holandeses foi o fluyt (o fluyt holandês, um navio
relativamente grande e deselegante teve um enorme sucesso como transportador de
carga, substituindo as velhas carracas bifuncionais), ou «barco voador» como os
Ingleses lhe chamavam, uma carreira comercial especializada introduzida no final do
séc. XVI. Nalguns aspectos, o equivalente ao navio-tanque dos nossos tempos, foi
criado especialmente para cargas volumosas e de baixo valor, como cereais e madeira,
e navegava com tripulações mais reduzidas que os navios convencionais.
As indústrias metalúrgicas, embora tivessem uma importância relativamente enorme
em termos de emprego e produção, alcançaram um grande significado estratégico
devido à importância crescente das armas de fogo e da artilharia nas guerras. As
indústrias metalúrgicas foram também importantes como percursoras da nova era de
industrialização. O ferro era o metal mais importante.
33
Na Idade Média, o ferro trabalhado era obtido de vários tipos de «forjas», nas quais o
minério de ferro era aquecido com carvão vegetal até se transformar numa massa
pastosa, ou «barra», que era depois alternadamente martelada e aquecida até as suas
impurezas serem retiradas. O processo era lento, dispendioso em combustível e
minério, e era produzido em pequenas porções. Nos séculos XIV e XV, a altura dos
fornos aumentou progressivamente e uma corrente de ar produzida por foles
accionados a água aumentava a temperatura da carga, e assim se desenvolveu o
alto-forno.
A Suécia, dotada de minério de ferro de alto nível, madeira e força hidráulica
abundantes, tinha uma indústria de ferro ainda modesta na Idade Média. No começo do
séc. XVI, as exportações atingiram cerca de 1000 toneladas por ano. No séc. XVII,
empresários valões e holandeses introduziram técnicas mais avançadas, e a produção
aumentou imenso, no final do século, a indústria sueca do ferro era provavelmente a maior
da Europa.
A Europa não era naturalmente rica em metais precisos, mas os minérios de metais
mais utilitários eram relativamente abundantes. Cobre, chumbo e zinco existiam em
várias partes da Europa e eram extraídos desde tempos pré-históricos. O estanho
estava mais localizado, estando praticamente confinado à Cornualha; mas também
esse metal fora um artigo de comércio muito antes da conquista romana da
Grã-Bretanha.
A Suécia era quase tão rica em cobre como em ferro, e, no séc. XVII, com capital e
assistência técnica holandeses, tornou-se o maior fornecedor europeu nos mercados
internacionais.
As descobertas ultramarinas ao fornecerem matérias-primas, estimularam
directamente novas indústrias; as refinarias de açúcar e o processamento de tabaco
foram as mais importantes, mas outras manufacturas desde a porcelana (em imitação
dos artigos chineses) até às caixas de rapé, se desenvolveram para a satisfação dos
gostos recém-adquiridos. A cana-de-açúcar também forneceu a matéria-prima para
destilarias de rum, e , no séc. XVII, os opulentes holandeses inventaram o gin, que
originalmente se destinava a fins medicinais.
A invenção da imprensa fez aumentar a procura do papel.
Comércio, rotas comerciais e organização comercial
De todos os sectores da economia europeia, o comércio foi sem dúvida o mais dinâmico
entre os séc. XV e XVIII. Livros mais antigos, descrevem o séc. XVI como uma era de
«revolução comercial».
Mais interessante e mais significativa para a história do Desenvolvimento Económico
foram a mudança do centro de gravidade do comércio europeu do Mediterrâneo para
os mares setentrionais, uma mudança ligeira mas perceptível no género de bens
envolvidos no comércio distante, e mudanças nas formas de organização comercial.
34
A invasão portuguesa do oceano Índico foi um rude golpe para os Venezianos e, em menor
grau, para outras cidades italianas. Em 1521, numa tentativa de recuperar o seu
monopólio, os Venezianos ofereceram-se para comprar a totalidade da importação
portuguesa, mas a proposta foi recusada.
Os espanhóis e os Portugueses, concentrados na exploração dos seus impérios
ultramarinos, deixaram o negócio da distribuição das suas importações na Europa – e
também o fornecimento da maior parte das suas exportações às colónias – a outros
europeus. Destes, os Neerlandeses, principalmente holandeses e flamengos, eram os
mais agressivos.
Os Holandeses não foram a única nação a aproveitar-se da fraqueza de Portugal.
Clandestinos ingleses tinham já feito uma viagem em 1591 e, em 1600, a Companhia
Inglesa das Índias Orientais foi criada com um monopólio semelhante ao da
companhia holandesa. Apesar de as 2 companhias serem até certo ponto rivais, ambas
consideravam os Portugueses o seu maior inimigo.
O tipo de artigos envolvidos no comércio de distância mudou de certa forma nos séc.
XVI e XVII. No séc. XVI, uma grande proporção de volume de bens transaccionados
no comércio internacional, consistia em artigos tão importantes como cereais,
madeira, peixe, vinho, sal, metais, tecidos e matérias-primas têxteis. No final do séc.
XVII, metade das importações inglesas, em volume, consistia em madeira; mais de
metade das exportações, também em volume, compunha-se de hulha, embora as
exportações de tecidos fossem muito valiosas.
Um ramo muito especial do comércio lidava com seres humanos: o comércio de
escravos. Embora as colónias espanholas se encontrassem entre os maiores
compradores de escravos, os próprios espanhóis não se dedicaram ao tráfico em larga
escala, cedendo-o contratualmente por asiento, aos comerciantes doutras nações. O
tráfico foi a princípio dominado pelos Portugueses e depois sucessivamente, pelos
Holandeses, pelos Franceses e pelos Ingleses. Normalmente era um comércio de
carácter triangular. Um navio europeu transportando armas de fogo, facas, outras
ferragens, contas e adornos baratos, tecidos alegremente coloridos e bebidas alcoólicas
navegava para a costa de África Ocidental, onde negociava com chefes tribais a troca
de mercadorias por escravos. Quando o negreiro carregava tantos escravos
acorrentados e algemados quantos o seu navio podia comportar, dirigia-se para as
Índias Ocidentais ou para os continentes da América do Norte ou do Sul. Aí trocava a
carga humana por um carregamento de açúcar, tabaco ou outros produtos do
Hemisfério Ocidental, com o qual regressava à Europa. Os governos europeus não
tomaram quaisquer medidas concretas para a proibir. Até ao séc. XIX.
A organização do comércio variava de país para país e consoante a natureza do
próprio comércio. O comércio intra-europeu herdou a organização sofisticada e
complexa desenvolvida pelos mercadores italianos dos finais da Idade Média. Os
comerciantes nativos, bem como os doutros países, aprenderam as técnicas
empresariais italianas como a contabilidade por partidas dobradas e o recurso ao
crédito. A maior dinastia empresarial do séc. XVI foi a família Fugger, com sede em
Ausburgo, no sul da Alemanha.
35
O primeiro Fugger conhecido na História era tecelão. Alguns dos seus descendentes
tornaram-se promotores (comerciantes-fabricantes) na indústria de lanifícios,
acabando por se envolver na venda por atacado de seda e especiarias com um
armazém em Veneza. No final do séc. XV estavam activamente empenhados em
financiar os Sacros Imperadores Romanos, conseguindo o domínio da produção das
minas de prata da distribuição de especiarias na Europa Central, pelas quais trocavam
a prata necessária para comprar as especiarias na Índia. Também aceitavam depósitos,
operavam intensamente com letras de câmbio estavam profundamente envolvidos no
financiamento aos monarcas de Espanha e de Portugal – um negócio que acabaria por
levar ao seu declínio. No séc. XVI, os Fugger eram destacados – Jacob II era
conhecido como um princípe entre os comerciantes.
A Espanha também teve algumas dinastias de comerciantes notáveis. A forma de
organização preferida era a sociedade, normalmente formalizada por contratos escritos
especificando os direitos e obrigações de cada sócio.
A organização comercial em Inglaterra, um país periférico no séc. XV, reflectia uma
forma anterior às das economias mais altamente desenvolvidas do Continente, mas
teve um rápido progresso, e, em finais do séc. XVII, era uma das mais avançadas.
Na segunda metade do séc. XVI, os Ingleses criaram várias companhias com alvarás
de comércio monopolista. Algumas dessas companhias adoptaram a forma
corporativa, mas outras transformaram-se em sociedades anónimas; isto é, reuniam
entradas em capital dos membros e colocavam-nas sob gestão comum- isto fazia-se
nos comércios a longa distância, nos quais os riscos e o capital exigido para financiar
uma única viagem excedia as quantias que um ou vários indivíduos estavam dispostos
a empregar ou investir. As Companhias da Moscóvia e do Levante foram a princípio
formadas numa base de capital anónimo, mas à medida que as relações comerciais se
desenvolveram e se tornaram mais estáveis, tornaram-se companhias corporativas. A
Companhia das Índias Orientais também adoptou a forma de sociedade anónima.
A organização do depósito franco já era altamente sofisticada no começo do séc. XV
em Bruges, e tornou-se ainda mais quando migrou para Antuérpia e para Amesterdão.
A primeira exigência é uma bolsa ou praça mercantil (a palavra moderna bolsa deriva,
no sentido de um mercado organizado ou regulamentado para o comércio de
mercadorias ou de títulos financeiros, deriva da sala de reuniões dos comerciantes em
Bruges, que era identificável por um símbolo que mostrava 3 sacas de dinheiro, ou
bolsas). Por regra, os artigos expostos não eram trocados naquele lugar; eram
simplesmente amostras que serviam para atestar a qualidade dos produtos. Depois de
as encomendas serem efectuadas, as mercadorias eram embarcadas a partir dos
armazéns. A utilização do crédito generalizou-se, sendo a maior parte dos pagamentos
efectuada através de instrumentos financeiros, como a letra de câmbio, ou por
transferência bancárias, em vez de se recorrer à utilização de dinheiro vivo.
O Banco de Amesterdão (fundado em 1609), era um banco público na medida em que
foi fundado sob os auspícios da própria cidade. Era igualmente um banco dedicado a
operações cambiais, mais do que um banco de emissão e desconto. Os fundos podiam
ser ali depositados e transferidos contabilisticamente duma conta para outra; mas o
banco não emitia notas nem concedia empréstimos a comerciantes através do desconto
36
de papel comercial. A sua função principal que desempenhava bem, era a de
proporcionar à cidade e a todos os comerciantes holandeses e estrangeiros que ali
afluíam, meios de pagamento estáveis e fiáveis.
O regime dos comércios coloniais diferia muito do comércio intra-europeu. O
comércio de especiarias do Império Português era um monopólio da Coroa; a armada
portuguesa funcionava igualmente como frota mercante e todas as especiarias tinham
de ser vendidas através da Casa da Índia, em Lisboa.
A situação era diferente, para lá do cabo da Boa Esperança. Ali os comerciantes
portugueses tomaram parte no «comércio regional» em concorrência com mercadores
muçulmanos, hindus e chineses. No comércio das especiarias, Goa era o terminal oriental,
enquanto Lisboa era o terminal ocidental.
O comércio entre Espanha e as colónias era semelhante. O comércio com as colónias era
um monopólio da coroa de Castela. Na prática, o governo colocou-o sob a administração da
Casa de Contratación (Casa de Comércio), uma espécie de agremiação sedeada em Sevilha.
37
38
Cap. VI
Nacionalismo e Imperialismo Económico
As políticas económicas dos Estados-nação do período da segunda logística europeia
tinham um objectivo duplo:
1. Criar um poder económico para fortalecer o Estado.
2. Usar o poder do Estado para promover o crescimento económico e enriquecer
a nação.
Os Estados pretendiam obter rendimento, e, com frequência, a sua necessidade de
rendimentos levava-os a decretar políticas prejudiciais às actividades verdadeiramente
produtivas.
Mercantilismo: um termo incorrecto
Adam Smith – um filósofo escocês do Iluminismo e o fundador da moderna ciência
económica, caracterizou as políticas económicas do seu tempo (e de séculos
anteriores) sob uma única epígrafe, o sistema mercantil. Apesar de condenar as
políticas como insensatas e injustas, tentou sistematizá-las – daí o termo sistema
mercantil -, pelo menos em parte, a fim de realçar a sua incoerência. Explorando
sobretudo exemplos britânicos, declarou que as políticas foram delineadas por
comerciantes e impingidas por governantes e estadistas perfeitamente ignorantes em
relação a assuntos económicos.
Durante mais de um século após Smith ter publicado o seu histórico Inquérito sobre a
Natureza e as Causas da riqueza das Nações, em 1776, o conceito sistema mercantil
teve uma conotação pejorativa. Na última parte do séc. XIX, vários historiadores e
economistas alemães, nomeadamente Gustav von Schmoller, inverteram radicalmente
essa noção. Nas palavras de Schmoller, o mercantilismo, «no seu âmago» mais
profundo, não é senão construção do Estado – não construção do Estado num sentido
restrito, mas construção do Estado e construção duma economia nacional ao mesmo
tempo.
O nacionalismo dos primeiros Estados-nação apoiava-se numa classe, não na massa, a chave
para as diferenças nacionais na política económica deve procurar-se nas divergentes
composições e interesses das classes governantes.
Em França e noutras monarquias absolutistas, os desejos dos soberanos eram
supremos. Em assuntos mais importantes, os monarcas absolutistas sacrificavam
frequentemente o bem-estar económico dos seus súbditos e os fundamentos
económicos do seu próprio poder por ignorância ou indiferença
A União dos Países Baixos, governada por e para os comerciantes ricos que dominavam as
principais cidades, seguiu uma política económica mais informada. Vivendo principalmente
do comércio, não podia dar-se ao luxo de ter as políticas restritivas e proteccionistas dos
seus vizinhos maiores. Estabeleceu-se o comércio livre interno, acolhendo os seus portos
e mercados, comerciantes de todas as nações. Por outro lado, no Império Holandês o
monopólio dos comerciantes holandeses era absoluto.
39
A Inglaterra encontrava-se algures no centro do espectro. A aristocracia fundiária
ligou-se pelo casamento a prósperas famílias de mercadores e a advogados e
funcionários relacionados com a actividade mercantil, e há muito que grandes
comerciantes tinham assumido um papel proeminente no governo e na política. Após
a Revolução de 1688-89, os seus representantes no Parlamento assumiram o poder
supremo do Estado. As leis e regulamento que fizeram em relação à economia
reflectiram um equilíbrio de interesses, beneficiando os interesses fundiários e
agrícolas da nação enquanto encorajavam as indústrias caseiras e apoiavam os
interesses da navegação e do comércio.
Os elementos comuns
Bulionismo – é uma forma de política económica que consiste na tentativa de
acumular tanto quanto possível ouro e prata num país e a proibição da sua exportação
por decreto, sob pena de morte aos infractores. As fúteis tentativas de Espanha para
poupar a sua riqueza do Novo Mundo forma o exemplo mais conspícuo desta política,
mas a maior parte dos Estados-nação tinha legislação semelhante.
Espanha e América espanhola
No séc. XVI, a Espanha era a inveja e o flagelo das cabeças coroadas da Europa. Em
resultado de alianças dinásticas pelo casamento, o seu rei Carlos I (1516-56) herdou,
não apenas o reino de Espanha mas também os domínios dos Habsburgos na Europa
Central, os Países Baixos e o Franco Condado. Em 1519, Carlos tornou-se Sacro
Imperador Romano como Carlos V. Este formidável império político parecia
igualmente assentar em fortes bases económicas. Embora os recursos agrícolas de
Espanha não fossem os melhores, esta herdou o sofisticado sistema mourisco de
horticultura em Valência e Andaluzia e a lã dos seus carneiros era muito apreciada em
toda a Europa. Tinha também algumas indústrias florescentes, nomeadamente têxtil e
metalúrgica. Os domínio de Carlos nos Países Baixos tinham a agricultura mais
avançada e alguma das indústrias mais prósperas da Europa. Os domínios de
Habsburgos na Europa Central continham além de recursos agrícolas, importantes
depósitos minerais, incluindo ferro, chumbo, cobre, estanho e prata. Mais
aparatosamente, o ouro e a prata do Novo Mundo começaram, a fluir para Espanha em
grandes quantidades. Além disso o reino de Aragão trouxe consigo a Sardenha, a
Sicília e toda a Itália a sul de Roma, e o reino de Castela contribuiu com um império
recém-descoberto e ainda por conquistar na América.
Apesar destas circunstâncias favoráveis, a economia espanhola não conseguiu
progredir – na verdade, regrediu a partir de meados do séc. XVII -, e o povo espanhol
pagou o preço sob a forma de níveis de vida mais baixos, maior incidência de fomes e
pragas e, por fim, no séc. XVII despovoamento. Muitos factores contribuíram para o
declínio de Espanha, as ambições exorbitantes dos seus soberanos e a miopia e
perversidade das suas políticas económicas têm de partilhar uma grande quota de
responsabilidade.
40
Carlos V julgava ser a sua missão reunificar a Europa Cristã. Com esse objectivo,
combateu os Turcos no Mediterrâneo e na Hungria, guerreou os príncipes protestantes
rebeldes da Alemanha e hostilizou os reis da dinastia francesa dos Valois. Incapaz de
conseguir um sucesso permanente em qualquer uma destas frentes, homem cansado e
derrotado, abdicou do trono de Espanha em 1556.
Esperara passar para o seu filho Filipe os seus domínios intactos, mas o seu irmão
Fernando conseguiu apoderar-se das terras dos Habsburgos na Europa Central e do
título de Sacro Imperador Romano após a morte de Carlos em 1558.
Para financiarem as suas guerras e consumo conspícuo, Carlos e Filipe contavam em
primeiro lugar, com os impostos. Apesar da sua pobreza, o povo espanhol do séc. XVI
era o mais tributado de toda a Europa. A Coroa conseguiu uma inesperada fonte de
rendimentos com a descoberta de ouro e prata no seu império americano.
Para piorar as coisas, a receita total raramente igualava as grandes despesas de
governo. Isto forçou os monarcas a recorrer a uma terceira fonte de financiamento, o
empréstimo.
Em oito ocasiões (em 1557, 1575, 1596, 1607, 1627, 1647, 1653 e 1680), os Habsburgos
espanhóis declararam falência régia. Cada uma resultou em pânico financeiro, verdadeira
bancarrota e liquidação de muitos banqueiros e outros investidores e ruptura das
transacções comerciais e financeiras correntes.
A ausência de qualquer política económica sistemática de longo prazo é claramente
ilustrada nas histórias das duas das mais importantes actividades económicas de
Espanha:
- A produção de cereais
- O fabrico de tecidos.
A produção de cereais, embora prejudicada pelos privilégios concedidos à Mesta,
prosperou durante o primeiro terço do séc. XVI em resultado, tanto do aumento da
população, como do crescimento moderado dos preços ocasionado pelo influxo inicial
do tesouro americano. Como os custos continuaram a subir, o resultado foi que a terra
arável foi destinada a outros objectivos que não o cultivo de cereais, e a carência de
cereais tornou-se mais grave. A Espanha tornou-se um importador regular de cereais
para pão.
A situação na indústria têxtil era muito semelhante. No começo do séc. XVI, a
Espanha exportou tecidos delicados, bem como lã em bruto. A expansão da procura
interna e, em especial, das colónias na América elevou os custos e também os preços.
A oferta não conseguia manter-se a par da procura crescente. Em 1548 foi permitida a
entrada de tecidos estrangeiros sem o pagamento de direito alfandegário, e em 1552
foi proibida a exportação (excepto para as colónias) de tecidos nacionais. O resultado
imediato foi uma grave depressão na indústria têxtil. A proibição da exportação foi
revogada em 1555, mas a perda de mercados estrangeiros e os aumentos inflacionistas
dos custos tinham privado a Espanha da sua vantagem competitiva. Espanha
continuou a importar tecidos até ao séc. XIX.
41
Do ponto de vista do estratega político, o monarca estava demasiado dependente das
receitas alfandegárias para abolir tarifas e taxas internas sobre o comércio entre as
várias componentes do Império. Mesmo após a união das coroas de Castela e Aragão,
os cidadãos duma eram tratados como estrangeiros na outra. Outras possessões dos
Habsburgos não se encontravam em melhor posição. Os comerciantes e industriais
dos Países Baixos deviam a sua penetração substancial nos mercados espanhóis à sua
competitividade superior, mais que a quaisquer privilégios especiais.
Até nas suas políticas religiosas os monarcas espanhóis conseguiram prejudicar o
bem-estar dos seus súbditos e enfraquecer as bases económicas do seu próprio poder.
No princípio do seu reinado, Fernando e Isabel conseguiram autorização do Papado
para criar um Santo Ofício, sobre o qual exerciam autoridade real directa. Os alvos
iniciais da Inquisição Espanhola eram os apóstatas entre os conversos; judeus que se
tinham convertido ao catolicismo, embora os judeus praticantes ainda fossem
tolerados. Muitos judeus e conversos encontravam-se entre os mais ricos e mais cultos
cidadãos espanhóis. O clima de medo criado pela Inquisição levou muitos conversos e
judeus a emigrar, levando com eles a sua riqueza, bem como os seus talentos.
Os monarcas adoptaram uma política semelhante em relação à sua outra minoria
religiosa, os mouros Muçulmanos. Com a capitulação do reino mouro de Granada, os
Reis Católicos tinham decretado uma política de tolerância religiosa com os Mouros
(contrária à sua quase simultânea perseguição dos Judeus); mas em menos de uma
década, começaram a perseguir também os mouros. Como a maioria dos mouros era
de humildes trabalhadores agrícolas, não tinham recursos para poderem emigrar,
tornaram-se cristãos nominais, os «Mouriscos». Permaneceram durante mais de um
século, dificilmente tolerados. Em 1609, outro governo espanhol, procurando
camuflar a notícia de mais uma derrota militar no estrangeiro, ordenou a expulsão de
todos os mouriscos, e o governo privou-se assim doutro recurso económico de que
necessitava desesperadamente.
As políticas espanholas em relação ao império americano eram tão limitadas e
autodestrutivas como as suas políticas internas. Assim que se começou a compreender
algo da natureza e extensão das descobertas do Novo Mundo, o governo impôs uma
política de monopólio e domínio rígido. As políticas monopolistas e restritivas
revelaram-se tão impraticáveis, que o governo teve de recuar rapidamente.
Em 1524 permitiu aos comerciantes estrangeiros estabelecerem negócio com a
América, mas não a nela se instalarem. Esta medida foi um filão tal para os
comerciantes italianos e alemães, que em 1538, o governo abdicou dessa política e
restituiu o monopólio aos Castelhanos. As políticas de monopólio e restrição
encorajaram a evasão e o contrabando tanto por espanhóis como por outros
expedidores. O comércio intracolonial foi desencorajado, embora algum se efectuasse,
especialmente entre o México e o Peru.
O maior absurdo das políticas económicas coloniais espanholas é realçado pelo
tratamento dado ao seu único território no Pacífico, as Ilhas Filipinas. Embora na
órbita portuguesa, como estava determinado pela linha de demarcação papal, as
Filipinas tornaram-se um território espanhol devido à descoberta de Magalhães. Os
Filipinos e outros asiáticos efectuavam transacções comerciais entre si mesmos e com
42
as regiões asiáticas vizinhas, incluindo a China; mas o único comércio com a Europa
permitido pelas autoridades espanholas era indirecto através do México e da própria
Espanha.
Portugal
Um dos feitos mais notáveis da era da expansão europeia foi o facto de Portugal, um
país pequeno e relativamente pobre, ter conseguido o domínio dum vasto império
marítimo na Ásia, na África e na América. Fora das poucas e pequenas cidades, a
economia era predominantemente de subsistência. Ao longo da costa marítima, as
ocupações não agrícolas eram a pesca e a secagem do peixe. O comércio com o
estrangeiro tinha pouco significado, mas estava a crescer.
Como conseguiu um país tão pequeno e atrasado o domínio do seu enorme império
tão rapidamente? Muitos factores estiveram envolvidos, nem todos susceptíveis duma
avaliação precisa. Um deles foi a sorte: na altura em que Portugal fez a sua incursão
no oceano Índico, as nações daquela área estavam invulgarmente fracas e divididas,
por motivos alheios aos acontecimentos na Europa. Outro factor menos acidental, mas
ainda assim fortuito, foi o conhecimento e a experiência acumulados do trabalho e
dedicação do príncipe D. Henrique. No entanto, existe outro factor mais especulativo,
mas de qualquer modo importante: o zelo, coragem e ganância dos homens que se
aventuraram pelos mares ao serviço do seu Deus e do seu rei e em busca de riquezas.
Com o entusiasmo das suas descobertas asiáticas e dos seus sucessos, os Portugueses
prestaram pouca atenção aos territórios que possuíam em África e na América. No
entanto, na década de 1530, a Coroa Portuguesa alarmou-se com as actividades dos
piratas franceses ao longo da costa do Brasil, e preocupou-se em assegurar colonos
portugueses para o Continente. O Rei fez cedências de terras a particulares, esperando
desta forma garantir colonos com pouca despesa para o país.
Só na década de 1570, com o transplante da cana-de-açúcar das ilhas da Madeira e de
S. Tomé e das técnicas do seu cultivo com mão-de-obra escrava, é que o Brasil se
tornou parte integrante da economia imperial. Em 1580, Portugal ficou subjugado ao
domínio espanhol, e embora Filipe II tivesse prometido preservar e proteger o sistema
imperial português, este sofreu depredações dos Holandeses e de outros, tanto no
Oriente como no Ocidente. Os planos portugueses para desenvolver e explorar um
império africano foram repetidamente adiadas até ao séc. XX.
O monopólio legal da Coroa Portuguesa sobre o comércio das especiarias foi alvo de
referências jocosas ao «Rei Merceeiro» e ao «Potentado da Pimenta» mas a realidade
subjacente a esses termos era bem diferente da que se poderia suspeitar. Em primeiro
lugar, Portugal nunca assegurou um domínio eficaz das fontes de fornecimento das
especiarias. Inicialmente a sua entrada intempestiva no oceano Índico, prejudicou
severamente o transporte tradicional de especiarias por terra para o Mediterrâneo
Oriental, assim privando temporariamente, os Venezianos do seu lucrativo comércio
de distribuição; mas as rotas tradicionais acabaram por vir a ser restabelecidas, e, no
final do séc. XVI, tinham um volume de comércio maior que alguma vez antes –
maior ainda que o das frotas portuguesas. Para isto contribuíram 2 motivos principais:
43
1. os Portugueses estavam pouco densamente disseminados. Com tão poucos
homens e navios, revelou-se impossível policiar a maior parte dos dois
oceanos.
2. a Coroa era obrigada a confiar, ou em funcionários oficiais para imposição do
seu monopólio, ou em adjudicatários que locavam uma parte do monopólio.
Em ambos os casos, verificou-se ineficácia e fraude. Os funcionários oficiais,
embora investidos de grandes poderes, não eram bem pagos e, frequentemente
complementavam, os seus magros salários aceitando subornos de
contrabandistas ou introduzindo-se eles mesmos em negócios ilícitos. Os
adjudicatários da Coroa, é claro tinham grandes estímulos à violação dos seus
contratos sempre que possível.
Mesmo antes da abertura da rota do Cabo, a Coroa Portuguesa monopolizou o
comércio com África, cujas exportações mais valiosas eram ouro, escravos e marfim.
Com a descoberta das Américas, a procura de escravos aumentou enormemente, e os
reis portugueses foram os primeiros beneficiados. No séc. XVIII, a descoberta de ouro
e diamantes no Brasil presenteou a Coroa com um novo Eldorado.
As investidas monopolísticas da Coroa não se limitaram aos produtos exóticos da
Índia e de África, estendendo-se igualmente a artigos de produção interna como o sal e
o sabão e, entre os mais lucrativos, o tabaco do Brasil. E o que a Coroa não conseguiu
monopolizar tentou tributar. O objectivo, tanto do monopólio como da tributação, era
o de obter receitas para a Coroa. Mas, dada a ineficácia e venalidade dos agentes reais,
a evasão era relativamente fácil e generalizada. Como resultado, os reis portugueses
foram forçados a contrair empréstimos, como o já tinham feito os seus pares
espanhóis. Os mutuantes eram, na maioria das vezes, estrangeiros – italianos e
flamengos -, ou mesmo súbditos do Rei, os «cristãos-novos».
«Cristãos-novos» era o termo eufemisticamente aplicado aos cidadãos portugueses
com antepassados judeus. Todavia, Portugal acabou por ter o seu próprio ramo da
Inquisição, uma atmosfera de suspeição mútua e de desconfiança impregnou a vida
portuguesa durante séculos, e Portugal perdeu muita riqueza e muitos trabalhadores
especializados e gente empreendedora para países mais tolerantes, em especial os
Países Baixos Holandeses.
Europa Central , Oriental e Setentrional
Toda a Europa Central do norte de Itália ao Báltico, estava nominalmente unificada no
Sacro Império Romano.
Após a Reforma Protestante, durante a qual muitos senhores seculares, e até
eclesiásticos, adoptaram a nova religião para se apossarem dos bens da Igreja, a
autoridade do Imperador foi drasticamente reduzida.
Na Alemanha, os adeptos do nacionalismo económico propuseram uma série de
princípio ou máximas que quase merecem ser consideradas um sistema ou pelo menos
um quase-sistema. Os escritores desta tradição são normalmente apelidados de
cameralistas, da palavra latina camera, que, no emprego que então se lhe dava na
Alemanha, significava o cofre do tesouro ou o tesouro público do Estado territorial. A
maior parte desses escritores era de funcionários públicos no activo ou já aposentados
44
– isto é, funcionários dos príncipes territoriais que lutavam por autonomia política e
económica.
Pode extrair-se alguma noção do teor das políticas que advogavam do título de um dos
seus livros mais influentes «A Áustria acima de tudo, custe o que custar) de Philipp
W. Van Hornigk (1864). Na sua preocupação de fortalecer o Estado territorial,
defendiam medidas que, além de encherem os cofres do Estado, reduziriam a sua
dependência doutros estados e torná-lo-iam muito mais auto-suficiente em tempo de
guerra:
- restrições ao comércio externo;
- promoção da indústria nacional;
- resgate de solos improdutivos;
- medidas para empregar os «pobres desocupados» (que nalguns casos se
traduziam em trabalhos forçados), etc.
No séc. XVIII, foram criadas cátedras especiais de Ciência do Estado em várias
universidades alemãs para formar futuros funcionários públicos. Na sua grande
maioria, os Estados Alemães eram demasiados pequenos e faltavam-lhes os
necessários recursos para se tornarem verdadeiramente auto-suficientes; houve
contudo, alguns poucos exemplos de políticas que conseguiram fortalecer o poder e a
autoridade dos governantes territoriais, embora à custa do bem-estar dos seus
súbditos.
O caso mais espectacular duma política de centralização de sucesso vir-se-á a dar com
a ascensão da Prússia dos Hohenzollern. Foi este sucesso que levou alguns
historiadores e economistas a rever a prevalecente condenação das políticas de
nacionalismo económico. A dinastia dos Hohenzollern tornou-se governante do
eleitorado de Brandeburgo, centrado na cidade de Berlin, no séc. XV. Os
Hohenzollern expandiram gradualmente os seus territórios através de heranças,
nomeadamente pela aquisição da Prússia Oriental em 1618. A Guerra dos Trinta Anos
provocou grande devastação, mas, começando com a ascensão de Frederico
Guilherme, o Grande Eleitor, em 1610, uma sucessão de hábeis governantes
transformou a Prússia Brandeburguiana numa das maiores e mais poderosas nações da
Europa, a percursora da nova Alemanha.
Os meios que utilizaram incluíram alguns dos instrumentos padrão da chamada
política mercantilista como:
- tarifas proteccionistas
- concessões de monopólio
- subsídios à indústria
- estímulo à instalação de empresários e trabalhadores especializados
estrangeiros nos seus territórios subpovoados
Mas mais importante para o sucesso do seu esforço foi a cuidadosa administração dos
próprios recursos do Estado. Através da centralização da sua administração, de
exigências de contabilidade rigorosa ao corpo de funcionários públicos de carreira que
tinham criado, duma meticulosa cobrança de impostos e da frugalidade nas despesas,
criaram um mecanismo estatal eficiente que constitui uma excepção na Europa do seu
tempo.
45
A sua única extravagância de monta era o exército, que por vezes absorvia mais de
metade do orçamento de Estado. Os reis prussianos usavam o exército em seu
proveito, não só militar e politicamente, mas também economicamente . devido à sua
temível reputação, conseguiam obter subsídios dos seus aliados, evitando, assim, a
necessidade de contrair empréstimos, processo este que arruinou os reinos da maior
parte dos outros monarcas absolutistas.
Por muito eficiente e poderoso que o Estado fosse, pelos padrões de época a economia
do país era apenas moderadamente próspera. A esmagadora maioria da população
produtiva ainda se dedicava à agricultura de baixo rendimento e a Prússia estava longe
de ser a grande potência industrial em que a Alemanha se viria a tornar no final do
séc. XIX.
No extremo oposto da ascensão da Prússia esteve o desaparecimento do reino da
Polónia. Antes de 1772, a Polónia era o terceiro maior estado da Europa em área e o
quarto maior em população; mas, nesse ano, os seus vizinhos mais poderosos, a
Rússia, a Prússia e a Áustria, iniciaram o processo de superação que, em 1795,
eliminou a Polónia do mapa político.
Nos séc. XVI e XVII, a Polónia exportou grandes quantidades de cereais para o
Ocidente, principalmente para o mercado de Amesterdão, através de Danzigue; mas
como a produção agrícola do Ocidente aumentou no séc. XVIII, a procura do cereal
polaco decresceu, e o país retornou à agricultura de subsistência.
Embora a ausência duma autoridade central e eficaz impossibilitasse uma coerente
política económica
para a Polónia, algumas das suas partes constituintes
conseguiram-no. O ducado da Curlândia é um exemplo. Sob o governo do enérgico
duque Jaime (ou Jacob), em meados do séc. XVII, a Curlândia que ocupava uma parte
da área actual da Letónia, tornou-se um verdadeiro modelo dum Estado mercantilista.
Jaime conseguiu promover a indústria através de subsídios e tarifas proteccionistas,
criou uma frota mercante e uma frota armada. Este aparatoso desenvolvimento foi,
infelizmente, talhado pela guerra sueco–polaca de 1655-1660, durante a qual Jaime foi
capturado e a sua capital pilhada.
A experiência da Curdilândia ilustra a eficácia limitada duma deliberada política
estatal no começo da Idade Moderna.
As limitações da capacidade do Estado em moldar a economia foram ainda mais
evidentes na história da Rússia, o maior Estado da Europa, e um dos mais poderosos.
Nos séc. XVI e XVII desenvolveu-se, política e economicamente, em grande
isolamento em relação ao Ocidente. A vasta maioria da população dedicava-se à
agricultura de subsistência, na qual emergiu a instituição da servidão, aumentando
mesmo em crueldade ao longo dos séculos. Em 1696, quando Pedro I, o Grande, se
tornou o único governante, o seu poder dentro do Estado Russo não foi desafiado.
Pedro tomou a deliberação de modernizar – isto é, ocidentalizar – o seu país,
incluindo a economia. Além de medidas tão insignificantes como obrigar os seus
46
cortesãos a usar roupas ao estilo ocidental e a cortar a barba, viajou amplamente pelo
Ocidente, observando processos industriais bem como fortificações e procedimentos
militares. Concedeu subsídios e privilégios a artesãos e empresários ocidentais para se
estabelecerem na Rússia e aí praticarem as suas artes e comércio. Construiu a cidade
de São Petersburgo, a sua «janela sobre o Ocidente», em terra recentemente
conquistada à Suécia no topo do golfo da Finlândia, um braço do mar Báltico.
Subjacente a todas as políticas e reformas de Pedro estava o seu desejo de expandir a
sua influência e território e de fazer da Rússia uma grande potência militar. Com este
objectivo instituiu um novo e assim esperava, mais eficaz sistema tributário e
reformou a sua administração central, cuja função era, como ele dizia, «receber
dinheiro, a maior quantidade possível, pois o dinheiro é a artéria da guerra». Só nas
indústrias do cobre e do ferro dos Montes Urais, onde o minério, a madeira e a energia
hidráulica eram abundantes e baratos, é que emergiram empresas viáveis.
Um dos seus sucessores, Catarina, a Grande, foi responsável por duas inovações nas
finanças públicas, que tiveram efeitos perniciosos na economia:
1. Empréstimos externos;
2. Enormes emissões da moeda fiduciária (papel-moeda).
Entretanto as forças verdadeiramente produtivas da economia, os camponeses
labutavam com as suas técnicas tradicionais, conseguindo uma magra subsistência
para si próprios após as exacções dos seus senhores e Estado.
Nos séc. XVI e XVII, os Suecos desempenharam um papel de grande potência política
e militar que é surpreendente, atendendo à sua reduzida população. Este sucesso
deveu-se, em parte, à abundância de recursos naturais, especialmente cobre e ferro,
ambos essenciais para o poderio militar, e em parte à eficácia administrativa do seu
governo.
Os monarcas suecos cedo alcançaram um grau de poder absoluto no seu reino sem
rival em nenhuma outra parte da Europa. Além do mais, exerciam, em geral, o seu
poder com sensatez – exceptuando as suas temerárias aventuras militares, que
acabariam por levar à sua derrota e apagamento -, pelo menos na esfera económica.
Aboliram as portagens e tarifas internas que prejudicavam o comércio noutros países,
padronizaram pesos e medidas, instituíram um sistema fiscal uniforme e tomaram
outras medidas que favoreceram o crescimento do comércio e da indústria. Nem todas
as políticas foram igualmente favoráveis – por exemplo, a restrição ao comércio
externo a Estocolmo e a algumas outras poucas cidades portuárias -, mas globalmente
deram liberdade aos empresários nativos e imigrantes (especialmente holandeses e
valões, que introduziram técnicas e conhecimento especiais, além de capital) para
desenvolver os recursos suecos. No séc. XVIII, após o declínio do seu poder político,
os Suecos tornaram-se os principais fornecedores de ferro do mercado europeu.
A Itália foi excluída desta análise das políticas de nacionalismo económico porque,
durante a maior parte da Idade Moderna, foi vítima de grandes rivalidades de poder.
Colbertismo em França
47
O exemplo arquetípico, do nacionalismo económico foi a França de Luís XIV. Luís
foi o símbolo – e o poder -, mas a responsabilidade pelo planeamento e execução da
sua vida pública couberam ao seu principal ministro durante mais de 20 anos
(1661-83), Jean Baptiste Colbert. A influência de Colbert foi tal, que os Franceses
forjaram o termo colbertisme – mais ou menos sinónimo de «mercantilismo».
Colbert tentou sistematizar e racionalizar o aparato dos domínios do Estado sobre a
economia que herdara dos seus antecessores, mas nunca foi completamente bem
sucedido, nem para a sua própria satisfação. O motivo principal deste insucesso foi a
sua incapacidade em extrair da economia receitas suficientes para financiar as guerras
de Luís e a sua extravagante corte.
Os reis franceses foram mutuários na Idade Média, especialmente durante a Guerra
dos Cem Anos, mas só no reinado de Francisco I (1515-47) é que uma dívida régia se
tornou característica permanente do sistema fiscal. Daí em diante, a dívida cresceu
progressivamente, excepto nas alturas em que a Coroa suspendia arbitrariamente os
pagamentos de juros e diminuía o valor do montante em dívida. O efeito dessas
bancarrotas parciais era o de tornar mais difícil à monarquia contrair empréstimos,
mas assim continuou a fazer, mesmo com taxas de juros altas. Além dos empréstimos,
a Coroa angariava receitas através da venda de cargos (judiciais, fiscais e
administrativos). A venda de cargos não era desconhecida noutros países, mas em
França tornou-se prática comum. A prática foi bem sucedida no seu objectivo
imediato, mas a longo prazo revelou-se completamente nociva.
Apesar da multiplicação de cargos e funcionários, a Coroa foi forçada a contar com a
iniciativa privada para cobrar a maior parte dos seus impostos, através da instituição
de cobradores de impostos. Estes indivíduos, por regra financeiros abastados,
contratavam com o Estado o pagamento, de uma só vez, de determinada quantia em
troca do privilégio de cobrar determinados impostos específicos.
Colbert pretendia reformar o sistema, especialmente abolindo as tarifas e portagens
internas, mas a necessidade que a Coroa tinha de receitas era demasiado grande e não
o pôde fazer.
Na última parte do séc. XVIII, sob a influência do Iluminismo e dos Fisiocratas,
alguns dos sucessores de Colbert, nomeadamente o economista Jacques Turgot,
tentaram efectivamente reformar o sistema e criar um comércio livre interno; mas a
oposição dos direitos adquiridos, incluindo funcionários públicos, cobradores de
impostos e a aristocracia, levaram-no à demissão.
Colbert, os seus antecessores e os seus sucessores tentaram aumentar a eficácia e a
produtividade da economia francesa. Elaborava inúmeros regulamentos e decretos a
respeito das características técnicas de produtos manufacturados e da conduta dos
comerciantes. Fomentaram a multiplicação de corporações com a declarada intenção
de melhorar as verificações de qualidade, mesmo quando o seu verdadeiro objectivo
era obter mais receitas. Subsidiaram manufactures Royales, quer para abastecer os
seus senhores com bens de luxo, quer para criar novas indústrias. Para garantir uma
balança comercial «favorável», criaram um sistema de restrições e de tarifas altamente
proteccionistas.
48
O homem, que ainda mais que Colbert, deve ser visto como o fundador da tradição
francesa do estadismo em assuntos económicos é o duque de Sully, o principal
ministro de Henrique IV (1589-1610).
Richelieu e Mazarino, os sucessores de Sully como principais ministros durante o
reinado de Luís XIII e durante a menoridade de Luís XIV, não tinham interesse nem
capacidade para os assuntos financeiros e económicos, deixaram as finanças do
Estado voltar às condições deploráveis que prevaleciam antes de Sully.
A primeira tarefa de Colbert foi, a de restaurar alguma aparência de ordem nas
abaladas finanças do estado, o que fez de forma característica, revogando
aproximadamente um terço da dívida régia, porém, a reputação histórica de Colbert
advém das suas ambiciosas mas muito falidas tentativas para regular e dirigir a
economia. Colbert não foi um grande inovador; houve precedentes históricos para
praticamente todas as suas políticas. O que distinguiu o seu regime, além do seu
proporcionalmente longo mandato como homem de confiança de Luís XIV, foi o
vigor dos seus esforços e o facto de ter escrito copiosamente sobre eles.
Um dos principais objectivos de Colbert foi o de tornar a França economicamente
auto-suficiente. Com este propósito promulgou, em 1664, um vasto sistema de tarifas
proteccionistas. Mas este não foi bem sucedido.
As medidas de regulamentação industrial de Colbert estavam mesmos directamente
relacionadas com o objectivo da auto-suficiência, mas não lhe eram totalmente
alheias. Tanto os produtores como os consumidores resistiram e fugiram às
regulamentações mas na medida em que foram impostas com sucesso, também
levaram ao progresso tecnológico. A ordenança do Comércio de Colbert (1673), que
codificou a lei comercial, foi muito mais benéfica para a economia.
Colbert também visou a criação dum grande império ultramarino. Os franceses tinham já,
na primeira metade do séc. XVII, estabelecido postos avançados no Canadá, nas Índias
Ocidentais e na Índia, mas preocupados com as lutas de poder na Europa, não lhes tinham
dado muita assistência. Colbert foi ao extremo oposto, sufocando as colónias com uma
avalanche de regras pormenorizadas e paternalistas. Criou também sociedades
monopolistas por acções para empreenderem o comércio com as Índias Orientais e
Ocidentais; mas, ao contrário dos modelos holandês e inglês, que resultaram da iniciativa
privada, com a colaboração dos governos, as companhias francesas eram, no fundo,
instituições nas quais particulares, incluindo membros da família real e da nobreza, tinham
sido induzidos ou coagidos a investir. Em poucos anos estavam moribundas.
Embora fosse um católico ferveroso, Colbert apoiou a tolerância limitada dos
Huguenotes garantida pelo Edicto de Nantes. Após a sua morte, houve a revogação do
Edicto e a subsequente fuga de muitos Huguenotes para regiões mais tolerantes.
O desenvolvimento prodigioso dos Países Baixos
As políticas económicas holandesas diferiam grandemente das dos Estados-nação
analisados anteriormente. E isso deu-se por dois motivos principais:
49
1. A estrutura do governo da República Holandesa era bastante diferente das
monarquias absolutistas da Europa Continental.
2. A economia holandesa dependia do comércio internacional em grau muito
maior que o de qualquer dos maiores vizinhos dos Países Baixos.
A União de Utreque, de 1579 – acordo entre as 7 províncias do Norte que vieram a
tornar-se a União dos Países Baixos, ou República Holandesa -, foi, por natureza,
mais uma aliança defensiva contra a Espanha que a constituição de um Estado-nação.
Os Estados gerais, o corpo legislativo da República, dedicaram-se exclusivamente à
política externa.
Os Estados Provinciais e das assembleias municipais, dedicavam-se aos assuntos
internos.
Os Holandeses estabeleceram a sua predominância mercantil no começo do séc. XVII,
esta continuou a crescer pelo menos até meados do século.
Os Holandeses especializaram-se no transporte das mercadorias de outros, a par das
suas exportações de arenques, mas também exportavam alguns outros produtos seus.
A agricultura holandesa, apesar de ocupar uma proporção bastante menor de
mão-de-obra à de qualquer outro lugar, era a mais produtiva da Europa, e
especializou-se em artigos de grande valor como manteiga, queijo e culturas
industriais. Os Países Baixos não tinham recursos naturais, como carvão e minérios,
mas importavam matérias-primas e produtos semi-acabados, como tecidos toscos de
lã da Inglaterra, e exportavam-nos já acabados. A indústria de construção naval, que
atingira um elevado nível de perfeição técnica, dependia da madeira do Báltico; mas
abastecia, não apenas as frotas pesqueiras, mercante e naval holandesas, mas também
as doutros países.
Os Países Baixos do Norte obtinham capital financeiro e humano com a chegada de
refugiados religiosos do sul, do sul dos Países Baixos, judeus de Espanha e de
Portugal e, após 1685, huguenotes de França. Estas migrações tanto simbolizaram
como contribuíram para uma política de tolerância religiosa nos Países Baixos, única
no seu tempo.
O jurista holandês Hugo de Groot (Grócio) escreveu o seu famoso tratado Mare
Liberum (Liberdade dos Mares), destinado a tornar-se uma das fundações do direito
internacional, como uma súmula para as negociações que conduziram às tréguas com
a Espanha em 1609.
A liberdade era igualmente a regra na indústria. Embora existissem grémios, não
estavam tão disseminados nem eram tão poderosos como noutros países; a maioria das
grandes indústrias operava completamente fora do sistema associativo. A grande
excepção à ausência de regulamentos no comércio e indústria holandeses foi o
«Instituto das Pescas», sancionado pelo governo, que regulamentava a pesca do
arenque. Os navios de apenas 5 cidades tinham autorização para participar na «Grande
Pescaria» (por oposição às pescarias locais de arenque fresco para consumo interno).
50
O Instituto licenciava os navios para fiscalizar a quantidade e também impunha
rígidas verificações de qualidade para manter a reputação do arenque holandês.
Estas políticas restritivas forma muito benéficas enquanto os Holandeses mantiveram
o seu quase-monopólio do mercado europeu, mas, quando outras nações adoptaram
gradualmente a tecnologia holandesa essas políticas contribuíram para a estagnação e
consequente declínio do comércio do arenque, que foi sintomático (e em parte causa)
do declínio de toda a economia holandesa.
«Colbertismo Parlamentar» na Grã-Bretanha
As políticas económicas em Inglaterra (e, após a união dos parlamentos escocês e inglês
em 1707, na Grã-Bretanha) diferiam da dos Países Baixos e das monarquias continentais
absolutistas. Mas ao passo que o absolutismo real cresceu na maior parte dos países
continentais nos séc. XVI e XVII, em Inglaterra deu-se um desenvolvimento contrário,
que resultou na criação duma monarquia constitucional sob o domínio parlamentar depois
de 1688.
Após a subida ao trono de Guilherme e Maria, em 1689, como monarcas
constitucionais, o Parlamento assumiu o domínio directo das finanças públicas e, em
1693, instituiu formalmente uma dívida «nacional» distinta das dívidas pessoais do
soberano.
Apenas em questões financeiras, a década de 1690 viu:
- Além do estabelecimento duma dívida consolidada
- A criação do Banco de Inglaterra
- Uma recunhagem da moeda nacional
- E a emergência dum mercado organizado de títulos tanto públicos como
privados.
O sucesso do novo sistema financeiro não foi imediato; nos primeiros anos foi
devastado por uma série de crises, que culminaram na famosa Bolha do mar do Sul de
1720. Porém, nas décadas intermediárias do séc. XVIII, quando a Grã-Bretanha se
encontrava empenhada numa série de guerras europeias e coloniais com a França, o
seu governo conseguiu empréstimos por apenas uma fracção dos custos do seu rival.
A facilidade, baixo preço e estabilidade do crédito para as finanças públicas
repercutiram-se favoravelmente nos mercados de capitais privados, disponibilizando
fundos para o investimento na agricultura, no comércio e na indústria.
Um antigo historiador referiu-se à política económica inglesa entre a Revolução
Gloriosa e a Revolução Americana como «Colbertismo Parlamentar». Tem o mérito
de indicar que, em Inglaterra, a actividade político-económica não era tão perrogativa
dum monarca absoluto (e dos seus favoritos), e sim que reagia aos interesses diversos
e por vezes conflituantes desses grupos – aristocratas brasonados, pequena nobreza
fundiária, comerciantes abastados, classes profissionais, cortesãos e outros -, que
estavam efectivamente representados no Parlamento.
As mais famosas e eficazes de todas as políticas do Colbertismo Parlamentar foram as
Leis de Navegação.
51
As Leis de Navegação, tinham como principal objectivo, reservar o comércio internacional
dum país à sua própria marinha mercante, não eram exclusivas de Inglaterra. No entanto,
em termos gerais, essas leis foram ineficazes por 2 motivos:
- Faltavam-lhes adequados mecanismos de aplicação
- Faltavam capacidade e estrutura competitiva às marinhas mercantes que
elas pretendiam beneficiar.
As Leis de Navegação tiveram ainda outro efeito, não pretendido: a perda duma
grande parte – e a parte economicamente mais progressista e próspera do «velho»
Império Britânico. Embora não fossem a única causa, nem sequer a mais importante,
da Revolução Americana, estavam no âmago do «velho sistema colonial» e, para a
maior parte dos Americanos, simbolizavam as desvantagens, reais e imaginadas da
dependência colonial. Desde os seus débeis começos no princípio do séc. XVII, as
colónias inglesas na América do Norte tinham crescido prodigiosamente.
O crescimento do rendimento e da riqueza foi ainda mais impressionante que o
crescimento da população, após os sofrimentos e desastres dos primeiros anos, esta
especializou-se em temos de vantagem comparativa e comercializou extensivamente
entre si, com a Metrópole e, ilegalmente, com o Império espanhol e com regiões da
Europa Continental. Embora as Leis de Navegação regulassem o comércio colonial, a
sua incrementação não foi eficaz senão após a Guerra dos Sete Anos (1763); mesmo
então, não foram um fardo excessivo, apenas o suficiente para dar aos que, por outros
motivos, aspiravam à independência política uma razão para se unirem.
Na Grã-Bretanha, em resumo, o crescimento do poder parlamentar à custa da
monarquia trouxe consigo uma maior ordem nas finanças públicas, um sistema fiscal
mais racional que o de qualquer outro país da Europa e um menor funcionalismo
estatal. O domínio parlamentar foi da maior eficácia em relações económicas com o
mundo exterior e o Parlamento seguiu uma política de rígido nacionalismo
económico. Internamente, embora o Parlamento quisesse dominar a economia,
normalmente não o conseguia. Em resultado disso, os empresários britânicos gozaram
um nível de liberdade e oportunidade praticamente únicas no mundo.
52
53
Cap. VII
O despontar da Indústria Moderna
No começo do séc. XVIII, várias regiões da Europa, sobretudo na Europa Ocidental,
tinham atingido consideráveis concentrações de indústria rural, principalmente mas
não exclusivamente, no sector têxtil. No começo da recente década de 70 foi
inventado um novo termo para descrever o processo de expansão e transformação
ocasional destas indústrias: proto-industrialização. O termo foi primeiramente
empregado em referência à indústria do linho da Flandres.
As características essenciais duma indústria proto-industrial são dispersas,
normalmente trabalhadores rurais organizados por empresários urbanos
(comerciantes-fabricantes) que fornecem as matérias-primas aos trabalhadores e
vendem a sua produção em mercados distantes. Os trabalhadores têm também de
adquirir pelo menos uma parte dos seus meios de subsistência.
Proto-industrialização e termos afins referem-se principalmente a indústrias de bens
de consumo, especialmente têxteis.
O Arsenal de Veneza, propriedade do Estado, que remontava à Idade Média, foi uma
das primeiras empresas industriais em larga escala da História.
Características da indústria moderna
Uma das diferenças mais óbvias entre as sociedades pré-industriais e as sociedades
industriais modernas é o papel grandemente diminuído da agricultura nesta última. A
contrapartida da sua menor importância, porém, é a muito maior produtividade da
agricultura moderna, que permite alimentar uma grande população não agrícola. Outra
diferença é a grande proporção da mão-de-obra moderna empregada no sector
terciário, ou de serviços. Este é um desenvolvimento relativamente recente,
especialmente visível na segunda metade doo séc. XX.
Durante o período da industrialização propriamente dito, que se estende sensivelmente
do princípio do séc. XVIII (na Grã-Bretanha) à primeira metade do séc. XX, o traço
característico da transformação estrutural da economia foi a ascensão do sector
secundário (mineração, indústria e construção), evidenciado pela proporção tanto de
mão-de-obra empregada como de produção.
A transformação foi notada primeiro em Inglaterra, depois na Escócia, e a
Grã-Bretanha tem sido correctamente descrita como «a primeira nação industrial». O
termo «Revolução Industrial», foi aplicado às últimas décadas do séc. XVIII e às
primeiras do séc. XIX; como se tornará evidente, o termo é incorrecto e induz em erro.
O seu uso desvia a atenção de tipos de desenvolvimento contemporâneos, mas
distintos na Europa Continental. Se a Grã-Bretanha nunca tivesses existido, a Europa
(e a América) ter-se-ia industrializado, embora com traços certamente distintos. Não
obstante, este capítulo é dedicado ao começo do processo de industrialização na
Grã-Bretanha do séc. XVIII.
54
No decurso desta transformação, designada como a «ascensão da indústria moderna»,
emergiram certas características que distinguem claramente a indústria «moderna» da
«pré-moderna», que são:
1. A ampla utilização de maquinaria accionada pela força mecânica.
2. A introdução de fontes de potência (ou energia) novas e inanimadas,
especialmente combustíveis fósseis,
3. O emprego generalizado de materiais que normalmente não existem na
natureza.
Um traço característico é a maior escala de iniciativa na maior parte das indústrias.
Durante o séc. XVIII, deu-se um notável aumento do uso da força hidráulica em
indústrias como a da moagem de cereais, têxtil e metalúrgica; e em tempos recentes
assistimos à proliferação duma grande de fontes de energia, desde os pequenos
motores eléctricos a corrente doméstica até enormes reactores nucleares.
Os desenvolvimentos mais importantes na aplicação de energia nas primeiras fases da
industrialização envolveram a substituição de hulha por madeira e carvão vegetal
como combustível e a introdução da máquina a vapor para utilização na mineração,
fabrico e transporte. A utilização de carvão e de coque no processo de fundição
reduziu grandemente o custo dos metais e multiplicou a sua utilização enquanto a
aplicação da ciência química criou uma série de novos materiais «artificiais» ou
sintéticos.
A «Revolução Industrial»: um termo incorrecto
Provavelmente, nenhum termo do léxico histórico-económico foi mais amplamente aceite
pelo público que o de «revolução industrial». Isto é lamentável, porque o termo, em si, não
tem base científica e transmite uma impressão grosseiramente enganadora da natureza
da mudança económica. No entanto, há mais de um século que tem sido utilizado para
simbolizar o período da história britânica que testemunhou a aplicação de maquinaria
accionada mecanicamente nas indústrias têxteis, a introdução da máquina a vapor de
James Watt e o «triunfo do sistema fabril de produção. Por analogia, o termo foi aplicado
ao começo da industrialização noutros países, embora sem consenso geral quanto às datas.
A expressão révolution industrielle foi utilizada pela primeira vez na década de 1820
por escritores franceses que, desejando realçar a importância da mecanização da
indústria francesa do algodão que então decorria na Normandia e no Norte, a
compararam à grande revolução política de 1789. ao contrário da crença generalizada,
Karl Marx não utilizou o termo no seu sentido convencional. O termo só ganhou
aceitação após a publicação, em 1884, de Lectures on the Industrial Revolution in
England, de Arnold Toynbee. Toynbee era um reformador social, não um estudioso;
mas o seu interesses principal resida no remediar do que ele cria ser a degradação
moral das classes trabalhadoras britânicas.
As primeiras descrições do fenómeno realçaram as «grandes invenções» e a natureza
dramática das mudanças. Em pouco mais de 20 anos, todas as grandes invenções de
Watt, Arkwright e Boulton se tinham concluído, o vapor tinha sido aplicado aos novos
teares e começara o novo sistema fabril – uma descrição que ª P. Usher secamente
caracterizou como exibindo «todas as formas superiores de inexactidão histórica».
55
Apesar de se reconhecer que a produtividade aumentara em consequência da força
mecânica e de maquinaria, a maioria dos relatos salientava o recurso ao trabalho
infantil, a substituição das artes tradicionais por maquinaria e as condições insalubres
das novas cidades industriais. Durante a maior parte da sua história, para a maioria das
pessoas, o termo «revolução industrial» tem tido uma conotação pejorativa.
Apesar dos esforços, quer para aumentar quer para diminuir a extensão da
«revolução», a datação convencional teve a aprovação de um erudito como T.S.
Ashton, o mais famoso historiador económico da Inglaterra do séc. XVIII. Isto é
duplamente irónico, pois Ashton, ao contrário dos seus antecessores, via o resultado
daquele período como uma «proeza», e não uma catástrofe, e porque não tinha
particular apreço pelo termo. O próprio Ashton escreveu:
«As mudanças não foram meramente ‘industriais’, mas também sociais e intelectuais.
A palavra ‘revolução’ implica uma subitaneidade de mudança que não é, na verdade,
característica dos processos económicos. O sistema de relações humanas a que por
vezes se dá o nome de capitalismo teve as suas origens muito antes de 1760 e atingiu
o seu pleno desenvolvimento muito depois de 1830: há um perigo em negligenciar o
facto essencial da continuidade».
Pré-requisitos e concomitantes da industrialização
Como Ashton escreveu, as mudanças não foram meramente industriais, mas também
sociais e intelectuais. Na verdade, foram igualmente comerciais, financeiras, agrícolas,
e até políticas. Há motivos para acreditar que as mudanças intelectuais foram as mais
fundamentais, no sentido em que permitiram ou encorajaram as demais.
Só na segunda metade do séc. XVIII, com o florescimento das ciências química e
eléctrica, é que as teorias científicas forneceram as bases para novos processos e novas
indústrias. É todavia indiscutível que já no final do séc. XVII os métodos da ciência –
em particular, a observação e a experimentação – vinham a ser aplicadas (nem sempre
com sucesso) para fins utilitários. E esses esforços não estavam limitados a indivíduos
com formação científica.
Um dos traços mais notáveis do avanço técnico no séc. XVIII e no princípio do séc.
XIX foi a grande proporção de inovações importantes efectuadas por engenhosos
latoeiros, mecânicos e engenheiros autodidactas (o termo «engenheiro» adquiriu o seu
sentido moderno no séc. XVIII) e outros autodidactas.
O modo por que a Inglaterra aumentou a sua produtividade agrícola deveu muito à
experimentação por tentativa com novas culturas e novas rotações de cultura.
Provavelmente, a inovação agrícola mais importante antes da agricultura científica
que foi introduzida no séc. XIX foi o desenvolvimento da chamada «alternância de
culturas», que implicava a alternância de campos cerealíferos com pastagens
temporárias. Isto teve a dupla vantagem de restaurar a fertilidade do solo através de
rotações melhoradas. Muitos proprietários e agricultores também ensaiaram a criação
selectiva de animais.
Uma condição importante tanto para as melhores rotações como para a criação
selectiva de animais domésticos foi a vedação e consolidação dos campos. No sistema
56
tradicional de campos abertos era difícil, se não impossível, obter o consenso entre os
muitos participantes na introdução de novas culturas ou rotações; e com os animais a
pastar em campos comuns, era igualmente difícil empreender uma criação selectiva.
A nova paisagem agrícola que emergiu para substituir as aldeias concentradas
rodeadas pelos seus campos abertos, consistia em quintas compactas, consolidadas e
fechadas (muradas com vedações ou com sebes). Concomitantemente aos processos
de divisão e melhoria tecnológica, emergiu uma tendência gradual para quintas
maiores.
Costumava pensar-se que os campos vedados «despovoavam» o campo, mas, na
verdade, as novas técnicas de cultivo a eles associadas aumentaram a procura de
mão-de-obra. Só na segunda metade do séc. XIX – com a introdução de maquinaria
agrícola como debulhadoras, segadeiras e arados a vapor – é que o valor absoluto da
força laboral agrícola começou a diminuir.
A comercialização da agricultura reflectiu um processo generalizado de
comercialização de toda a nação. Logo no fim do séc. XVII, o comércio externo inglês
per capita excedia o de todas as nações, excepto os Países Baixos, e Londres tinha
desenvolvido uma organização comercial e financeira notavelmente sofisticada que
começou a rivalizar com a de Amesterdão.
Por volta do séc. XVI, Londres tinha já começado a funcionar como um «pólo de
crescimento» para a economia inglesa. As suas vantagens eram geográficas e políticas.
A comercialização interagiu com a organização financeira que então se desenvolvia da
nação. As origens do sistema bancário inglês são obscuras, mas, nos anos que se
seguiram à Restauração de 1660, vários ourives poeminentes começaram a operar
como banqueiros. Emitiam recibos de depósitos que circulavam como nota de banco e
concediam empréstimos a empresários de confiança. A fundação do Banco de
Inglaterra em 1694, com o seu monopólio legal da banca comercial, forçou os
banqueiros privados a desistir da sua emissão de notas bancárias, mas continuaram a
operar como bancos de depósitos, aceitando ordens de pagamento e descontando letras
de câmbio.
Entretanto, as províncias fora de Londres continuavam a não dispôr de dispositivos
bancários formais, embora «escrivães de dinheiro» (correctores), advogados e
grossistas abastados exercessem algumas funções bancárias elementares, como
desconto de letras de câmbio e remessa de fundos para Londres. O Banco de Inglaterra
não abriu sucursais e as suas notas (de alto valor facial) não circulavam fora de
Londres. A Real Casa da Moeda era extremamente ineficiente; o valor facial das suas
moedas de ouro era demasiado elevado para ser útil no pagamento de salários ou no
comércio a retalho e a cunhagem de moedas de prata ou cobre foi muito reduzida.
Esta escassez de moedas de baixo valor levou a iniciativa privada a preencher a
lacuna: industriais, comerciantes e até publicanos, emitiam certificados provisórios e
moedas divisionárias que serviam as necessidades da circulação monetária local.
Destas várias origens surgiu a instituição de «bancos da província» (isto é, qualquer
57
banco não situado em Londres), cujo crescimento foi extremamente rápido na segunda
metade do séc. XVIII.
A euforia engendrada pela Revolução Gloriosa (1688-89) resultou na criação duma
série de sociedades anónimas na década de 1690, algumas das quais, como o Banco de
Inglaterra, titulares de alvarás régios e concessões de monopólio.
Uma euforia semelhante inundou o país após a bem sucedida conclusão da Guerra da
Sucessão Espanhola e culminou na explosão financeira conhecida como Bolha do Mar
do Sul. O episódio deve o seu nome à Companhia do Mar do Sul, titulada em 1711
com um monopólio nominal do comércio com o Império Espanhol, embora o
verdadeiro motivo da sua criação tenha sido o de angariar dinheiro para o governo
prosseguir com a guerra.
A bolha do Mississípi (teve lugar em França) foi inspirada por um financeiro
aventureiro escocês, John Law, que persuadiu o duque de Orleães, regente do
rei-infante Luís XV, a deixá-lo fundar um banco, o Banque Royale, e também uma
companhia para explorar as possessões francesas da América do Norte, depois
chamada «Mississípi». A bolha rebentou em 1720, quando o Parlamento, por
iniciativa da Companhia do Mar do Sul, aprovou a Lei da Bolha (Bubble Act, no
original, tem, o sentido de acto legislativo parlamentar destinado a refrear arrojos
financeiros inconsistentes – os pretensos «castelos no ar». A Lei proibia a formação de
sociedades anónimas sem a autorização expressa do Parlamento, que se revelou parco
na concessão de tais autorizações.
Em resultado disso, a Inglaterra entrou na sua «revolução industrial» com uma barreira
jurídica contra as formas económicas (ou de responsabilidade limitada) de
organização comercial, condenando a maior parte das suas empresas industriais e
outras sociedades em nome colectivo ou a simples empresas em nome individual.
Tem-se debatido exaustivamente se esta restrição dificultou ou não a industrialização
inglesa; mas de qualquer forma não foi uma dificuldade fatal. A Lei da Bolha foi
revogada em 1825.
Outra importante consequência da Revolução Gloriosa, foi a de colocar firmemente as
finanças públicas do Reino nas mãos do Parlamento, o que reduziu significativamente
o custo das obrigações públicas e, consequentemente, libertou capital para o
investimento privado. Embora o sistema fiscal fosse altamente regressivo (isto é,
proporcionalmente, tributava mais pesadamente os rendimentos mias baixos), tal
permitiu também, a acumulação de capital para investimento.
A Grã-Bretanha deveu muito da sua precoce prosperidade e começo pioneiro na
indústria moderna à sua localização insular, que não só lhe proporcionou
efectivamente protecção gratuita contra o desmembramento e destruição do esforço de
guerra continental, como também a dotou de transportes baratos. A longa linha da
costa, excelentes portos naturais e muitos cursos de água navegáveis eliminaram a
maior parte da necessidade de transporte por terra que retardou o crescimento do
comércio e da indústria no Continente.
58
A rede britânica de canais e rios navegáveis foi extremamente eficiente naquela época,
mas não satisfaz a procura de transporte interno. Tradicionalmente, a manutenção das
estradas era da responsabilidade paroquiana, com recurso do trabalho forçado dos
habitantes locais. Não, surpreendemente, o estado das estradas assim mantidas era
deplorável. No começo da década de 1690, o Parlamento, através de resoluções, criou
concessões de portagem a que cometeu a construção e manutenção de troços de boas
estradas nas quais os utilizadores, quer viajassem em vagões, carruagens, a cavalo ou
a pé, eram cobradas taxas.
Tecnologia e inovação industriais
Tinham-se feito muitas tentativas para substituir o carvão vegetal por hulha no
alto-forno, as impurezas da hulha condenaram-nas ao malogro. Em 1709, Abraham
Darby, um industrial siderúrgico quacre de CoalBrookdale, no Shropshire, obteve
combustível de carvão duma forma muito semelhante por que outros siderúrgicos
produziam carvão vegetal a partir de madeira – isto é, aqueceu o carvão num
contentor fechado para lhe retirar as impurezas sob a forma de gás, deixando um
resíduo de coque, uma forma quase pura de carbono, que depois utilizou como
combustível no alto-forno para fazer ferro-guza.
Apesar do avanço tecnológico de Darby, esta inovação difundiu-se lentamente. O
aumento constante de preço do carvão vegetal – juntamente com inovações como o
processo de pudlagem e laminação de Henry Cort, de 1783-84 -, libertou a produção
do ferro da dependência do combustível vegetal. Os industriais siderúrgicos
alcançaram economias de escala integrando todas estas operações num único local,
normalmente no próprio local de produção de carvão, ou perto deste, e quer a
produção total de ferro quer a proporção obtida com combustível mineral aceleraram
dramaticamente.
A energia do vapor foi em primeiro lugar utilizada nas indústrias minerais. À medida
que a procura de carvão e de metais aumentou, intensificaram-se os esforços para
obter em minas cada vez mais profundas. Em 1698, Thomas Savery, um engenheiro
militar, conseguiu a patente, de uma bomba a vapor, a que chamou «O Amigo do
Mineiro». Algumas das bombas de Savery foram instaladas na primeira década do séc.
XVIII, sobretudo nas minas de estanho da Cornualha, mas o aparelho tinha vários
defeitos – entre os quais a tendência para explodir. Thomas Newcomen, um ferrageiro
e latoeiro familiarizado com os problemas das indústrias mineiras, decidiu remediar
esses defeitos através do método de tentativas, e, em 1712, conseguiu construir a sua
primeira bomba a vapor atmosférico para uma mina de carvão no condado de Stafford.
A maior deficiência do dispositivo de Newcomen era o seu elevado consumo de
combustível em relação ao trabalho produzido. Na década de 1760 foi pedido a James
Watt, um «fazedor de instrumentos matemáticos» (técnico de laboratório) da
Universidade de Glásgua, que reparasse um pequeno modelo de uma máquina de
Newcomen utilizada em demonstrações no curso de Filosofia Natural. Intrigado, Watt
começou a fazer experiências coma a máquina; em 1769 obteve a patente dum
condensador separado, que eliminou a necessidade de aquecimento e arrefecimento
alternados do cilindro. Entretanto, Watt formou uma sociedade com Mathew Boulton,
um próspero fabricante de ferragens perto de Birmingham e que disponibilizou a Watt
59
tempo e instalações para mais experiências. Em 1774, John Wilkinson, industrial de
fundição das redondezas, patenteou uma nova perfuradora para fazer canos para
canhões que também era adequada para cilindros de máquinas. No ano seguinte, Watt
conseguiu uma porrogação da sua patente por 25 anos, e a empresa de Boulton e Watt
iniciou a produção comercial de máquinas a vapor. Um dos seus primeiros clientes foi
John Wilkinson, que utilizou a máquina para accionar os foles do seu alto-forno.
As inovações na fiação e na tecelagem, juntamente com a separadora mecânica de
sementes, foram as mais importantes na indústria do algodão, mas de forma alguma as
únicas. Verificou-se uma série de pequenos melhoramentos em todas as fases de
produção, desde a preparação das fibras para a fiação até ao branqueamento, ao
tingimento e à estampagem.
As reduções drásticas no preço dos artigos de algodão afectaram a procura de tecidos de
lã e de linho e proporcionaram incentivos e modelos para a inovação técnica.
As mudanças técnicas envolvendo os têxteis de algodão, a indústria do ferro e a
indústria da energia do vapor constituem o fulcro da chamada «revolução industrial»
na Grã-Bretanha, mas não foram estas as únicas indústrias assim afectadas. Nem todas
as mudanças exigiram o emprego da força mecânica.
Adam Simth (contemporâneo de James Watt) escreveu, em A Riqueza das Nações,
sobre os grandes aumentos de produtividade conseguidos numa fábrica de alfinetes
apenas pela especialização e divisão do trabalho.
A indústria química também sofreu importante expansão e diversificação. Alguns dos
avanços resultaram do progresso da ciência química, especialmente associada ao químico
francês Antoine Lavoisier (1743-94) e aos seus discípulos.
Em 1746, John Roebuck, um industrial que tinha estudado química idealizou um
económico processo de produção recorrendo a câmaras de chumbo; em sociedade com
outro industrial Samuel Garbett, começou a produzir ácido sulfúrico a uma escala
comercial. Entre outras utilizações imediatas, o produto foi empregado como agente
branqueador nas indústrias têxteis, substituindo o leite azedo, o soro de leite coalhado,
a urina e outras substâncias naturais.
Outro grupo de produtos químicos amplamente usados em processos industriais era o
dos alcalinos, especialmente a soda cáustica e a potassa. Foi outro francês, Nicholas
Leblanc, quem descobriu, em 1791, um processo para produzir alcalinos usando
cloreto de sódio, ou sal comum.
As minas de carvão foram também responsáveis pelos primeiros caminhos-de-ferro na
Grã-Bretanha. No séc. XVII, tinham-se usado trilhos e carris na superfície, na
vizinhança das minas, para facilitar o transporte, e cavalos como os animais de tiro
mais vulgares.
A locomotiva a vapor foi o produto dum complexo processo evolutivo com muitos
antecedentes. Richard Trevithick (1771-1833), um engenheiro de minas da Cornualha,
merece crédito por ter construído a primeira locomotiva operacional, em 1801.
60
Trevithick utilizou um mecanismo de alta pressão (ao contrário de Watt) e concebeu a
sua locomotiva para se movimentar em estradas normais. Embora tecnicamente
operável, a locomotiva não foi um sucesso económico porque as estradas não
conseguiam suportar o seu peso.
George Sthephenson (1781-1848), um autodidacta, construiu em 1813, uma máquina
a vapor fixa com cabos para içar vagões de carvão vazios dos cias de embarque de
volta à mina. Em 1822 persuadiu os promotores da projectada Via Férrea
Stockton-Darlington, uma linha de uma mina de carvão, a usar vapor em vez de
tracção animal, e na sua inauguração, em 1825, conduziu pessoalmente uma máquina
por si concebida. Liverpul-Manchéster. Normalmente considerada a primeira linha
ferroviária pública do mundo, abriu em 1830.
Variação regional
Os termos Grã-Bretanha e Inglaterra foram utilizados mais ou menos alternadamente.
A maioria dos primeiros registos da chamada «revolução industrial» concentrou-se
unicamente em Inglaterra. É importante reconhecer as grandes variações regionais na
industrialização dentro da Inglaterra, bem como os cursos muito diversos de mudança
económica dentro das partes constituintes do Reino Unido da Grã-Bretanha e da
Irlanda do Norte.
Dentro da Inglaterra, o ritmo diferencial de mudança enfatizou claramente a
importância das regiões carboníferas, localizadas sobretudo no Nordeste
(particularmente Tyneside) e no Centro, embora o Lancashire também possuísse
importantes jazidas. O Lancashire tornou-se quase sinónimo de algodão, mas também
tinha grandes empreendimentos vidreiros e químicos, e a indústria do algodão tinha
igualmente postos avançados no Centro-Leste. A indústria do ferro e as suas muitas
ramificações fabris concentravam-se no Centro-Oeste, no Sul do condado de Iorque e
no Nordeste. As indústrias de lanifícios tendiam a concentrar-se na zona ocidental do
condado de Iorque, substituindo ao centros mais antigos e pré-industriais de East
Anglia e da parte ocidental. O condado de Stafford quase monopolizou a indústria
cerâmica e possuía igualmente importantes siderúrgicas. A Cornualha continuou a ser
uma importante fonte de estanho e cobre. Exceptuando a florescente metrópole de
Londres, com as suas muitas indústrias de bens de consumo (especialmente a indústria
cervejeira), o sul manteve-se essencialmente agrícola.
O País de Gales, conquistado pelos Ingleses na Idade Média, tinha sido sempre tratado
como um parente pobre. Na última parte do séc. XVIII, as extensas regiões
carboníferas do sul do País de Gales forneceram as bases para uma grande indústria do
ferro, que, por volta de 1800, produzia cerca de um quarto do ferro britânico; mas foi
orientada para o comércio de exportação, e gerou muito poucas indústrias subsidiárias.
Os minérios eram fundidos sobretudo no sul do País de Gales, em torno de Swansea.
A maior parte do interior do país, montanhoso e infértil, manteve-se pobre e pastoril.
A Escócia, ao contrário do País de Gales, manteve a sua independência da Inglaterra
até à união voluntária dos parlamentos em 1707. em meados do séc. XVIII, a Escócia
era um país pobre e de rectaguarda. A maioria da sua população continuava a
dedicar-se à agricultura de quase-subsistência, e em grandes áreas das Terras Altas o
61
sistema tribal da organização social e económica manteve-se intacto. Menos de um
século depois, a Escócia estava com a Inglaterra na vanguarda das nações industriais
do mundo.
Em resumo, a transformação da Escócia duma atrasada economia doméstica para uma
economia industrial de primeiro plano foi ainda mais espectacular que a
industrialização contemporânea da Inglaterra.
A inclusão da Escócia no Império Britânico após 1707 deu-lhe acesso aos mercados
ingleses, o que indubitavelmente contribuiu para a aceleração do ritmo da vida económica.
O sistema educativo do país, desde escolas paroquianas até às suas quatro universidades
(com Inglaterra apenas a ter duas), criou uma população invulgarmente letrada para a
época. De modo semelhante, o precoce sistema bancário escocês, completamente
diferente do inglês e praticamente livre da regulamentação governamental, permitiu aos
empreendedores escoceses um acesso relativamente fácil ao crédito e ao capital.
A Irlanda, em triste contraste com a Escócia, falhou quase por completo a
industrialização. Os Ingleses tratavam a Irlanda, ainda mais que o País de Gales, como
uma província conquistada. O facto é que a população irlandesa, como a da
Grã-Bretanha, mais que duplicou entre meados do séc. XVIII e 1840, a Irlanda perdeu
um quarto da sua população em menos de uma década pela fome e emigração.
Aspectos sociais do começo de industrialização
Entre 1700 e 1850, os números mostram um crescimento rápido da população durante
as primeiras etapas da industrialização. Que o crescimento da população não esteve
exclusivamente relacionado com o processo de industrialização é apoiado pelo facto
de ter sido um fenómeno europeu generalizado, não confinado à Grã-Bretanha e a
outras nações industrializadas. Por outro lado, seria incorrecto dizer que não houve
relação; os destinos contrastantes da Grã-Bretanha e da Irlanda nas décadas
intermédias do séc. XIX sugerem que a industrialização foi pelo menos um factor
permissivo do crescimento continuado da população.
Factores que contribuíram para a descida da taxa de mortalidade:
- Introdução de prática de inoculação contra a varíola no princípio do século e
da vacinação a partir de 1798.
- Aperfeiçoamento dos conhecimentos médicos.
- Criação de novos hospitais.
- Uma melhoria do nível de vida, que foi ao mesmo tempo efeito e causa do
crescimento económico.
- O progresso agrícola trouxe uma maior abundância e variedade de alimentos,
melhorando a nutrição.
- A produção acrescida de carvão proporcionou habitações mais quentes.
- A produção de sabão, que duplicou na segunda metade do século, indica uma
maior atenção à higiene pessoal.
62
- A maior produção de tecido barato de algodão, contribuiu para padrões mais
elevados de limpeza.
A migração interna alterou em muito o estabelecimento geográfico de população. A
maior parte desta migração foi para distâncias relativamente curtas, do campo para as
áreas industriais, em expansão, mas – conjuntamente com as taxas mais elevadas de
crescimento natural – ocasionou duas mudanças notáveis na distribuição espacial da
população:
1. uma viragem na densidade do Sudeste para o Noroeste
2. uma urbanização crescente.
O País de Gales e a Escócia eram muito menos densamente povoados que a Inglaterra.
No princípio do séc. XIX o condado mais densamente povoado fora da área
metropolitana de Londres era o Lancashire, seguido pela região ocidental do condado
de Iorque e por quatro condados incluindo as regiões carboníferas do Centro-Oeste.
O rápido crescimento das cidades é ainda mais surpreendente se se atender ao facto de
que resultou inteiramente da migração dos campos; dadas as hediondas condições
sanitárias, a taxa de mortalidade excedia a taxa de natalidade (a mortalidade infantil
era particularmente elevada), e a taxa de crescimento natural era, de facto, negativa. O
facto de as pessoas se terem sujeitado a viver em tais condições é prova das grandes
pressões económicas que as forçaram a mudarem-se.
As fábricas desenvolveram-se primeiro no sector têxtil, e estenderam-se lentamente a
outras indústrias. As fábricas podiam pagar salários mais elevados porque a
produtividade do trabalho era mais elevada em resultado do avanço tecnológico e da
disposição de mais capital por trabalhador. Desta forma, as fábricas atraíam
gradualmente mais mão-de-obra, e a tendência geral dos salários reais foi de subida.
Fazendo um balanço, parece provável ter havido uma melhoria gradual ao nível de
vida das classes trabalhadoras nos cem anos que medearam entre 1750 e 1850, embora
alguns grupos tenham provavelmente sofrido um revés durante as Guerras
Francesas.
A desigualdade da distribuição de rendimento e riqueza, que já era grande na
economia pré-industrial, tornou-se ainda maior nas primeiras etapas da
industrialização
63
64
Cap. VIII
Desenvolvimento económico no séc. XIX: Determinantes Básicas
Neste capítulo consideramos as tendências mais gerais nas determinantes básicas :
População, recursos, tecnologia e instituições.
População
Após a efectiva estagnação desde o começo ou meados do séc. XVII até meados do
séc. XVIII, a população da Europa começou novamente a crescer a partir de cerca de
1740. no séc. XIX, o crescimento populacional na Europa acelerou. O crescimento
populacional continuou no séc. XX, embora a taxa de crescimento na Europa tivesse
diminuído ligeiramente enquanto a do resto do mundo aumentava.
Tais taxas de crescimento, tanto na Europa como no mundo como um todo, não têm
precedentes. Além das flutuações a curto prazo (que podiam ser por vezes severas,
como durante a Peste Negra), a população mundial tinha duplicado aproximadamente
de 1000 em 1000 anos desde a invenção da agricultura até ao fim do séc. XVIII.
No séc. XIX, a população da Europa duplicou em menos de cem anos, e, no séc. XX,
essa taxa foi mesmo excedida para o mundo como um todo. Ás taxas actuais de
crescimento natural, a população mundial duplicará no prazo de 25 ou 30 anos.
Não há, assim uma correlação clara entre industrialização e crescimento populacional.
Devem equacionar-se outros factores causais. Antes das melhorias dos transportes que
permitiram a importação em larga escala de produtos alimentares do Ultramar no
último quartel do séc. XIX, um obstáculo de maior importância ao crescimento
populacional eram os próprios recursos agrícolas da Europa. A produção agrícola
aumentou imenso ao longo do século por dois motivos:
1. a quantidade de terra sob cultivo aumentou.
2. a produtividade agrícola (produção por trabalhador) aumentou por causa da
introdução de técnicas novas e mais científicas. Um melhor conhecimento da
química do solo e uma maior fertilização, a princípio natural, depois artificial,
aumentou o rendimento dos solos ordinários e possibilitou o cultivo de antigas
terras improdutivas. O preço mais baixo do ferro promoveu a utilização de
ferramentas e utensílios melhores e mais eficazes. A maquinaria agrícola,
como debulhadoras e ceifeiras mecânicas, estreou-se na segunda metade do
século.
O transporte barato também facilitou a migração da população. A migração interna, se
bem que menos dramática, foi ainda mais essencial ao processo de desenvolvimento
económico no séc. XIX. Em todos os países ocorreram importantes alterações
regionais na concentração da população, mas a alteração mais fundamental foi o
crescimento da população urbana, quer no seu todo quer em termos de percentagem
do total.
A urbanização a par da industrialização, progrediu rapidamente no séc. XIX. A
Grã-Bretanha, uma vez mais, indicou o caminho. Aproximadamente em 1850, mais de
65
metade da população britânica vivia em cidades com mais de 2000 habitantes, e por volta
de 1900 a proporção chegou aos três quartos.
A população dos países industriais, não só vivia em cidades, como preferia as cidades
maiores. Há muitas razões sociais e culturais para as pessoas quererem viver em cidades.
Historicamente, a principal limitação ao crescimento das cidades tem sido económica. Nas
sociedades pré-industriais, a maior parte da população, mesmo não agrícola, vivia em
zonas rurais. Era mais barato transportar para mercados distantes produtos industriais
acabados, como têxteis e ferro, que fornecer alimento e matérias-primas às
concentrações de trabalhadores. A introdução da energia a vapor e do sistema fabril, a
transição do carvão vegetal para o coque como combustível para a indústria do ferro e os
melhoramentos nos transportes e nas comunicações mudaram a situação. A ascensão do
sistema fabril exigia uma concentração da força de trabalho. Graças à importância do
carvão, alguns dos maiores centros industriais, cresceram em ou perto de, jazidas de
carvão – a Província Negra, em Inglaterra, a área do Ruhr, na Alemanha, a região em torno
de Lille, no norte de França e a região de Pittsburgh, na América do Norte. Estes
exemplos também sublinham a importância dos recursos no crescimento económico
moderno.
Recursos
A Europa Industrial não passou por qualquer aumento mágico na quantidade ou qualidade
dos recursos naturais, em comparação com a Europa Pré-Industrial, mas em resultado da
mudança tecnológica e da pressão da procura crescente, os recursos que eram
anteriormente desconhecidos ou que tinham pouco valor adquiriram, de súbito, uma
importância enorme, mesmo crítica.
Isto resultou em procura sistemática de fontes anteriormente desconhecidas e em
investigação científica e tecnológica para expandir a sua exploração. No fim do séc. XIX,
a procura de matérias-primas, além doutros motivos, levou cada vez mais as nações
europeias a estenderem o domínio político a zonas pobremente organizadas ou debilmente
governadas de África e da Ásia.
O desenvolvimento e difusão de tecnologia
Simon Kuznets, galardoado com um Prémio Nobel da Economia, referiu-se ao período em
que vivemos como a «moderna época económica». Segundo ele, uma época económica é
determinada e moldada pelas aplicações e ramificações duma «inovação de época».
Segundo Kuznets, uma grande parte da história económica – e mesmo a história política,
social e cultural – dos anos entre 1492 e 1776 pode ser explicada por referência a<o
progresso da exploração e descoberta, ao comércio marítimo, ao crescimento das
marinhas e a fenómenos afins.
A época económica actual (moderna), nas palavras de Kuznets, começou na segunda
metade do séc. XVIII, e a inovação de época que a ela associou é «a aplicação alargada da
ciência e problemas de produção económica».
66
O período da história tecnológica que vai desde o começo do séc. XVIII até
aproximadamente 1860 ou 1870 é melhor caracterizado como a era do artesão-inventor.
Ao analisar o processo técnico em qualquer período da História mas especialmente na
moderna época económica, é sensato ter em conta as distinções entre termos
intimamente relacionados, mas conceptualmente diferentes:
1. invenção
2. inovação
3. difusão de nova tecnologia
Invenção, em termos de tecnologia, refere-se a uma novidade patenteável de natureza
mecânica, química ou eléctrica. Em si mesma, a invenção não tem um significado económico
especial.
Inovação, quando a invenção é inserida num processo económico, é que assume significado
económico. Por exemplo, a invenção de James Watt do condensador separado para a
máquina a vapor de Newcomen, que patenteou em 1769, teve um papel insignificante na
economia até ele, em sociedade com Matew Boulton , ter começado a produzir e
comercializar máquinas a vapor em 1776.
Difusão, refere-se ao processo por que uma inovação se dissemina numa dada indústria,
entre indústrias e internacionalmente, para lá das fronteiras geográficas. A difusão não é
de forma alguma, um processo automático de replicar a inovação inicial; devido às
diferentes exigências de indústrias diferentes, a diferentes equilíbrios de factores em
ambientes diferentes e a diferenças culturais entre nações, pode deparar-se com
problemas semelhantes aos relacionados com a introdução duma inovação original.
Fontes de energia e produção de energia
Quando a patente básica de watt expirou, em 1800, menos de 500 máquinas estavam
operacionais na Grã-Bretanha, e apenas umas quantas dúzias no Continente. Por muito
fundamentais que os seus contributos tenham sido para a evolução da tecnologia do vapor,
as máquinas de Watt tinham muitas limitações como fontes industriais de energia. São
várias as razões para a sua limitada utilidade, entre as quais o imperfeito conhecimento
científico, a resistência insuficiente dos metais utilizados na sua construção e a falta de
ferramentas adequadas.
Os 50 anos seguintes testemunharam muitos desenvolvimentos importantes na tecnologia
da máquina a vapor. Metais mais leves e mais fortes, ferramentas mais precisas e melhor
conhecimento científico, incluindo mecânica, metalografia, calorimetria e a teoria dos
gases, bem como a ciência embrionária da Termodinâmica, todos eles deram a sua
contribuição.
Os primeiros avanços provieram, de mecânicos práticos e engenheiros como o cornualense
Richard Trevithick e o americano Oliver Evans, que construíram e testaram máquinas de
alta pressão, que Watt considerava inseguras e nada práticas.
O progresso tecnológico também se verificou na principal concorrente da máquina a
vapor, a roda hidráulica. Nas décadas de 1820 e 1830, cientistas e engenheiros franceses
67
inventaram e aperfeiçoaram a turbina hidráulica, um dispositivo altamente eficaz na
conversão da força da queda da água em energia útil.
Os fenómenos eléctricos tinham sido observados em tempos recuados, mas até ao séc.
XVIII a electricidade tinha sido considerada como apenas uma curiosidade. Nos finais do
séc. XVIII, as pesquisas de Benjamin Franklin na América e dos italianos Luigi Galvani e
Alessandro Volta, que inventaram a pilha voltaica, ou bateria, promoveram-na do estatuto
de truque de palco a objecto de investigação laboratorial. Em 1807, Sir Humphry Davy
descobriu a electrólise. A fase seguinte no estudo da electricidade foi dominada por
Michael Faraday, aluno de Davy, pelo físico dinamarquês Hans Ørsted e pelo matemático
francês André Ampère. Em 1820, Ørsted observou que uma corrente eléctrica produz um
campo magnético à volta dos condutores, o que levou Ampère a formular uma relação
quantitativa entre electricidade e magnetismo. Entre 1820 e 1831, Faraday descobriu o
fenómeno da indução electromagnética e inventou um primeiro gerador accionado à mão.
Trabalhando com base nestas descobertas, Samuel Morse desenvolveu o telégrafo
eléctrico na América entre 1832 e 1844.
O aperfeiçoamento da lâmpada eléctrica incandescente quase simultaneamente entre
1878 e 1880, por Joseph Swan em Inglaterra e Thomas Edison nos Estados Unidos,
tornou obsoleta a iluminação de arco voltaico e inaugurou um crescimento fulgurante da
indústria eléctrica. Durante várias décadas, a electricidade competiu acesamente com
duas outras fontes de iluminação recentemente aperfeiçoadas, o gás de iluminação e o
querosene.
Em 1879, o mesmo ano em que Edison patenteou a sua lâmpada eléctrica, um alemão,
Werner von Siemens, inventou o carro eléctrico (ou simplesmente, eléctrico), com
consequências revolucionárias para o transporte de massas nas metrópoles superlotadas
da época.
O petróleo é outra importante fonte de energia que veio a evidenciar-se na segunda
metade do séc. XIX. A sua exploração comercial começou com a perfuração do poço de
Drake em Titusville , na Penisilvânia, em 1859. Como a electricidade também o petróleo
líquido e o seu subproduto, o gás natural, começaram por ser utilizados como fontes de
iluminação.
Vários inventores e engenheiros, faziam experiências com motores de combustão interna.
Por volta de 1900, havia vários motores desse tipo, a maior parte dos quais utilizava como
combustível um dos vários destilados do petróleo líquido, como a gasolina e o gasóleo. A
utilização mais importante para o motor de combustão interna foi nos transportes; nas
mãos de empresários como os franceses Armand Peugeot, Louis Renault e André Citroën,
o inglês William Morris eo americano Henry Ford, deu azo a uma das maiores indústrias
do séc. XX. O motor de combustão interna tinha também aplicações industriais, e, no
século XX tornou possível o desenvolvimento da indústria aeronáutica.
Aço barato
A única grande inovação técnica na indústria do ferro na primeira metade do séc. XIX
foi o jacto de ar quente, patenteado pelo engenheiro escocês James B. Nielson em
1828. ao usar gases de desperdícios para pré-aquecer o ar utilizado no alto-forno, o
jacto de ar quente gerou uma combustão mais completa do combustível, diminuiu o
68
consumo de combustível e acelerou o processo de fundição. Foi rapidamente adoptado
para siderurgias da Escócia, do Continente, e mesmo nos Estados Unidos, mas mais
lentamente em Inglaterra e no País de Gales.
As inovações tecnológicas mais dramáticas a atingir a indústria do ferro, verificadas
na segunda metade do século, relacionam-se com o fabrico de aço. O aço é, na
verdade uma variedade especial de ferro; contém menos carbono que o ferro fundido,
mas mais que o ferro forjado. Já era fabricado há muitos séculos, mas em pequenas
quantidades e a custo elevado, pelo que o seu emprego era limitado a produtos de
qualidade como arames, molas de relógio, instrumentos cirúrgicos, lâminas de espadas
e cutelaria fina. Em 1856, Henry Bessemer, um inventor inglês patenteou um novo
método para produzir aço directamente do ferro fundido, eliminando o processo de
pludagem e conseguindo um produto superior. A produção do aço de Bessemer
aumentou rapidamente, e em breve destronou o ferro vulgar em inúmeras utilizações.
A expansão da indústria do aço teve um impacto profundo sobre outras indústrias,
quer nas que abasteciam a indústria do aço (como a do carvão) quer nas que
empregavam o aço.
Transportes e comunicações
A locomotiva a vapor e os seus acessórios, os carris de ferro (ou aço), epitomaram o
processo de desenvolvimento económico. Foram, ambos os símbolos e os
instrumentos da industrialização.
Antes do caminho-de-ferro, os transportes inadequados foram obstáculo maior à
industrialização na Europa Continental e nos Estados Unidos. Sem a vantagem dos cursos
de água naturais da Grã-Bretanha, viam-se confinados aos mercados locais.
Embora desenvolvido mais cedo que a locomotiva, o navio a vapor desempenhou um
papel menos vital na expansão do comércio e da indústria até ao final do século. Na
primeira metade do séc. XVIII, os navios a vapor deram o seu maior contributo no
desenvolvimento do comércio interno. O crédito pela invenção do navio a vapor é
normalmente conferido ao americano Robert Falton, cujo navio, o Clermont, fez a sua
primeira viagem bem sucedida no Hudson em 1807.
Até ao fim da Guerra Civil Americana, os navios a vapor que cruzavam os oceanos
transportavam principalmente correspondência, passageiros e carga ligeira e valiosa.
A verdadeira era do navio a vapor só chegou com o aperfeiçoamento da hélice (na
década de 1840), do motor composto (na década de 1850), dos cascos de aço (na
década de 1860) e da abertura do canal de Suez em 1869.
Talvez nenhuma invenção isolada do séc. XIX se compare com a da imprensa no
século XV quanto ao seu efeito no campo da comunicação. A maquinaria para o
fabrico de papel, inventada cerca de 1800, e a impressora rotativa, usada em primeiro
lugar pelo Times de Londres em 1812, reduziram drasticamente o custo dos livros e
dos jornais. Devido às reduções dos impostos de selo especiais sobre o papel e a
impressão, o material de leitura passou a estar mais ao alcance das massas e contribuiu
para a sua cada vez maior alfabetização.
69
à invenção da litografia, em 1819, e o desenvolvimento da fotografia depois de 1827
possibilitaram a reprodução barata e a vasta disseminação de imagens visuais. A
Grã-Bretanha introduziu a franquia postal em 1840.
Em 1866, o americano Cyrus W. Field conseguiu colocar, com sucesso um cabo telegráfico
no Atlântico Norte, proporcionando uma comunicação quase instantânea entre a Europa e
a América do Norte. Seguiram-se-lhe outros cabos telegráficos submarinos. O telefone
patenteado por Alexander Bell em 1876, tornou as comunicações à distância ainda mais
pessoais, mas a sua principal utilização, no início, visou facilitar as comunicações locais.
O inventor e empresário italiano Gugliemo Marconi, baseando-se nas descobertas
científicas do inglês James Clerck Maxwell e do alemão Heinrich Hertz, inventou a
telegrafia sem cabos (ou rádio) em 1895.
No campo das comunicações de negócios, a invenção da máquina de escrever e
doutras máquinas de escritório rudimentares ajudou os ocupados executivos a
acompanhar e a contribuir para o fluxo cada vez maior de informações que as suas
operações em larga escala e as suas actividades a nível mundial tornavam necessário.
A máquina de escrever também foi importante na introdução de mão-de-obra feminina
nos escritórios.
O emprego da ciência
Todas as evoluções se baseavam, muito mais que as primeiras inovações tecnológicas,
no emprego da ciência nos processos industriais. A indústria eléctrica, em especial
requeria um elevado grau de conhecimento e experiência científicos. Noutras
indústrias, o avanço científico tornou-se cada vez mais o pré-requisito do avanço
tecnológico. Significou, uma maior interacção entre cientistas, engenheiros e
empresários. Cada vez mais, o desenvolvimento tecnológico exigia a colaboração
duma série de especialistas em ciência e engenharia cujo trabalho era coordenado por
executivos que, embora dela não tivessem qualquer tipo de conhecimento especial,
compreendiam as potencialidades da nova tecnologia.
A ciência química revelou-se especialmente prolífica no nascimento de novos
produtos e processos. Também desempenhou um papel fundamental na metalurgia.
No princípio do séc. XIX, os únicos metais economicamente importantes eram os já
conhecidos desde a Antiguidade: ferro, cobre, chumbo, estanho, mercúrio, ouro e
prata. Após a revolução química associada a Antoine Lavoisier, foram descobertos
muitos metais novos, incluindo o zinco, o alumínio, o níquel, o magnésio e o crómio.
Além de descobrirem estes metais, os cientistas e os industriais encontraram
utilizações para eles e idearam métodos de produção económica. Uma das suas
utilizações principais foi na feitura de ligas, a mistura de dois ou mais metais com
características distintas dos seus componentes. O latão e o bronze são exemplos de
ligas naturais (ligas que ocorrem na natureza). Na segunda metade do séc. XIX, os
metalurgistas criaram muitas ligas especiais de aço acrescentando pequenas
quantidades de crómio, manganésio, tungsténio e outros metais para conferir
qualidades especialmente desejadas ao aço vulgar. Também desenvolveram uma série
de ligas não ferrosas.
70
A estrutura institucional
A estrutura institucional da actividade económica na Europa do séc. XIX que
produziu a primeira civilização industrial, deu grandes oportunidades à iniciativa
individual, permitiu a liberdade de escolha ocupacional e a mobilidade geográfica e
social, contou com a propriedade privada e o domínio da lei e realçou a utilização da
racionalidade e da ciência na prossecução de fins materiais. Nenhum destes elementos
era novo no séc. XIX, mas a sua justaposição e o reconhecimento explícito de que
foram alvo fizeram deles contributos poderosos para o processo de desenvolvimento
económico.
Fundamentos jurídicos
A Grã-Bretanha, já tinha conseguido uma estrutura substancialmente moderna para o
desenvolvimento económico, adaptado tanto à inovação como à mudança social e
material. Uma das instituições chaves dessa estrutura foi o sistema jurídico conhecido
por direito comum. As características distintivas do direito comum eram o seu carácter
evolucionário, a sua confiança no costume e no precedente que ia sendo estabelecido
em decisões legais escritas e a sua flexibilidade. Proporcionou protecção para a
propriedade e os interesses privados contra as depradações do Estado e ao mesmo
tempo protegia o interesse público das exacções privadas. Também incorporou os
costumes dos comerciantes (o «direito comercial») tal como se revelavam em
tribunais comerciais especializados. Transmitido às colónias inglesas no processo de
colonização, o direito comum tornou-se a base dos sistemas jurídicos dos estados
Unidos e dos domínios britânicos quando atingiram a independência ou a autonomia.
No Continente, as antiquadas instituições do passado tinham-se fossilizado perante as
forças erosivas de mudança, a ponto de a transição gradual e pacífica para a nova
ordem já não ser possível. A Revolução Francesa, ao abalar o Antigo Regime, abriu
novas perspectivas e novas oportunidades para a iniciativa e a ambição. Abolia sem
rodeios os restos decadentes da ordem feudal instituiu um sistema jurídico mais
racional que veio a ser consagrado nos Códigos Napoleónicos.
As assembleias revolucionárias ultrapassaram as meras declarações, e especificaram
os fundamentos jurídicos da nova ordem. Além de abolirem o regime feudal
estabeleceram a propriedade privada da terra, suprimiram todos os impostos e tarifas
aduaneiros internos, aboliram os grémios de ofícios e todo o aparato de
regulamentação estatal da indústria, proibiram os monopólios, deram alvarás a
companhias e outras empresas privilegiadas e substituíram os lançamentos arbitrários
e desiguais de impostos do Antigo Regime por um sistema fiscal racional e uniforme.
Em 1791, a Assembleia foi ao ponto de aprovar a drástica Lei Le Chapelier, que
proibia organizações ou associações de trabalhadores e patrões.
Naturalmente, os Franceses as suas reformas revolucionárias para as terras que
conquistaram durante as guerras Revolucionárias e Napoleónicas.
71
A obra purgativa da revolução não deverá ser encarada como meros actos negativos de
demolição. Pelo contrário, esses actos representavam os primeiros passos essenciais
conducentes a uma política positiva, construtiva e bastante consistente.
As instituições francesas modernas- e as várias outras nações influenciadas pelos
Franceses – receberam os seus cunhos definitivos, não da própria Revolução, mas de
Napoleão. A reacção da opinião pública que possibilitou a ditadura de Napoleão foi
uma reacção aos excessos da Revolução e à corrupção e licensiosidade que proliferam
sob o directório.
A síntese napoleónica será talvez mais bem compreendida na grande obra de
codificação legal iniciada durante a Revolução mas completada sob o Império. Um
compromisso clássico entre o direito romano herdado, tal como tinha sido adoptado às
necessidades e costumes locais, e a nova legislação revolucionária, os Códigos
preservam, no entanto, os princípios fundamentais da Revolução: igualdade perante a
lei, um Estado secular, liberdade de consciência e liberdade económica. O Code
Civile, promulgado em 1804, é o mais fundamental e o mais importante. Escrito por
advogados e juristas da classe média, reflectiu claramente as preocupações e interesses
das classes proprietárias. Considerou a propriedade um direito absoluto, sagrado e
inviolável. Também sancionou especificamente a liberdade contratual e conferia força
de lei aos contratos válidos. Reconheceu a letra de câmbio e outras formas de papel
comercial e autorizou expressamente os empréstimos a juros – um dispositivo de
assinalável importância para o desenvolvimento da indústria nos países
católico-românicos.
O Code Civile que acompanhou os exércitos franceses de ocupação manteve-se
depois de estes terem partido. Por toda a Europa e para lá dela, incluindo a Luisiana e
o Quebeque bem como praticamente toda a América Latina. O Code Civile ou foi
adoptado integralmente ou constituiu a base dos códigos nacionais.
Outros códigos napoleónicos de especial importância para o desenvolvimento
económico foi o Code de Commerce, promulgado em 1807. Antes dele, nenhuma
norma abrangente regera as formas da empresa comercial.
O Code de Commerce distinguia três tipos principais de organizações empresariais:
1. meras sociedades, nas quais os sócios eram individual e colectivamente
responsáveis por todas as dívidas do negócio.
2. sociétés en Commandite (sociedades em comandita), sociedades limitadas nas
quais o sócio ou sócios activos assumiam a responsabilidade ilimitada de todo
o negócio, enquanto os sócios comanditários ou limitados arriscavam
unicamente as quantias que tinham efectivamente investido.
3. sociétés anonymes (sociedades anónimas), corporações na acepção americana,
com responsabilidade limitada para todos os sócios. Eram companhias
«anónimas» na medida em que os nomes dos particulares não podiam constar
na designação oficial da companhia.
Devido aos seus privilégios, cada anonyme tinha de ser expressamente autorizada pelo
Governo, que, na primeira metade do século, foi extremamente relutante em conceder
72
essas autorizações. Uma Commandite, podia ser criada através de simples registo
notarial, e rapidamente se tornou a forma preferida de empreendimento.
A forma en commandite foi adoptada na maior parte das nações continentais e
desempenhou uma função vital na angariação de capital para o comércio e para a
indústria no período de transição que antecedeu a livre constituição, numa altura em
que a maior parte dos governos se revelava ainda mais conservadora que os Franceses
na concessão de alvarás às anonymes. Depois de a França a ter adoptado a
constituição livre em 1867, outros países seguiram-lhe rapidamente o exemplo.
Política e pensamento económicos
Nas décadas de 1760 e 1770, os Fisiocratas (chamados, em França, les économistes)
tinham começado a advogar os méritos da liberdade económica e da concorrência. Em
1776, o ano da Declaração da Independência dos Estados Unidos, Adam Smith
publicou a Riqueza das Nações, que viria a tornar-se uma declaração da
independência económica individual. Smith tinha sido por vezes retratado como
apologista dos homens de negócios ou da «burguesia», mas isso é o resultado de uma
leitura errada. As suas críticas aos comerciantes não são menos destrutivas que a sua
condenação dos governos disparatados ou mal orientados. Todavia, a maior
preocupação de Smith ao longo do livro foi mostrar que a abolição de restrições e
limitações vexatórias e «desrazoáveis» à iniciativa privada promoveriam a
concorrência dentro da economia, e isso, por sua vez maximizaria a «riqueza das
nações».
Só muito depois da sua morte – e depois de vários outros escritores, como o reverendo
T. R. Malthus e David Ricardo, terem contribuído para o corpo de literatura conhecido
como «economia política clássica» - é que as ideias de Smith começaram a ser
contempladas na legislação. Isto verificou-se em primeiro lugar no Reino Unido, nas
décadas de 1820 e 1830.
A maior proeza dos economistas clássicos foi a revogação das Corn Laws, o que
introduziu um longo período de comércio livre na Grã-Bretanha. Além do comércio
livre, os dogmas do liberalismo económico (como ficou conhecida a nova doutrina)
preconizavam uma redução do papel do Governo na economia. Em seu nome, o
sistema fiscal foi revisto e simplificado e as Leis de Associação, as Leis de
Navegação, as Leis de Usura e outros símbolos legislativos do Antigo Regime na vida
económica foram todos rejeitados.
Segundo Smith e o seu «sistema de liberdade natural», o Governo tinha 3 funções a
desempenhar:
1º O dever de proteger a sociedade contra a violência e a invasão doutras
sociedades independentes.
2º O dever de proteger, o mais possível, todos os membros da sociedade
contra a injustiça ou opressão de cada um dos outros seus membros, ou o
dever de estabelecer uma administração correcta de justiça.
3º O dever de erigir e manter determinadas obras públicas e determinadas
instituições públicas que um único indivíduo ou um pequeno grupo de
indivíduos não podem ter interesse em erigir e manter.
73
Esta descrição idealizada do papel do Governo de acordo com os economistas
clássicos deu origem a um mito, que é o mito do Laissez-faire. O seu entendimento
popular era o de que os indivíduos, especialmente as pessoas que tinham negócios,
deviam ser libertadas de todas as restrições governamentais (excepto as leis criminais)
para desempenhar os seus interesses egoístas.
Na prática, o Laisser-Faire não era de forma alguma tão impiedoso ou de motivações
tão egoístas ou tão inexorável como as declarações extremistas faziam crer. O alvo
principal dos economistas clássicos era o velho aparato de regulamentação económica,
que em nome do interesses nacional enchia muitas vezes os bolsos de privilégios e
monopólios especiais e interferia doutras formas com a liberdade individual e com a
procura de riqueza. Ao mesmo tempo que o Parlamento desagregava o velho sistema
de regulamentação e de privilégios especiais, decretava uma nova série de
regulamentações preocupadas com o bem-estar geral, especialmente, dos menos aptos
em se protegerem a si próprios. As medidas incluíram, as Leis Fabris, novas leis de
saúde e sanitárias e a reforma do governo local. Estas leis não foram obra de nenhuma
classe ou segmento da população, apesar de terem contado com o capital intelectual
dos Utilitaristas. Os reformadores humanitários de ascendência aristocrática ou da
classe média uniram forças com os dirigentes das classes trabalhadoras para lutar por
elas e foram eleitos por whigs e tories, bem como pelos Radicais.
O liberalismo económico tinha também os seus defensores no Continente, mas estes
nunca alcançaram o mesmo grau de sucesso que os seus pares britânicos. Uma razão
para tal, foi a
Tradição de o paternalismo estatal estar mais profundamente enraizado no Continente
que na Grã-Bretanha. Uma outra foi que, sendo a Grã-Bretanha o reconhecido guia
tecnológico, muitos indivíduos esperavam que o Governo ajudasse a diminuir o fosso.
O comércio livre ganhou alguns adeptos, e houve uma certa redução da interferência
governamental na economia, mas, globalmente, o Governo desempenhou um papel
mais activo que na Grã-Bretanha.
Os Estados Unidos tinham uma combinação única de governo e iniciativa privada. Os
economistas clássicos tinham poucos adeptos puristas. O Governo Federal
desempenhou o papel minimalista que lhe fora atribuído pela teoria clássica, e até à
Guerra Civil, seguiu geralmente uma política comercial liberal ou de tarifas baixas. Os
governos locais ou estatais, por outro lado, desempenharam um papel activo na
promoção do desenvolvimento económico. O «Sistema Americano», como lhe
chamou Henry Clay, encarava o Governo como uma agência destinada a dar
assistência a indivíduos e à iniciativa privada, de forma a acelerar o desenvolvimento
dos recursos materiais da nação.
Estrutura de classes e lutas de classes
A transição da agricultura para as novas formas de indústria e o crescimento das
cidades fomentaram o aparecimento de novas classes sociais. É evidente que o lugar
dum indivíduo numa hierarquia social depende parcialmente de como ele ou ela ganha
a vida, e pessoas com a mesma ocupação tendem a partilhar valores comuns e uma
74
perspectiva comum, diferentes e talvez irreconciliáveis com os valores e as
perspectivas das pessoas que se dedicam a outras actividades. O séc. XIX assistiu, por
vezes, a lutas amargas entre grupos rivais pelo reconhecimento e domínio social e
político.
A Waterloo, a aristocracia com terras continuou a gozar de prestígio social e de poder
político, apesar dos efeitos da Revolução Francesa. A sua posição de chefia foi
duramente desafiada pelas classes médias, que cresciam rapidamente. Em meados do
século, estas últimas tinham conseguido instalar-se no poder na maior parte da Europa
Ocidental, e durante a segunda metade do século fizeram profundas incursões na
posição exclusiva da aristocracia na Europa Central.
No começo do séc. XIX, os trabalhadores urbanos constituíam uma pequena minoria
da população, mas , com o alargamento do sistema industrial, começaram a ganhar
superioridade numérica. No entanto, é enganador falar na classe trabalhadora, pois
havia muitas gradações e diferenças no seio da população trabalhadora.
Karl Marx profetizou, em meados do séc. XIX, que a polarização que pensava
observar nas então avançadas sociedades industriais continuaria até, por fim, restarem
apenas 2 classes, a classe governante de capitalistas (absorveria e substituiria a
aristocracia) e o proletariado industrial. Enquanto premonição esta profecia foi
falsificada pelos factos históricos. Em vez de polarizar 2 classes mutuamente
antagónicas, o aumento da industrialização aumentou significativamente a classe
média de trabalhadores de colarinho branco, de trabalhadores especializados e de
empresários individuais.
As formas mais usuais de solidariedade e entreajuda da classe trabalhadora eram os
sindicatos e, eventualmente, nalguns países, partidos políticos da classe trabalhadora.
Embora os sindicatos tenham uma longa história, que remonta às associações de
jornaleiros do fim da Idade Média, o movimento moderno data do começo da
indústria moderna.
Na primeira metade do séc. XIX, os sindicatos eram fracos e localizados e tinham,
normalmente, uma duração curta em face da oposição de patrões adversários e duma
legislação desfavorável ou repressiva.
A maior parte das nações ocidentais passou por, pelo menos, 3 fases nas suas atitudes
oficiais em relação aos sindicatos:
1ª Fase – proibição ou supressão imediata, foi tipificada pela Lei Le Chapelier de
1791, em França, pelas Leis de Associação de 1799-1800, na Grã-Bretanha, e
por legislação semelhante noutros países.
2ª Fase – marcada na Grã-Bretanha pela revogação das Leis de Associação em
1824-25, os Governos concederam uma tolerância limitada aos sindicatos,
permitindo a sua formação, mas perseguindo-os frequentemente por
empenharem em acções públicas como as greves.
3ª Fase – não alcançada antes do séc. XX nalguns países, noutros não alcançado
de todo, reconheceu aos trabalhadores e trabalhadoras o direito legal de se
organizarem e empenharem em actividades colectivas.
75
Na Grã-Bretanha, na década de 1830, o movimento sindicalista envolveu-se num
movimento político mais alargado conhecido por cartismo, cujo objectivo era
conseguir o sufrágio e outros direitos políticos para ao que estavam privados deles.
Sociedade Unida dos Engenheiros (maquinistas e mecânicos), o primeiro dos
chamados sindicatos do Modelo Novo. A característica distintiva do Modelo Novo era
a de apenas organizar trabalhadores especializados e por actividades; representava a
«aristocracia» do trabalho. Os trabalhadores não especializados e os trabalhadores das
novas indústrias fabris continuaram desorganizados até quase ao fim do século.
Os sindicatos do Modelo Novo tentaram timidamente aumentar os salários e as
condições de trabalho dos seus membros, já então os mais bem pagos da indústria
britânica, através de negociações pacíficas com os empregados e de entreajuda mútua.
Evitavam as actividades políticas e raramente recorriam às greves, excepto em casos
desesperados. Em resultado disso a sua força cresceu, mas os associados eram poucos.
Tentativas para organizar a grande massa de trabalhadores semiespecializados ou não
especializados resultaram em greves bem sucedidas das «raparigas dos fósforos»
(jovens trabalhadoras da indústria dos fósforos), em 1888 e dos estivadores de
Londres , em 1889.
No Continente os sindicatos tiveram um progresso mais lento. Desde o princípio, os
sindicatos franceses estiveram intimamente associados ao socialismo e a ideologias
políticas semelhantes. Em 1895, os sindicatos franceses conseguiram formar uma
Confederação Geral do Trabalho (CGT) não política, mas nem sequer essa
confederação agrupou todos os sindicatos activos e teve, muitas vezes, dificuldades
em conseguir que as suas directivas fossem respeitadas a nível local. O movimento
trabalhista francês manteve-se descentralizado, altamente individualista e geralmente
ineficaz.
O movimento laboral alemão data da década de 1860. Como o francês esteve também
associado desde o início a partidos políticos e a acção política, ao contrário do
movimento francês, foi mais centralizado e coeso. O movimento trabalhista alemão
tinha 3 divisões principais:
- Os Hirsch-Dunker, ou sindicatos liberais, que se dirigiam sobretudo a
trabalhadores especializados.
- Os sindicatos socialistas ou «livre», com muito mais membros.
- Os sindicatos católicos ou cristãos, fundados coma a benção do Papa por
oposição aos sindicatos socialistas «sem Deus». Em 1914, o movimento
sindicalista alemão tinha 3 milhões de membros, cinco sextos dos quais
pertencentes a sindicatos socialistas, o que fez dele o segundo maior da
Europa.
Os sindicatos dos Países Baixos, da Suíça e do Império Austro-Húngaro seguiram o
modelo alemão. Nos países escandinavos, o movimento trabalhista desenvolveu as
suas próprias tradições distintivas. Aliou-se com o movimento cooperativo, bem como
os partidos políticos social-democratas, e em 1914 tinha feito mais que qualquer outro
76
movimento sindical para melhorar as condições de vida e de trabalho dos seus
membros. Na Rússia e no resto da Europa Oriental, os sindicatos forma ilegais até ao
fim da I Guerra Mundial.
As primeiras tentativas para formar organizações de massa das classes trabalhadoras
nos Estados Unidos tiveram um êxito limitado face à oposição governamental e
patronal e à dificuldade de garantir a cooperação entre os trabalhadores de diferentes
sectores, profissões, religiões e raízes étnicas. Na década de 1880, Samuel Gompers
assumiu a chefia da organização de fortes sindicatos apenas de trabalhadores
especializados, e em 1886 uniu-os na Federação Americana do Trabalho (FAT).
Como os sindicatos do Modelo Novo da Grã-Bretanha, também a FAT seguiu as
tácticas de «pão com manteiga», concentrando-se no bem-estar dos seus membros,
mantendo-se afastada dos enredos políticos e evitando a acção política pública. O
primeiro Congresso de Sindicatos na Austrália, efectuou-se em 1879, apenas 11 anos
depois do primeiro do género na Grã-Bretanha.
Educação e alfabetização
Outra característica do desenvolvimento económico no séc. XIX – menos notada mas
pouco menos notável que o crescimento das cidades, dos trabalhadores industriais e
dos rendimentos – foi o crescimento da alfabetização e educação.
As percentagens de alfabetização nos adultos mostram uma correlação aproximada entre
níveis e taxas de industrialização, por um lado, e esforço e realização educacional, por
outro. É significativo que a Grã-Bretanha (ou o Reino Unido), a primeira nação industrial,
ocupe uma elevada percentagem, ma não no topo. Em geral, os países do noroeste da
Europa (e os Estados Unidos) têm os melhores desempenhos, quer em termos de esforço
quer de realização, ao passo que os da Europa Meridional e Oriental (representados pela
Espanha, pela Itália e pela Rússia) são menos impressionantes. Isto está em harmonia com
os níveis e as taxas de industrialização.
O aspecto mais surpreendente, é a posição elevada da Suécia, quer em 1850, quer em
1900; a Suécia era um país pobre em meados do séc. XIX, mas na segunda metade do
século registou uma das mais altas taxas de crescimento de todos os países da Europa. O
seu elevado nível inicial de alfabetização é atribuível a factores religiosos, culturais e
políticos anteriores ao início da industrialização, mas a grande reserva de capital humano
assim conseguido manteve-a em vantagem depois de começada a industrialização
Antes do séc. XIX, quase não existiam instituições educativas com apoios públicos.
Os abastados contratavam tutores particulares para os seus filhos. As instituições
religiosas e de caridade e, nuns quantos casos, as escolas particulares que cobravam
uma propina providenciavam educação elementar a uma fracção de população,
principalmente nas cidades.
Ninguém sonhava com a alfabetização universal; na verdade muitas opiniões
influentes se opunham à alfabetização dos «pobres trabalhadores», considerando-a
incompatível com as suas «posições» na vida. A educação técnica foi proporcionada
quase exclusivamente através do sistema de aprendizagem.
77
Os estudos secundários e superiores estavam em grande parte reservados aos filhos
(principalmente rapazes) das classes privilegiadas exceptuando os aspirantes a
membros do clero. Com poucas excepções (nomeadamente na Escócia e nos Países
Baixos), as universidades antigas há muito que tinham deixado de ser centros de
desenvolvimento do conhecimento; mergulhadas, num curriculum tradicional que
privilegiava os clássicos, formavam funcionários para a Igreja e para o Estado e
davam a aparência duma educação liberal aos filhos das classes dirigentes.
A Revolução Francesa introduziu o princípio da educação gratuita financiada pelo
Estado, mas na própria França o princípio foi ignorado pelos governos da Restauração
até depois de 1840. a Revolução Francesa deu azo a outras inovações educativas de
particular significado para a Era Industrial. Tratava-se de escolas especializadas para a
ciência e para a engenharia das quais a École Polytechnique e a École Normale
Supérieure são as mais famosas. Criadas a um nível universitário, mas fora do sistema
universitário (que Napoleão reorganizou para formar profissionais e funcionários
públicos), estas instituições não só proporcionaram instrução avançada como também
se dedicaram à pesquisa. Foram muito imitadas por toda a Europa excepto na
Grã-Bretanha, e um docente da Polytechnique que organizou a instrução na Academia
Militar Norte-Americana em West Point, a primeira escola de engenharia na América.
A época da reforma pós-napoleónica na Alemanha resultou na revitalização das suas
velas universidades e na criação de várias outras novas. A formação científica seguiu
quase à risca o curriculum e métodos da École Polytechnique, mas foi aberta a um
número maior de estudantes que no sistema francês. Assim, à medida que a ciência se
transformou cada vez mais na base da indústria, a Alemanha preparou-se para se
aproveitar da situação.
Quando, na década de 1870, os educadores americanos se começaram a preocupar
com a necessidade de remodelar o seus sistema de ensino superior, voltaram-se para o
modelo alemão, e não para os modelos francês e inglês. Subsequentemente, as
universidades francesas e britânicas, e também de outros países, vieram imitá-las.
Relações internacionais
No congresso de Viena, em 1814-15, os vencedores de Napoleão tentaram
restabelecer o Antigo Regime, política, social e economicamente, mas os seus
esforços revelaram-se vãos. As forças ideológicas da democracia e do nacionalismo
desencadeada pela Revolução Francesa, juntamente com as forças económicas da
industrialização incipiente, minoraram os seus esforços. A queda final do Antigo
Regime, excepto na Rússia e no Império Otomano tornou-se evidente nas revoluções
de 1830 e 1848 no Continente.
Em todas essas revoluções, o nacionalismo foi uma força potente. O nacionalismo
como ideologia não pertencia a uma classe social enquanto tal. Era principalmente
78
abraçado por membros das classes médias instruídas, mas também reflectia as
aspirações dos povos divididos da Itália e da Alemanha de verem as suas nações
unificadas e as aspirações das nacionalidades súbditas dos impérios austríaco, russo e
otomano.
O séc. XIX não assistiu a quaisquer guerras generalizadas e devastadoras como as
Guerras Napoleónicas que lhe deram início ou a I Guerra Mundial que o fechou. As
guerras relativamente curtas e limitadas que entretanto ocorreram tiveram por vezes,
importantes resultados políticos, com implicações para a política económica, mas não
prejudicaram seriamente a acumulação de capital num processo de mudança técnica.
Perto do final do século, as tensões políticas, por vezes exarcebadas pela rivalidade
económica, tornaram-se mais agudas e extravasaram para o reflorescimento do
imperialismo europeu, que alargou grandemente o sistema mundial de mercado, com a
Europa no seu centro.
79
80
Cap. IX
Padrões de desenvolvimento: os primeiros industrializadores
De um certo ponto de vista, o processo de industrialização do séc. XIX foi um
fenómeno à escala europeia. De diferente ponto de vista, porém a industrialização foi
basicamente um fenómeno regional. Ainda uma terceira forma de encarar o processo
de industrialização é, contudo, o método mais convencional de o analisar em termos
de economias nacionais. Esse processo tem as desvantagens de possivelmente
negligenciar as ramificações internacionais e supranacionais do processo e de ignorar
ou menosprezar a sua dinâmica regional; mas tem duas fortes vantagens:
1. é a vantagem puramente técnica de a maior parte das medidas quantitativas
descritivas da actividade económica ser reunida e agregada em termos de
economias nacionais.
2. e mais fundamentalmente, o quadro institucional da actividade económica e as
políticas tendentes a influenciar a direcção e o carácter dessa actividade são, na
maior parte das vezes, estabelecidas dentro das fronteiras nacionais.
Grã-Bretanha
Em resultado da sua primazia na indústria e dos seu papel como potência marítima
esmagadoramente superior, alcançada durante as últimas guerras, emergia também
como a principal nação comercial, sendo responsável por um quarto ou um terço do
comércio internacional total – bem mais que o dobro do dos seus principais rivais. A
Grã-Bretanha manteve o seu domínio industrial e comercial durante a maior parte do
séc. XIX. Após 1870, mesmo quando a produção e o comércio totais continuavam a
aumentar, perdeu gradualmente a primazia para as outras nações que se
industrializavam rapidamente. Os Estados Unidos ultrapassaram-na em termos de
produção industrial total na década de 1880, e a Alemanha na primeira década do séc.
XX. Nas vésperas da I Guerra Mundial, era ainda a principal nação comercial, mas
então dominava apenas cerca de um sexto do comércio total e era seguida de perto
pela Alemanha e pelos Estados Unidos.
Os têxteis, o carvão, o ferro e a engenharia, as bases da prosperidade precoce da
Grã-Bretanha, continuaram a ser os seus trunfos. Na indústria mineira, a Grã-Bretanha
manteve a primazia na Europa 8embora os Estados Unidos a tivessem ultrapassado no
começo do séc. XX) e produzia excedentes para exportação. A indústria da
engenharia, uma criação de finais do séc. XVIII, pode encontrar as suas raízes em
todas as três indústrias acima referidas.
De modo semelhante, a evolução da indústria naval, desde a propulsão à vela até ao
vapor e da construção em madeira até ao ferro e ao aço, foi outro poderoso estímulo.
A Grã-Bretanha não conseguiu manter indefinidamente a sua preeminência à medida
que outras nações menos desenvolvidas mas bem dotadas começaram a
industrializar-se. Nesse sentido, o declínio relativo da Grã-Bretanha era inevitável.
Tendo em conta os vastos recursos e o rápido crescimento populacional dos Estados
Unidos e da Rússia, não é surpreendente que acabassem por ultrapassar a pequena
nação insular na produção total. Mais difícil de explicar é a baixa taxa de crescimento
81
da produtividade total dos factores (produção por unidade de todas as entradas) foi de
zero.
A explicação mais recente aponta para outra causa possível do declínio relativo da
Grã-Bretanha: o malogro empresarial. Não restam dúvidas de que a Grã-Bretanha
Vitoriana teve alguns empresários individuais dinâmicos e agressivos, William Lever
(da Lever Brothers, mais tarde Unilever) e Thomas Lipton (chá), entre outros,
tornaram-se nomes familiares. Por outro lado, há provas abundantes de que os
empresários do final da época vitoriana não exibiam em geral o dinamismo dos seus
antepassados, adoptaram o estilo de vida de cavalheiros ociosos e deixaram a
administração diária das suas empresas a gerentes contratados. A introdução tardia e
quase timorata de novas indústrias de alta tecnologia (ao tempo), como as dos
químicos orgânicos, da electricidade, da óptica e do alumínio, ainda que muitos dos
inventores fossem britânicos, é um sinal de letargia empresarial. Ainda mais
impressionante é a resposta tardia e parcial dos empresários britânicos à nova
tecnologia naquelas indústrias fundamentais de que eram, ou tinham sido
representantes máximos.
Em parte, o atraso do sistema educativo britânico pode ser responsabilizado pelo
abrandamento industrial e pelos fracos resultados empresariais. A Grã-Bretanha foi a
última grande nação ocidental a adoptar a escola elementar universal pública,
importante para a formação duma força de trabalho especializada. As poucas grandes
universidades britânicas, deram importância diminuta à educação científica e em
engenharia (mas as universidades escocesas valorizaram-na). Apesar de terem de
algum modo recuperado do seu turpor do séc. XVIII, dedicavam-se ainda em primeiro
lugar à familiarização dos filhos das classes ociosas com os clássicos. Esta era uma
faceta de perpetuação dos valores aristocráticos, com o seu desdém pelas realizações
comerciais e industriais. O contraste com o séc. XVIII é flagrante e irónico; nesse
tempo, a sociedade britânica era largamente considerada mais fluída e aberta que as do
Antigo Regime no Continente. Um século depois, as opiniões, se não a realidade,
estavam invertidas.
De todas as grandes nações, a Grã-Bretanha era a mais dependente de importações e
exportações para o seu bem-estar material. Tinha de longe, a maior marinha mercante e
ao maiores investimentos externos de qualquer nação – ambos importantes angariadores
de moeda estrangeira.
Desde o começo do séc. XIX, se não antes, apesar das suas importantes indústrias
exportadoras, que a Grã-Bretanha tinha uma balança «desfavorável», ou negativa, do
comércio de mercadorias. O défice era coberto pelos ganhos da marinha mercante e
pelo investimento externo o que permitiu o aumento quase contínuo deste último ao
longo do século.
Em resumo, deve dizer-se que, apesar de todas as vicissitudes, o rendimento real per
capita dos Britânicos aumentou sensivelmente duas vezes e meia entre 1850 e 1914,
que a distribuição de rendimento se tornou ligeiramente mais igual, que a proporção
da população na mais completa miséria diminuiu e que, em 1914, o britânico médio
desfrutava do padrão de vida mais elevado da Europa.
82
Estados Unidos
O exemplo mais espectacular de rápido crescimento económico nacional foi o dos
Estados Unidos. Apesar de os Estados Unidos terem acolhido o grosso da emigração
proveniente da Europa, o maior factor de crescimento populacional resultou duma
taxa de crescimento natural elevada. Em nenhuma altura a população nascida no
estrangeiro ultrapassou um sexto do total. No entanto, a política americana de
imigração quase irrestrita até após a I Guerra Mundial marcou definitivamente a vida
nacional, e a América tornou-se conhecida como o receptáculo da Europa.
O rendimento e a riqueza cresceram ainda mais rapidamente que a população. Desde os
tempos coloniais, a escassez de mão-de-obra em relação à terra e a outros recursos
implicara salários mais elevados e um nível de vida melhor que na Europa. Foi este facto,
juntamente com as oportunidades de realização individual e as liberdades religiosa e
política gozadas pelos cidadãos americanos, que atraiu os emigrantes da Europa. Embora
as estatísticas sejam imperfeitas, é provável que o rendimento médio per capita tenha
pelo menos duplicado entre a adopção da Constituição e a eclosão da Guerra Civil .
A permanente escassez e o elevado custo de mão-de-obra premiavam a maquinaria
que poupasse mão-de-obra, quer na agricultura, quer na indústria. Na agricultura, as
melhores técnicas europeias resultaram em melhor produtividade por hectare que, nos
Estados Unidos, mas os agricultores americanos, utilizando máquinas relativamente
baratas (mesmo antes da introdução de tractores), conseguiam rendimentos muito
superiores por trabalhador. Na indústria prevaleceu uma situação semelhante.
As enormes dimensões físicas dos Estados Unidos, com climas e recursos diferentes
permitiram um grau de especialização regional ainda maior que o que era possível em
qualquer país da Europa. Na época em que conquistou a sua independência quase 90%
da sua força laboral dedicava-se principalmente à agricultura e muita da restante ao
comércio, a nova nação em breve começou a diversificar-se. Em 1789, o ano em que a
Constituição entrou em vigor, Samuel Slater chegou de Inglaterra e, no ano seguinte,
em sociedade com comerciantes de Rhode Island, criou a primeira indústria fabril da
América. Pouco depois, em 1793, o descaroçador de algodão, inventado por Eli
Whitney, lançou o sul da América do Norte como principal fornecedor da
matéria-prima da maior indústria fabril do mundo.
Esta dicotomia levou a um dos primeiros grandes debates sobre política económica na
nova nação. Alexander Hamilton, o primeiro secretário do Tesouro, queria patrocinar
as fábricas atravésde tarifas proteccionistas e outras medidas. Por outro lado, Thomas
Jefferson, o primeiro secretário de Estado e terceiro presidente, preferiu o
encorajamento da agricultura e do comércio como seu auxiliar. Os Jeffersonianos
venceram a luta política, mas os Hamiltonianos (depois da morte trágica e prematura
de Hamilton) viram as suas ideias triunfarem.
Outra vantagem da dimensão dos Estados Unidos foi o seu potencial para um grande
mercado interno praticamente livre de barreiras aduaneiras artificiais. Mas para realizar
esse potencial foi necessário criar uma vasta rede de transportes. No começo do século
XX, a escassa população estava espalhada ao longo da costa marítima do Atlântico; a
comunicação era mantida através de navegação costeira, complementada por umas quantas
83
carreiras postais. Os rios proporcionavam o único acesso prático ao Interior e esse
acesso estava extremamente limitado por quedas de água e rápidos. Para remediar esta
deficiência, os Estados e as municipalidades, em cooperação com interesses privados,
empenharam-se num extensivo programa de melhorias internas, o que na prática implicou a
construção de estradas com portagens e canais.
Uma razão de peso do decepcionante desempenho económico dos canais foi o advento
dum novo concorrente, o caminho-de-ferro. A era do caminho-de-ferro começou
quase simultaneamente nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, embora nos estados
Unidos tenha por muitos anos dependido profundamente da tecnologia, equipamento e
capital britânicos. No entanto, os patrocinadores americanos, rapidamente perceberam
as potencialidades deste novo meio de transporte. Em 1840, a extensão de vias férreas
concluídas excedia, não apenas a da Grã-Bretanha, mas a de toda a Europa, e assim
durante a maior parte do século.
Apesar do rápido crescimento das fábricas, os Estados Unidos permaneceram uma
nação predominantemente rural ao longo de todo o séc. XIX. A população urbana não
ultrapassava a população rural senão depois da I Guerra Mundial. Em 1890, os
Estados Unidos tinha-se transformado na nação mais industrializada do mundo.
Bélgica
A primeira região da Europa Continental a adoptar o modelo britânico de
industrialização foi a terra que se tornou o reino da Bélgica em 1830. a proximidade à
Grã-Bretanha não é um factor a desprezar na sua precoce e bem sucedida imitação da
industrialização britânica, mas houve outros motivos mais fundamentais:
1. A região já tinha uma longa tradição industrial. Na Idade Média, a Flandres
fora um importante centro de produção de tecidos e, a leste, o vale do
Sambre-Mosa foi famoso pela sua cutelaria. Bruges e Antuérpia foram as
primeiras cidades do Norte a assimilar as técnicas comerciais e financeiras
italianas em finais da Idade Média. Na Flandres cresceu uma importante
indústria artesanal do linho, e na bacia do Hainault e no vale do Sambre-Mosa
desenvolveu-se a indústria mineira.
2. A riqueza de recursos naturais da Bélgica assemelhava-se à da Grã-Bretanha.
Tinha jazidas de carvão de fácil acesso, minério de ferro nas proximidades das
jazidas de carvão, bem como minérios de chumbo e zinco.
3. Em parte devido à sua localização e às suas ligações políticas, a região que se
tornou a Bélgica recebeu importantes injecções de tecnologia, investimento e
capital estrangeiros e desfrutou duma posição favorável em determinados
mercados externos, especialmente franceses.
As minas de carvão eram as maiores utilizadoras de máquinas a vapor, de ambas as
versões, de Newcomen e Watt, e também atraíram a maior quantidade de empresários
e capitais franceses. Durante o domínio francês desenvolveu-se um tráfico de grande
importância para a indústria carbonífera belga e para a indústria francesa em geral, e
que sobreviveu às várias transformações políticas depois de 1814.
A indústria do algodão cresceu dentro e em torno da cidade de Gante, que na verdade
se transformou na Manchéster belga. As fábricas de Cockerill no rio Mosa em
84
Seraing, perto de Liège, foram o primeiro aglomerado industrial em grande escala no
Continente.
A Revolução Belga, bastante moderada em termos de perdas de vida e de
prosperidade, provocou, uma depressão económica resultante da incerteza sobre o
carácter e futuro no novo Estado. Todavia, a depressão foi de curta duração, e os anos
intermédios da década foram palco duma vigorosa explosão industrial. Além de
condições económicas internacionais, que eram igualmente favoráveis, dois factores
especiais foram os principais responsáveis pelo carácter e dimensão do
desenvolvimento da Bélgica:
1. a decisão governamental de construir uma extensa rede de caminho-de-ferro à
custa do Estado, uma benção especial para as indústrias de carvão, de ferro e
de engenharia.
2. uma notável inovação institucional no campo da banca e da finança.
Em 1822, o rei Guilherme I autorizou a criação dum banco decapitais anónimos, a
Société Générale, para favorecer a Industrie Nationale des Pays-Bas (conhecida após
1830 como Société Générale de Belgique), com sede em Bruxelas; doou-lhe
propriedades do Estado investiu uma parcela considerável da sua fortuna pessoal em
acções da empresa. Após a revolução contudo, com uma nova administração nomeada
pelo novo governo, estimulou um aumento sem precedentes no Continente.
Em 1835, um grupo rival de financeiros obteve autorização para criar outro banco
privado, o Banque de Belgique. Semelhante à Société Générale em todos os aspectos
importantes (embora substancialmente mais pequeno), o novo banco não perdeu
tempo a imitar o seu antecessor no sector da banca de investimentos. Como a Société
Générale, também o Banque de Belgique tinha uma ligação francesa por intermédio
do banco parisiense da Hottinguer et Cie.
Em 1840, se não antes, a Bélgica era claramente o país mais industrializado do
Continente e, em valores per capita, seguia muito de perto a Grã-Bretanha.
França
De todos os primeiros países industrializados, a França foi o que teve o padrão de
crescimento mais aberrante.
A característica mais marcante do séc. XIX, no caso da França, foi a sua baixa taxa de
crescimento demográfico. A industrialização da Grã-Bretanha, da Bélgica e,
eventualmente, da América e da Alemanha baseou-se essencialmente em abundantes
reservas de carvão. A França, embora não estivesse completamente privada de carvão,
não possuía jazidas abundantes, e, de resto, o tipo de jazidas que possuía tornava a sua
exploração bastante dispendiosa. Estes factos tiveram implicações importantes para
outras indústrias relacionadas com a do carvão, como a do ferro e do aço. Em
tecnologia, a França não estava atrasada, cientistas, inventores e inovadores franceses
tomaram a dianteira em várias indústrias, incluindo a da energia hidroeléctrica, do
aço, do alumínio, dos automóveis e, no séc. XX, da aviação.
85
Está agora bem determinado que o crescimento económico moderno em França teve
início no séc. XVIII. Para o século como um todo, as taxas de crescimento, quer da
produção total quer da produção per capita, foram sensivelmente as mesmas em
França e na Grã-Bretanha, talvez até um pouco mais elevada em França, embora a
França tivesses começado (e terminado) com um produção per capita mais baixa. Mas
o século acabou com a Grã-Bretanha num processo de «revolução industrial» (no
algodão), enquanto a França foi apanhada nas malhas duma grande sublevação
política, a Revolução Francesa. Nesse ponto reside uma importante diferença que
afectou os desempenhos relativos das duas economias durante a maior parte do séc.
XIX.
Após uma depressão bastante severa no pós-guerra, que afectou toda a Europa
Continental Ocidental e tocou mesmo a Grã-Bretanha, a economia francesa retomou o
seu crescimento com taxas ainda superiores às do séc. XVIII.
Embora o desemprego global da economia fosse bastante respeitável, sofreu variações
na taxa de crescimento (além das flutuações a curto prazo, às quais todas as
economias em curso de industrialização estavam sujeitas). A indústria do ferro
adoptou o processo de pludagem e iniciou a transição para a fundição com coque.
Lançaram-se as fundações duma importante indústria de máquinas e de engenharia;
em meados do século, o valor das exportações de maquinaria excedeu o das
importações em mais de 3 para 1. Muitas das novas máquinas destinaram-se à
indústria têxtil caseira, especialmente à indústria de lanifícios e algodão, que eram as
maiores utilizadoras de máquinas mais importantes em termos de emprego e de valor
acrescentado.
As crises políticas e económicas de 1848-51 introduziram um hiato no ritmo de
desenvolvimento económico. A crise nas finanças públicas e privadas paralisou a
construção de caminhos-de-ferro e doutras obras públicas. A produção de carvão caiu
abruptamente; a produção de ferro decresceu mais lentamente. A importação de
mercadorias caiu para metade em 1848, mas recuperariam no ano seguinte.
Com o coupe d’état de 1851 e a proclamação do II Império no ano seguinte, o
crescimento económico francês retomou o seu anterior curso a um ritmo acelerado. A
taxa de crescimento afrouxou um pouco após a moderada recessão de 1837, mas as
reformas económicas da década de 1860, nomeadamente os tratados de comércio livre
e as leis da constituição liberalizada de sociedades comerciais de 1863 e de 1867,
providenciaram um novo estímulo.
A guerra de 1870-71 trouxe o desastre económico e militar, mas a França recuperou
economicamente duma forma que espantou o mundo. A França sofreu menos com a
depressão de 1873 que outras nações em curso de industrialização e recuperou mais
rapidamente. Deu-se um novo impulso que continuou até ao final de 1881. no período
entre 1851 e 1881 como um todo, a riqueza e o rendimento franceses cresceram às
taxas mais elevadas de todo o século, a uma média de 2% a 4%.
A recessão teve início em 1882 durou mais tempo e provavelmente custou mais à
França que qualquer outra do século XIX. No princípio assemelhou-se a muitas outras
86
recessões começando com um pânico financeiro, mas seguiram vários outros factores
que a agravaram e prolongaram: doenças catastróficas, que afectaram seriamente as
indústrias vinícolas e da seda durante duas décadas; avultadas perdas em
investimentos externos por incúria de governos negligentes e de caminhos-de-ferro
falidos; o regresso a nível mundial ao proteccionismo em geral e, em particular as
novas tarifas francesas; e uma amarga guerra comercial com a Itália desde 1887 até
1898. globalmente, o comércio esterno definhou e manteve praticamente estacionário
durante mais de 15 anos e, com a perda de mercados estrangeiros, a indústria interna
também estagnou. A acumulação de capital atingiu o seu ponto mais baixo na segunda
metade do século.
A prosperidade regressou, por fim, mesmo antes do final do século, com a extensão
dos campos de minério de Lorena e o advento de novas indústrias como as da
electricidade, do alumínio, do níquel e dos automóveis. A França desfrutou uma vez
mais de uma subida da taxa de crescimento.
La Belle Époque, como os Franceses chamam aos anos imediatamente anteriores à I
Guerra Mundial, foi um período de prosperidade material e também de eflorescência
cultural. Embora não sejam possíveis comparações precisas, é provável que, em 1913,
o francês médio tivesse um nível de vida material tão ou mais elevado que o dos
cidadãos de qualquer outra nação continental.
De todas as grandes nações industriais a França era a que tinha a maior proporção de
mão-de-obra na agricultura – cerca de 40% em 1913. Este facto tem sido
frequentemente apontado como uma evidência primária do «retardamento» da
economia francesa, mas a interpretação correcta não é assim tão simples. Diversos
factores foram invocados para justificar a proporção relativamente elevada de
população que se dedicava à agricultura – incluindo as baixas taxas de crescimento
populacional e de urbanização!-, mas é menos frequentemente observado que, no
princípio do séc. XX, a frança era a única nação industrial da Europa auto-suficiente
em géneros alimentares, e tinha mesmo um excedente para exportação.
Com respeito à escala e estrutura dos empreendimentos, a França foi famosa (ou
notável) pela pequena dimensão das suas empresas, significativamente, estas empresas
concentravam-se na mineração, na metalurgia e nos têxteis, as mesmas indústrias nas
quais as empresas de grandes dimensões e com elevados investimentos de capitais
prevaleciam noutros países industrializados, com a excepção de existirem em maior
quantidade. Entre estes dois extremos havia um grande número de empresas de
pequena e média dimensão que empregava a grande maioria de assalariados. No
extremo mais baixo da escala, os que empregavam menos de 10 trabalhadores cada,
dedicavam-se às tradicionais indústrias artesanais, como o processamento de
alimentos, o vestuário e a carpintaria, enquanto as que tinham mais de 100
trabalhadores se dedicavam principalmente às indústrias modernas – química,
vidrararia, papel e borracha, bem como têxteis, mineração e metalurgia. Duas outras
características da dimensão relativamente pequena das empresas francesas não podiam
deixar de ser referidas:
- Elevado valor acrescentado (artigos de luxo)
- Dispersão geográfica.
Em parte a dispersão foi determinada pela natureza das fontes de energia disponíveis.
87
A energia hidráulica, por muito importante que tivesse sido para a industrialização
francesa, ajudou a impor um padrão: pequena dimensão das empresas, dispersão
geográfica e baixa urbanização. Estas características acabaram por ser partilhadas por
outros países com poucas reservas de carvão.
Alemanha
A Alemanha foi a última a juntar-se ao grupo dos primeiros países industrializadores.
Pode, na verdade, dizer-se que era um país atrasado. Pobre e pouco desenvolvido na
primeira metade do séc. XIX, aquela nação politicamente dividida era também
predominantemente rural e agrária. Uma rede deficiente de transportes e de
comunicação impediu o desenvolvimento económico, e as inúmeras divisões políticas,
com os seus distintos sistemas monetários e políticas comerciais, e outros obstáculos
às trocas comerciais, atrasaram ainda mais o progresso.
Na vésperas da I Guerra Mundial, o Império Alemão Unificado era a nação industrial
mais poderosa da Europa. Possuía as maiores e mais modernas indústrias de produção
de ferro e aço e seus derivados, de energia eléctrica e maquinaria e de químicos.
Com se deu esta transformação?
A história económica alemã no séc. XX pode ser dividida em 3 períodos bastantes
distintos e quase simétricos:
1. Estende-se desde o começo do século até à formação do Zollverein, em 1833,
testemunhou um despertar gradual para as mudanças económicas que
decorriam na Grã-Bretanha, em França e na Bélgica e a criação das condições
jurídicas e intelectuais essenciais à transição para a moderna ordem industrial.
2. Um período de imitação e apropriação deliberadas que durou até cerca de 1870
– foram moldadas as fundações materiais da indústria, transportes e finanças
modernas.
3. A Alemanha ascendeu rapidamente à posição de supremacia industrial na
Europa Ocidental Continental que ainda hoje ocupa. Em cada um destes
períodos, as influências estrangeiras desempenharam um papel importante. No
princípio, as influências, como também as próprias mudanças, foram
basicamente jurídicas e intelectuais, emanando da Revolução Francesa e da
reorganização napoleónica da Europa. Um vivo fluxo de capital, tecnologia e
dinâmica estrangeiros, que atingiu o seu máximo na década de 1850, marcou o
segundo período. No último período, a expansão da indústria alemã para
mercados estrangeiros dominou o quadro.
A margem esquerda do Reno, unida política e economicamente à França sob
Napoleão, adoptou o sistema jurídico francês e as suas instituições económicas, a
maior parte das quais se manteve depois de 1815. Sob Napoleão, a influência francesa
foi muito forte na Confederação do Reno (a maior parte da Alemanha Central). Até a
Prússia adoptou, numa forma modificada, muitas instituições jurídicas e económicas
francesas.
88
Um edicto de 1807 aboliu a servidão, autorizou a nobreza a dedicar-se a «ocupações
burguesas [comércio e indústria] sem derrogação do seu estatuto» e aboliu a distinção
entre propriedade nobre e não nobre, criando assim, efectivamente, o «comércio livre»
em terra. Edictos posteriores aboliram os grémios e eliminaram outras restrições à
actividade comercial e industrial, melhoraram e modernizaram a administração
central. Outras reformas deram à Alemanha o primeiro sistema educativo moderno.
Zollverein (literalmente, portagem ou união tarifária)- estabeleceu as fundações em
1818, decretando uma tarifa comum para toda a Prússia. Em 1833, um tratado com os
maiores Estados do sul da Alemanha, com excepção da Áustria, resultou na criação do
próprio Zollverein, que fez duas coisas:
1. aboliu todas as portagens e barreiras aduaneiras internas, criando um «mercado
comum» alemão.
2. criou uma tarifa externa comum determinada pela Prússia.
Em geral, o Zollverein seguiu uma política comercial liberal (isto é, de tarifas baixas),
não por um princípio económico mas por a administração prussiana querer excluir a
proteccionista Áustria da participação na união.
Se o Zollverein tornou possível uma economia alemã unificada, o caminho-de-ferro
transformou-a numa realidade.
A chave da rápida industrialização da Alemanha foi o crescimento célere da indústria
carbonífera do Ruhr. Pouco antes da I Guerra Mundial, o Ruhr produzia cerca de dois
terços do carvão da Alemanha. A produção comercial no vale do Ruhr começou na
década de 1780, sob a direcção da administração mineira estatal prussiana. No final da
década de 1830, foram descobertos os veios «escondidos» (profundos) a norte do vale
do Ruhr.
A produção alemã do aço ultrapassou a da Grã-Bretanha em 1895, e em 1914 ascendia
a mais do dobro da produção britânica. As empresas alemãs adoptaram rapidamente a
estratégia da integração vertical, adquirindo as suas próprias minas de carvão e
minério, fábricas de fundição, altos-fornos, fundições e laminadores, oficinas de
fabrico de máquinas, etc.
O ano de 1870-71, tão dramático na história política, com a Guerra Franco-Prussiana,
o derrube do II Império em França e a criação dum novo II Império na Alemanha, foi
menos dramático na história económica. A unificação económica já tinha sido
conseguida e um novo aumento cíclico do investimento, do comércio e da produção
industrial tinha começado em 1869. esta hiperactividade cessou subitamente com a
crise financeira de Junho de 1873, que introduziu uma grave depressão. Depois de
terminada a depressão, o crescimento foi retomado com mais vigor que anteriormente.
Entre 1883 e 1913, o produto interno líquido aumentou foi de quase 2% por ano.
Os sectores mais dinâmicos da indústria alemã foram os que produziram bens de
capital ou intermédios para consumo industrial, a negligência relativa dos bens de
consumo, contrasta vivamente com a situação em França e ajuda a explicar os seus
diferentes padrões de crescimento.
89
Em 1864, Hofman regressou à Alemanha como distinto professor e consultor da nova
indústria da tinturaria. No período de alguns anos, a indústria valendo-se do pessoal e
recursos das universidades, impôs o seu domínio na Europa e no mundo. A indústria da
química orgânica foi também a primeira no mundo a estabelecer os seus próprios
laboratórios e pessoal de investigação. Ela introduziu, assim, muitos produtos novos e
dominou também a produção de fármacos.
A indústria eléctrica cresceu mais rapidamente que a química. A urbanização
extremamente rápida da Alemanha que se verificou enquanto a indústria estava em
crescimento, proporcionou-lhe um estímulo suplementar; a indústria alemã não teve
de lutar contra uma bem-estruturada indústria do gás de iluminação, como a indústria
britânica. A iluminação e os transportes urbanos foram as duas primeiras utilizações
mais relevantes da electricidade. No princípio do séc. XX, os motores eléctricos
estavam a competir com as máquinas a vapor e a substituí-las como fontes de energia.
Ainda outra característica notável da estrutura industrial germânica foi a prevalência
de cartéis. Um cartel é um acordo ou contrato entre empresas nominalmente
independentes para fixar preços, limitar a produção dividir mercados ou, por outro
lado, promover práticas monopolistas e anticompetitivas. Esses contratos ou acordos
eram contrários à proibição pelo direito comum, de combinações de restrição do
comércio na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos, mas eram perfeitamente legais e até
cobertos por lei na Alemanha.
A teoria económica elementar ensina que o comportamento dos cartéis restringe a
produção por forma a aumentar os lucros, mas tal prognóstico é dificilmente
compatível com a excepcional marca alemã de rápido crescimento da produção,
mesmo ou especialmente- em indústrias cartelizadas.
A resolução deste paradoxo pode detectar-se na combinação de cartéis com tarifas
proteccionistas, após a conversão de Bismarck ao proteccionismo em 1879. Através
de tarifas proteccionistas, os cartéis podiam manter artificialmente preços elevados no
mercado interno, enquanto se dedicavam a exportações praticamente ilimitadas para
mercados estrangeiros, mesmo a preços abaixo do custo médio de produção se os
preços das vendas internas pudessem compensar as perdas nominais das exportações.
A rentabilidade deste tipo de actividade foi melhorada com a prática dos
caminhos-de-ferro estatais ou regulamentados em cobrar uma taxa mais baixa para
transportes destinados às fronteiras do país que para transporte dentro do país.
90
91
Cap. X
Padrões de desenvolvimento: retardatários e ausentes
Na medida em que o começo da industrialização esteve associado ao carvão, os
últimos países a iniciarem a industrialização, por outro lado, tinham pouco ou nenhum
carvão dentro das suas fronteiras. A produção em Espanha, na Áustria e na Hungria
mal bastava para satisfazer a pouca procura interna. A Rússia tinha enormes jazidas,
mas antes de 1914 a sua exploração quase não tinha começado a desenvolver-se.
Suíça
A Alemanha foi o último dos primeiros industrializados, a Suíça foi o primeiro dos
retardatários. Apesar de a Suíça já ter adquirido, na primeira metade do século ou
antes, alguns recursos importantes que desempenharam um papel relevante na sua
rápida industrialização após 1850 – nomeadamente um elevado nível de alfabetização
adulta -, a sua estrutura económica era ainda largamente pré-industrial. Só em 1850
conseguiu uma união aduaneira (ao contrário da Alemanha, que tinha um Zollverien
mas não um Governo Central), uma união monetária efectiva, um sistema postal
centralizado ou um padrão uniformizado de pesos e medidas.
País pequeno, tanto em território como em população, a Suíça é igualmente pobre em
recursos naturais convencionais que não a água e a madeira, não tem praticamente
nenhum carvão. Devido às montanhas 25% da sua área terrestre é incultivável e, na
realidade, praticamente inabitável. Apesar destes revezes, os Suíços conseguiram
alcançar um dos mais elevados padrões de vida na Europa no começo do séc. XX e,
no último quartel do século, o mais elevado do mundo. Como o conseguiram?
Os Suíços há muito tempo que praticavam a combinação da indústria doméstica com a
agricultura e a criação de gado, devido à escassez de terra arável. Fizeram-no em grande
parte com matérias-primas importadas e, na última parte do séc. XIX, também com
produtos alimentares importados, dependendo assim de mercados internacionais.
O sucesso suíço nos mercados internacionais resultou duma combinação invulgar, se na
única, de tecnologia avançada com indústrias de mão-de-obra intensiva. Esta combinação
deu origem a produtos
de alta qualidade, muito apreciados e de grande valor
acrescentado, como os tradicionais relógios de sala e de pulso suíços, os delicados
têxteis, a intricada maquinaria especializada e os requintados queijos e chocolates. As
indústrias de mão-de-obra intensiva eram, em primeiro lugar de mão-de-obra intensiva
especializada. A explicação assenta na elevada taxa de alfabetização na maioria dos
cantões suíços e nos sofisticados sistemas de aprendizagem que predominavam. O que
forneceu mão-de-obra especializada e adaptável, disposta a trabalhar mediante o
pagamento de salários relativamente baixos.
O Instituto de Tecnologia, fundado em 1851, que forneceu inteligências bem-formadas e
soluções engenhosas para difíceis problemas técnicos que surgiram no final do séc. XIX.
Mais tradicional que a indústria do algodão, a indústria da seda acabou na verdade, por
dar uma maior contribuição ao crescimento económico suíço no séc. XIX, em termos de
92
emprego e de exportação, que a primeira também passou por um processo de
modernização tecnológica.
Devido à falta de jazidas de carvão e de pequenas jazidas de minério de ferro, a Suíça
sensatamente, não tentou desenvolver uma indústria primária do ferro; mas, com base em
matérias-primas importadas, desenvolveu uma importante indústria de transformação de
metais. Quando chegou a era da electricidade, a indústria rapidamente se voltou para o
fabrico de maquinaria eléctrica; de facto os engenheiros suíços contribuíram com muitas
inovações para a nova indústria, especialmente na área da hidroelectricidade.
A indústria de lacticínios, muito famosa pelos seus queijos, converteram a sua produção
de um processo manual para um processo fabril, assim expandindo grandemente a
produção e a exportação. A indústria também desenvolveu a produção de leite condensado
(com base numa patente americana) e criou duas indústrias paralelas, a produção de
chocolate e de alimentos pré-confeccionados para bebé. Através das suas próprias
pesquisas também desenvolveram várias especialidades farmacêuticas, em termos globais,
era a segunda maior do mundo; embora atingisse apenas um quinto da produção alemã,
produzia tanto como o resto do mundo junto.
As tendências firmadas na segunda metade do séc. XIX mantiveram-se no séc. XX: o
declínio da importância relativa da agricultura, o crescimento da indústria e (ainda mais
acentuadamente) dos serviços e a dependência permanente da procura internacional,
especialmente do turismo (a partir da décadas de 1870) e dos serviços financeiros (a
partir da I Guerra Mundial).
Países Baixos e Escandinávia
Pode parecer incongruente associar os Países Baixos aos países escandinavos numa
discussão sobre o padrão de industrialização; na verdade é bastante lógico. As
características comuns dos países escandinavos considerados conjuntamente
são
culturais, não económicas. Em termos de estrutura económica, os Países Baixos têm mais
em comum com a Dinamarca que qualquer deles com a Noruega e a Suécia. O habitual
emparelhamento dos Países Baixos com a Bélgica revela que este foi um dos primeiros
países a ser industrializados, ao contrário daqueles; que a Bélgica tinha carvão e
desenvolveu uma indústria pesada, os Países Baixos não.
Todos esses quatro países depois de permanecerem consideravelmente atrasados em
relação aos condutores da primeira metade do século, dispararam rapidamente na segunda
metade e, em particular, nas duas ou três últimas décadas.
Em 1914, estes quatro países, juntamente com a Suíça, tinham alcançado padrões de vida
comparáveis aos dos primeiros países continentais industrializados. Devido ao seu começo
mais tardio e à sua carência de carvão, é importante compreender as fontes do seu
sucesso.
A densidade populacional variou muito. Os Países Baixos tinham uma das maiores
densidades da Europa, ao passo que a Noruega e a Suécia tinham a mais baixa, inferior
mesmo à da Rússia. A Dinamarca estava no meio, mas estava mais perto dos Países Baixos.
93
Considerando o capital humano como uma característica da população, podemos dizer que
todos estes quatro países estavam extremamente bem dotados. Tanto em 1850 como em
1914, os países escandinavos tiveram as taxas de alfabetização mais elevadas da Europa,
ou do mundo, e os Países Baixos estavam bastante acima da média europeia. Este facto foi
de valor inestimável na ajuda das economias nacionais a encontrar os seus nichos nas
correntes em expansão e em constante mutação da economia internacional.
Quanto a recursos naturais, a Suécia era o país mais dotado de abundantes depósitos de
minérios, tanto fosfóricos como não fosfóricos (e também minérios metálicos não
ferrosos, mas estes tinham menos importância), de vastas extensões de madeira virgem e
da energia hidráulica. A Noruega também possuía madeira, alguns minérios metálicos e um
enorme potencial hidroeléctrico. A energia hidráulica foi, na Suécia e na Noruega, um
factor significativo no seu desenvolvimento do início do séc. XIX, mas tornou-se
particularmente importante com o aproveitamento da energia hidroeléctrica depois de
1890. A
Dinamarca e os Países Baixos estavam quase tão desprovidos de energia
hidráulica como de carvão. Tinham alguma energia eólica, que não era negligenciável, mas
que dificilmente podia servir de base a um grande desenvolvimento industrial.
A localização foi um factor importante para todos os quatro países. Ao contrário da
Suíça, todos tinham acesso imediato ao mar. isso teve importantes implicações para um
significado recurso natural internacional, o peixe, bem como o transporte barato, as
marinhas mercantes e a indústria da construção naval. Cada um aproveitou estas
oportunidades à sua maneira.
Os Holandeses, com uma longa tradição de pesca e marinha mercante, mas mais
recentemente de algum modo moribundas, tiveram dificuldades em desenvolver bons
portos adequados a navios a vapor; acabaram por fazê-lo em Roterdão e em Amesterdão,
com resultados espectaculares para o comércio em trânsito para a Alemanha e para a
Europa Central e para o processamento de produtos alimentares e matérias-primas
ultramarinas (açúcar, tabaco, chocolate, cereais, e até petróleo).
A Dinamarca também tinha uma venerável história comercial, especialmente em relação ao
tráfego através do Sund. Em 1857, em troca dum pagamento de 63 milhões de Kronor por
outras nações comerciais, a Dinamarca aboliu os direitos de portagem da Alfândega de
Mar e no porto de Copenhaga.
Na primeira metade do século, a Noruega tornou-se um grande fornecedor de peixe e de
madeira no mercado europeu, e na segunda metade detinha a segunda maior marinha
mercante (depois da Grã-Bretanha).
A Suécia, embora tivesse desenvolvido a sua marinha mercante mais lentamente
beneficiou do levantamento de restrições no comércio internacional em geral e da
redução de tarifas de transporte nas suas avultadas exportações de madeira, ferro e
aveia.
As instituições políticas dos quatro países não colocaram barreiras significativas à
industrialização ou ao seu crescimento económico. O acordo pós-napoleónico desligou a
Noruega da coroa da Dinamarca e ligou-a à da Suécia, da qual se dissidiou pacificamente
em 1905, mas a Suécia perdeu a Finlândia para a Rússia em 1809. o congresso de Viena
criou o Reino Unido dos Países Baixos, que agrupava as províncias do Sul, que se
94
separaram não muito pacificamente, para virem a formar a moderna Bélgica em 1830. em
1864, a Prússia e a Áustria apoderaram-se dos ducados dinamarqueses do Eslésvico e da
Hulsácia. Por outro lado, o século passou duma forma relativamente pacífica,
verificando-se uma democratização progressiva em todos os países. Eram razoavelmente
bem governados, sem corrupção notória nem projectos estatais grandiosos, embora em
todos eles o governo tivesse dado alguma ajuda às vias férreas e, na Suécia, como na
Bélgica, o Estado tivesse construído as linhas principais.
Como os países pequenos dependiam de mercados estrangeiros, seguiram essencialmente
uma política comercial liberal, embora na Suécia, os dois países cuja estrutura agrária
mais se assemelhava às do Antigo Regime, as reformas agrárias efectuaram-se
gradualmente, a partir do séc. XVIII, ao longo da primeira metade do séc. XIX. As
reformas resultaram na completa abolição dos últimos vestígios de servidão e na criação
duma nova classe de camponeses-proprietários independentes com uma pronunciada
orientação no mercado.
O factor chave do sucesso destes países (a par da elevada alfabetização), foi a sua
capacidade de adaptação à divisão internacional do trabalho determinado pelos primeiros
industrializadores e de demarcação das áreas de especialização em mercados
internacionais para que estavam particularmente ajustados. Isto significou
evidentemente, uma grande dependência do comércio internacional, que tinha flutuações
notórias; mas também significou elevados lucros para aqueles factores de produção
suficientemente venturosos para estarem bem situados em tempos de prosperidade.
Apesar destes países terem entrado em força no mercado mundial em meados do séc.
XIX, com a exportação de matérias-primas e bens de consumo ligeiramente refinados,
tinham todos desenvolvido indústrias altamente sofisticados no começo do séc. XX. A isto
chama-se «industrialização contra a corrente»; isto é um país que em tempos exportara
matérias-primas começa a processá-las e a exportá-las sob a forma de bens
semifabricados e acabados.
Todos os quatro países tiveram taxas de crescimento bastante satisfatórias, apesar de
sofrerem flutuações cíclicas, desde de pelo menos meados do século até à década de
1890. Depois, nas duas décadas que precedem imediatamente a I Guerra Mundial, essas
taxas de crescimento já por si satisfatórias, aceleraram, especialmente nos países
escandinavos, elevando rapidamente os seus níveis de rendimento per capita para o nível
mais alto no Continente.
A electricidade foi uma grande benção para as economias dos quatro países. A Noruega e
a Suécia, com o seu vasto potencial hidroeléctrico, foram especialmente favorecidas; mas
mesmo a Dinamarca e os Países Baixos, que podiam importar carvão relativamente barato
da região carbonífera do nordeste da Grã-Bretanha, beneficiaram muito com a
electricidade gerada pelo vapor.
Os quatro países desenvolveram rapidamente importantes indústrias para o fabrico de
maquinaria e produtos eléctricos (por ex: lâmpadas eléctricas nos Países Baixos).
Engenheiros suecos e, em menor escala, noruegueses e dinamarqueses tornaram-se
pioneiros da indústria eléctrica. A Suécia foi o primeiro país a fundir ferro em larga
escala recorrendo à electricidade, sem necessitar de carvão.
95
Em resumo, a experiência dos países escandinavos, como o da Suíça, mostra que foi
possível desenvolver indústrias sofisticadas e um elevado padrão de vida sem recursos
internos de carvão ou indústrias pesadas e que não há um modelo único para uma
industrialização de sucesso.
Império Austro-Húngaro
A Áustria-Hungria, ou as terras dominadas antes de 1918 pela Monarquia Habsburga, teve
no séc. XIX, uma reputação de certa forma injustificada de atraso económico.
O Império Habsburgo caracterizou-se pela diversidade e disparidade regionais, estando
as províncias ocidentais (especialmente a Boémia, a Morária e a própria Áustria)
economicamente muito mais avançadas que as do leste. Dentro das províncias ocidentais
puderam observar-se alguns indícios de crescimento económico moderno logo na segunda
metade do séc. XVIII.
Os começos da industrialização dentro do império no séc. XVIII estão agora bem
definidas. As indústrias têxteis, do ferro, do vidro e do papel cresceram na própria
Áustria e nas terras checas. Colectivamente, as indústrias têxteis eram, de longe, as
maiores, predominavam os linhos e as lãs, mas uma incipiente indústria do algodão existia
desde, pelo menos, 1763. A mecanização teve início na indústria do algodão no final do
século, estendeu-se à indústria de lanifícios nas primeiras décadas do seguinte e mais
lentamente à indústria do linho. Na década de 1840, o Império era superado apenas no
Continente, pela frança na produção de artigos de algodão.
Pensava-se que a Revolução de 1848 marcava uma grande linha divisória na história tanto
económica como política do Império, mas essa noção tem, hoje, sido desacreditada.
Impressionado pelo carácter gradual mas cumulativo da industrialização austríaca desde o
séc. XVIII até à I Guerra Mundial, um investigador caracterizou-a como um caso de
crescimento económico «vagaroso», mas a palavra laborioso talvez se adequasse mais.
Alguns dos obstáculos – o terreno difícil e a falta de recursos naturais – foram impostos
pela natureza, outros, como as instituições inimigas do crescimento, foram obras do
homem.
Entre as últimas, a persistência da servidão legalizada até 1848 foi o mais anacrónico. Na
verdade, porém, a servidão foi um impedimento menos significativo do que poderia
pensar-se. As reformas de José II na década de 1780 permitiram aos camponeses deixar
as propriedades dos seus senhores sem penalizações e comerciar a suas colheitas como
quisessem. A principal consequência da abolição da servidão em 1848 foi a de permitir aos
camponeses a posse livre e sem encargos e a de substituir os impostos pagos ao estado
pelos que eram anteriormente pagos aos seus senhores feudais.
A abolição, em 1850, da fronteira aduaneira entre as metades austríacas e húngara do
império foi vista por alguns como uma realização progressista e por outros como uma
perpetuação do estatuto «colonial» da metade oriental.
Outro obstáculo institucional a um crescimento económico mais rápido foi a política
comercial externa da Monarquia. Ao longo do século manteve-se firmemente
proteccionista, o que facilitou o objectivo da Prússia de a excluir do Zollverein. As
96
elevadas tarifas limitaram não apenas as importações mas também as exportações, porque
as indústrias protegidas, que o eram a custo elevado, eram incapazes de competir nos
mercados mundiais.
No começo do séc. XX, o comércio externo da minúscula Bélgica excedeu o da
Áustria-Hungria em valor absoluto; em termos per capita excedeu-o muitas vezes. É
inegável que a posição geográfica e a topografia do Império contribuíram para a sua fraca
imagem no comércio internacional e que a sua união aduaneira interna que abrangia as
áreas industrial e agrícola, compensou em certa medida o seu limitado acesso aos
mercados estrangeiros e às fontes de abastecimento.
Razão de peso tanto para o lento crescimento como para a desigual difusão da indústria
moderna foram os níveis de educação e alfabetização, componentes da maior importância
do capital humano. Os níveis de alfabetização para a metade austríaca do Império eram
sensivelmente iguais aos de França e da Bélgica em meados do séc. XIX, estavam
desigualmente distribuídos. Dentro do Império como um todo, existia uma grande
correlação entre níveis de alfabetização e níveis de industrialização e de rendimento per
capita.
Apesar dos obstáculos, quer naturais quer institucionais, houve industrialização e
crescimento económico na Áustria ao longo do século, bem como na Hungria da última
parte do século.
Na Hungria, depois de esta parte da Monarquia ganhar autonomia e um governo próprio,
graças ao Compromisso de 1867, verificaram-se taxas de produção ainda superiores.
Os transportes tiveram um papel crucial no desenvolvimento económico do Império. O
Danúbio e mais alguns grandes rios corriam para sul e para leste, longe dos mercados e
dos centros industriais. Só na década de 1830, com o advento das embarcações fluviais a
vapor, é que aqueles puderam ser navegados contra a corrente.
Na década de 1860, mais de metade das mercadorias transportadas nos
caminhos-de-ferro húngaros consistiu em cereais e farinha. O tráfico de farinha
permitiu, todavia, à Hungria começar a industrializar-se. Na última parte do século,
Budapeste tornou-se o maior centro de moagem da Europa, e a nível mundial só foi
superada por Minneapolis. Também fabricava, e até exportava, maquinaria de moagem, e
no final do século começou igualmente a fabricar maquinaria eléctrica.
A produção industrial húngara consistia em bens de consumo, especialmente produtos
alimentares. Estes incluíam, além da farinha, açúcar refinado (a partir da beterraba),
frutas em conserva, cerveja e bebidas alcoólicas. Estas eram as respostas da Hungria à
ênfase da Áustria e da Boémia nos têxteis.
Na Boémia e na Silésia Austríaca, de algum modo mais bem dotadas de carvão que o resto
do Império, as indústrias metalúrgicas modernas desenvolveram-se da década de 1830 em
diante. Estas indústrias incluíam, não apenas a produção primária de ferro-gusa, como
também a refinação e o fabrico, a par de algumas fábricas de maquinaria e de
máquinas-ferramenta. Também se criaram algumas indústrias químicas pesadas.
97
Em resumo, a Monarquia Habsburga, que em termos industriais tinha estado ao mesmo ou
mesmo à frente dos desunidos Estados Alemães na primeira metade do séc. XIX, caiu
para muito atrás do crescimento industrial do Império Alemão Unificado após 1871. na
metade ocidental (austríaca) da Monarquia, a indústria continuou a crescer, regular e não
espectacularmente, ao passo que a da metade oriental (húngara) disparou depois de
aproximadamente 1867. No começo do séc. XX, a parte ocidental encontrava-se
sensivelmente ao mesmo nível de desenvolvimento da média da Europa Ocidental; a região
oriental, embora muito atrás da ocidental, estava, apesar de tudo, bem à frente do resto
da Europa Oriental.
Europa Meridional e Oriental
Uma primeira característica comum é o insucesso em se industrializarem
significativamente antes de 1914, com os consequentes baixos níveis de rendimento per
capita e uma elevada incidência de pobreza.
Segunda característica comum: níveis abissalmente baixos de capital humano. Entre as
maiores nações, a Itália, a Espanha e a Rússia situavam-se em último lugar, quer em taxas
de alfabetização adulta quer em termos de taxas de frequência da escola primária, e os
países mais pequenos do sudeste da Europa não se distanciavam muito. Quanto a
matrículas na escola primária, a Roménia e a Sérvia estavam à frente da Rússia, mas atrás
da Espanha e da Itália.
Terceira característica comum: teve um peso importante nas suas possibilidades de
desenvolvimento económico: a falta de qualquer reforma agrária significativa, com
consequentes baixos níveis de produtividade agrícola.
Quarta característica comum: às nações atrasadas, todas sofreram, em diferentes graus,
de governos autocráticos, autoritários, corruptos e ineficientes.
Península Ibérica
No séc. XIX , as histórias económicas da Espanha e de Portugal são tão semelhantes que é
conveniente analisá-las como se de uma se tratasse. Ambas emergiram das Guerras
Napoleónicas com sistemas económicos primitivos, e mesmo arcaicos, e regimes políticos
reaccionários. Este último aspecto fomentou sublevações revolucionárias em ambos os
países em 1820, embora as revoluções acabassem por se frustar, conduziram a guerras
civis endémicas que interferiram com a actividade económica normal e impossibilitaram
qualquer política económica coerente. Finanças públicas deploráveis afligiram ambos os
países.
A baixa produtividade agrícola permaneceu uma fraqueza estrutural de ambas as
economias. A Espanha ensaiou uma reforma agrária, mas que resultou em fiasco completo.
Como o governo da França revolucionária, também confiscou as terras da Igreja, das
municipalidades e dos aristocratas que se lhe opuseram nas guerras civis, com a intenção
de as vender aos camponeses. O resultado foi que a maior parte da terra acabou na posse
dos que já eram abastados, tanto aristocratas como a burguesia urbana.
98
Portugal nem sequer tentou uma reforma agrária. Entretanto, o aumento da população de
ambos os países resultou no cultivo de mais cereais – o meio de subsistência – em solos
inferiores e em menos pastagens para o gado, provocando uma queda acrescida da
produtividade.
Apesar desta perspectiva globalmente deprimente, existiram alguns casos interessantes –
variações regionais sobre um tema de atraso. Na Catalunha, em Barcelona e seus
arredores desenvolveu-se uma moderna indústria algodoeira na década de 1790 que,
graças a tarifas proteccionistas e a um mercado colonial protegido em Cuba e Porto Rico,
floresceu até que à perda das últimas colónias, em 1900.
Existiam indústrias vinícolas vocacionadas para a exportação na Andaluzia (a região de
Jerez, de onde o sherry inglês e o xerez português) e, em Portugal, na região do Porto
(«Oporto»). Em 1850, os vinhos e as aguardentes representavam 28% das exportações
espanholas, mas a temida filoxera, uma doença da vinha que já tinha atingido a França,
espalhou-se pela Espanha nas últimas décadas do século, com um efeito devastador. Em
1913, as vinhas não chegavam aos 12% das exportações espanholas.
Na década de 1820, a crescente procura externa de chumbo para canalizações resultou
na abertura de jazidas de chumbo extremamente ricas no sul de Espanha. Entre 1869 e
1898, altura em que foi ultrapassada pelos Estados Unidos, a Espanha foi a maior
produtora mundial de chumbo.
Em 1900, as exportações de minérios e de metais representavam cerca de um terço do
total das exportações. Infelizmente para a Espanha, a maior parte das exportações era
efectuada em bruto (chumbo e cobre) ou em minério (ferro), com poucos benefícios para
a economia interna.
O capital estrangeiro também predominou noutros sectores da economia especialmente na
banca e nos caminhos-de-ferro. Antes de 1850, os desenvolvimentos nestas duas áreas
tinham sido insignificantes; a banca era dominada pelo Banco de Espanha, essencialmente
um instrumento das finanças governamentais, e no final da década de 1840 apenas tinham
sido construídos alguns quilómetros de via-férrea. Na década de 1850, numa das
frequentes mudanças de governo, o novo regime deu um encorajamento especial aos
investidores estrangeiros (sobretudo franceses) para criarem bancos e construírem
ferrovias. Infelizmente, quando as principais linhas foram construídas e a garantia de
dividendos acabou, os caminhos-de-ferro não tinham desenvolvido um tráfego suficiente
para fazer face aos custos de operação, e a maioria das linhas férreas entrou em
falência. Só no final do século é que os caminhos-de-ferro se tornaram um negócio
rentável.
Portugal inaugurou em 1856 a sua primeira via-férrea, uma curta linha que partia de
Lisboa, e a história dos caminhos-de-ferro portugueses é ainda mais triste que a de
Espanha . construídas com capital estrangeiro (especialmente francês), as suas vias
férreas sofreram com a fraude e a corrupção, bem como com falências, e pouco fizeram
pelo desenvolvimento da economia.
A Espanha tinha algumas jazidas de carvão (Portugal nenhuma), mas não eram de boa
qualidade e estavam mal localizadas para fins de exploração industrial. Apesar disso, nas
duas últimas décadas do séc. XIX cresceu uma pequena indústria do ferro e do aço ao
99
longo da costa setentrional, nas proximidades de Bilbau. No séc. XX, a região tornou-se
uma das mais ricas e economicamente desenvolvidas da Espanha. Nada de semelhante se
verificou em Portugal.
Itália
Relegada para a rectaguarda da mudança económica desde o começo da Idade Moderna,
dividida e dominada por poderes estrangeiros, há muito que a Itália tinha perdido a
primazia nos assuntos económicos.
O Congresso de Viena reimpôs o desconcertante mosaico de principados nominalmente
independentes, mas a maior parte, incluindo os Estados Papais e o Reino das Duas Sicílias,
estava sob o domínio ou influência do Império Habsburgo. A Áustria anexou directamente
a Lombardia e Veneza; duas das províncias economicamente mais avançadas, e antigas
sedes de famosas indústrias e de comércio, foram separadas do resto da Itália por
barreiras tarifárias da Áustria.
O reino de Sardenha, o único Estado genuinamente independente, era uma mistura
curiosa, uma nação artificial composta por quatro grandes subdivisões com diferentes
climas, recursos, instituições, e até línguas. A ilha da Sardenha, estiolava-se na
estagnação do feudalismo; os seus senhores absentistas não tinham interesse nenhum em
melhorar as suas propriedades, e, consequentemente, a população iletrada vivia nas
condições mais primitivas.
A Sabóia que deu ao Reino, e mais tarde à Itália, a sua dinastia reinante, pertencia
cultural e economicamente à França. Génova, o centro comercial, mantivera-se uma
república independente durante vários séculos antes de Napoleão.
Os diferenciais económicos regionais, importantes em quase todos os países, eram
especialmente marcados em Itália. Aí, o clivo norte-sul, ainda hoje evidente, existia desde
a Idade Média. A produtividade agrícola era mais elevada no Norte, especialmente no
Piemonte e no vale do Pó, e havia também alguma indústria. E foi no Norte,
economicamente mais desenvolvido, que se iniciou o movimento de unificação nacional.
Um homem notável destacou-se no reino de Sardenha. Foi o Conde Camillo Benso di Cavour
– proprietário fundiário e agricultor progressista que também patrocinara um
caminho-de-ferro, um jornal e um banco e que, em 1850, se tornou ministro da Marinha,
do Comércio e da Agricultura na recentemente monarquia constitucional do seu pequeno
país. No ano seguinte acumulou
pasta das Finanças, e em 1852 tornou-se
primeiro-ministro. Afirmou repetidamente que a ordem financeira e o progresso
económico eram as duas condições indispensáveis para Piemonte assumir, aos olhos da
Europa, a primazia da Península Itálica. Para alcançar estes objectivos, defendeu o auxílio
económico externo, incluindo o investimento de capitais estrangeiros. Entre 1850 e 1855,
as exportações aumentaram 50%, enquanto as importações quase triplicaram; os
investimentos franceses financiaram a conseguinte balança comercial altamente
deficitária.
Uma parte da dívida pública tinha sido contraída para saldar mal-sucedidas guerras de
1848 e 1849, e ainda mais para preparar a agora triunfante guerra de 1859, em que o
reino da Sardenha, com o auxílio militar e financeiro da França, derrotou o Império
Austríaco e preparou o caminho para o reino unificado da Itália, em 1861.
100
Com a maior parte da mão-de-obra empregada na agricultura de baixa produtividade, a
Itália tinha um longo caminho a percorrer sob as melhores circunstâncias. A unificação
mitigou um dos maiores obstáculos ao desenvolvimento económico, a fragmentação do
mercado; mas sem a exploração das vantagens dos transportes e das comunicações, até
esta realização teria sido ilusória.
Nenhuma lei podia remediar a pobreza de recursos naturais, e apenas a legislação mais
sensata e a administração mais judiciosa podiam superar a escassez de capital.
Infelizmente para a Itália, os esforços de Cavour durante esses anos alucinantes levaram
à sua morte prematura apenas 3 meses depois da proclamação do Reino, assim privando o
país as sua sensata e inspirada chefia.
Perto do fim da década de 1890, após a guerra tarifária com a frança e com uma nova
injecção de capital estrangeiro, desta vez da Alemanha, a Itália vivenciou um pequeno
crescimento industrial que durou, com flutuações, até depois do início da I Guerra
Mundial. A Itália não era ainda uma nação industrial, mas tinha feito um começo tardio.
Sudeste da Europa
Os cinco pequenos países que ocupavam o extremo sudeste do Continente Europeu –
Albânia, Bulgária, Grécia, Roménia e Sérvia – eram, com a possível excepção de Portugal,
os países mais pobres da Europa a ocidente da Rússia.
No princípio do séc. XX eram todos predominantemente rurais e agrários, com 70 ou 80%
da mão-de-obra empregada na produção primária. A tecnologia era primitiva e a
produtividade e o rendimento per capita correspondentemente baixos. Havia uma ligeira
variação dentro do grupo, estando a Roménia ligeiramente melhor que as outras e a
Albânia na cauda.
Apesar da sua pobreza, taxas de natalidade elevadas, combinadas com taxas de
mortalidade moderadamente decrescentes, engendraram um crescimento acentuado da
população a partir de meados do séc. XIX. Houve migração para áreas urbanas e para os
países mais desenvolvidos do Ocidente e a alguma migração para outros continentes,
especialmente de Gregos para os Estados Unidos.
Não havia uma abundância de recursos naturais que aliviasse a pressão populacional.
Grande parte da terra era montanhosa e inadequada para cultivo, especialmente na Grécia
e, menos marcadamente, na Albânia, na Bulgária e na Sérvia. A Roménia estava mais bem
dotada de terra arável, mas, empregando-se técnicas primitivas de cultivo, não era ainda
especialmente produtiva. Existiam algumas pequenas jazidas de carvão muito dispersas, e
pequenas jazidas de metais não ferrosas, mas mal tinham começado a ser exploradas, pelo
capital estrangeiro, quando eclodiu a I Guerra Mundial. O recuso mineral mais importante
era o petróleo da Roménia. Várias empresas estrangeiras, sobretudo alemãs, começaram a
fazer perfurações na última década do séc. XIX.
De acordo com o seu carácter agrário, o comércio externo de todos estes países
consistia na exportação de produtos agrícolas e na importação de produtos fabricados,
principalmente bens de consumo. Os cereais, sobretudo o trigo, representavam cerca de
70% das exportações da Roménia e da Bulgária. A Sérvia, com menos terra arável,
101
exportava principalmente porcos vivos e, pouco antes da guerra, produtos suínos
processados, ameixas secas e frescas e a sua famosa aguardente de ameixa, a slivovica. A
Grécia, com ainda menos terra arável e não muito adequada ao cultivo de cereais,
exportava sobretudo uvas e passas de uvas, bem como algum vinho e aguardente.
Em contraste com a lenta difusão de tecnologia agrícola e industrial, a tecnologia
institucional de bancos e dívidas externas espalhou-se rapidamente. Em 1885, todos os
quatro Estados das Balcãs tinham criado bancos centrais com poderes exclusivos de
emissão de notas.
Em 1898, a Grécia chegou a um ponto tão grave de endividamento ao estrangeiro, que teve
de concordar com uma Comissão Financeira Internacional criada pelas grandes potências
para supervisionar as suas finanças. Por fim, todos os outros estados dos Balcãs, com
excepção da Roménia, tiveram de aceitar uma verificação estrangeira semelhante.
Grande parte dos empréstimos externos foi contraída para a construção de redes
ferroviárias, principalmente por conta do Estado.
Depois de aproximadamente 1895 emergiu um pequeno sector industrial em cada um dos
países, principalmente de indústrias de bens de consumo, mas nada comparável aos
desenvolvimentos industriais anteriormente verificados na Europa Ocidental no séc. XIX.
Na prática, pode dizer-se que a indústria moderna não tinha ainda penetrado no sudeste
da Europa antes da I Guerra Mundial.
Rússia Imperial
No princípio do séc. XX, o Império Russo era geralmente considerado uma das grandes
potências. O seu território e população, de longe maiores que os de qualquer outra nação
europeia, fazia merecer aquele estatuto. Também em termos económicos brutos a Rússia
se destacava: em produção industrial ocupava o quinto lugar mundial, depois dos Estados
Unidos, da Alemanha, da Grã-Bretanha e da França. Tinha grandes indústrias têxteis, e
especialmente de algodão e linho, e também indústrias pesadas: carvão, ferro-gusa e aço.
Era a segunda maior do mundo (depois dos Estados Unidos) em produção de petróleo, e
durante alguns anos, no fim do séc. XIX, esteve em primeiro lugar. Porém, estes valores
são enganadores enquanto indicadores do poderio económico da Rússia.
A Rússia continuava a ser uma nação predominantemente agrária, com mais de dois terços
da sua mão-de-obra ligados à agricultura e a produzir mais de metade do rendimento
nacional. A produtividade, especialmente na agricultura, era abissavelmente baixa,
embaraçada que estava por uma tecnologia primitiva e pela escassez de capital.
Os começos da industrialização russa têm sido detectados no reinado de Pedro, o Grande,
e mesmo antes mas, exceptuando a indústria oitocentista do ferro do Ural, estas
primeiras empresas industriais eram empreendimentos «de estufas» relacionados com as
necessidades do Estado Russo e não eram economicamente viáveis. Na primeira metade do
séc. XIX, especialmente na década de 1830, a industrialização tornou-se mais visível. A
maioria destes trabalhadores era de servos formais que descontavam dos seus salários
pagamentos em dinheiro aos seus senhores, em vez dos habituais pagamentos em trabalho.
Paradoxalmente, havia igualmente uma série de empresários-servos.
102
A indústria mais dinâmica e de crescimento mais rápido foi a dos têxteis de algodão,
principalmente na região de Moscovo, e as refinarias de açúcar de beterraba da Ucrânia
ocupavam um distante segundo lugar. São Petersburgo vangloriava-se de várias fábricas
de algodão grandes e modernas e também de algumas oficinas metalúrgicas e de
maquinaria, como também a Polónia Russa.
A Guerra da Crimeia revelou singelamente o atraso da indústria e da agricultura russas e
preparou, indirectamente, o caminho para uma série de reformas, a mais notável das quais
foi a «emancipação dos servos» em 1861. Simultaneamente, o governo encorajou um
programa de construção de vias-férreas com base em capital e tecnologia importadas e
reorganizou o sistema bancário para permitir a introdução de técnicas financeiras
ocidentais. Os sinais da eficácia das novas políticas tornaram-se evidentes em meados da
década de 1880 e no «grande arranque» de produção industrial na década de 1890.
Muito do mérito deste grande arranque deve-se ao programa de construção de redes
ferroviárias, especialmente ao da Linha Transiberiana, estatal iniciada em 1891, e à
expansão associada das indústrias mineira e metalúrgica.
A Donbas, nome por que a bacia é conhecida (sudeste da Ucrânia), possuía grandes jazidas
de carvão, mas estava muito longe dos principais centros populacionais. Nos arredores de
Krivoi Rog, descobriram-se jazidas muito ricas em minério de ferro, pelo mesmo motivo
não puderam ser economicamente exploradas. Na década de 1880, empresários franceses
persuadiram o Governo Czarista a construir uma via-férrea que ligasse as duas zonas e
instalaram altos-fornos em ambos os locais, criando assim a primeira união metalúrgica
«de extracção cruzada» do mundo. A produção de carvão e ferro-gusa subiu em flecha.
O Governo procurou, por vários meios, encorajar a industrialização. Contraiu empréstimos
externos para financiar a construção de caminhos-de-ferro estatais e garantiu as
obrigações dos caminhos-de-ferro pertencentes a empresas privadas. Onerou altamente
as importações de produtos de ferro e aço, mas ao mesmo tempo facilitou a introdução do
equipamento mais recente de fabrico de ferro e aço e de produtos de engenharia. Os
produtos da Silísia Polaca e de São Petersburgo, bem como do sudeste da Ucrânia,
beneficiaram com estas medidas.
No meio século que antecedeu a I Grande Guerra, a economia russa passou por mudanças
substanciais no sentido de um sistema mais moderno e tecnologia, proficiente, mas
manteve-se bastante atrás das economias ocidentais mais avançadas, em particular da
alemã. A sua fraqueza económica agudizou-se durante a guerra, contribuindo para a
derrota russa e abrindo caminho às revoluções de 1917.
Japão
A última entrada, e a mais surpreendente, no rola das nações que iniciaram a
industrialização no séc. XIX – e a única completamente alheia à tradição europeia – foi a
do Japão. Na primeira metade dos século, o Japão manteve a sua política de exclusão da
influência estrangeira, em especial a Ocidental, mais eficazmente que qualquer outra
nação oriental. Desde o começo do séc. XVII, o governo dos Tokugawa tinha proibido o
comércio com o exterior e tinha proibidos os Japoneses de viajarem para o estrangeiro. A
sociedade estava estruturada em rígidas classes sociais, ou castas, nalguns aspectos
semelhantes ao feudalismo da Europa medieval. O nível de tecnologia era semelhante ao
da Europa do princípio do séc. XVII. Apesar destas limitações, a organização da economia
103
era surpreendentemente sofisticada, com mercados activos e um sistema de crédito. O
nível de alfabetização era substancialmente mais elevado que o dos países da Europa
Meridional e do Leste.
Em 1853, e de novo em 1854, o comodoro Matthew Perry, um comandante naval
norte-americano, entrou na baía de Tóquio e, ameaçando bombardear a cidade, forçou o
xógum Tokugawa a encetar relações diplomáticas e comerciais com os Estados Unidos. Em
breve, outras nações ocidentais conseguiram privilégios semelhantes aos que tinham sido
concedidos aos Estados Unidos.
A fraqueza do xogunato dos Tokugawa face às usurpações ocidentais deu origem a motins
nacionalistas e a um movimento para repor o Imperador, que durante séculos tinha apenas
desempenhado funções cerimoniais, numa posição central da governação. Em 1867, subiu
ao trono um jovem imperador vigoroso e inteligente, Mutsu-hito; no ano seguinte, o
partido do Imperador forçou o Xógum a abdicar e levou o Imperador para Tóquio, a
capital de facto. Este acontecimento marcou o nascimento do Japão Moderno, é chamado
Restauração Meiji (Meiji significa «governo iluminado» e foi o nome escolhido por
Mutsu-hito para designar o seu reinado). A Era Meiji durou desde 1868 até à morte de
Mutsu-hito, em 1912.
Imediatamente depois de conquistar o poder, o novo Governo mudou o tom do movimento
nacionalista. Em vez de tentar expulsar os estrangeiros, o Japão cooperou com eles mas
mantendo-os a uma meiga distância. O antigo sistema feudal foi abolido e substituído por
uma administração formalista altamente centralizada, moldada no sistema francês, por um
exército de tipo prussiano e por uma marinha à inglesa. Métodos industriais e
financeiros foram importados de muitos países, mas em particular dos Estados Unidos.
Homens jovens e inteligentes foram estudar para o estrangeiro, os métodos ocidentais da
política e governação, ciência militar, tecnologia industrial, comércio e finanças, com o
objectivo de adoptar os métodos mais eficientes. Criaram-se no Japão novas escolas
segundo os modelos ocidentais e convidaram-se peritos estrangeiros para formarem os
seus homólogos japoneses. Porém, o Governo foi cauteloso em estabelecer rígidos limites
às suas funções e em se certificar de que abandonavam o país de pois de cessados os seus
contratos, para os impedir de estabelecerem posições de domínio.
Os problemas financeiros tinham sido uma das causas de descontentamento para com o
antigo regime dos Tokugawa, e o novo Governo Meiji herdou uma imensidão de papel
moeda inconvertível, que foi forçado a aumentar nos primeiros anos de transição. Em
1873 decretou um imposto sobre a terra calculado com base na produtividade potencial
da terra arável, sem atender à produção real. Isto teve um efeito duplamente benéfico:
por uma lado assegurou ao Governo uma receita segura ( à custa dos camponeses, é bom
não esquecer); em segundo lugar, garantiu que a terra seria utilizada da melhor forma,
todos os que fossem incapazes de maximizar os rendimentos perdê-la-iam ou seriam
forçados a vendê-las aos que o conseguiam.
O Japão tinha poucos recursos naturais . as duas indústrias têxteis tradicionais do Japão
baseadas em matérias-primas nacionais, a seda e o algodão, tiveram destinos muito
diferentes. Pouco depois da liberalização do comércio, a indústria do algodão foi
completamente aniquilada pelos produtos fabricados no Ocidente, especialmente na
104
Grã-Bretanha. A indústria da seda, por outro lado sobreviveu, e a sua parte mais próxima
do sector agrário, a produção do fio de seda em bruto a partir de casulos, até floresceu.
A outra grande exportação agrária era de chá, que nos primeiros anos da Era Meiji foi
tão importante como a seda; porém a sua importância relativa declinou gradualmente com
o crescimento da população e do rendimento nacionais.
Embora a iniciativa governamental tenha sido responsável pela introdução da maioria dos
elementos tecnológicos ocidentais, não foi intenção do Governo proibir a iniciativa
privada. Pelo contrário, uma das suas palavras de ordem era «desenvolver a indústria e
promover a iniciativa».
As indústrias pesadas- ferro, aço, engenharia e químicos – desenvolveram-se mais
lentamente, e fizeram-no recorrendo a grandes subsídios e à protecção tarifária, sendo
já auto-suficiente no fabrico dos seus produtos por volta de 1914.
A I Guerra Mundial representou um grande benefício para a economia japonesa. Ao entrar
na guerra ao lado dos Aliados, o Japão teve também a possibilidade de se apropriar de
colónias alemãs no Pacífico e de concessões na China.
Globalmente a transição económica do Japão de uma sociedade atrasada e tradicional na
década de 1850 para uma importante nação industrial no tempo da I Guerra Mundial foi
um feito espantoso. A transição económica do Japão teve também consequências políticas.
Em 1894-95, o Japão derrotou rapidamente a China numa curta guerra e juntou-se ao
grupo das nações imperialistas ao anexar território chinês (nomeadamente Taiwan, que
mudou o nome para Formosa) e demarcando uma esfera de influências na própria China.
Apenas em 10 anos o Japão derrotou decisivamente a Rússia tanto em terra como no mar.
as recompensas desta proeza foram a metade meridional da ilha de Sacalina e os
interesses russos em Port Arthur e na península chinesa de Liaodong, bem como o
reconhecimento russo da predominância japonesa na Coreia, que o Japão anexou em 1910.
Os Japoneses provaram, assim, que podiam jogar o jogo do homem branco.
105
106
Cap. XI
O crescimento da economia mundial
O período de crescimento mais rápido ocorreu entre o princípio da década de 1840 e
1873, quando o comércio total aumentou anualmente mais de 6% - cinco vezes mais
rapidamente que o crescimento populacional e três vezes mais que o aumento da produção.
A movimentação internacional de pessoas e capitais – migração e investimento estrangeiro
– também aumentou rapidamente. No princípio do séc. XX era já possível falar
significativamente duma economia mundial, na qual praticamente todas as partes
habitadas tinham participação, ainda que mínima, embora a Europa fosse, de longe, a mais
importante. Ela era, de facto o centro dinâmico que estimulava o todo.
A Grã-Bretanha opta pelo comércio livre
O Governo Britânico tinha começado a alterar o regime proteccionista no fim do séc.
XVIII, mas o eclodir da Revolução Francesa e das Guerras Napoleónicas protelou os seus
esforços. Na verdade, o bloqueio britânico e o Sistema Continental representavam formas
extremas de colisão com o comércio internacional.
A defesa de Adam Smith do comércio internacional livre proveio da sua análise dos
ganhos da especialização e divisão do trabalho quer entre nações quer entre os indivíduos.
David Ricardo, no seu Princípios de Economia Política (1819), supôs (incorrectamente) que
Portugal tinha uma vantagem absoluta na produção de tecidos e de vinho, quando
comparado com Inglaterra, mas que o custo relativo de produzir vinho era inferior;
nessas circunstâncias, demonstrou que Portugal teria toda a vantagem em especializar-se
na produção de vinhos e em comprar tecidos à Inglaterra. Este era o princípio da
vantagem comparativa, a base da teoria do moderno comércio internacional.
Tantos os argumentos de Smith como os de Ricardo para o comércio livre se fundaram em
campos puramente lógicos. Para terem quaisquer efeitos práticos na política, estes
argumentos tinham de convencer grandes grupos de gente influente de que o comércio
livre os beneficiaria. Em 1820, um grupo de comerciantes londrinos dirigiu uma petição ao
Parlamento no sentido de este liberalizar o comércio internacional. Por coincidência,
aproximadamente na mesma altura, vários homens relativamente jovens apostados em
modernizar e simplificar os processos arcaicos de governação ascenderam a posições
influentes no Partido Tory, que então governava. Entre eles encontrava-se Robert Peel,
que, enquanto ministro do Interior; reduziu o número de crimes capitais de mais de 200
para 100; e criou o Corpo da Polícia Metropolitana – o primeiro do género, cujos membros
eram chamados bobbies ou peelers. Outro dos chamados tories liberais foi William
Husskisson; que, como presidente da Comissão do Comércio, simplificou em muito e
reduziu o labirinto de restrições e impostos que impediam o desenvolvimento do comércio
internacional. A reforma parlamentar de 1832 estendeu os direitos à classe média urbana,
maioritariamente favorável a um comércio livre.
O pilar e o símbolo do sistema proteccionista do Reino Unido (que inclui a Irlanda a partir
de 1801) foram as chamadas Corn Laws, impostos sobre a importação de cereais
panificáveis. Após anteriores tentativas mal sucedidas para as revogar ou modificar,
Richard Cobden, um industrial de Manchéster, formou, em 1839, a Liga contra as Corn
107
Laws e montou uma forte e eficaz campanha para influenciar a opinião pública. Em 1841, o
governo dos Whigs, então no poder, propôs reduções nas tarifas de trigo e do açúcar,
quando estas medidas foram derrotadas, foram convocadas novas eleições gerais.
Na campanha eleitoral, os Whigs, procurando lucrar com o sentimento anti-Corn Laws,
propuseram uma redução (não revogação) das Corn Laws, ao passo que os Tories
defenderam o statu quo. Os Tories venceram, mas o novo primeiro ministro, agora Sir
Robert Peel, já tinha decidido efectuar profundas revisões no sistema fiscal, incluindo a
abolição de tarifas de exportação, a eliminação ou redução de muitas tarifas de
importação, mas não dos impostos sobre os cereais, e a criação dum imposto sobre o
rendimento para cobrir as receitas cessantes.
Peel introduziu uma proposta de lei para revogar as Corn Laws, que, com o apoio da
maioria dos Whigs foi aprovada em Janeiro de 1846, apesar da oposição interna da maior
parte do seu próprio partido. Na sequência da revogação das Corn Laws, o moderno
sistema político inglês – pelo menos até 1914 – começou a tomar forma.
Os Whigs, depois conhecidos como Liberais, tornaram-se o partido do comércio livre e
das indústrias, ao passo que os Tories também conhecidos por Conservadores,
continuaram a ser o partido dos proprietários de terras e, porventura, do imperialismo.
A era do comércio livre
O grande desenvolvimento que se seguiu no movimento para o comércio livre foi um
notável tratado de Comércio, o Tratado de Cobden-Chevalier, ou Tratado Anglo-Francês
de 1860.
Parte da política proteccionista da França consistia numa simples proibição imposta à
importação de todos os têxteis de algodão e lã e em tarifas muito elevadas sobre outros
produtos, incluindo mesmo matérias-primas e bens intermédios. Depois da Guerra da
Crimeia, na qual a Grã-Bretanha e a França tinham sido aliadas, Napoleão III quis
cimentar esses novos laços de amizade. Além do mais, embora a França tivesse
tradicionalmente seguido uma política de proteccionismo, uma forte corrente de
pensamento favorecia o liberalismo económico. O economista Michel Chevalier, enquanto
professor tinha ensinado os princípios do liberalismo económico e do comércio livre.
Nomeado por Napoleão para o Senado Francês, persuadiu o Imperador de que um tratado
de comércio com a Grã-Bretanha seria desejável.
Chevalier era amigo de Richard Cobden, famoso pela sua oposição às Corn Laws, e por
intermédio de Cobden persuadiu Gladstone, o ministro britânico das Finanças, das
vantagens dum tratado.
O tratado especificava que a Grã-Bretanha eliminaria todas as tarifas sobre as
importações de produtos franceses, com excepção do vinho e da aguardente. Devido aos
antigos laços económicos da Grã-Bretanha com Portugal, que também produzia vinho, a
Grã-Bretanha foi cautelosa ao proteger o privilégio português no mercado britânico. Por
seu lado a frança retirou as proibições à importação de têxteis britânicos e reduziu as
tarifas sobre uma grande variedade de produtos britânicos. Os Franceses desistiram do
proteccionismo extremo a favor de um proteccionismo moderado.
108
Característica importante do Tratado foi a inclusão duma cláusula de nação mais
favorecida. Isto significava se uma parte negociasse um tratado com um terceiro país, a
outra parte do tratado beneficiaria automaticamente de quaisquer tarifas mais baixas
concedidas ao terceiro país.
As consequências desta rede de tratados de comércio foram muito notáveis. A maior
parte do aumento verificou-se no comércio intra-europeu, mas as nações ultramarinas
também participaram. Outra consequência dos tratados, nomeadamente em frança mas
também em vários outros países, foi uma reorganização da indústria imposta pela
concorrência; empresas ineficientes que tinham sido protegidas por tarifas e proibições
tiveram de se modernizar e melhorar a sua tecnologia, ou fechavam as portas. Assim, os
tratados promoveram a eficiência técnica e aumentaram a produtividade.
A «Grande Depressão» e o regresso ao proteccionismo
Com a industrialização e o comércio internacional a crescerem, as flutuações estavam
mais frequentemente relacionadas com o «estado do comércio» (flutuações na procura),
tornaram-se cíclicas na sua natureza e transmitiram-se de país para país através dos
canais comerciais. A natureza cíclica dos movimentos tornou-se mais pronunciada à
medida que o século avançava.
Estatísticas posteriores distinguiram diversas variedades de «ciclos económicos», como
vieram a ser chamados: «ciclos das existências», com um prazo relativamente curto (2 ou
3 anos); movimentos com prazos maiores (9 ou 10 anos), terminando frequentemente em
crises financeiras seguidas por depressões.
Os preços, em praticamente todos os países da Europa e também nos Estados Unidos,
alcançaram um pico no princípio do século, quase no fim das Guerras Napoleónicas. As
causas foram reais (restrições de guerra) e monetárias (exigências das finanças de
guerra). Daí em diante, até meados do século, apesar das flutuações de curto prazo, a
tendência secular foi de descida.
Otto von Bismarck , criador e Chanceler do novo Império Alemão, anteriormente,
Chanceler da Prússia, um político astuto e ele próprio um latifundiário da Prússia Oriental,
viu a sua oportunidade. Os industriais da Alemanha Ocidental há muito que clamavam por
protecção; agora que os Junkers da Prússia Oriental também a exigiam, Bismarck
«acedeu» às suas exigências, condenou os tratados do Zollverein com a França e com
outras nações e, em 1879, deu a sua aprovação a uma nova lei tarifária que introduziu o
proteccionismo na indústria e na agricultura. Este foi o primeiro passo importante para o
«regresso ao proteccionismo».
Junkers – designação corrente no séc. XIX dos proprietários fundiários prussianos a
leste do rio Elba, que continuavam, ao arrepio da generalizada abolição da servidão
pessoal na Europa, a exercer com cobertura legal e até ao fim da I Guerra Mundial, uma
tutela de carácter feudal sobre os trabalhos agrícolas.
Os interesses proteccionistas em França, nunca conformados com o Tratado de
Cobden-Chevalier, ganharam força política com a derrota na Guerra Franco-Prussiana, e
ainda mais com a tarifa alemã de 1879. Em 1881, conseguiram obter uma nova lei tarifária
que reintroduziu explicitamente o princípio do proteccionismo.
109
Os adeptos do comércio livre continuaram a ter uma influência política considerável, e, em
1882, novos tratados de comércio com sete países continentais mantiveram os princípios
básicos do Tratado de Cobden-Chevalier. A tarifa de 1881 não correspondeu às exigências
proteccionistas dos agrários.
Depois das eleições de 1889 (em França), uma maioria proteccionista regressou à Câmara
dos Deputados, e foi aprovada a infame tarifa Meline de 1892. A tarifa tem sido
caracterizada como extremamente proteccionista, mas um termo mais correcto seria
«proteccionismo refinado». Embora garantisse protecção a alguns sectores da agricultura
e mantivesses a protecção industrial da tarifa de 1881, também continha várias
características defendidas pelos adeptos do comércio livre.
Houve uma quantas persistências de comércio livre neste regresso ao proteccionismo das
quais a Grã-Bretanha foi a mais notável. Desenvolveram-se movimentos políticos para a
«política de reciprocidade» e para a «preferência do Império», não conseguiram qualquer
sucesso antes da I Guerra Mundial. Os Países Baixos especializaram-se no processamento
de exportações ultramarinas como o açúcar, o tabaco e o chocolate para reexportação
para a Alemanha e outros países continentais; mantiveram, assim, uma confortável posição
de comércio livre, como também a Bélgica, que estava profundamente dependente das
suas indústrias de exportação. A Dinamarca, uma nação predominantemente agrária,
parece ter sofrido com as importações em larga escala de cereais baratos; mas os
Dinamarqueses ajustaram-se muito rapidamente, trocando o cultivo de cereais pela
criação de gado e produtos leiteiros e de aves domésticas, importando cereais baratos
para ração. Assim, a Dinamarca também se manteve no bloco de comércio livre.
Em resumo, a economia mundial do princípio do séc. XX estava mais
interdependente do que alguma vez estivera ou voltaria a estar até muito
Guerra Mundial. Na agonia e no rescaldo da guerra mundial, os povos do
especial os da Europa, descobririam, à sua própria custa, o quanto
afortunados.
integrada e
depois da II
mundo, e em
tinham sido
O padrão-ouro internacional
Ao longo da História, vários bens (por ex: terra, gado e trigo) serviram como padrões
monetários, mas o ouro e a prata foram sempre os padrões mais destacados. A função de
um padrão monetário é a de definir a unidade de valor num sistema monetário, a unidade
na qual todas as outras formas de dinheiro são convertíveis.
Depois das guerras, o Governo Britânico decidiu regressar a um padrão metálico, mas
escolheu o ouro, o padrão de facto do séc. XVIII, em detrimento da prata, embora a libra
tivesse continuado a chamar-se «esterlina». A moeda de conta (padrão de valor) era o
soberano de ouro, ou libra de ouro, definido como 113,0016 grãos de ouro fino (puro). De
acordo com os termos da lei parlamentar que criou o padrão ouro, houve que observar
três condições:
1. A Real Casa da Moeda foi obrigada a comprar e vender quantidades ilimitadas de
ouro a um preço fixo.
2. O Banco de Inglaterra – e, por extensão, todos os outros bancos – ficou obrigado,
sob solicitação, a resgatar por ouro as suas obrigações monetárias (notas
bancárias, depósitos)
3. Não se podiam impor quaisquer restrições à importação ou exportação de ouro.
110
Isto significa que o ouro serviu como derradeira base ou reserva de todas as
disponibilidades monetárias do país . a quantidade de ouro que o Banco de Inglaterra
guardava nos seus cofres determinava o montante de crédito que podiam conceder.
Durante os primeiros três quartos do séc. XIX, a maior parte dos restantes países tinha
padrões de pratas ou bimetálicos 8ouro e prata); alguns não tinham sequer um padrão
metálico.
Durante um curto período, nas décadas de 1860 e 1870, a França tentou criar uma
alternativa ao padrão-ouro internacional na forma da União Monetária latina.
Entretanto, a primeira nação, depois da Grã-Bretanha, a adoptar oficialmente o
padrão-ouro foi o novo Império Alemão. Depois da vitória sobre a França na Guerra
Franco-Prussiana, Bismarck, o chanceler alemão, exigiu à nação derrotada uma
indemnização de reparação. O Governo adoptou uma nova moeda de conta, o marco de
ouro, e constituiu o Reichsbank como o seu banco central e único emissor de moeda.
Antes da Guerra Civil, os Estados Unidos estavam tecnicamente num padrão bimetálico,
aderiram ao padrão-ouro a partir de 1879, embora o Congresso não o tivesse adoptado
legalmente senão em 1900.
A Rússia tinha adoptado um padrão nominal de prata ao longo do séc. XIX, na década de
1890, o conde Whitte decidiu que o país deveria aderir ao padrão-ouro, o que fez em
1897. nesse mesmo ano, o Japão, criou uma reserva de ouro no Banco do Japão e adoptou
oficialmente o padrão-ouro. Assim, no princípio do séc. XX, praticamente todas as
importantes nações mercantis tinham adoptado o padrão-ouro internacional. Este sistema
resistiu menos de duas décadas.
Migração e investimentos internacionais
Além do movimento mais livre de mercadorias simbolizado pela era do comércio livre,
também se verificou no séc. XIX um grande aumento no movimento internacional de
pessoas e capitais, os factores de produção além da terra.
O maior número de emigrantes saiu das Ilhas Britânicas; galeses, escoceses e irlandeses
instalaram-se no estrangeiro, principalmente nos Estados Unidos e nas colónias britânicas.
Emigrantes de língua alemã foram para os Estados Unidos e para a América Latina. Esta
também recebeu muitos novos cidadãos de Espanha e Portugal. O final do séc. XIX e os
princípios do séc. XX assistiram a uma grande migração da Itália e da Europa Oriental. Os
Italianos foram para os Estados Unidos, mas também para a América Latina,
especialmente para a Argentina. Emigrantes da Áustria-Hungria, da Polónia e da Rússia
dirigiram-se principalmente para os Estados Unidos.
Globalmente, esta vasta migração teve efeitos benéficos; aliviou as pressões populacionais
nos países fornecedores de emigrantes, assim diminuindo a tendência da descida dos
salários reais; e proporcionou aos países de muitos recursos e escassa mão-de-obra uma
oferta de trabalhadores motivados por salários mais altos que os que conseguiriam
auferir nos seus países de origem. Através de laços humanos e culturais, bem como
económicos, promoveu a integração da economia internacional.
111
Em geral, os recursos disponíveis para o investimento no estrangeiro (como também para
o investimento interno) resultaram dos enormes aumentos de riqueza e rendimento
gerados pela aplicação de novas tecnologias. Mas, ao contrário do investimento interno, o
investimento externo requer fontes especiais de fundos gerados pelo comércio e
pagamento externos.
Há duas categorias principais de fundos (ouro ou moeda estrangeira) que podem ser
usados para o investimento internacional:
· Os que provêm do saldo de exportações do comércio e mercadorias
· Os que provêm de exportações «invisíveis» como serviços de navegação, ganhos
da banca e seguros internacionais, remessas de emigrantes e juros e dividendos
de anteriores investimentos externos.
O principal incentivo ao investimento no estrangeiro é a expectativa (nem sempre
cumprida) que o investidor tem duma taxa de rentabilidade mais elevada no estrangeiro
que no seu próprio país.
Os mecanismos de investimento no estrangeiro consistem numa série de dispositivos
institucionais para a transferência de fundos de um país para outro:
- Mercados cambiais
- Mercados accionistas e obrigacionistas
- Bancos centrais
- Bancos privados de investimento e comerciais
- Corretores e muitos outros
A maioria destes dispositivos institucionais especiais, embora já existissem
anteriormente, cresceu grandemente durante o séc. XIX.
A Grã-Bretanha – ou mais precisamente, os investidores privados da Grã-Bretanha – era
de longe, o maior investidor estrangeiro antes de 1914. esta situação verificou-se apesar
de durante a maior parte do século a Grã-Bretanha ter tido uma balança comercial
desfavorável, isto é, importou mercadorias de valor superior às que exportou. Assim, para
a Grã-Bretanha, as fontes dos seus investimentos externos consistiram quase
inteiramente em exportações invisíveis. No princípio do século, os lucros da marinha
mercante britânica, a maior do mundo, foram os grandes responsáveis pela sua balança de
pagamentos favorável (e não da comercial9, e continuaram a ser decisivos até ao fim.
Cada vez mais, os lucros da banca e dos seguros internacionais e, em especial, dos antigos
investimentos no estrangeiro contribuíram para o saldo positivo.
Antes de cerca de 1850, os investidores britânicos, adquiriram títulos de dívida pública
de vários países europeus e investiram aí em empresas privadas, especialmente nas
primeiras vias-férreas francesas. As revoluções de 1848 no Continente Europeu
desencorajaram os investidores britânicos doutros investimentos nesses países. Em vez
disso, voltaram-se para as vias-férreas, minas e ranchos americanos, para investimentos
semelhantes na América Latina e, acima de tudo, para o Império Britânico.
A França era o segundo maior investidor no estrangeiro. Iniciou o século contraindo
empréstimos externos, principalmente na Grã-Bretanha e Holanda, para pagar a avultada
indemnização de reparação exigida pelos Aliados após a derrota de Napoleão. Mas a
França rapidamente estabeleceu um grande excedente de exportação no comércio de
112
mercadorias, que providenciou o grosso dos recursos para o investimento no exterior até
à década de 1870. Depois disso , os ganhos dos investimentos anteriores, como acontecia
com a Grã-Bretanha, mais que financiaram novos investimentos.
Na primeira metade do século, os franceses investiram principalmente nos seus vizinhos:
Espanha, Portugal, nos vários estados Italianos e Bélgica, e em investimentos menos
avultados na Suíça, Áustria e Alemanha Ocidental, bem como os do Império Otomano e do
Egipto – de que se arrependeriam, quando esses dois estados declararam falência parcial
em 1875-76.
Depois da aliança franco-russa de 1894, os investidores franceses, investiram quantias
astronómicas em títulos russos, tanto públicos como privados. Em 1914, no eclodir da I
Guerra Mundial, um quarto de todo o investimento externo francês estava centrado na
Rússia.
Ao contrário dos Britânicos, os Franceses apostaram menos de 10% dos seus
investimentos nas colónias francesas. Globalmente o contributo francês para o
desenvolvimento económico da Europa foi substancial, mas devido a guerras, revoluções e
outros desastres naturais e provocados pelo homem, e especialmente a enorme
catástrofe da I Guerra Mundial, os investidores e os seus herdeiros sofreram
consequências dramáticas.
A Alemanha apresenta o interessante caso duma nação que, ao longo do século, sofreu a
transição de devedora líquida para credora líquida. Desunida e pobre no princípio do
século, os Estados Alemães tinham poucas dívidas externas e ainda menos créditos no
estrangeiro. Nas décadas intermédias do século, as províncias ocidentais beneficiaram de
um influxo de capital francês, belga e britânico; este capital ajudou a desenvolver
indústrias poderosas e um forte excedente para exportação que providenciou os fundos
com que a Alemanha repatriou o capital estrangeiro e acumulou investimento no exterior.
O Governo Alemão, como o Francês, tentou por vezes socorrer-se do investimento privado
estrangeiro como arma de política externa; em 1887, vedou a bolsa de valores de Berlim
aos títulos russos e forçou mais tarde, o Deutsche Bank a empreender a construção da
linha férrea da Anatólia (chamada Berlim-Bagdade).
As mais pequenas nações desenvolvidas da Europa Ocidental – a Bélgica, os Países Baixos e
a Suíça -, todas tendo, ao longo do século, beneficiado de investimentos estrangeiros nas
suas economias, tornaram-se de igual modo credoras líquidas no final do século.
De entre os beneficiários de investimento estrangeiro, os estados Unidos eram, de longe,
os maiores. Depois da Guerra Civil, e em particular a partir do final da década de 1890, os
investidores americanos começaram a investir directamente no estrangeiro numa
diversidade de operações industriais, comerciais e agrícolas. Nos quatro anos seguintes
da I Guerra Mundial, em resultado de empréstimos americanos aos Aliados, os Estados
Unidos tornaram-se a maior nação credora do mundo.
Na Europa, o maior beneficiário singular de investimento estrangeiro era a Rússia. A rede
russa de caminhos-de-ferro, foi construída com uma grande parte de capital estrangeiro,
que foi canalizado para títulos privados (acções e obrigações) e para obrigações do
Estado ou com aval do Estado. Bancos estrangeiros, também investiram fortemente em
113
bancos comerciais russos e nas grandes empresas metalúrgicas da Bacia do Donetz, entre
outras. O que contraía mais empréstimo era o Governo Russo que utilizava o dinheiro não
só para construir vias-férreas mas também para financiar o seu exército e marinha.
Depois de 1917, os investidores perderam tudo.
A maior parte dos investimentos nos países escandinavos não só se pagou a si própria
como teve contribuições positivas no desenvolvimento das economias nas quais foi
efectuada. Os investimentos estrangeiros na Suécia, na Dinamarca e na Noruega foram,
numa base per capita, os maiores da Europa. As quantias emprestadas foram
sensatamente investidas, e, a par dos elevados níveis educacionais das populações desses
países, deve-lhes ser creditado o rápido desenvolvimento daquelas economias no final do
século XIX.
Como os países escandinavos também a Austrália, a Nova Zelândia e o Canadá tinham
volumosos investimentos estrangeiros relativamente à dimensão das suas populações, o
que ajuda a perceber as suas elevadas taxas de crescimento e altos padrões de vida no
começo do séc. XX. Tendo em conta as populações dispersas e as grandes áreas
territoriais destes três países, não é surpreendente que se tivessem especializado na
produção de bens que exigissem pouca mão-de-obra em relação à terra: lã na Austrália e
na Nova Zelândia e trigo no Canadá. Com rendimentos per capita relativamente altos, os
três países desenvolveram indústrias terciárias domésticas e alguma capacidade fabril,
mas continuaram dependentes da Europa, sobretudo da Grã-Bretanha. No princípio do
séc. XX, os Estados Unidos tinham substituído a Grã-Bretanha como maior fornecedor e
mercado estrangeiro no Canadá.
O renascer do imperialismo ocidental
Os vastos continentes da Ásia e da África participaram apenas residualmente na expansão
comercial do séc. XIX até a isso serem obrigados pelo poderio militar do Ocidente.
Apesar de regiões da Ásia, nomeadamente a Índia e a Indonésia, tivessem estado sujeitas
à influência e conquista europeias desde o princípio do séc. XVI, grande parte do
Continente continuava isolada.
A maior parte da África tinha um clima opressivo para os Europeus e uma série de
doenças desconhecidas e frequentemente letais. Tinha poucos rios navegáveis o que
tornava o Interior extremamente inacessível. A efectiva ausência de Estados políticos
organizados à semelhança dos europeus e o baixo nível de desenvolvimento económico
tornaram-na pouco atractiva para os comerciantes e empresários europeus. No entanto,
apesar dessas características negativas, uma concatenação de acontecimentos levou
inexoravelmente ao envolvimento da Ásia e da África na crescente economia mundial
antes do fim do séc. XIX.
África
A Colónia do Cabo, no extremo sul de África, tinha sido colonizada pelos Holandeses em
meados do séc. XVII e era utilizada como posto de abastecimento pelos navios da
carreira da Índia em viagem de e para a Indonésia. Os Britânicos apoderaram-se do posto
durante as Guerras Napoleónicas, especialmente a abolição da escravatura em todo o
Império em 1834 e os esforços para garantir um tratamento mais humano dos nativos,
enfureceram os Bóeres ou Africânderes (descendentes dos colonizadores holandeses).
114
No princípio, tanto as colónias Bóeres como as britânicas eram essencialmente agrárias,
mas, em 1867, a descoberta de diamantes levou a uma grande invasão de caçadores de
tesouros provenientes de todo o mundo. Em 1886 descobriu-se ouro no Transval. Estes
factos alteraram completamente a base económica das colónias e intensificaram as
rivalidades políticas.
Em outubro de 1899 começou a Guerra Sul-Africana, ou dos Bóeres. Os Britânicos
sofreram várias derrotas inicialmente, mas vieram a reorganizar-se com reforços e
ocuparam e anexaram o Transval e o Estado Livre de Orange. Pouco depois, o Governo
Britânico alterou a sua política, de repressão para a conciliação, restaurou a autonomia e
incentivou o movimento para a união com a colónia do Cabo e o Natal, que os Britânicos
tinham anteriormente anexado. Em 1910, a União Sul-Africana juntou-se ao Canadá, à
Austrália e à Nova Zelândia como domínio autónomo de pleno direito do Império Britânico.
Os Franceses no final do século, tinham conquistado e anexado um enorme território
escassamente povoado (incluindo a maior parte do deserto do Sara), que baptizaram de
África Ocidental Francesa. Em 1830, Carlos X conquista a Argélia Francesa. Em 1881,
ataques fronteiriços à Argélia perpetrados por povos tribais da Tunísia foram o pretexto
para invadir a Tunísia e criar um «protectorado». Os Franceses completaram o seu
império norte-africano em 1912 estabelecendo um protectorado na parte mais larga de
Marrocos.
A abertura do canal do Suez por uma empresas francesa, em 1869, revolucionou o
comércio mundial. Também pôs em perigo o «corredor vital» britânico para a Índia – ou
assim parecia aos Britânicos. Os Britânicos viraram-se contra os Franceses, que estavam
a expandir-se para leste a partir dos seus domínios da África Ocidental. Em Fachoda, em
1898, forças rivais francesas e britânicas defrontaram-se, mas as rápidas negociações
em Londres e Paris evitaram hostilidades mais acesas. Por fim, os Franceses retiraram,
abrindo o caminho para o Governo Britânico no que se tornou conhecido como o Sudão
Anglo-Egípcio.
A África Central foi a última região do «Continente Negro» a ser aberta à penetração
europeia. A sua inacessibilidade, clima inóspito, flora e fauna exóticas foram responsáveis
pelo seu epíteto e formidável reputação. Antes do séc. XIX, as únicas reivindicações
europeias na região eram as de Portugal: Angola na Costa Ocidental e Moçambique na
Costa Oriental.
A descoberta de diamantes na África do Sul estimulou a exploração na esperança de
descobertas semelhantes na África Central. Por fim, a ocupação francesa de Tunes em
1881, e a ocupação britânica do Egipto, em 1882, desencadearam uma luta de
reivindicações e concessões.
Para impedir as reivindicações britânicas e portuguesas, Bismarck e Jules Ferry, o
primeiro-ministro francês, convocaram uma conferência internacional sobre assuntos
africanos a realizar em Berlim, em 1884. catorze nações, incluindo os Estados Unidos,
enviaram representantes. Reconheceram o Estado Livre do Congo, encabeçado por
Leopoldo, rei dos Belgas, uma decorrência da sua Associação Internacional, e lançaram as
regras básicas de posteriores anexações. A mais importante especificava que uma nação
deve ocupar efectivamente um território para ver a sua reivindicação reconhecida.
115
Ásia
A decadência interna tinha enfraquecido seriamente a dinastia Manchu, que governava a
China desde os meados do séc. XVII.
Os interesses comerciais britânicos proporcionaram a ocasião inicial para a intervenção.
As sedas e os chás chineses encontraram um bom mercado na Europa, mas os
comerciantes britânicos tinham muito pouco para oferecer em troca, até descobrirem
que os chineses tinham um apreço especial por ópio. O governo Chinês proibiu a sua
importação, mas o comércio floresceu através de contrabandistas e funcionários
alfandegários corruptos.
Quando um honesto funcionário apreendeu e queimou, em Cantão, um grande
carregamento de ópio em 1839, os comerciantes britânicos exigiram retaliação. Lord
Palmerston, o ministro dos Negócios Estrangeiros, informou-os de que o Governo não
poderia intervir com o fim de permitir que súbditos britânicos violassem as leis do país
com que comerciavam, mas os representantes militares e diplomáticos no local
desrespeitaram essas instruções, e tomaram medidas punitivas contra os chineses. E
assim começou a Guerra do Ópio (1839-42), que terminou com o imposto Tratado de
Nanquim. De acordo com esse tratado, a China deu à Grã-Bretanha a ilha de Hong-Kong,
concordou com a abertura de mais cinco portos para comerciar sob supervisão consular,
criou uma tarifa de importação uniforme de 5% e pagou uma substancial indemnização de
reparação. O comérci9o do ópio continuou.
A China evitou a cisão completa pelas grandes potências apenas devido à grande rivalidade
entre elas. Em vez duma divisão definitiva, a Grã-Bretanha, a França, a Alemanha, a
Rússia, os Estados Unidos e o Japão contentaram-se com a concessão, por tratados
especiais, de portos, de esferas de influência e arrendamentos a longo prazo no território
chinês.
O Império Chinês entrou num estado de decadência quase visível. Sucumbiu, em 1912, a
uma revolução conduzida pelo Dr. Sun Yat-sem, médico formado no Ocidente, cujo
programa era «nacionalismo, democracia e socialismo». As potências ocidentais não
tentaram interferir na revolução, nem tão pouco ficaram preocupadas. A nova República
da China permaneceu fraca e dividida com as suas esperanças de reforma e regeneração
adiadas por muito tempo.
A Coreia do séc. XOX era um reino semi-autónomo sob governação nominal da China,
embora os Japoneses há muito que tivessem aí pretensões. A acesa rivalidade entre a
China e o Japão pelo predomínio e a pobreza em geral do país desencorajaram os
diplomatas e comerciantes ocidentais. O Japão anexou formalmente a Coreia em 1910.
Indochina é o nome frequentemente dado à vasta península do sudeste da Ásia por a
cultura da região ser essencialmente um misto das civilizações indiana e chinesa. Durante
o séc. XIX, os Britânicos, movimentando-se a partir da Índia, estabeleceram o domínio
sobre a Birmânia e os Estados Malaios e vieram a incorporá-los no Império.
Em 1858, uma expedição francesa ocupou a cidade de Saigão, na Cochinchina, e quatro
anos depois a França anexou a própria Cochinchina. Uma vez estabelecidos na Península, os
116
Franceses viram-se envolvidos em conflito com os nativos, o que os obrigou a estender a
sua protecção a regiões mais extensas que nunca. Na década de 1880 dispuseram a
Cochinchina, o Camboja, Aname e Tonquim na União da Indochina Francesa, a que
acrescentaram o Laus em 1893.
A Tailândia (ou Sião, como era designada pelos Europeus), entre a Birmânia a ocidente e a
Indochina Francesa a leste, teve a sorte de permanecer um reino independente. Embora
estivesse aberta à influência Ocidental devido a tratados desarmantes, como a maior
parte da Ásia, os seus governantes reagiram com gestos conciliatórios e ao mesmo tempo
tentaram aprender com o Ocidente a modernizar o seu reino.
Explicações do imperialismo
Depois de adoptar a tecnologia ocidental, o Japão seguiu políticas imperialistas muito
parecidas com as da Europa. Os Estados Unidos, apesar de fortes críticas internas,
embarcaram numa política de colonialismo antes do final do século. Alguns territórios
britânicos eram muito mais agressivamente imperialistas que a própria metrópole.
Faz-se por vezes uma distinção entre imperialismo e colonialismo. Assim, nem a Rússia
nem a Áustria-Hungria tinham colónias ultramarinas, mas ambas eram claramente impérios
no sentido de que governavam povos estrangeiros sem o seu consentimento.
As causas do imperialismo foram muitas e complexas. Não há uma única teoria que
explique todas as causas. De facto, o imperialismo tem sido chamado «imperialismo
económico», como se formas anteriores de imperialismo não tivessem conteúdo
económico. Uma dessas explicações diz o seguinte:
1. A concorrência no mundo capitalista torna-se mais intensa, resultando na
formação de grandes empresas e na eliminação de empresas pequenas.
2. Nas grandes empresas, o capital acumula-se mais rapidamente e, como o poder de
compra das massas é insuficiente para adquirir todos os produtos da indústria de
larga escala, a taxa de lucro decai.
3. À medida que o capital se acumula e a produção das indústrias capitalistas não é
escoada, os capitalistas recorrem ao imperialismo para obterem domínio político
sobre regiões nas quais podem investir o excedente de capital e vender os seus
produtos em excesso.
Em última análise, o imperialismo moderno, bem como político ou económico que é, deve
ser encarado como um fenómeno psicológico e cultural.
117
118
Cap. XII
Sectores estratégicos
Há três áreas que têm de ser analisadas com alguma profundidade para que o processo de
industrialização seja inteligível – agricultura, finanças e banca e o papel do Estado nos
assuntos económicos.
Agricultura
Uma das maiores mudanças estruturais ocorridas na economia do séc. XIX foi o declínio
da dimensão relativa do sector agrícola. Isso não implica, que a agricultura tivesse
deixado de ser importante; muito pelo contrário. O pré-requisito dum declínio na
dimensão relativa foi o aumento da produtividade agrícola, sendo a dimensão do declínio
da primeira proporcional ao aumento da última. Um aumento da produtividade agrícola
pode contribuir para o desenvolvimento económico global, de cinco formas possíveis:
1. O sector agrícola pode fornecer um excedente de população (mão-de-obra) que se
ocupa de actividades não agrícolas.
2. O sector agrícola pode fornecer produtos alimentares e matérias-primas para o
sustento da população não agrícola.
3. O sector agrícola pode servir como mercado para a produção das indústrias e
para o sector terciário.
4. Tanto através de investimento voluntário como de impostos, o sector agrícola
pode fornecer capital para investir em sectores não agrícolas.
5. Através das exportações agrícolas, o sector agrícola pode fornecer moeda
estrangeira que permita aos outros sectores obterem as entradas necessárias de
bens de capital ou de matérias-primas que não estão internamente disponíveis.
Não é necessário que o sector agrícola desempenhe todas estas cinco funções para uma
sociedade se desenvolver economicamente, mas é difícil imaginar uma situação na qual o
desenvolvimento possa verificar-se sem o apoio da agricultura em, pelo menos, duas ou
três delas. E, para que isso aconteça a produtividade tem de aumentar.
O próspero sector agrário também proporcionou um pronto mercado para a indústria
britânica. Na verdade, a população rural da nação de antes de meados do séc. XIX
constituiu, para a maior parte das indústrias, um mercado maior que o das nações
estrangeiras. Embora apenas uma porção ínfima da receita agrícola fosse investida na
indústria, a riqueza agrária contribuiu substancialmente para a criação de
infra-estruturas económicas e sociais: canais e portagens no séc. XVIII e vias férreas no
séc. XIX. Globalmente a agricultura britânica desempenhou um papel decisivo na ascensão
da indústria britânica.
O papel da agricultura no Continente, diferiu do da britânica, e também de região para
região. Houve uma estreita correlação entre produtividade agrícola e industrialização de
sucesso, com um gradiente de noroeste para sul e leste. A reforma agrária foi
frequentemente um pré-requisito da melhoria substancial na produtividade.
Basicamente a reforma agrária envolve uma mudança no sistema da propriedade fundiária.
119
O movimento de vedação dos campos em Inglaterra, que resultou na criação de
explorações compactas e relativamente grandes no lugar do sistema de campos abertos,
pode ter-se por uma espécie de reforma agrária. A Revolução Francesa, que aboliu o
Antigo Regime e confirmou aos proprietário-camponeses autónomos franceses a posse das
suas pequenas quintas, foi um tipo diferente de reforma agrária. A Suécia e a Dinamarca
aboliram a servidão na última parte do séc. XVIII e instituíram procedimentos de
vedação dos campos que, em meados do séc. XIX, tinham dado origem a uma classe de
verdadeiros proprietários camponeses.
Noutros países, a reforma agrária teve um resultado menos feliz. Na Monarquia
Habsburga, José II tentou, na década de 1780, aliviar os fardos que pesavam sobre o
campesinato, com resultados medíocres; a emancipação total teve de esperar pela
revolução de 1848.
Em Espanha e em Itália, tentativas timoratas de reforma agrária colidiram com as
necessidades governamentais de receitas, e foram eficazmente reprimidas.
Os Estados Balcânicos herdaram os seus sistemas de propriedade fundiária do período do
domínio turco, mas não fizeram tentativas sérias para os alterarem.
A Rússia Imperial distinguiu-se por passar por dois tipos muito distintos de reforma
agrária em duas gerações sucessivas. A emancipação dos servos, empreendida
relutantemente em 1861; os antigos servos, embora libertados dos seus senhores,
pertenciam agora compulsivamente à comuna camponesa, a mir, para dela saírem, tinham
de obter um passe especial, mas, mesmo que partissem, eram ainda obrigados a pagar a
sua parte de impostos e pagamentos liberatórios. A seguir à Revolução de 1905-6, o
Governo aboliu outros pagamentos liberatórios e decretou a chamada Reforma de
Stolypine (nome do ministro que a ideou), que previa a propriedade privada da terra e a
consolidação de parcelas em quintas compactas. Em resultado desta «aposta nos fortes»,
a produtividade da agricultura russa começou a ascender, mas todo o país foi, pouco
depois, submerso pela guerra e pela revolução.
O desempenho da agricultura francesa é, à primeira vista, tão contraditório e paradoxal
como o da indústria francesa. A França frequentemente acusada de ser orientada para a
agricultura de subsistência e tecnicamente atrasada, também tinha muitos agricultores
progressistas. Em 1882, quando o morcellement (desmembramento da propriedade)
estava no seu auge, havia cerca de 27% da terra em parcelas de 10 hectares, situavam-se
no Sul e no Ocidente, menos férteis, e mais de 45% da terra continham-se em
propriedades de 40 hectares ou mais, principalmente nas regiões mais férteis do Norte e
do Leste. Estas quintas prósperas produziam um excedente comerciável para alimentar a
crescente população urbana a níveis de nutrição cada vez mais elevados. Há igualmente
alguns indícios de que as poupanças originadas na agricultura eram aplicadas em
investimentos industriais ou pelo menos, em infra-estruturas. Por fim, a indústria vinícola,
que faz parte da agricultura, serviu como importante fonte de receitas de exportação.
Na Bélgica, nos Países Baixos e na Suíça, a agricultura há muito que estava orientada para
o mercado. A produtividade nestes três países situava-se entre as mais elevadas do
Continente.
120
Uma grande variedade caracterizou o desempenho da agricultura nos diversos Estados
alemães e, mais tarde, no novo Império Alemão.
A agricultura contribuiu muito para o desempenho económico tanto da Dinamarca como da
Suécia, embora não para o da Noruega. A forma mais espectacular por que os sectores
primários dos países escandinavos contribuíram para o seu desenvolvimento económico foi
por meio das exportações.
A Finlândia, que era governada pelo czar da Rússia como grão-ducado, é por vezes incluída
nos países escandinavos. Porém, ao contrário deles, não sofreu qualquer mudança
estrutural substancial no séc. XIX. Continuou predominantemente agrária com uma
agricultura de baixa produtividade e baixas receitas médias. A sua maior exportação era
a madeira.
A agricultura austro-húngara, como indústria austro-húngara, reflectiu fielmente a
localização do Império entre o ocidente e o oriente. O crescimento da produção agrícola,
parece ter sido razoavelmente satisfatório ao longo do século em ambas as metades do
Império. A população camponesa constituía um mercado adequado, e até dinâmico, para os
têxteis e bens de consumo. A metade húngara da Monarquia «exportava» produtos
agrícolas, especialmente trigo e farinha, para a metade austríaca, em troca de produtos
fabricados e, também, de investimentos de capital. A incapacidade do Império como um
todo em desenvolver uma exportação agrícola substancial pode atribuir-se a dois
factores:
1. as dificuldades de transportes
2. o facto de o mercado interno absorver a maior parte da produção.
Espanha, Portugal, Itália, Grécia , não passaram por nenhuma reforma agrária significativa
no séc. XIX. Com bem mais de metade da população envolvida na agricultura, mesmo nos
primeiros anos do séc. XX, a produtividade e as receitas mantiveram-se entre as mais
baixas da Europa. Embora estes quatro países exportassem alguma fruta e vinho, para que
os seus climas eram adequados, todos eles se mantiveram em parte dependentes de
importações para as suas necessidades panificáveis.
A agricultura desempenhou um papel dinâmico no processo de industrialização americana e
na ascensão do Estados Unidos à posição de maior potência do mundo. Desde o período
colonial, a agricultura forneceu em abundância não só a alimentação e as matérias-primas,
mas também a maior parte das exportações americanas.
A agricultura americana esteve orientada para o mercado desde o princípio; embora
houvesse, por ex: casos de produção doméstica de bens de consumo e de tecidos, os
agricultores americanos cedo contaram com alguns artesãos rurais e com pequenas
indústrias para o fabrico das suas ferramentas e doutros artigos.
Os Estados Unidos nem tiveram nem necessitaram duma reforma agrária ao estilo
europeu, mas beneficiaram dum extraordinário estímulo à economia agrícola na disposição
do domínio público. Desde o começo que o Governo seguiu uma política de vendas a
indivíduos particulares (e a algumas empresas) em propriedade aloidal - por outras
palavras, um mercado livre da terra.
121
Talvez em nenhum outro país a agricultura tenha desempenhado um papel tão vital no
processo da industrialização como no Japão. Através do imposto sobre a propriedade da
terra de 1873, a agricultura também financiou a maior parte das despesas orçamentais
(94% na década de 1870 e quase metade ainda em 1900) e, deste modo, indirectamente,
uma parte da formação de capital. Apesar da sua pobreza, os camponeses japoneses
constituíam o maior mercado para a indústria japonesa.
Finança e banca
O processo de industrialização no séc. XIX foi acompanhado por uma proliferação no
número e variedade de bancos e outras instituições financeiras necessárias ao
fornecimento dos préstimos financeiros exigidos pelo mecanismo económico cada vez mais
complexo e alargado. Dum largo espectro de formas possíveis de interacção entre o
sector financeiro e os outros sectores da economia que carecem dos seus serviços,
podemos isolar três casos-tipo:
1. aquele no qual o sector financeiro desempenha um papel positivo e indutor de
crescimento.
2. aquele no qual o sector financeiro é essencialmente neutro ou meramente
permissivo.
3. aquele no qual o financiamento inadequado restringe ou impede o desenvolvimento
industrial e comercial.
Os sistemas bancários inglês e escocês foram distintos até à segunda metade do séc.
XIX, o sistema irlandês era também distinto, ao passo que o do País de Gales estava
agregado ao inglês.
De acordo com a Lei Bancária de 1844, o Banco de Inglaterra trocou o seu monopólio da
banca comercial por um monopólio de emissão de notas. Manteve-se primordialmente um
banco estatal (embora de propriedade privada), fornecendo serviços financeiros ao
Governo; no entanto, tornou-se também, cada vez mais, um banco dos banqueiros, e em
finais do século tinha conscientemente adoptado as funções dum banco central.
O sistema bancário francês, como o inglês, era dominado por um banco de inspiração
política que fazia a maior parte dos seus negócios com o Governo, o Banco de França.
Criado por Napoleão em 1800, rapidamente adquiriu um monopólio de emissão de notas e
outros privilégios especiais.
Antes de 1848, a França não tinha bancos comerciais nem bancos semelhantes aos bancos
ingleses de província. Era, com efeito, subbancária, pois os notários provinciais, que
desempenhavam algumas funções de corretagem, não podiam suprir o papel dos bancos em
falta.
A França tinha, na primeira metade do século XIX, outro tipo importante de instituição
financeira. Era a haut banque parisienne, banqueiros comerciais privados semelhantes aos
de Londres. As actividades principais destes bancos privados (referiam-se a si próprios
como de «negócios») eram, como em Londres, o financiamento do comércio internacional e
as transacções em moeda e ouro e prata estrangeiros, mas, a seguir às Guerras
Napoleónicas, começaram a colocar empréstimos e outros títulos públicos, como os das
empresas de canais e caminhos-de-ferro.
122
Os bancos franceses, quer ao privados quer os comerciais, também abriram o caminho à
promoção do investimento francês no estrangeiro. Globalmente, o sistema bancário
francês da primeira metade do século XIX, travado pelo conservadorismo governamental
e pelas políticas restritivas do Banco de França, não conseguiu explorar todo o seu
potencial na promoção do desenvolvimento da economia; na segunda metade do século foi
um pouco mais expansivo, mas menos que os sistemas da Bélgica e da Alemanha.
A Société Générale de Belgique e o Banque de Belgique operaram maravilhas na promoção
da industrialização do seu pequeno país, mas a própria latitude dos seus poderes,
juntamente com a sua intensa rivalidade, conduziu-os a dificuldades. Em 1850, o Governo
criou o Banque Nationale de Belgique como um banco central com o monopólio de emissão
de notas, libertando os demais e todos os que foram posteriormente autorizados para o
exercício de funções bancárias comerciais e de investimento normais. Globalmente, o
sistema bancário belga atingiu elevadas marcas no seu papel de promoção e
desenvolvimento da sua economia.
Os Holandeses estavam muito longe da posição de primazia nas finanças e comércio
europeus que tinham ocupado no séc. XVII, mas continuavam a ter reservas de poder
financeiro. Em 1814, o Reino Unido dos Países Baixos ocupou o lugar da defunta República
Holandesa, o Nederlandsche Bank ocupou o lugar do Banco de Amesterdão, que tinha sido
extinto durante a ocupação francesa.
A Suíça que veio a revelar-se um centro financeiro mundial de primeira grandeza no séc.
XX, era muito menos importante antes de 1914. Genebra foi, na Renascença, um dos
centros financeiros chave da Europa e que os banqueiros privados suíços eram ainda
importantes no séc. XVIII. No entanto, as bases da ulterior proeminência suíça foram
lançadas no séc. XIX. Nas décadas de 1850, 1860 e 1870, inúmeros novos bancos foram
criados segundo o modelo do Crédit Mobilier francês, incluindo vários dos que mais tarde
se tornariam famosos.
Não se podia dizer que existisse um sistema bancário alemão na primeira metade do séc.
XIX. Os vários Estados soberanos, com os seus distintos sistemas monetários e de
cunhagem, impediram a emergência dum sistema financeiro unificado. A Prússia, a Saxónia
e a Baviera tinham bancos com o monopólio da emissão de notas (primeiro deles, o banco
da Baviera, fundado em 1835), mas eram rigorosamente fiscalizados pelos respectivos
governos e estavam sobretudo ao serviço das finanças públicas. Existiam inúmeros bancos
privados, especialmente em importantes centros comerciais, mas a sua principal
preocupação era o financiamento do comércio local e internacional ou, nalguns casos, a
colocação de fortunas pessoais. Da década de 1840 em diante, alguns deles começaram a
envolver-se nas finanças promocionais, fundando e participando no capital de novas
empresas industriais e, em especial, nas vias-férreas. Foi o prenúncio duma nova era na
banca alemã.
A característica distintiva do sistema financeiro alemão tal como se desenvolveu na
segunda metade do século, foi a banca comercial «universal» ou banca «mista», dedicada
tanto ao crédito a curto prazo como a investimento a longo prazo, ou banca promocional.
Uma outra importante inovação institucional o Reichsbank, criado em 1875, encimou a
estrutura financeira alemã. Também ele foi, em parte, uma consequência da vitória da
Prússia sobre a França e da avultada indemnização da reparação que aquela acarretou. Na
123
designação, foi meramente uma transformação do Banco Estatal Prussiano, mas os seus
recursos e poderes foram grandemente alargados. Detinha o monopólio da emissão de
notas e agia como banco central. Como tal, podia sustentar os Kreditbank em tempos
difíceis, e permitiu-lhes, assim, assumirem riscos maiores aos que assumiriam em
condições normais.
O desenvolvimento da banca alemã na segunda metade do séc. XIX foi uma das
consequências mais decisivas – na verdade, como alguns diriam, uma causa – do igualmente
rápido processo de industrialização. Talvez se tenha sobrevalorizado o papel dos bancos;
naturalmente, muitos outros elementos contribuíram para o sucesso da indústria alemã e,
por sua vez, esse mesmo sucesso contribuiu para o sucesso e prosperidade do sistema
bancário.
É um facto que os bancos desempenharam um papel proeminente no desenvolvimento
industrial; globalmente, o sistema bancário alemão era, no princípio do século XX, talvez o
mais poderoso.
A Áustria (ou Monarquia Habsburga) adoptou o seu moderno sistema bancário ao mesmo
tempo que a Alemanha. O primeiro banco comercial moderno foi o Creditanstalt austríaco,
constituído em Dezembro de 1855. A sua fundação foi o resultado directo da rivalidade
dos irmãos Pereire e dos Rothschild. Os Pereire lançaram, por ele, uma oferta de compra,
ao mesmo tempo que conseguiam adquirir os Caminhos-de-ferro Estatais Austríacos para
o Crédit Mobilier, mas os Rothschild, que tinham sido os «judeus da corte» dos
Habsburgos desde o tempo de Napoleão, inviabilizaram o negócio. Mantém-se, hoje em
dia, após transformações profundas, uma das instituições financeiras mais poderosas da
Europa Central.
Apesar de a economia da Suécia ser relativamente atrasada na primeira metade do séc.
XIX, tinha uma longa tradição bancária. O Svreiges Riksbank (o antecessor do Banco
Nacional da Suécia), fundado em 1656, foi, na verdade, o primeiro banco a emitir
verdadeiras notas. No entanto, a história moderna da banca na Suécia, como a de muitos
outros países europeus, data das décadas de 1850 e 1860 e buscou a sua inspiração no
exemplo do Crédit Mobilier. Poder discutir-se se a bem sucedida transformação da
economia sueca contribuiu para a prosperidade dos bancos, ou vice-versa, mas é evidente
que ambos progrediram juntos.
Na primeira metade do séc. XIX, a Dinamarca tinha um banco central, o NationalBank, de
capitais privados mas dominado pelo Governo, e várias pequenas caixas económicas. Como
a Suécia, a sua história bancária moderna remonta à década de 1850. financeiramente, a
Noruega e a Finlândia estavam menos avançadas que a Dinamarca e a Suécia, mas nestes
quatro países os níveis gerais de alfabetização tornaram a população mais apta ao
aproveitamento dos instrumentos bancários.
As nações latinas do Mediterrâneo também lograram obter modernas instituições
financeiras nas décadas de 1850 e 1860, mas principalmente por iniciativa francesa e
empregando capital francês.
A Espanha tinha um banco emissor, o Banco de San Carlos (mais tarde designado Banco de
España), que datava de 1782, mas a sua principal preocupação eram as finanças públicas.
A importante cidade comercial e industrial de Barcelona tinha também um banco emissor
124
que remontava à década de 1840, mas não se envolveu em actividades promocionais. Em
1855, depois de uma mudança de governo ter instalado uma facção «moderada»,
persuadiram o ministro das Finanças a apresentar um projecto de lei nas Cortes
autorizando o Governo a dar alvarás a entidades bancárias do modelo do Crédit Mobilier.
No princípio do ano seguinte, instituíram a Sociedad General de Credito Mobiliario
Español.
A lei que autorizava o Credito Mobiliario Español permitiu ao Governo dar alvarás a
instituições semelhantes sem qualquer outro consentimento das Cortes. O pouco
desenvolvimento económico que a Espanha alcançou no séc. XIX foi, em grande medida, um
resultado das actividades destas instituições de inspiração francesa.
Pouco depois de obterem o alvará para o Credito Mobiliario Español, os Pereire acordaram
com o Governo Português uma instituição similar em Lisboa. A câmara alta do Parlamento
Português recusou-se a ratificar o acordo. Mais tarde nesse mesmo ano, outro
especulador financeiro francês, que tinha auxiliado o Governo na obtenção de um
empréstimo, conseguiu um alvará para um Crédit Mobilier português, mas foi de pouca
dura.
O investidor abriu falência na crise de 1857, e a instituição afundou-se com ele.
Subsequentemente, empresários franceses contribuíram para a formação de dois bancos
hipotecários nos moldes do Crédit Foncier, mas nenhum outro investidor considerou
Portugal zona vantajosa para a banca de investimentos.
Os Pereire também pretendiam abrir uma filial no florescente estado do Piemonte.
Cavour, o génio impulsor desse desenvolvimento, recebeu de braços abertos o seu
interesse como contrapeso da influência que os Rothschild exerciam sobre todas as
relações financeiras do pequeno reino; mas acabou por se decidir contra a alienação
daquele poder financeiro, e concedeu à Cassa del Commercio e delle Industrie,
propriedade dos últimos, o único alvará dum banco de investimentos de capitais privados
do Piemonte. Devido a uma má administração resultaram grandes prejuízos, os Rothschild
retiraram-se em 1860, o banco estagnou até 1863, altura em que os Pereire adquiriram a
participação maioritária, aumentaram o seu capital social e mudaram-lhe o nome para
Società Generale de Creidto Mobiliare Italiano. Nos anos seguintes, passou a estar
associada a praticamente todos os novos empreendimentos em Itália, incluindo
vias-férreas, siderurgias e metalurgias. Mantinha relações de proximidade com altas
esferas do poder e era o segundo maior banco de Itália, logo a seguir à Banca Nazionale.
Porém, em plena crise de 1893, a revelação de graves escândalos na sua organização
interna e nas suas relações com o Governo forçou-o a fechar.
A Guerra da Crimeia revelou dramaticamente o atraso económico da Rússia face ao
ocidente e levou o governo do Czar a uma campanha de construção de vias-férreas e à
emancipação dos servos. Também o levou a um exame dos sistemas financeiro e bancário.
A maior instituição financeira era o Banco Estatal, fundado em 1860. era totalmente
detido pelo Estado e estava sob supervisão directa do ministério das Finanças. De início,
não emitiu notas de banco – o papel-moeda inconvertível era emitido directamente pela
imprensa do Estado -, mas quando, em 1897, a Rússia aderiu ao padrão-ouro, o Banco
Estatal ficou com o monopólio da emissão de notas.
125
Os financeiros europeus também colaboraram com a sua experiência com os seus vizinhos
do Próximo e Médio Oriente. O primeiro banco comercial fundado na região (e o primeiro
banco britânico num país estrangeiro), o Banco do Egipto, começou a funcionar em 1855.
Desenvolvimento semelhante ocorreu no venerável e decrépito Império Otomano. Em
1856, um grupo de investidores britânicos organizou o Banco Otomano em Constantinopla
como um simples banco comercial. Alguns anos depois solicitou um alvará de único banco
emissor, mas os ministros reformadores de formação francesa desejavam, ao tempo, uma
ligação com o mercado financeiro francês. Em 1863, obrigaram o Banco Otomano a unir-se
a um grupo francês encabeçado pelo Crédit Mobilier numa nova instituição, o Banque
Impériale Otomane. Era uma instituição extremamente invulgar, combinando as funções
de banco central e o monopólio da emissão de notas com as dum regular banco comercial e
de investimentos.
A Pérsia (actual Irão) tinha uma instituição semelhante, o Banco Imperial da Pérsia,
fundado por interesses britânicos em 1889. os investidores tinham pretendido usar o
banco para financiar a construção de caminhos-de-ferro, mas o Governo Russo, receoso
da penetração britânica no seu flanco sul, exerceu pressões diplomáticas sobre o Xá para
impedir a construção de vias-férreas. O banco, criado, assim, «por lapso» e gerido por
não-profissionais da área financeira, pouco contribuiu para o desenvolvimento económica
da Pérsia.
O Banco de Hong-Kong e Xangai, fundado por comerciantes britânicos aí instalados,
desempenhou um papel de relevo nas finanças chinesas e é, hoje em dia, uma grande
empresa multinacional. A principal função destes bancos era o financiamento do comércio
internacional, mas também colaboraram na emissão de títulos de empresas e governos
estrangeiros.
No séc. XIX, a banca teve, nos Estados Unidos, uma carreira diversificada. Nos primeiros
anos da república a luta entre os Hamiltonianos, que defendiam um forte protagonismo do
Governo Federal, e os Jeffersonianos, que preferiam deixar a política aos Estados
individuais, reflectiu-se na história da Banca.
Durante a guerra civil, e em parte como medida de finanças de guerra, o Congresso criou
o Sistema Bancário Nacional, que permitia aos bancos munidos de alvará federal competir
com bancos constituídos ao abrigo do alvará estadual. A concorrência era injusta porque o
Congresso também impunha um imposto discriminatório sobre as emissões de notas pelos
bancos estaduais, o que forçou muito deles a converterem-se em bancos nacionais.
Ambos os sistemas bancários, estadual e nacional, suportaram normas e regulamentos
excessivamente restritivos. Por ex: a ramificação bancária era, em geral, proibida. Os
bancos não podiam envolver-se nas finanças internacionais, o que significava que o grande
volume de importações e exportações do país era financiado a partir da Europa e pelo
número relativamente pequeno de bancos comerciais privados. Alguns acreditavam que a
ausência de um banco central também tornava o país mais susceptível aos pânicos
financeiros e às depressões que ocorreram. Para remediar esta falha, o Congresso criou,
em 1913, o Sistema de Reserva Federal, que, entre outras coisas, aliviou os bancos
nacionais da sua função de emissores de notas, mas também lhes permitiu o envolvimento
nas finanças internacionais.
126
Em resumo, a experiência dos estados Unidos, com um rápido crescimento económico e um
sistema bancário em mudança e de certa forma caótico, parece mostrar que, apesar de os
bancos serem necessários ao crescimento económico em sociedades industriais
complexas, já um sistema racional não o é.
O papel do Estado
É possível ao Governo desempenhar diversos papéis em relação à economia. A função mais
fundamental do Governo na esfera económica, que não pode ser evitada ou dispensada, é a
conformação do contexto legal do esforço económico. Esta pode variar entre uma parte
política de «não interferência» e uma de domínio estatal absoluto.
A segunda grande categoria de formas por que o Governo participa na economia inclui
actividades promocionais que excluam as directamente produtivas. Entre elas se contam
tarifas, isenções fiscais, abatimento e subsídios, bem como medidas como a criação de
gabinetes de turismo ou imigração. Nem todas as actividades desta categoria são
necessariamente conducentes ao crescimento; por ex: uma tarifa proteccionista pode
perpetuar uma indústria ineficiente.
Em alguns aspectos semelhantes às actividades promocionais, mas normalmente com um
objectivo diferente em mente, são as funções reguladoras de governo. Estas variam entre
medidas para proteger a saúde e segurança de grupos específicos de trabalhadores e
fiscalizações rigorosas de preços, salários e produção. O objectivo de tais
regulamentações pode ser o de fomentar o crescimento, mas, mais frequentemente, o
objectivo está relacionado com o crescimento; destina-se, antes, a eliminar a injustiça ou
a exploração. Neste último caso, os efeitos secundários e não desejados da
regulamentação podem retardar o crescimento.
Por fim, os Governos podem tomar parte em actividades directamente produtivas. Estas
variam entre medidas benignas, como o oferecimento de estruturas educativas, e a
propriedade e domínios absolutos pelo Estado de todos os bens produtivos. Essa
participação governamental pode ser essencialmente empreendedora ou inovadora e,
consequentemente, favorável à iniciativa privada; ou pode competir com, ou suplantar a
iniciativa privada, como no caso da propriedade estatal de empresas de serviços públicos
ou de instalações telegráficas.
Apesar da sua reputação de berço do governo minimalista, a dimensão da administração
pública no Reino Unido (ou Grã-Bretanha) foi provavelmente típica da da Europa como um
todo; quanto muito, foi ligeiramente maior, em termos relativos, que a maioria das nações
continentais.
Antes do séc. XIX, os serviços postais privados coexistiam com serviços postais públicos
pesados e ineficientes, que eram mantidos mais com fins de censura, espionagem e
receitas que por utilidade pública. O moderno serviço postal teve início em 1840, quando
Sir Rowland Hill, correio-mor do Reino Unido, introduziu a franquia pré-paga e uniforme
de um péni. Em poucos anos, a maioria das nações ocidentais tinham adoptado sistemas
semelhantes. A mesma política foi mais tarde seguida, no decurso do século, após a
invenção do telefone. A maior parte dos países continentais seguiu o exemplo britânico,
127
mas nos estados Unidos tanto o telégrafo como o telefone foram deixados à iniciativa
privada.
Exemplo muito invulgar de empresa privada foi a Companhia das Índias Orientais. Embora
tivesse sido fundada no princípio do séc. XVII como empresa estritamente comercial, no
princípio do séc. XIX tinha-se tornado a governante da Índia, «um Estado dentro dum
Estado».
Houve um sector em que a Grã-Bretanha correspondeu à sua reputação minimalista. Em
campo algum de se deixou ficar tão atrás das demais nações ocidentais como no apoio
público à educação. Até 1870, as únicas escolas disponíveis eram geridas por fundações
privadas ou religiosas, a maior parte das quais cobrava propinas, com excepção das
escolas paroquianas da Escócia. Em resultado disso, metade da população não recebia
qualquer educação formal. Apenas os ricos recebiam mais que os rudimentos. Esse factor,
mais que qualquer outro, servia para preservar a arcaica estrutura britânica de classes
numa época de rápidas mudanças sociais e contribuiu para o declínio relativo da primazia
industrial britânica. A Lei de Bases da Educação de 1870 instituiu o apoio do Estado às
escolas privadas e ligadas à Igreja já existentes que obedecessem a certos critérios. No
entanto, só em 1891 é que a educação se tornou, e em princípio gratuita e universal até
aos 12 anos. Mesmo em 1920, apenas um oitavo da população elegível frequentara uma
escola secundária.
No ensino superior, a Inglaterra também ficava muito atrás do Continente e dos Estados
Unidos. Até serem instituídas bolsas de estudo estatais no séc. XX, Oxford e Cambridge
apenas estavam abertas aos filhos dos abastados, sobretudo aristocracia. Por contraste,
a Escócia, com uma população muito inferior, tinha quatro universidades antigas e
prósperas abertas a todos os candidatos qualificados.
A maioria dos países continentais tinha longas tradições de paternalismo estatal ou
Estatismo. Em vários deles, o Estado detinha florestas, minas e mesmo empresas
industriais. No séc. XVIII, à medida que a superioridade da tecnologia britânica em
determinadas indústrias se tornou óbvia, os Governos patrocinaram esforços de obtenção
de acesso a essa tecnologia, pela espionagem ou por outras formas.
A tecnologia em rápido desenvolvimento dos transportes – especificamente, a dos
caminhos-de-ferro – obrigou todos os governos ao envolvimento. O britânico, fiel à sua
tradição minimalista, fez o mínimo, deixando a promoção, a construção e a maior parte
dos pormenores de funcionamento à iniciativa privada; mas mesmo o Parlamento Britânico
teve de aprovar legislação de base que permitisse às empresas comprar terras para
servidões de passagem e a Lei do Caminho-de-Ferro de 1844 fixou uma série de normas e
regulamentos, incluindo uma tarifa máxima para passageiros de terceira classe.
Nos outros países, os Governos interessam-se muito mais pelos caminhos-de-ferro.
Outros países, se não começaram com redes estatais, mais cedo ou mais tarde
aproximar-se-iam do princípio da propriedade pública.
Se, em retrospectiva, o séc. XIX parece ser um século em que o Governo foi menos
usurpador que em séculos anteriores, ou que o que se seguiu, isso não significa que o
Governo não tenha desempenhado papel algum.
128
129
Cap. XIII
Visão de conjunto da economia mundial no Século XX
Estimulada pelo ritmo acelerado da mudança tecnológica, ferida pelas duas guerras mais
destrutivas da História, a economia mundial do séc. XX assumiu dimensões novas e sem
precedentes. E onde estas dimensões foram mais evidentes foi no comportamento
populacional.
População
à população da Europa mais que duplicou no séc. XIX, mas a do mundo fora das áreas de
colonização europeia aumentou pouco mais de 20 %. No séc. XX, por outro lado, o
crescimento populacional na Europa desacelerou, enquanto o do resto do mundo acelerou a
taxas sem precedentes. A maior parte desse crescimento ocorreu desde a II Guerra
Mundial.
A causa do formidável aumento nos números foi o declínio das taxas brutas de
mortalidade, especialmente em países não ocidentais. As nações ocidentais sofreram uma
«transição demográfica» ( de um regime de elevadas taxas de natalidade e mortalidade
para um muito inferior) em finais do séc. XIX e princípio do séc. XX. Factor de maior
importância contributivo para o declínio da taxa de mortalidade global foi o declínio da
mortalidade infantil (com menos de 1 ano).
Consequência da maior importância do declínio das taxas de mortalidade foi um aumento
da esperança média de vida. Isto é frequentemente medido pelo conceito «esperança de
vida à nascença», o número médio de anos que as pessoas nascidas num dado ano viverão.
No começo do séc. XX, este valor situava-se normalmente abaixo de 50, mesmo em países
avançados.
Há uma estrita correlação entre estas estatísticas, em especial as da esperança de vida,
e várias medidas de bem estar – como o rendimento per capita, os níveis nutricionais e os
padrões de cuidados de saúde. Assim, em países, com altos rendimentos médios a
população, por regra, é mais bem alimentada e tem melhor assistência médica que a de
países de rendimentos nitidamente inferiores; consequentemente, as taxas de
mortalidade são inferiores e a esperança de vida correspondentemente maior.
O processo de urbanização, tão marcado na Europa, no séc. XIX, continuou no séc. XX,
espalhando-se a outras regiões do mundo. Em nações industriais avançadas, as cidades são
normalmente centros de afluência, bem como de cultura, uma vez que a produtividade e os
rendimentos são geralmente mais elevados nas ocupações urbanas que nas ocupações
rurais. Todavia, isto não é necessariamente verdade nas nações do Terceiro Mundo.
Nelas, uma grande proporção dos habitantes urbanos consiste em migrantes
desempregados ou subempregados vindos dos campos e vivendo em miseráveis bairros de
lata na orla dos centros citadinos.
O crescimento das cidades deu-se, em primeiro lugar, em resultado da migração interna, à
medida que a população excedente de áreas rurais e pequenas cidades procurava as
melhores oportunidades e a liberdade da vida e sedução citadinas. A migração
internacional, característica tão destacada da história populacional do séc. XIX, também
130
continuou, embora sob circunstâncias de algum modo diferentes. A maior parte da
migração do séc. XIX tinha sido motivada por pressões económicas internas e
oportunidades no estrangeiro. Estes factores mantiveram-se influentes no séc. XX, mas a
opressão política (ou a sua ameaça) na sequência das guerras e revoluções também
desempenhou um papel de relevo.
O tipo de migração internacional do séc. XIX atingiu o seu auge nos anos imediatamente
anteriores à I Guerra Mundial, principalmente para os Estados Unidos. A depressão dos
anos 30 reduziu drasticamente as oportunidades na América e a II Guerra Mundial
reduziu ainda mais a maré de imigração, muitos refugiados da devastação dos tempos de
guerra e das novas repressões políticas fizeram engrossar o número de imigrantes.
O carácter de imigração também mudou em décadas recentes. Anteriormente, os
imigrantes eram, na sua esmagadora maioria, europeus; hoje muitos mais chegam da Ásia e
da América Latina.
O carácter de imigração e emigração europeia tem-se também modificado no séc. XX. No
séc. XIX, a Europa forneceu o grosso dos migrantes internacionais, mas hoje em dia, a
Europa Ocidental tornou-se um abrigo de refugiados políticos e, pelo menos
temporariamente, uma terra de oportunidades para as multidões empobrecidas da Europa
Mediterrânica, do Norte de África e de regiões do Médio Oriente.
A Alemanha Ocidental suportou o ímpeto da maré de refugiados, que a princípio pareceu
um fardo pesado; mas, com a reanimação económica da Europa Ocidental Continental, nos
anos 50 e 60, com a sua grande procura de mão-de-obra ultrapassou a oferta de
refugiados, o fardo mostrou ser uma benção.
Vários países nomeadamente a França, a Suíça, a Bélgica, bem como a Alemanha Ocidental,
convidaram «trabalhadores hóspedes» de Portugal, da Espanha, da Itália, da Grécia, da
Jugoslávia, da Turquia e do Norte de África para complementarem a sua mão-de-obra
nativa. Na maior parte dos casos, estas migrações foram temporárias, ou assim se
pretendia que fossem, mas também levaram a alguma imigração permanente.
Recursos
O crescimento sem precedentes da população no séc. XX, bem como a fortuna crescente
de pelo menos uma parte do mundo, resultaram numa procura sem precedentes dos
recursos mundiais.
A economia mundial reagiu razoavelmente bem às exigências que se lhe fizeram. Deveu-se,
em grande parte, à interacção crescente da ciência e da tecnologia com a economia. Os
agrónomos descobriram novas formas de aumentar o rendimento das culturas, os
engenheiros descobriram novas utilizações para os recursos existentes e, na verdade,
criaram novos recursos a partir dos velhos na forma de produtos sintéticos.
Em termos de recurso, o desenvolvimento mais importante no séc. XX tem sido uma
mudança da natureza e das fontes da energia primária.
No séc. XX, o carvão tem sido largamente, embora não completamente, substituído por
novas fontes de energia, especialmente o petróleo e o gás natural. Embora o petróleo
131
tenha começado a ser produzido comercialmente no séc. XIX, ele era então usado
sobretudo para iluminação, e só depois como lubrificante.
O petróleo adquiriu um grande significado geopolítico. Ironicamente, a Europa, embora
abundantemente dotada de carvão, é, de entre as maiores massas terrestres, a de menos
reservas de petróleo. Por outro lado, os Estados Unidos, a Rússia, e possivelmente a
China, têm imensos recursos de carvão e petróleo. Foi nos estados Unidos que a produção
do petróleo se começou a fazer em larga escala.
Apesar de continuarem a ser grandes produtores, os Estados Unidos passaram a ser
importadores líquidos de petróleo. Os países do Médio Oriente que circundam o golfo
Pérsico são agora, colectivamente, a maior fonte de abastecimento do mercado mundial. A
Rússia é também grande produtora.
Tecnologia
Em épocas anteriores, a marca do sucesso das sociedades humanas foi a sua capacidade
para se adaptarem aos ambientes. No séc. XX, a marca do sucesso foi a sua capacidade
para manipular o ambiente e adaptá-lo às necessidades da sociedade. O meio fundamental
de manipulação e adaptação é a tecnologia – especificamente a tecnologia baseada na
ciência moderna. Importante causa do ritmo mais acelerado da mudança social no séc. XX,
é notória a aceleração do progresso científico e tecnológico.
A história recente dos transportes e das comunicações proporcionam um exemplo da
aceleração da mudança tecnológica. No princípio do séc. XIX, a rapidez das viagens não
tinha mudado significativamente desde o período helénico. Até à invenção do telégrafo
eléctrico, a comunicação com distâncias apreciáveis estava limitada pela velocidade dos
mensageiros humanos.
A base científica da indústria moderna resultou em centenas de novos produtos e
materiais. Depois da invenção da seda artificial, em 1898, criaram-se dúzias de fibras
têxteis artificiais ou sintéticas. No séc. XX, os materiais plásticos feitos a partir do
petróleo e doutros hidrocarbonetos substituíram a madeira, os metais, as louças de barro
e o papel em milhares de usos que vão desde os pequenos contentores até às máquinas
perfuradoras de alta velocidade. O emprego crescente de energia eléctrica e mecânica, a
invenção de novos dispositivos que poupam mão-de-obra e o desenvolvimento de
instrumentos automáticos de gestão provocaram alterações nas condições de vida e
trabalho de maior projecção que a chamada «revolução industrial» na Grã-Bretanha.
No princípio do séc. XX, empregavam-se una quantos dispositivos mecânicos rudimentares,
principalmente com fins comerciais, mas a era do computador electrónico só teve início
após a II Guerra Mundial. Desde então, o progresso tem rivalizado com a velocidade a que
opera. Sem ele, muitos outros avanços científicos, como a exploração do espaço, teriam
sido impossíveis.
Outro requisito do avanço científico e técnico é uma considerável disponibilidade de
mão-de-obra especializada – ou «cérebro». No começo do séc. XX, praticamente todos os
países ocidentais tinham elevadas taxas de alfabetização, em forte contraste com as
taxas baixas da maior parte do resto do mundo. O fosso técnico, cada vez maior entre
132
regiões desenvolvidas e subdesenvolvidas do mundo está patente em diferenças de níveis
educacionais, bem como em diferenças de rendimento.
A mera alfabetização, por muito importante que seja para a iniciação e manutenção do
desenvolvimento económico, não é suficiente para o mundo de alta tecnologia do final do
séc. XX. A capacidade dos indivíduos para participarem plena e efectivamente na nova
matriz científico-tecnológica da civilização quer como cientistas e técnicos, quer nas suas
super-estruturas comerciais e burocráticas, exige cada vez mais estudos avançados ao
nível liceal ou universitário e além destes. Essa é outra razão do fosso cada vez maior
entre nações ricas e pobres.
Na agricultura, ainda hoje a principal fonte de abastecimento da maioria dos produtos
alimentares e matérias-primas do mundo, a produtividade aumentou grandemente nas
nações ocidentais graças às técnicas científicas de fertilização, de selecção de sementes
e criação de gado e de contenção de pestes e à utilização de energia mecânica.
Infelizmente, estas técnicas ainda não são largamente utilizadas nos países do Terceiro
Mundo, mantendo-se assim um enorme fosso de produtividade entre países ricos e países
pobres.
O aumento da produção de energia foi ainda mais notável. A maior parte do aumento
verificou-se em regiões de colonização europeia e sob formas ainda embrionárias no
princípio do século. A preponderância da América do Norte (principalmente, nos Estados
Unidos) e da Europa em todos os tipos de electricidade, tanto em 1950 como nos anos 80,
em contraste com as minúsculas quotas da África e da América do Sul.
O petróleo e o gás natural, que representavam no início do século, apenas uma diminuta
fracção da energia total, ultrapassaram o carvão como fonte de energia por volta de
1960, e nos anos 80 ascenderam a mais de 60% da produção mundial total.
O motor de combustão interna, o mais importante consumidor de petróleo, foi uma
invenção do séc. XIX, mas apenas gerou uma revolução quando foi aplicado aos dois
dispositivos tecnológicos do séc. XX, o automóvel e o avião.
O automóvel veio a simbolizar o desenvolvimento económico do séc. XX da mesma forma
que a locomotiva a vapor simbolizou o do séc. XIX.
A indústria da aviação comercial desenvolveu-se rapidamente nos anos 30, a par da
tecnologia – e, nas vésperas da II Guerra Mundial, o serviço transatlântico ficou
disponível.
Instituições
Modificada pela mudança tecnológica e por alterações no emprego dos recursos naturais,
pressionada pelo crescimento da população mundial e alternadamente prejudicada e
aliviada por mudanças políticas fora do âmbito da própria economia, a estrutura
institucional da economia mundial de finais do séc. XX diferiu grandemente do que fora no
princípio do século. Mudanças institucionais mais significativas:
- nas relações internacionais
- o papel do Governo
- natureza e dimensão das empresas
133
-
o papel da educação.
Relações internacionais
A economia mundial de antes de 1914 foi dominada, literal e figuradamente, pela Europa
(especialmente a Ocidental) e pelos Estados Unidos. A I Guerra Mundial e as suas
concomitantes, as revoluções russas de 1917, trouxeram mudanças fundamentais a esta
estrutura. A Rússia Czarista desapareceu, sendo o seu lugar ocupado pela União Soviética,
com uma forma nova de organização económica. O Império Habsburgo, na Europa
Centro-Oriental, também desapareceu, substituído por vários Estados nacionais novos ou
alargados, economicamente empobrecidos e instáveis. A Alemanha perdeu o seu império
ultramarino, bem como uma parte substancial do seu próprio território e população. Os
restantes impérios europeus exploraram as suas colónias com um fervor nacionalista
crescente. O Japão, que antes da guerra tinha um pequeno império, alargou-o, e tornou-se
uma importante potência económica. A própria Europa sofreu um declínio da sua quota no
comércio e nas produções mundiais, principalmente para os Estados Unidos, para os
domínios britânicos e Japão. Por fim, as décadas de 1920 e 1930 testemunharam a
ascensão das ditaduras fascistas em Itália, na Alemanha e em várias outras nações
europeias, também elas com novas formas de organização económica.
A II Guerra Mundial trouxe consigo uma reorganização mundial das relações
internacionais, com importantes consequências económicas. A Europa perdeu a sua
hegemonia, tanto na política como na economia. Em vez disso, uma rivalidade entre as duas
novas superpotências, os Estados Unidos e a União Soviética, substituiu a velha contenda
entre as grandes potências europeias tradicionais. Em consequência desta rivalidade, a
Europa foi dividida mais clara e decisivamente que nunca entre leste e ocidente: um bloco
do Leste sob domínio soviético e um grupo ocidental de nações predominantemente
democráticas, a maior parte das quais política e economicamente ligadas aos Estados
Unidos.
O Japão devastado pelo bombardeamento americano, que incluiu as duas únicas bombas
atómicas, suportou quase cinco anos de ocupação por forças militares americanas,
praticamente todas as suas principais instituições (com a notável excepção da dinastia
imperial), emergindo como uma nação verdadeiramente democrática. A eclosão da Guerra
da Coreia, que coincidiu com a restauração da soberania japonesa, proporcionou um
poderoso estímulo económico para o Japão, que o aproveitou muito bem. Numas quantas
décadas, o Japão tornara-se a segunda maior economia do mundo.
A China, que tinha resistido mais ou menos bem às incursões ocidentais durante mais de
dois séculos, sofreu duas mudanças radicais – revoluções – no séc. XX, bem como décadas
de guerra civil e internacional. Em 1911, um grupo de jovens reformadores com ideias
ocidentais derrubou a venerável dinastia Ts’ing (Ch’ing) e tentou criar uma moderna
república democrática. Imediatamente após a II Guerra Mundial, o Partido Comunista
Chinês começou o seu ataque ao Governo, que acabaria por derrubar em 1949. Durante
alguns anos, os Comunistas chineses aliaram-se à União Soviética e tentaram modelar a
sua economia de acordo com a orientação soviética. Depois de romperem com a União
Sovi´tica em 1960, ensaiaram várias outras experiências sem sucesso. Pontualmente nos
naos 70, restabeleceriam relações diplomáticas e económicas com os Esatdos Unidos e
outras nações ocidentais, e começou uma nova era de desenvolvimento económico com uma
curiosa amálgama de iniciativa pública e privada.
134
Algumas instituições internacionais datam do séc. XIX – por exemplo, a Cruz Vermelha
Internacional, fundada em Genebra em 1864, e a União Postal Universal, criada em 1874 e
com sede em Berna, na Suíça -, mas o século XX tem sido prolífico na sua criação. Existem
literalmente centenas de organizações, a maioria das quais de pouco ou nenhum
significado económico, mas algumas afectam o desempenho da economia mundial de
formas relevantes.
A Sociedade das Nações, criada pelo tratado de Versalhes em 1919, foi ideada por
Woodrow Wilson para garantir a paz mundial e, deste modo, a prosperidade. A recusa do
Senado Norte-Americano em ratificar o tratado e dos estados Unidos em entrarem para
a Sociedade, a par da fraqueza da sua estrutura, condenou-a ao malogro.
Uma das subagências da Sociedade, a Organização Internacional do Trabalho (OIT),
sobreviveu à Sociedade, e persiste como subagência das Nações Unidas.
A sucessora da Sociedade – as Nações Unidas – tem obtido uma marca ligeiramente
melhor na manutenção da paz e tem criado várias agências especializadas na resolução de
assuntos económicos e afins. Duas delas precederam, na verdade, a criação das Nações
Unidas e têm desempenhado um papel de relevo na economia mundial: o Fundo Monetário
Mundial (FMI) e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (Banco
Mundial) – ambas aprovadas numa conferência em julho de 1944 em Breton Woods no New
Hamsshire, em antecipação da vitória aliada na II Guerra Mundial.
O papel do Governo
Outra importante mudança institucional que afecta todas as nações no séc. XX é o papel
muito mais alargado do Governo na economia. O crescimento do Governo está em parte
relacionado com as necessidades financeiras das duas guerras mundiais e com outras
considerações de defesa nacional – mas apenas em parte.
Na União Soviética, e noutras economias ao estilo soviético, o Governo assumiu total
responsabilidade pela economia através dum amplo sistema de planeamento e verificação
económicos.
Depois da II Guerra Mundial, a maioria dos países adoptou uma qualquer forma de
planeamento económico, embora não tão abrangente ou compulsivo como o da União
Soviética. Daí o rótulo de «economias mistas» que se tem aplicado às nações da Europa
Ocidental.
A outra grande razão do crescimento do Governo – os pagamentos de transferência –
também têm raízes no final do séc. XIX, mas não alcançou grandes proporções antes do
fim da II Guerra Mundial. Na década de 1880, Bismarck, o chanceler alemão, introduziu
o seguro obrigatório de doença e acidentes para trabalhadores e um sistema de pensões
muito limitado para os idosos e incapacitados, em grande parte por razões paternalistas.
Estas inovações foram gradualmente copiadas e alargadas noutros países, principalmente
após a I Guerra Mundial; os Estados Unidos, por ex: só adoptaram uma segurança social
alargada (incluindo o subsídio de desemprego) depois das reformas de New Deal, nos anos
30. Depois da II Guerra Mundial, devido a grandes pressões políticas, a maior parte dos
estados democráticos alargou em muito os seus sistemas de segurança social e outros
135
pagamentos de transferência. Por este motivo, tornaram-se conhecidos nalguns sectores
como «Estados-Providência».
As formas de empresa
No princípio do séc. XX, a sociedade anónima de responsabilidade limitada, ou empresa
moderna, estava já bem implantada nos principais países industriais, mas, na maior parte
das vezes, era apenas adoptada em indústrias de grandes dimensões e que necessitavam
de avultados investimentos de capital.
Estas tendências no emprego da forma societária de organização tiveram o seu início nos
Estados Unidos na última parte do séc. XIX, mas difundiram-se rapidamente pela Europa
por todo o mundo no séc. XX. O motivo para tanto foi o de permitir às empresas
competirem com sucesso com outro fenómeno de origem norte-americana a empresa
multinacional. As empresas multinacionais não eram uma novidade absoluta, nem eram
exclusivamente norte-americanas – o bando dos Médicis, no séc. XV, sedeado em
Florença, tinha filiais noutros países -, mas eram relativamente raras até ao séc. XX.
Mão-de-obra sindicalizada
No princípio do séc. XX, o direito dos trabalhadores de se organizarem e negociarem
colectivamente foi reconhecido (por ex: na Grã-Bretanha e na Alemanha ) a mão-de-obra
sindicalizada exercia um poder considerável no mercado de trabalho. Mesmo nesses
países, a mão-de-obra sindicalizada era uma minoria. Os anos entre as duas guerras
testemunharam um aumento da adesão dos sindicatos nas nações industrializadas e uma
difusão da sindicalização noutras nações menos desenvolvidas.
Desde meados da década de 1950, com o crescimento do sector terciário a das indústrias
de alta tecnologia, a associação sindical declinou, em termos de percentagem de
mão-de-obra.
Na Europa Ocidental, as tendências de adesão sindical, embora distintas dos Estados
Unidos, têm sido semelhantes. Diferença significativa, é a de que na Europa as
associações sindicais estão muito mais intimamente identificadas com os partidos
políticos que nos Estados Unidos.
Os nazis aboliram não só os partidos políticos como também os sindicatos. Todos os
trabalhadores forma obrigados a tornarem-se membros da Frente do Trabalho, uma
organização conduzida por elementos do Partido Nazi para assegurar a disciplina laboral.
Em Itália, na União Soviética e noutros países totalitários ocorreram desenvolvimentos
semelhantes. Ao tempo da Revolução de 1917, os membros das associações sindicais
russas (que subsistiram ilicitamente no regime czarista) pensaram que seriam chamados
para desempenhar na reforma e reorganização da economia e da sociedade russas.
Ficaram profundamente decepcionadas quando o Governo se serviu dos sindicatos não
como defensores dos direitos dos trabalhadores mas como instrumentos para impor a
disciplina laboral e partidária.
136
137
Cap. XIV
Desintegração económica internacional
As consequências económicas da I Guerra Mundial
Antes de 1914, a economia mundial tinha funcionado livre e, no seu todo eficientemente.
Apesar de algumas restrições sob a forma de tarifas proteccionistas, monopólios privados
e cartéis internacionais, o grosso da actividade económica, tanto interna como
internacional, foi regulada por mercados livres. Durante a guerra, os governos de todas as
nações beligerantes e os de algumas não beligerantes impuseram contenções directas dos
preços da produção e da fixação da mão-de-obra. Estas contenções estimularam
artificialmente alguns sectores da economia e, do mesmo modo, restringiram
artificialmente outros. Embora a maioria das contenções tivesse sido eliminada no final da
guerra, as relações anteriores à guerra não se restabeleceram nem rápida nem
facilmente.
Um problema ainda mais sério resultou da ruptura do comércio externo e das formas da
guerra económica a que os beligerantes – a Grã-Bretanha e a Alemanha, em particular
recorreram. Antes da guerra, a Grã-Bretanha, a Alemanha, a França e os Estados Unidos,
na qualidade de principais nações industriais e comerciais do mundo, eram igualmente,
entre si, os melhores clientes e principais fornecedores. As trocas comerciais entre a
Alemanha e as demais nações interromperam-se imediatamente, embora os Estados
Unidos, na sua fase neutral, tentassem manter relações . nisso foram impedidos pelas
acções retaliatórias tanto da Grã-Bretanha como da Alemanha.
Intimamente relacionada com a ruptura do comércio internacional e com a imposição de
contenções pelos Governos, a perda de mercados externos teve efeitos ainda mais
duradouros. A Alemanha, foi completamente banida dos mercados ultramarinos – é , sem o
engenho dos seus cientistas e engenheiros, teria sido forçada a capitular muito mais cedo
do que o fez. Mesmo a Grã-Bretanha, com o seu domínio dos mares e uma grande marinha
mercante, foi forçada a desviar recursos das suas utilizações correntes para a produção
de guerra. Em 1918, as suas exportações industriais tinham caído para cerca de metade
do seu nível de antes da guerra. Consequentemente, as nações ultramarinas começaram a
fabricar para si mesmas ou a comprar a outras nações ultramarinas produtos que
anteriormente adquiriam na Europa. Os Estados Unidos e o Japão, que tinham já
desenvolvido importantes indústrias fabris, que protegeriam, depois da guerra com
tarifas elevadas. Os Estados Unidos também aumentaram em muito as suas exportações
para os países aliados e neutrais da Europa.
A guerra também perturbou o equilíbrio da agricultura mundial. Ao aumentar
grandemente a procura de géneros alimentares e de matérias-primas, ao mesmo tempo
que algumas regiões deixavam de produzir ou eram banidas dos mercados, a guerra
estimulou a produção, quer em zonas organizadas, como nos Estados Unidos, quer em
áreas relativamente virgens, como na América Latina. Isto levou à superprodução e à
queda dos preços nos anos 20. o trigo, o açúcar, o café e a borracha revelaram-se
especialmente vulneráveis.
Além de perderam mercados externos, as nações beligerantes da Europa sofreram ainda
uma quebra de receitas nos transportes marítimos e noutros serviços. A marinha
138
mercante alemã, completamente paralisada durante a guerra, teve de ser cedida aos
Aliados em pagamento de reparações de guerra.
O esforço de guerra submarina dos Alemães infligiu pesados danos à marinha mercante
britânica, ao passo que os Estados Unidos, com um programa subsidiado de construção
naval em tempo de guerra, se tornaram, pela primeira vez desde a Guerra Civil, grandes
competidores no transporte marítimo internacional. Londres e outros centros financeiros
europeus perderam alguma da sua receita na banca, nos seguros e noutros serviços
financeiros e comerciais, que, durante a guerra, foram transferidos para Nova Iorque e
para outros países (Suíça, por exemplo).
Outra grande perda provocada pela guerra foi a da recita de investimentos no
estrangeiro. Antes da guerra, a Grã-Bretanha, a França e a Alemanha eram os principais
investidores externos. Uma vez que a Grã-Bretanha e a frança importavam mais do
exportavam, a receita proveniente dos investimentos externos ajudava a pagar o
excedente das importações. Foram ambas obrigadas
a alienar alguns dos seus
investimentos externos para financiar a aquisição de material de guerra de que
necessitavam com urgência. O valor doutros investimentos diminuiu em resultado da
inflação e de dificuldades monetárias com ela relacionadas. Outros, ainda, sofreram
grandes reveses ou a rejeição mais completa, nomeadamente os avultados investimentos
franceses na Rússia, que o novo poder soviético se negou a reconhecer.
Os investimentos da Alemanha em países beligerantes foram confiscados durante a
guerra e, subsequentemente, todos consignados a pagamentos de reparação. Os Estados
Unidos, por outro lado, passaram de devedores líquidos a credores líquidos em
consequência do seu enorme excedente de exportação e dos avultados empréstimos aos
Aliados.
A inflação provocou uma desarticulação final nas economias nacionais e internacionais. As
pressões das finanças de guerra forçaram todos os beligerantes (e alguns não
beligerantes), com excepção dos Estados Unidos, a saírem do padrão-ouro, que servira no
período de antes da guerra para estabilizar, ou pelo menos sincronizar, os movimentos de
preços. Todos os beligerantes recorreram a empréstimos em larga escala e à emissão de
papel-moeda para financiarem a guerra. Isto provocou uma subida dos preços, embora
nem todos tenham subido na mesma proporção. A grande disparidade nos preços e,
consequentemente, nos valores das moedas dificultou a retomada do comércio
internacional, igualmente provocando graves repercussões sociais e políticas.
Consequências económicas da paz
A Paz de Paris, como ficou conhecido o acordo pós-guerra, em vez de tentar resolver os
graves problemas económicos causados pela guerra, acabou por exacerbá-los. Os
negociadores da paz não pretenderam que isso sucedesse; pura e simplesmente, não
conseguiam avaliar as realidades económicas.
Dos tratados de paz resultaram duas grandes categorias de dificuldade económica:
- o crescimento do nacionalismo económico
- problemas monetários e financeiros
os tratados da paz não foram os únicos culpados de ambas as dificuldades, mas a ambas
acrescentaram problemas, em vez de os minorarem.
139
O Tratado de Versalhes com a Alemanha, restituiu à França e autorizou a ocupação
francesa do Vale do Sarre, rico em carvão, durante 15 anos. Concedeu à recentemente
recriada Polónia a maior parte da Prússia Ocidental e uma parte da Silésia Superior, rica
em minérios. As suas colónias em África e no Pacífico já tinham sido ocupadas pelos
aliados (incluindo o Japão), que viram confirmadas as suas posses.
Além disso, a Alemanha teve:
- de entregar a sua marinha de guerra
- aceitar restrições às suas forças armadas
- aceitar a ocupação aliada da Renânia durante 15 anos
- várias outras condições danosas ou meramente humilhantes
A mais humilhante de todas foi a famosa cláusula de «culpa da guerra». Artigo 231º
John Maynard Keynes, um conselheiro económico da delegação britânica à conferência da
paz, ficou tão perturbado, que se demitiu das suas funções e escreveu um best-seller – As
consequências Económicas da Paz – em que previa consequências terríveis, não apenas para
a Alemanha mas para toda a Europa, a menos que as cláusulas de reparação fossem
revistas. Embora o raciocínio de Keynes tenha sido contestado, o curso posterior dos
acontecimentos pareceu apoiar a sua predição.
Õ desmembramento do Império Austo-Húngaro nas últimas semanas da guerra resultou
em dois novos Estados, a Áustria e a Hungria. A Checoslováquia, criada a partir de antigas
províncias austríacas e húngaras, e a Polónia, recriada de antigas terras austríacas,
alemãs e (principalmente) russas, também se tornaram novos Estados-Nação. A Sérvia
obteve as províncias eslavas meridionais da Áustria-Hungria e uniu-se ao Montenegro para
se tornar a Jugoslávia. A Roménia, aliada às potências ocidentais, obteve muito território
da Hungria, ao passo que a Bulgária, um inimigo vencido, perdeu terra para a Grécia, para
a Roménia e para a Jugoslávia. A Itália ficou com Trieste, o Trentino e o Tirol Meridional
Austríaco, de língua alemã.
O nacionalismo económico não se limitou aos novos Estados que emergiram da
desagregação de impérios. Durante a sua guerra civil, a Rússia simplesmente desapareceu
da economia internacional. Quando reemergiu sob o regime soviético, as suas relações
económicas foram conduzidas duma forma completamente diferente de qualquer outras
anteriormente utilizada. O Estado tornou-se o único comprador e vendedor no comércio
internacional. Apenas comprava e vendia o que os seus governantes políticos consideravam
ser estrategicamente necessário ou conveniente.
Um nacionalismo económico tão exagerado produziu o oposto ao que os seus formuladores
pretendiam – níveis de produção e rendimentos inferiores, e não superiores. As
consequências adversas deste neomercantilismo, nome dado a tais políticas, não cessaram
com a aplicação das medidas legislativas. Cada nova medida de restrição provocava
retaliação doutras nações cujos interesses eram atingidos.
As desordens monetárias e financeiras causadas pela guerra e agravadas pelos tratados
da paz acabariam por levar a um completo colapso da economia internacional.
A Grã-Bretanha tinha abandonado o padrão-ouro em 1914 como medida orçamental de
guerra, como centro indisputado dos mercados financeiros mundiais, fizeram-se sentir
140
fortes pressões para um rápido regresso ao padrão-ouro, a fim de evitar uma acrescida
erosão, iniciada durante a guerra, da sua primazia financeira. Sob o sistema de antes da
guerra, a libra equivalia a 4,86 dólares, mas os Estados Unidos tinham permanecido no
padrão-ouro durante toda a guerra. A Grã-Bretanha tinha uma taxa de inflação superior
à dos Estados Unidos.
Em 1925, o ministro das Finanças Winston Churchill, que antes tinha trocado a sua
lealdade aos Liberais pelos Conservadores, resolveu fazer regressar a Grã-Bretanha ao
padrão-ouro à prioridade do anteguerra. Para manter a indústria britânica competitiva,
era necessária uma queda dos preços de aproximadamente 10 %, o que por sua vez exigiu
uma descida equivalente dos salários. O efeito global foi uma redistribuição do
rendimento à custa dos trabalhadores e a favor dos que viviam de rendimentos fixos.
Quando confrontados com um corte de salários em resultado do regresso ao padrão-ouro
os mineiros entraram em greve em 1 de Maio de 1926 e persuadiram muitos outros
sindicatos a juntarem-se-lhe no que deveria ser uma greve geral, mas a greve só durou 10
dias, acabando com a derrota dos sindicatos. Por curta que fosse, a greve geral deixou um
legado amargo da divisão e ódio de classes que dificultou ainda mais uma acção nacional
concertada contra os problemas internos e internacionais.
Apesar dos problemas da Grã-Bretanha, a maior parte da Europa prosperou no final dos
anos 20. Durante cinco anos, de 1924 a 1929, parecia que a normalidade tinha de facto
regressado. A maioria dos países, particularmente os Estados Unidos, a Alemanha e a
França, viveu um período de prosperidade. Porém, a base dessa prosperidade era frágil e
dependia do continuado fluxo voluntário de fundos da América para a Alemanha.
A Grande Depressão, 1929-33
Ao contrário da Europa, os Estados Unidos emergiram da guerra mais fortes que nunca.
Embora tenham vivido, a par da Europa, uma depressão aguda em 1920-21, a queda
revelar-se-ia breve, e durante quase uma década a sua economia crescente sofreu apenas
pequenas flutuações.
No final do Verão de 1929, a Europa começava já a sentir a tensão da interrupção dos
investimentos americanos no estrangeiro, e mesmo a economia americana tinha deixado
de crescer. Na Europa, a Grã-Bretanha, a Alemanha e a Itália estavam já no meio duma
depressão. Mas, com os preços das acções em alta permanente, os investidores
americanos e os supervisores públicos pouca importância deram a estes sinais
pertubadores.
Em 24 de Outubro de 1929 - «a Quinta-Feira Negra» da história financeira
norte-americana, seguiu-se-lhe outra onda de vendas em 29 de Outubro, a « Terça-Feira
Negra» e continuou a cair. A retirada de capital da Europa, continuou ao longo de 1930,
provocando uma pressão intolerável em todo o sistema financeiro. Os mercados
financeiros estabilizaram, mas os preços das mercadorias eram baixos e continuavam em
queda, transmitindo a pressão a produtores como a Argentina e a Austrália.
141
A derrocada do mercado bolsista não foi a causa da depressão – que tinha já começado,
tanto nos Estados Unidos como na Europa – mas foi um sinal evidente de que a depressão
se estava a instalar.
O comércio internacional caiu drasticamente entre 1929 e 1932, induzindo quedas
semelhantes, embora menos drásticas, na produção fabril, no emprego e no rendimento
per capita.
Uma característica maior das decisões de política económica de 1930-31 tinha sido a sua
aplicação unilateral: as decisões de suspender o padrão-ouro e de impor tarifas e
contingentes tinham sido tomadas por governos nacionais sem consulta ou acordo
internacional e sem considerarem as repercussões nem as reacções das partes afectadas.
Isto foi em grande parte responsável pela natureza anárquica da desordem que se seguiu .
Õ último grande esforço a fim de garantir a cooperação internacional para acabar com a
crise económica foi a Conferência Monetária Mundial de 1933. Oficialmente proposta pela
Sociedade das Nações em Maio de 1932 e adoptada por resolução na Conferência de
Lausana em Julho desse ano, a ordem de trabalhos da conferência previa acordos para
restaurar o padrão-ouro, reduzir as pautas aduaneiras e os contingentes de importação e
incrementar outras formas de cooperação internacional. O papel dos estados Unidos,
então envolvidos numa eleição presidencial, numa tal conferência foi universalmente tido
por essencial.
Roosevelt foi investido no auge da depressão; um dos seus primeiros actos oficiais foi a
decretação de 8 dias de «feriado bancário», para dar ao sistema bancário tempo para se
reorganizar, e a maior parte das medidas dos famosos «cem dias» envolveu acções de
emergência para fortalecimento da economia interna.
Quando a conferência se efectuou em Londres, em Junho, Roosevelt fez saber que a
primeira responsabilidade do Governo Norte-Americano era a recuperação da
prosperidade interna e que não poderia participar em quaisquer compromissos
internacionais que interferissem com essa tarefa. Desanimados, os delegados à
conferência escutaram uns quantos discursos sem qualquer importância e suspenderam os
trabalhos em Julho sem tomarem qualquer medida significativa. Uma vez mais, a
cooperação internacional tinha falhado.
As consequências a longo prazo da depressão também merecem referência. Entre elas
encontravam-se um crescimento do papel do Governo na economia, uma mudança gradual
nas atitudes em relação à política económica (a chamada revolução Keynesiana) e os
esforços de países da América Latina e de alguns outros do Terceiro Mundo para
desenvolverem indústrias orientadas para a substituição das importações. A depressão
também contribuiu, através do sofrimento e inquietação que provocou, para a ascensão de
movimentos políticos extremistas, tanto da esquerda como da direita, nomeadamente na
Alemanha, contribuindo, indirectamente, para o germinar da II Guerra Mundial.
Tentativas rivais de reconstrução
Frankelin Roosevelt, durante os quatro anos do seu primeiro mandato, o volume de
legislação ultrapassou o de qualquer administração anterior. Lidou, sobretudo com a
recuperação económica e a reforma social nos sectores da agricultura e da banca, com o
142
sistema monetário, os mercados de títulos, o trabalho, a segurança social, a saúde, a
habitação, os transportes, as comunicações, os recursos naturais – na verdade, com todos
os aspectos da economia e da sociedade americanas.
O acto legislativo mais característico de todo o período talvez tenha sido a Lei da
Reconstrução Industrial Nacional. Instituiu uma Administração de Reconstrução Nacional
(ARN) para supervisionar a preparação, por representantes da própria indústria, de
«códigos de concorrência leal» para cada indústria. Era um sistema de planeamento
económico privado («autogoverno industrial») com supervisão governamental, para
proteger o interesse público e garantir o direito de os trabalhadores se organizarem e
reivindicarem colectivamente.
Nenhuma nação ocidental sofreu mais coma a guerra que a França. A maioria dos
combates na Frente Ocidental tinha ocorrido na sua região mais rica. Mais aterradora foi
a perda de vidas, por isso não é surpreendente que a França exigisse à Alemanha que
pagasse pela guerra.
Contando com as reparações alemãs para pagar os custos, o Governo Francês iniciou
imediatamente um programa alargado de reconstrução física nas regiões danificadas pela
guerra que teve o efeito incidental de estimular a economia para novos máximos de
produção. O franco desvalorizou-se mais nos primeiros sete anos da paz que durante a
guerra. Percebendo que os alemães não podiam ser obrigados a pagar, um gabinete de
coligação constituído por seis antigos primeiro-ministros estabilizou o franco em 1926 a
cerca de um quinto do seu valor de antes da guerra, recorrendo a drásticas opções
económicas e a firmes aumentos nos impostos. Esta solução foi mais satisfatória que
qualquer outra das soluções extremas adoptadas pela Grã-Bretanha e pela Alemanha, mas
ignorou quer a classe dos que viviam de rendimentos fixos, que perdeu cerca de quatro
quintos do seu poder de compra com a inflação quer as classes operárias, que suportaram
a maior parte do fardo da agravação fiscal. Assim, como na Alemanha, a inflação
contribuiu para o crescimento do extremismo tanto à direita como à esquerda.
O franco quando se estabilizou, estava subvalorizado em relação a outras moedas
importantes. Isso estimulou as exportações, entravou as importações e conduziu a um
influxo de ouro. Assim, a depressão atacou a França mais tarde que os outros países – não
antes de 1931 – e foi talvez menos severa, mas foi de maior duração.
Como acontecera noutros países, a depressão deu origem a protestos sociais e a uma nova
onda de organização extremistas. O governo da Frente Popular nacionalizou o Banco de
França e os caminhos-de-ferro e aplicou uma série de medidas de reforma laboral, como
sejam o máximo de 40 horas de trabalho por semana, a arbitragem necessária de litígios
laborais e férias pagas aos trabalhadores da Indústria.
No problema mais vasto da recuperação económica, a frente Popular não teve mais
sucesso que os Governos anteriores, franceses e estrangeiros, tinham tido, e cindiu-se em
1938, quando os assuntos externos dominavam cada vez mais o universo político.
Na Europa Central e Oriental, e também em Espanha, os desenvolvimentos políticos – a
ascensão das ditaduras fascistas – obscureceram os fenómenos puramente económicos;
mas mesmo aqueles tinham os seus aspectos económicos. A primeira ditadura foi a de
Itália. Benito Mussolini foi legitimamente empossado em 1922, mas rapidamente
143
consolidou o seu poder com métodos totalitários. Para acomodar os fundamentos do seu
regime, Mussolini contratou o filósofo Giovanni Gentile para prover a uma racionalização
do Fascismo, que foi então publicitada como a própria filosofia de Mussolini.
O Fascismo:
- Glorificava o uso da força
- Tinha a guerra pela mais nobre das actividades humanas
- Denunciava o liberalismo, a democracia, o socialismo e o individualismo
- Tratava o bem-estar material com desdém
- Considerava as desigualdades humanas não apenas inevitáveis como desejáveis.
Acima, de tudo deificava o Estado como a encarnação suprema do espírito humano.
Como tentativa da reconstrução total da sociedade, o Fascismo necessitava duma forma
distinta de organização económica. Mussolini criou o Estado Corporativo, uma das mais
publicitadas e menos bem sucedidas inovações do seu regime.
Em princípio o Estado Corporativo era a antítese tanto do Capitalismo como do socialismo.
Embora permitisse a propriedade privada, os interesses quer de proprietários quer de
trabalhadores estavam subordinados aos interesses mais elevados da sociedade no seu
todo tal como era representada pelo Estado. Na prática, e se é que as corporações
funcionaram de todo agiram sobretudo como sindicatos patronais capitalistas cujo
propósito era o aumento dos rendimentos dos homens de negócios e dos administradores
do partido, à custa dos trabalhadores e consumidores.
Mais bem sucedida que a Itália no combate à depressão, a Alemanha Nazi, foi a primeira
grande nação industrial a alcançar a recuperação total. Desenvolveu o primeiro sistema
moderno de auto-estradas e fortaleceu e expandiu grandemente as suas indústrias, o que
lhe conferiu uma vantagem decisiva sobre os seus inimigos nos primeiros anos da II
Guerra Mundial.
Ao contrário do regime totalitário da Rússia, os Nazis não recorreram à nacionalização
total da economia (embora a administração das empresas confiscadas aos Judeus fosse
frequentemente entregue a membros do partido); apoiam-se na coerção e na autoridade
para alcançarem os seus objectivos.
Um dos principais objectivos económicos dos Nazis foi o de tornar a economia alemã
auto-suficiente em caso de guerra. Não esqueceram os efeitos devastadores do bloqueio
aliado durante a I Guerra Mundial e quiseram ficar imunes a esse tipo de dificuldades no
futuro. A política de auto-suficiência também determinada a natureza das relações
comerciais alemãs com outras nações.
A Espanha, tendo evitado o envolvimento na I Guerra Mundial, escapou a muitos dos
problemas e dilemas colocados a outros países europeus. A sua indústria beneficiou
inclusivamente da procura em tempo de guerra, mas era ainda uma nação
predominantemente agrária, prejudicada por uma agricultura de baixa produtividade.
Durante a ditadura de Miguel Primo de Rivera, entre 1923 e 1930, a economia participou
na prosperidade internacional da época, mas a depressão que se seguiu foi factor
determinante da queda da monarquia e do estabelecimento da II República, em 1931. O
clima internacional desses anos não foi muito favorável às reformas que os Republicanos
visavam empreender. Em 1936, o general Francisco Franco iniciou uma guerra civil
144
sangrenta e destrutiva que terminou com o derrube da república em 1939 e a instituição
dum regime autárquico nalguns aspectos semelhante aos da Itália Fascista e da Alemanha
Nazi, mas sem a tecnologia avançada desta última.
As revoluções russas e a União Soviética
A Rússia Imperial entrou na I Guerra Mundial na expectativa de uma rápida vitória sobre
os Impérios Centrais. Essa ilusão depressa se desvaneceu e, à medida que a guerra se
arrastava, os tradicionais flagelos russos, a ineficiência e a corrupção, cobraram os seus
créditos. No começo de 1917, a economia estava destruída. No início de Março, greves e
motins eclodiram em Petrogrado ( o novo nome de Petersburgo). No 12 de Março, aos
chefes dos grevistas e dos soldados juntaram-se-lhe representantes de vários partidos
socialistas num soviete (conselho) de Delegados dos Trabalhadores e dos Soldados. No
mesmo dia, uma comissão da Duma (parlamento) decidiu formar um governo provisório e,
em 15 de Março, conseguiu a abdicação do Czar. Assim terminou o longo reinado dos
Romanov, numa revolução curta, quase sem chefes e praticamente sem derramamento de
sangue.
O Governo Provisório era uma mistura heterogénea de aristocratas, intelectuais e
parlamentares. O novo regime proclamou imediatamente a liberdade de expressão, de
imprensa e de religião, anunciou que empreenderia a reforma social e a redistribuição da
terra e prometeu reunir uma assembleia constituinte para determinar a forma
permanente de governo da Rússia. Também tentou continuar a guerra contra a Alemanha;
isso revelar-se-ia a sua desgraça.
Lenine, o chefe da facção bolchevique dos partidos socialistas russos, que tinha passado a
maior parte da sua vida adulta no exílio, regressou a Petrogrado com a conivência do
Governo Alemão, que esperava que ele contribuísse para a agitação social e para o caos
político. Lenine assumiu rapidamente o seu domínio no Soviete de Petrogrado e levou a
cabo uma incansável campanha contra o Governo Provisório.
À Revolução de Outubro seguiram-se quatro anos de lutas e amarga guerra civil. Os
Bolchevistas, que agora se chamavam a si mesmos comunistas, introduziram uma política
drástica designada Comunismo de Guerra. Implicava a nacionalização da economia urbana,
o confisco e a distribuição de terras aos camponeses e um novo sistema jurídico. A sua
característica mais significativa foi, a sua introdução dum governo de partido único, a
«ditadura do proletariado» com Lenine à frente.
Pouco depois da Revolução de Outubro, o Governo acedeu à exigência de independência da
Finlândia. Embora tenha acedido às exigências dos estados bálticos da Estónia, da
Lituânia e da Letónia, resistiu às da Ucrânia, da Transcaucásia e doutras regiões. Em
1922, Lenine decidiu criar uma federação, pelo menos de nome contra o conselho do seu
especialista nas questões das nacionalidades, o georgiano naturalizado russo José
Estaline. Em 30 de Dezembro de 1922 nasceu a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS).
Confrontado com a estagnação económica e a possibilidade duma grande revolta
camponesa, Lenine inverteu radicalmente a sua acção com a chamada Nova Política
Económica (NEP), um compromisso com princípios capitalistas da economia que Lenine
considerou «um passo atrás para seguir um frente». Mas os chamados pilares dominantes
145
da economia permaneceram na posse e sob o domínio do Estado. A NEP também incluía um
vigoroso programa de electrificação, a criação de escolas técnicas para engenheiros e
gestores industriais e a criação duma organização mais sistemática dos sectores estatais
da economia. Apesar de algumas dificuldades acrescidas com os camponeses, a produção
aumentou tanto na indústria como na agricultura, e, por volta de 1926 a 1927, os níveis de
produção do anteguerra tinham sido substancialmente recuperados.
Em 1928, o domínio de Estaline sobre o parido e sobre o país era praticamente total. Em
1929, assim que passou a dominar firmemente o aparelho do partido e dos orgãos do
Estado, lançou o primeiro dos planos quinquenais. A este acontecimento chama-se, por
vezes «a segunda revolução bolchevique».
Todos os recursos do Governo Soviético foram directamente ou indirectamente
empregados nesses esforço. Para assuntos puramente técnicos, a Comissão do
Planeamento Estatal (Gosplan) tinha a responsabilidade genérica da formulação de planos,
definição de objectivos de produção e emissão de directivas às diversas agências
subsidiárias. Sem atender a custos, lucros ou preferências dos consumidores, o
mecanismo de planeamento substitui o mercado.
Os objectivos do I Plano Quinquenal foram oficialmente declarados cumpridos decorridos
apenas quatro anos e três meses. Na verdade, o plano estava longe de ser um completo
sucesso. Apesar de em alguns sectores da indústria e da produção terem aumentado
prodigiosamente, a maior parte das indústrias não tinham conseguido atingir as suas
quotas, que tinham sido irrealisticamente elevadas a uma alta fasquia.
Em 1933, o Governo inaugurou o II Plano Quinquenal, no qual se deveria dar ênfase aos
bens de consumo. Apesar de grandes aumentos na produção industrial, o país manteve-se
essencialmente agrário. Uma particularidade notável do II Plano Quinquenal deu-se em
1936-37 – a Grande Purga. Milhares de pessoas, desde trabalhadores não qualificados até
importantes chefes partidários e militares, foram levados a julgamento (ou executados
sem julgamento) por alegados crimes que iam da sabotagem à espionagem e à traição.
Naturalmente, isto teve um efeito significativo na produção.
O III Plano Quinquenal, lançado em 1938, foi interrompido pela invasão alemã de 1941, e a
União Soviética recaiu em algo semelhante ao Comunismo de Guerra.
Aspectos económicos da II Guerra Mundial
Verdadeira guerra global, envolveu directa ou indirectamente as populações de todos os
continentes e de quase todos os países do mundo. Ao contrário da sua antecessora, que
tinha sido antes de mais, uma guerra de estratégia, esta foi uma guerra de evolução – em
terra, no ar e no mar.
As capacidades económicas e, em especial, industriais dos beligerantes adquiriram uma
nova importância. Em última análise, a linha de produção tornou-se tão importante como
alinha de fogo. A derradeira arma secreta dos vitoriosos foi a enorme capacidade
produtiva da economia americana.
Os prejuízos materiais foram muito superiores aos da I Guerra Mundial, em grande
medida devido aos bombardeamentos aéreos. As infra estruturas de transportes,
especialmente caminhos-de-ferro e portos e docas revelaram-se alvos tentadores.
146
Todos os combatentes recorreram à guerra económica, uma expressão nova para uma
velha política. No fim da guerra, o cenário económico era, na Europa, extremamente
desolador. Em 1945, a produção industrial e agrícola foi de metade, ou menos, da que
tinha sido em 1938. Além dos prejuízos materiais e da perda de vidas humanas, milhões de
pessoas tinham sido desenraízadas e afastadas das suas famílias e outros milhões ainda
enfrentavam a perspectiva da fome. Para piorar as coisas, o quadro institucional da
economia tinha sido profundamente danificado. A reconstrução não iria ser tarefa fácil.
147
148
Cap. XV
Reconstruindo a economia mundial
No fim da guerra, a Europa estava prostrada, quase paralisada. Todos os países
beligerantes excepto a Grã-Bretanha e a união Soviética tinham sofrido derrota militar e
ocupação inimiga. Apenas os poucos países neutrais europeus escaparam aos prejuízos
directos, mas mesmo eles sofreram de muitas carestias provocadas pela guerra.
O auxílio chegou por dois canais principais, sobretudo com origem na América:
- À medida que as forças aliadas avançavam pela Europa Ocidental no Inverno e
Primavera de 1944-45, distribuíram rações de emergência e medicamentos à
população civil em risco, tanto à inimiga como à libertada.
- O outro canal foi a Administração das Nações Unidas para Auxílio e reconstrução
(ANUAR). Os Estados Unidos suportaram mais de dois terços dos custos, outros
membros das Nações Unidas o restante.
Depois de 1947, o trabalho da ANUAR foi continuado pela Organização Internacional dos
Refugiados, pela Organização Mundial de Saúde e por outras agências especializadas das
Nações Unidas, bem como agências nacionais voluntárias e oficiais.
Em contraste com s Europa, os Estados Unidos emergiram da guerra mais fortes que
nunca. O mesmo se passou, em menor grau, com o Canadá e as demais nações da
Commonwealth e vários países da América Latina. Poupados aos prejuízos directos da
guerra, as suas indústrias e agricultura beneficiaram de grande procura em tempo de
guerra, o que permitiu a utilização total da sua capacidade, modernização tecnológica e
expansão.
Apesar das dificuldades que a inflação trouxe a quem vivia de rendimentos fixos, ela
manteve as indústrias a trabalhar e permitiu aos estados Unidos alargarem a necessária
ajuda económica à reconstrução da Europa e doutras regiões devastadas pela guerra e
flageladas pela pobreza.
Planeamento da economia do pós-guerra
Uma tarefas mais urgentes que esperavam os povos europeus depois das suas
necessidades de sobrevivência foi a da restauração da lei, da ordem e da administração
pública normais.
A própria magnitude do esforço de reconstrução apontou para um papel bem mais
importante para o Estado na vida económica e social que o que fora característico do
período anteguerra.
A nível internacional, o planeamento do pós-guerra, tinha começado durante a própria
guerra. Em Agosto de 1941, Frankelin Roosevelt e Winston Churchill assinaram a Carta do
Atlântico, que comprometia os seus países (e, subsequentemente, outros membros das
Nações Unidas) a empreenderem a reconstrução dum sistema multilateral de comércio
mundial na vez do bilateralismo dos anos 30. Claro que foi apenas uma declaração de
intenções e não obrigou a quaisquer acções concretas; mas pelos menos, foi uma
declaração de boas intenções.
149
Em 1944, numa conferência internacional na estância de Bretton Woods, no
Newhampshire, na qual os delegados americanos e britânicos tiveram os principais papéis,
foram lançadas as bases de duas grandes instituições:
- O Fundo Monetário Internacioal (FMI) seria responsável pela gestão da estrutura
de taxas de câmbio entre as várias moedas mundiais e também pelo financiamento
de desequilíbrios a curto prazo das balanças de pagamento.
- O Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), também
conhecido como Banco Mundial, concederia empréstimos a longo prazo para a
reconstrução das economias devastadas das nações mais pobres do mundo. Estas
duas instituições não se tornariam operacionais antes de 1946 e, por vários
motivos, não foram completamente eficazes durante vários anos; mas pelo menos
tinha-se tomado uma iniciativa no sentido de reconstruiu a economia mundial.
Os conferencistas de Bretton Woods também consideraram a criação duma Organização
Internacional do Comércio (OIC) que formularia regras de reciprocidade entre as nações.
Foram efectuadas mais conferências com este fim, mas o melhor que se conseguiu foi um
Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (GATT), assinado em Genebra em
1947.
O Plano Marshall e «milagres» económicos
Em 5 de Junho de 1947, o general George C. Marshall, que fora nomeado secretário do
Estado Norte-Americano pelo presidente Truman, proferiu uma alocução de investidura
na Universidade de Harvard em que anunciou que, se as nações da Europa apresentarem
um pedido unificado e coerente de ajuda, o governo dos Estados Unidos daria uma
resposta favorável. Foi esta a origem do Plano Marshall.
Representantes de 16 nações reuniram-se em Paris em 12 de Julho de 1947,
autodesignando-se Comité de Cooperação Económica Europeia (CCEE). Dele faziam parte
todas as nações democráticas da Europa Ocidental (e a Islândia), mesmo as neutrais
Suíça e Suécia, bem como a Áustria (ainda sob ocupação militar), o não democrático
Portugal, a Grécia e a Turquia. A Finlândia e a Checoslováquia mostraram-se interessadas
em participar, mas foram contidas pela União Soviética; nem a união Soviética nem
qualquer outro país do Leste da Europa se fizeram representar. A Espanha de Franco não
foi convidada e a Alemanha, ainda sujeita a ocupação militar, não tinha governo para se
ver representada.
A Administração Truman lançou um forte programa de persuasão com esse fim, e, na
Primavera de 1948, o Congresso aprovou a Lei da Ajuda Externa, que criou o Programa da
Reconstrução Europeia (PRE), que seria gerido pela Administração de Cooperação
Económica (ACE). Depois da deliberação do Congresso dos Estados Unidos, o CCEE
converteu-se na Organização Europeia de Cooperação Económica (OECE), que foi
responsável, juntamente com a ACE, pela afectação da ajuda americana. Os membros da
OECE também tiveram de constituir fundos de contrapartida nas suas próprias moedas, a
serem atribuídas sob o consentimento da ACE.
A Conferência de Potsdam tinha aceite o abate de armamentos alemães e doutras
indústrias pesadas (já iniciado pelos Russos), reparações aos vitoriosos e às vítimas da
agressão nazi, rígidas limitações à capacidade produtiva alemã e um vigoroso programa de
150
desnazificação, incluindo o julgamento de dirigentes nazis como criminosos de guerra. Na
verdade, apenas o último objectivo foi cumprido tal como se tinha pretendido
inicialmente.
Assim como o Zollerein serviu como percursor do Império Alemão, a unificação económica
das zonas ocidentais de ocupação delineou a futura República Federal da Alemanha.
Para estimularem a recuperação económica nas suas zonas, as potências ocidentais
efectuaram uma reforma da moeda alemã em Junho de 1948, substituindo os
desvalorizados e desprezados Reichmarks nazis por marcos alemães numa proporção de 1
marco novo por cada 10 marcos antigo. Á reacção imediata e esmagadora, chamou-se
milagre económico.
A União Soviética, que não tinha sido consultada sobre a reforma monetária e que
considerava uma infracção ao acordo de Postdam (o que de facto era), retaliou fechando
todas as ligações rodoviárias e ferroviárias entre as zonas ocidentais de ocupação e
Berlim Ocidental.
Entretanto, a Alemanha Ocidental estava a ser integrada no Programa de Reconstrução
Europeia. De início, em 1948, o auxílio às zonas ocidentais de ocupação foi recebido e
distribuído pelo governo militar americano. Posteriormente, os estados da Alemanha
Ocidental foram autorizados a eleger representantes para uma convenção constitucional,
e, em Maio de 1949, nasceu a República Federal da Alemanha. Em Setembro, retirou o
bloqueio a Berlim.
Com a Alemanha Ocidental agora perfeitamente integrada na OECE e no Plano Marshall, a
recuperação económica da Europa Ocidental podia considerar-se completa. O Plano
Marshall chegou ao fim em 1952; tinha superado as expectativas de vários dos seus
participantes, e mesmo as de alguns dos seus criadores. Para lá do facto de a Europa
Ocidental ter não só recuperado como excedido níveis de produção do anteguerra, a
OECE e outras instituições recém-criadas mantiveram-se e estimularam a economia a
novos extremos.
Uma das mais importantes dessas novas instituições foi a União Europeia de Pagamento
(UEP). Este engenhoso dispositivo permitiu um comércio multilateral livre dentro da OECE
Os resultados foram espectaculares. Sensivelmente nas duas décadas que se seguiram à
formação da UEP, o comércio mundial cresceu a uma taxa anual média de 8%, a mais
elevada da História com excepção de alguns anos que se seguiram aos tratados comerciais
da década de 1860.
A OECE metamorfoseou-se na Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico
(OCDE) à qual aderiram os Estados Unidos e o Canadá (e, mais tarde, o Japão e a
Austrália): uma organização de países industriais avançados para coordenar a ajuda a
países subdesenvolvidos, promover acordo sobre políticas macroeconómicas e debater
outros problemas de interesse comum.
O termo «milagre económico» foi aplicado pela primeira vez ao notável arranque do
crescimento da Alemanha Ocidental após a reforma monetária de 1948. foi então notado
que várias nações nomeadamente a Itália e o Japão, tinham taxas de crescimento tão ou
mais altas que a alemã.
151
A ajuda americana desempenhou um papel crucial no início da recuperação. Daí em diante,
os Europeus mantiveram-na com elevados níveis de poupança e investimento.
As economias europeias tinham estagnado durante toda uma geração. Além de terem
perdido o seu incremento potencial de crescimento, apenas dispunham de equipamento
obsoleto e estavam muito atrás dos Estados Unidos em progresso tecnológico. Assim, a
modernização tecnológica acompanhou o chamado milagre económico, para o que foi
importante factor contributivo.
Os sistemas económicos da Europa Ocidental do pós-guerra estavam igualmente longe do
antiquado capitalismo estereotipado do séc. XIX e das economias de doutrina socialista
da Europa do Leste. Nas economias mistas ou de Estado-providência, que se tornaram
características das democracias ocidentais, o Governo assumiu as tarefas de promoção da
estabilidade global, dum clima favorável ao crescimento e da protecção mínima aos
economicamente débeis e desprivilegiados, mas abandonou à iniciativa privada a tarefa
fundamental de produção de bens e serviços desejados pelas populações.
Por fim, e a longo prazo, há que ter em grande conta a riqueza europeia de capital humano.
As suas elevadas taxas de alfabetização e instituições educativas especializadas, dos
jardins de infância às escolas profissionais, universidades e institutos de investigação,
forneciam o pessoal especializado e os peritos que faziam a nova tecnologia funcionar com
eficiência.
A emergência do Bloco Soviético
De todas as nações que entraram na guerra, a União Soviética foi a que, em sentido
absoluto mais prejuízos sofreu. Segundo estimativas oficias, 30% da riqueza do período
que antecedeu a guerra tinha sido destruída.
Apesar dos sofrimentos do seu povo, a União Soviética emergiu como uma das duas
superpotências do mundo do pós-guerra. Embora fosse pobre numa base per capita, os
seus vastos territórios e população permitiram-lhe desempenhar esse papel. Para
recuperar a economia devastada e arremessar a produção a novos níveis, o Governo lançou
o IV Plano Quinquenal em 1946. Como já os planos anteriores tinham feito, favoreceu a
indústria pesada e os armamentos, dando especial atenção à energia atómica. O novo plano
também recorreu extensivamente às indemnizações físicas e à tributação dos antigos
países do Eixo e novos satélites da URSS.
Estaline, instituiu uma série de mudanças em altos cargos do Governo e da economia nos
anos imediatamente a seguir à guerra. Uma revisão constitucional em 1946 substituiu o
Conselho de Ministros, no qual Estaline assumiu a posição de presidente, ou
primeiro-ministro.
Estaline morreu em 1953. Nikita Khruchtchev, sucedeu a Estaline como secretário-geral
do Partido Comunista, emergiu como chefe supremo. O Governo iniciou um programa
oficial de «desestalinização», que inclui a remoção do seu corpo do famoso Túmulo de
Lenine na Praça Vermelha, em Moscovo.
Apesar da mudança de chefia e dumas quantas reformas superficiais, a natureza básica
do sistema económico soviético não se alterou. Em 1955, o Governo anunciou o
152
«cumprimento» dum plano quinquenal e a inauguração doutro, embora altos funcionários se
queixassem da ineficiência generalizada e de um terço das empresas industriais não
terem atingido as suas metas de produção.
A agricultura soviética manteve-se num estado de crise quase sem remédio durante o
período pós-guerra, apesar dos esforços maciços do Governo para aumentar a
produtividade. O sistema de exploração colectiva não oferecia incentivos suficientes aos
camponeses.
Em Janeiro de 1949, na sequência dos sucessos iniciais do Programa de Reconstrução
Europeia, a União Soviética criou o Conselho de Assistência Económica Mútua (COMECON
–raramente se emprega a sigla CAEM, preferindo em geral o acrónimo do inglês Council
for Mutual Economic Assistance) numa tentativa de moldar as economias dos seus
satélites leste-europeus numa união mais coesa. Em vez de desenvolver um sistema de
comércio multilateral, como na Europa Ocidental, a maior parte do comércio tanto com a
União Soviética como entre os outros países continuou a ser bilateral.
Embora não pertencesse ao Bloco Soviético, a República Popular da China esteve por
pouco tempo aliada à União Soviética. Objectivo fundamental da chefia comunista chinesa
era a reestruturação da sociedade e a correcção dos processos de análise, do
comportamento e da cultura. Os vestígios da estrutura «feudal» e «burguesa» de classes
foram eliminados pelos expedientes simples da expropriação e da execução judicial.
A União Soviética tinha desde o início oferecido assistência económica, técnica e militar à
RPC (República Popular da China), mas os Chineses recusaram-se aceitar os ditames
soviéticos. Em 1960, a URSS cortou toda a ajuda e retirou todos os seus conselheiros e
assistentes técnicos. Apesar da retirada dos técnicos e do auxílio soviéticos, a China
alcançou o seu maior triunfo tecnológico em 1964, com a explosão duma bomba atómica.
A União Soviética tinha três outros Estados satélites, ou clientes, na Ásia:
- República Popular da Mongólia
- República Popular Democrática da Coreia ou Coreia do Norte
- República Socialista do Vietname
O único Estado socialista reconhecidamente aliado da União Soviética no Hemisfério
Ocidental foi a República de Cuba. Fidel Castro, o chefe revolucionário que derrubou o
despótico ditador Fulgencio Batista, em 1 de Janeiro de 1959, não se proclamou
imediatamente marxista; mas a política anti-Castro dos estados Unidos, que culminou no
apoio à desastrosa invasão da baía dos Porcos em 1961, empurrou-o para os braços duma
União Soviética encantada por descobrir uma base de difusão das suas doutrinas no
Hemisfério Ocidental. Tornou-se membro da COMECON em 1972.
A economia da descolonização
A II Guerra Mundial assinou o atestado de óbito do imperialismo europeu. As palavras de
ordem dos Aliados Ocidentais em tempo de guerra, exigindo liberdade e democracia em
todo o mundo, reforçaram a causa dos movimentos independentistas, ao realçarem o
contraste entre os ideais ocidentais e as realidades do colonialismo.
Quando a Grã-Bretanha concedeu a independência ao Subcontinente Indiano em 1947,
emergiram quatro nações:
153
Índia, Paquistão, Sri Lanka e Bangladesh.
Os quatro países têm populações extremamente densas, poucos e pobres recursos
naturais e baixos níveis de alfabetização. Estão também sujeitos a perturbações raciais e
religiosas e a governos instáveis, frequentemente ditatoriais. A maior parte da
mão-de-obra dedica-se em todos eles, à agricultura de baixa produtividade. Todos estes
países são extremamente pobres.
A Índia é o menos desafortunado. Nos anos 60 e 70 valeu-se da «revolução verde» na
agricultura e é hoje praticamente auto-suficiente em provisões alimentares. Tem também
mais indústria que os outros. Nenhum deles é um estado de orientação socialista, mas em
todos o Governo desempenha um papel fundamental na economia.
A Birmânia rebaptizada Myanmar, a Indonésia, o Laus, o Camboja, o Vietname do Norte,
Singapura, Malásia e a República das Filipinas. Todos estes países excepto Singapura, têm
características em comum, incluindo o clima e a topografia. São todos predominantemente
rurais e agrários, dividindo-se a mão-de-obra entre explorações agrícolas de subsistência
e a produção agrícola de plantação para exportação. Alguns também possuem minérios
estratégicos muito procurados nos mercados mundiais petróleo na Indonésia e estanho na
Malásia. Todos têm baixas taxas de alfabetização e altas taxas de crescimento
populacional. As correntes de democracia são fracas e a maioria desesperadamente
pobre.
Singapura, porém, é altamente urbanizada e relativamente abastada. Situada na
confluência de importantes rotas comerciais, desenvolveu uma economia sofisticada, à
semelhança de Hong-Kong, tendo como principal suporte o comércio, bem como serviços
bancários e financeiros, e mesmo alguma indústria.
O mapa político de África no final da II Guerra Mundial pouco diferiu do dos anos do
entreguerras. As potências imperiais do passado subjugavam ainda quase todo o
Continente.
A antiga colónia italiana da Líbia tornou-se a primeira nação africana a conseguir a
independência. Com a sua escassa população, aparente falta de recursos naturais e
economia atrasada, o futuro da nova nação estava longe de ser promissor, mas subsídios
ocidentais ajudaram-na a sobreviver até a descoberta de petróleo ter fortalecido a sua
base económica.
O Sudão com uma vasta área mas poucos recursos e uma população na sua maioria
analfabeta, tem sido incapaz de fazer funcionar quer uma democracia quer uma economia
e tem sido governado por uma série de regimes militares. A sua independência foi
declarada a 1 de Janeiro de 1956.
Tunísia, Marrocos e Argélia (África Setentrional Francesa) eram países
predominantemente agrários, com uma agricultura do tipo mediterrânico (cereais,
oliveiras, citrinos, etc.), mas também possuem importantes depósitos minerais. Em
especial, as jazidas de petróleo e de gás natural da Argélia, descobertas pouco depois da
independência, proporcionaram-lhe meios para desenvolver a indústria e ter uma palavra
na política mundial. Antes da independência todos estes três países estavam
comercialmente orientados para a França, e essa orientação manteve-se, embora um
acordo comercial com a Comunidade Europeia, em 1976, tenha alargado os seus mercados
154
externos. A Argélia passou a exportar muito do seu gás natural líquido para os Estados
Unidos.
Em 1957, o estado do Gana emergiu como a primeira nação negra na comunidade Britânica,
tornando-se membro das Nações Unidas, seguido da Nigéria em 1960 e outros antigos
domínios britânicos seguiram o mesmo exemplo.
Paradoxalmente, as primeiras colónias britânicas em África a conseguirem a
independência total encontravam-se entre as menos avançadas económica e politicamente.
Porque eram essencialmente povoadas por africanos negros, não houve problemas de
minorias brancas.
Embora o colonialismo estivesse a morrer, se é que não estava já morto, deixou um legado
deplorável. Com poucas excepções, largamente confinadas a áreas de colonização
europeia, as novas nações eram desesperadamente pobres. Em três quartos de um século
de colonialismo, as nações da Europa tinham extraído fortunas imensas em minérios e
outros produtos mas partilhado pouco da sua riqueza com os Africano. Só tardiamente
algumas potências coloniais tinham feito qualquer esforço para instruírem os seus
súbditos ou os preparem para uma autonomia responsável.
A maioria dos governos das novas nações foi flagelada pela ineficiência e pela corrupção.
Mesmo quando as suas intenções eram benignas, poucos dispunham dos recursos,
especialmente de capital humano, para as levarem a bom termo.
As origens da Comunidade Europeia
As Organizações Internacionais dependem da cooperação voluntária dos seus membros e
não têm poderes directos de coerção.
As Organizações Supranacionais exigem que os seus membros cedam pelo menos uma
parte da sua soberania e podem compelir na extensão dos seus mandatos.
Tanto a Sociedade das Nações como as Nações Unidas são exemplo de organizações
internacionais.
A continuada a bem sucedida cooperação poderá porventura, levar a uma fusão de
soberanias, que é a esperança dos proponentes da unidade europeia. Têm-se tornado,
desde 1945, cada vez mais frequentes as propostas, formuladas por fortes cada vez mais
influentes, de algum tipo de organização supranacional na Europa.
As propostas decorrem de duas fontes distintas mas relacionadas – políticas e
económicas:
- A motivação política esta enraizada na crença de que só pela organização
supranacional se pode erradicar permanentemente a ameaça de guerra entre as
potências europeias.
- A motivação económica assenta no argumento de que mercados maiores
promoverão uma maior especialização e uma concorrência acrescida e,
consequentemente maior produtividade e melhores níveis de vida.
As duas motivações fundem-se na ideia de que o poderio económico é a base do poder
político e militar e de que uma economia europeia plenamente integrada tornaria as
155
guerras intra-europeias menos prováveis, se não impossíveis. Devido à ideia
profundamente enraizada de soberania nacional, a maior parte das propostas práticas de
uma organização supranacional tem encarado a unificação económica como preliminar de
uma unificação política.
Em 1950, o ministro francês dos Negócios Estrangeiros Robert Schuman, propôs a
integração das indústrias francesas e oeste-alemão do carvão e do aço e convidou outras
nações a participarem. O Plano Schuman foi um artifício para manter a indústria alemã
sob vigilância e fiscalização. A Alemanha Ocidental, as nações do Benelux e a Itália
acederam. O tratado que criou a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) foi
assinado em 1951 e entrou em vigor no ano seguinte. Previa a eliminação de tarifas e de
contingentes sobre o comércio intracomunitário de minério de ferro, carvão, coque e aço,
uma pauta externa comum sobre as importações doutras nações e fiscalizações sobre a
produção e as vendas.
Pouco depois de a Comunidade ter iniciado a sua obra, as mesmas nações ensaiaram um
novo passo de gigante no sentido da integração, com um tratado de uma Comunidade
Europeia de Defesa.
Em 1957, os participantes no Plano Schuman assinaram dois outros tratados em Roma,
criando:
- A Comunidade Europeia da Energia Atómica (EURATOM), para o desenvolvimento
de usos pacíficos da energia atómica.
- A Comunidade Económica Europeia (CEE) ou Mercado Comum
O tratado do Mercado Comum previa a eliminação gradual de direitos aduaneiros sobre as
importações e de restrições quantitativas sobre todo o comércio entre os Estados
membros e a sua substituição por uma pauta aduaneira comum ao longo do período de
transição de 12 a 15 anos. Os membros da Comunidade comprometeram-se à implantação
de políticas comuns em relação a transportes, agricultura, segurança social e uma série de
outros sectores críticos da política económica e à permissão da livre circulação de
pessoas e de capitais dentro das fronteiras da Comunidade.
O tratado do Mercado Comum entrou em vigor, em 1 de Julho de 1958 e, em poucos anos,
a Comunidade frustrou os pessimistas ao encurtar, em vez de alargar, o período de
transição.
Depois da assinatura do tratado do Mercado Comum, a Grã-Bretanha, os países
escandinavos, a Suíça, a Áustria e Portugal criaram a Associação Europeia de Comércio
Livre (EFTA), os chamados «sete de fora», em contraste com os seis Estados inseridos no
mercado comum. O tratado da EFTA só previa a eliminação de tarifas sobre produtos
industriais entre os países signatários. Não abrangia os produtos agrícolas, não previa uma
pauta aduaneira comum e admitia a retirada a qualquer momento de qualquer membro. Era
uma união muito mais fraca que a do Mercado Comum.
156
157
Cap. XVI
A economia mundial no fim do séc. XX
A longa prosperidade económica da Europa do pós-guerra teve a sua correspondência
noutras zonas da economia mundial, nomeadamente no Japão.
De finais dos anos 30 até finais dos anos 40, a economia japonesa tinha estado isolada do
resto do mundo, e o Japão podia adoptar muitas inovações tecnológicas a um custo
mínimo. Mais importante foi o alto nível de capital humano do Japão, que lhe permitiu
aproveitar a tecnologia superior. Depois de o Japão ter compensado o seu atraso
tecnológico, tornou-se pioneiro na introdução de nova tecnologia, especialmente na
electrónica e na robótica. Para isto, pôde contar não só com as suas reservas de capital
humano mas também com os elevados níveis de poupança e investimento do povo japonês.
Outro factor significativo é a sofisticação da gestão japonesa, que compreendeu o
elevado retorno da investigação e desenvolvimento industriais. Poderíamos citar o espírito
ou mentalidade do povo japonês – colectivista (num sentido geral), cooperante e dado ao
jogo em equipa. Isto é evidente tanto nas atitudes dos empregadores para com os
empregados (e vice-versa) como na política governamental.
No fim do séc. XIX e na primeira metade do séc. XX, os países da América Latina tinham
tido uma participação activa na divisão internacional do trabalho, com base na sua
vantagem comparativa em produtos primários. Mesmo em meados do séc. XX, alguns deles
os países do cone meridional (Argentina, Uruguai e Chile), gozavam rendimentos per capita
comparáveis aos da Europa Ocidental. A partir daí, na despropositada suposição de que
eram de certa forma cidadãos mundiais de segunda classe, dada a sua especialização em
produtos primários, várias nações da América Latina aderiram a programas de
«industrialização de substituição das importações», tentando produzir para si mesmos os
produtos fabricados que anteriormente importavam. Estes programas goraram-se por
vários motivos:
1. os mercados internos eram demasiados pequenos
2. havia uma falta de cooperação internacional na região
3. ao contrário do Japão, faltava à região capital humano para empregar com
eficiência a nova tecnologia.
Embora a produção total, tanto industrial como agrícola, tenha aumentado
substancialmente abaixo do do resto do mundo excepto da África e a quota da região no
comércio mundial total diminuiu continuamente. As desfavoráveis balanças comerciais das
nações individuais, especialmente da Argentina, do Brasil e do México, deram origem a
níveis alarmantes de endividamento internacional nos anos 80, que ameaçaram todo o
sistema de pagamentos internacionais.
As condições económicas em África tornaram-se com o avanço do séc. XX para o seu fim,
ainda mais deploráveis que as da América Latina. Às novas nações que emergiram com o
fim do colonialismo europeu faltavam recursos, naturais e, em particular humanos, para
fazerem face às complexidades duma economia moderna. As circunstâncias políticas
entravaram, de igual modo, esforços de desenvolvimento económico.
158
Outra região do mundo que adquiriu uma grande importância económica na última parte do
séc. XX foi o sudoeste da Ásia ou Médio Oriente. A razão desta crescente importância
económica pode resumir-se sucintamente numa só palavra: petróleo.
O petróleo foi descoberto no Irão (então chamado Pérsia) na primeira década do séc. XX
e, subsequentemente, em vários Estados árabes das margens do Golfo Pérsico – Iraque,
Arábia Saudita, Kwait e emiratos mais pequenos.
Em 1960, os países do Médio Oriente juntamente com s Líbia e a Venezuela, formaram a
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) a que vários outros países
aderiram mais tarde. Em 1970, as nações da OPEP eram responsáveis por mais de um
terço da produção mundial de energia.
Mudanças políticas e religiosas no Médio Oriente alteraram o equilíbrio económico do
poder. Em 1979, no Irão, uma revolta religiosa fanática expulsou o Xá e instituiu uma
república islâmica.
O colapso do Bloco Soviético
No segundo semestre de 1989 desenrolaram-se na Europa do Leste vários acontecimentos
tão significativos como inesperados: o derrube de regimes comunistas num país após o
outro.
Uma mescla de motivos políticos e económicos subjaz à revolta das massas nessas terras
de antigo domínio dos Comunistas. Tivessem esses regimes sido capazes de cumprir as
promessas de condições materiais melhoradas e de um alto nível de vida, e o povo teria
provavelmente aceite a privação de liberdade; mas não foram. Pelo contrário, as
circunstâncias materiais, incluindo as condições de vida e de trabalho das gentes,
detioraram-se claramente, em contraste com as facilidades e a abundância dos seus
vizinhos ocidentais.
Um dos acontecimentos mais dramáticos e simbólicos de 1989 foi a destruição do marco
de Berlim. Durante quase três décadas, permaneceu como um símbolo da tirania e
repressão comunistas.
Em 1964, os conservadores na hierarquia do Partido Comunista depuseram o exuberante
Nikita Khruchtchev, colocando no seu lugar Leonid Brejnev, que governou quase duas
décadas. Sob Brejnev, a economia soviética estagna; a ineficiência e a corrupção
proliferaram. Tanto a taxa de crescimento económico como a produtividade declinaram.
Quando Mikhail Gorbachov – primeiro dirigente soviético nascido depois da Revolução de
Outubro – subiu ao poder em 1985, a economia estava em crise. Gorbachov apercebeu-se,
sem dúvida, de que a União Soviética já não estava em posição de impor a sua vontade aos
seus relutantes ex-satélites. A sua maior necessidade era a de se reformar a si própria, e
daí o programa de Gorbachov de reestruturação e abertura.
Embora Gorbachov desse maior ênfase à perestoika (reestruturação), foi a glasnot
(abertura) que teve o efeito mais imediato.
Uma das justificações da glanost foi a de recrutar a iniciativa e o entusiasmo da
população para as tarefas da perestroika, ou reestruturação económica.
159
Gorbachov defendia, aparentemente, um regresso a algo como a Nova Política Económica
de Lenine, na qual o Estado manteria o domínio dos «sectores vitais» da economia mas
permitiria uma iniciativa limitada nos restantes.
Em Agosto de 1991, nas vésperas dum novo tratado entre a união Soviética e algumas das
suas repúblicas constituintes que conferiria muito mais poder a estas últimas, um pequeno
grupo da linha dura do Partido Comunista tentou um golpe de Estado. Os condutores do
golpe, colocaram Gorbachov, então em férias na Crimeia, sob prisão domiciliária,
suspenderam a liberdade de imprensa e declararam lei marcial. Porém, o povo russo,
especialmente os cidadãos de Moscovo e de Leninegrado, recusaram-se a serem
intimidados. Sob a chefia de Ieltsin e com o apoio de algumas unidades militares que
vieram em seu auxílio, desafiaram abertamente os condutores do golpe, que rapidamente
perderam a coragem e fugiram, vindo a ser presos.
Três dias depois, um Gorbachov triunfante regressou a Moscovo, mas a Moscovo para
onde voltou não era a mesma que deixara. As relações de poder tinham-se alterado
drasticamente. A maior parte das repúblicas constituintes declarou a sua independência
do Governo Central. Gorbachov demitiu-se da Presidência no dia 25 de Dezembro, e a
união Soviética deixou de existir.
Alguns economistas que estudaram a união Soviética nos anos 60 e 70 previram o
fenómeno de «convergência» - que as economias soviética e ocidental se tornariam
parecidas.
A esfoliação da Comunidade Europeia
Após mais de 30 anos de existência, a comunidade Europeia ainda não tinha realizado os
sonhos e visões dos proponentes mais ardentes da unidade europeia, uns estados unidos
da Europa. Apesar da remoção de barreiras aduaneiras internas não tinha conseguido
abolir todas as restrições ao comércio intra-europeu nem abolir as fronteiras aduaneiras
internas. A união monetária estava longe da conclusão e as crises orçamentais eram um
problema perene. A admissão dos países mediterrânicos menos desenvolvidos, Grécia,
Espanha e Portugal, introduziu uma série de novos problemas, em particular na esfera
agrícola.
O objectivo final da união política evoluiu por uma luta entre dois grandes grupos
partidários:
- À Comissão Europeia, com sede em Bruxelas e as hostes eurocratas; juntou-se o
Parlamento Europeu na procura de medidas cada vez maiores de unidade e dum
papel mais relevante para o Parlamento.
- Os governos estavam representados no Conselho de Ministros, também conhecido
como Conselho Europeu, que detinha o poder final em todos os assuntos não
cobertos pelos tratados que instituíram a Comunidade.
Em 1985, o Conselho Europeu (chefes de Estado ou de governo) decidiu, prosseguir para
uma maior união, e, em Fevereiro de 1986 assinou o Acto Único Europeu (AUE), que
assumiu a forma de emendas e aditamentos aos trabalhos existentes.
O movimento para a unidade sofreu um impulso noutra direcção em 1986, quando os
governos de França e do Reino Unido concordaram com a construção dum túnel de
160
caminho-de-ferro sob o Canal da Mancha. A sua conclusão foi agendada para 1993, pouco
depois da entrada em vigor do Acto Único Europeu.
Outro desenvolvimento favorável, também agendado para 1993, foi a criação dum Espaço
Económico Europeu (EEE) através da fusão da Comunidade Europeia com a Associação
Europeia de Comércio Livre.
Em 1991, a Comunidade decidiu criar o seu próprio banco central em 1994, a que se
seguiria uma moeda única em 1999.
Limites ao Crescimento?
Em 1972, previa-se que os limites ao crescimento neste planeta serão atingidos algures
dentro dos próximos cem anos. Invocaram-se cinco grandes tendências de preocupação
global:
1. industrialização acelerada
2. rápido crescimento populacional
3. subnutrição generalizada
4. diminuição dos recursos não renováveis
5. ambiente em deterioração
Muitos críticos acreditaram que os autores tinham sobredramatizado as suas conclusões,
quase todos concordaram que eles tinham identificado de facto tendências de
«preocupação global», nomeadamente o crescimento populacional e a degradação
ambiental.
Durante mais ou menos os últimos cem anos, as nações abastadas sofreram uma transição
demográfica de um regime de elevadas taxas de natalidade e de mortalidade para um
muito menor, com consequente redução da taxa de crescimento populacional. A
expectativa é de que, à medida que as outras nações mais pobres aumentam o seu nível de
bem-estar material, também estas reduzem as taxas de natalidade e, consequentemente,
as taxas de crescimento populacional.
A desigualdade na distribuição de recursos – entre indivíduos, grupos sociais e nações,
está no âmago do problema do desenvolvimento económico. A sua solução não será fácil.
Vai exigir estudo, pesquisa e mudança institucional generalizada. É esse o desafio que
enfrentam tanto as nações desenvolvidas como as subdesenvolvidas. A história contada
neste livro mostra que o desafio pode ser ganho.
161
162
Índice
Cap. I: Introdução: história económica e desenvolvimento
...............................
- Crescimento,
desenvolvimento
e
..................................................................
- Determinantes do desenvolvimento económico
............................................................
- Produção e produtividade
..................................................................................................
- Estrutura económica e mudança estrutural
..................................................................
- A logística do crescimento económico
............................................................................
económico
progresso
1
1
2
3
3
4
5
5
7
8
8
Cap. II: Desenvolvimento económico nos tempos antigos ........................................................
- Dinâmica económica e a emergência da civilização ......................................................
- As fundações económicas do império .............................................................................
- Comércio e desenvolvimento no mundo mediterrânico ...............................................
- Comércio e desenvolvimento no mundo mediterrânico ...............................................
10
10
11
11
12
12
Cap.
III:
Desenvolvimento
económico
na
Europa
Medieval 12
.....................................................
13
- Sociedade rural
14
...................................................................................................................
- Padrões de estabilidade
15
....................................................................................................
15
- Forças de mudança
16
.............................................................................................................
16
- A Europa expande-se
17
.........................................................................................................
18
- O renascimento da vida urbana
19
.......................................................................................
- Correntes e técnicas comerciais
21
.....................................................................................
22
- Tecnologia industrial e as origens da força mecânica
23
................................................
25
- A crise da economia medieval
26
..........................................................................................
27
29
Cap. IV: Economias não ocidentais nas vésperas da expansão ocidental 31
..............................
- O mundo do Islão
34
.................................................................................................................
34
- O Império Otamano
35
............................................................................................................
35
- Ásia Oriental
37
........................................................................................................................ 39
163
- Ásia Meridional
....................................................................................................................
- África
...........................................................................................................................
..........
- As Américas
..........................................................................................................................
Cap.
V:
A
segunda
logística
.............................................................................................
- População e níveis de vida
..................................................................................................
- Exploração e descoberta
...................................................................................................
- A expansão ultramarina e a sua repercussão na Europa
............................................
- A revolução dos preços
......................................................................................................
- Tecnologia e produtividade agrícola
...............................................................................
- Tecnologia e produtividade industriais
..........................................................................
- Comércio, rotas comerciais e organização comercial
.................................................
42
44
45
47
47
48
49
europeia 51
53
55
57
57
58
58
59
60
61
62
62
63
64
66
68
Económico 70
Cap.
VI:
Nacionalismo
e
Imperialismo
......................................................................
- Mercantilismo: um termo incorrecto
..............................................................................
- Os elementos comuns
.........................................................................................................
- Espanha e América espanhola
..........................................................................................
- Portugal
...........................................................................................................................
......
- Europa Central , Oriental e Setentrional
......................................................................
- Colbertismo em França
......................................................................................................
- O desenvolvimento prodigioso dos Países Baixos
........................................................
- «Colbertismo Parlamentar» na Grã-Bretanha
..............................................................
Cap.
VII:
O
despontar
da
...........................................................................
- Características da indústria moderna
............................................................................
Indústria
71
71
72
74
75
77
81
81
82
85
87
87
89
90
91
92
Moderna 95
95
96
97
164
- A «Revolução Industrial»: um termo incorrecto
.........................................................
- Pré-requisitos e concomitantes da industrialização
...................................................
- Tecnologia e inovação industriais
....................................................................................
- Variação regional
.................................................................................................................
- Aspectos sociais do começo de industrialização
.........................................................
98
99
Cap. VIII: Desenvolvimento económico no séc. XIX: Determinantes Básicas
....................
- População
...........................................................................................................................
....
- Recursos
...........................................................................................................................
.....
· O desenvolvimento e difusão de tecnologia
...................................................
· Fontes de energia e produção de energia
.......................................................
· Aço barato
..............................................................................................................
· Transportes e comunicações
..............................................................................
· O emprego da ciência
...........................................................................................
-
A estrutura institucional ...................................................................................................
·
·
·
·
·
Fundamentos jurídicos
.........................................................................................
Política e pensamento económicos
....................................................................
Estrutura de classes e lutas de classes
..........................................................
Educação e alfabetização
...................................................................................
Relações internacionais
.......................................................................................
Cap. IX: Padrões de desenvolvimento: os primeiros industrializadores
...............................
- Grã-Bretanha
........................................................................................................................
- Estados Unidos
....................................................................................................................
- Bélgica
...........................................................................................................................
165
.........
- França
...........................................................................................................................
.........
- Alemanha
...........................................................................................................................
....
Cap.
X:
Padrões
de
desenvolvimento:
retardatários
e
ausentes
............................................
- Suíça
...........................................................................................................................
............
-
Países Baixos e Escandinávia ............................................................................................
- Império Austro-Húngaro
...................................................................................................
- Europa Meridional e Oriental
...........................................................................................
·
·
·
-
Península Ibérica ...................................................................................................
Itália ........................................................................................................................
Sudeste da Europa
...............................................................................................
Rússia Imperial ....................................................................................................................
- Japão
...........................................................................................................................
...........
Cap. XI: O crescimento da economia mundial .............................................................................
- A Grã-Bretanha opta pelo comércio livre
......................................................................
- A era do comércio livre
......................................................................................................
- A «Grande Depressão» e o regresso ao proteccionismo
...........................................
- O padrão-ouro internacional
.............................................................................................
- Migração e investimentos internacionais
.......................................................................
- O renascer do imperialismo ocidental
.......................................................................
· África
......................................................................................................
..........
· Ásia
...........................................................................................................
............
· Explicações do imperialismo
...........................................................................
102
102
103
105
106
106
109
114
116
166
Cap. XII: Sectores estratégicos ...............................................................................................
- Agricultura ........................................................................................................................
- Finança e banca ...............................................................................................................
116
117
118
- O papel do Estado
119
...........................................................................................................
120
121
Cap. XIII: Visão de conjunto da economia mundial no Século XX 122
.....................................
122
- População
....................................................................................................................... 123
....
123
- Recursos
124
....................................................................................................................... 126
.....
127
- Tecnologia
130
....................................................................................................................... 131
..
- Instituições
133
...................................................................................................................... 133
· Relações internacionais
134
..................................................................................
136
· O papel do governo
137
...........................................................................................
139
· As formas de empresa
.....................................................................................
141
· Mão-de-obra sindicalizada
142
..............................................................................
143
144
Cap. XIV: Desintegração económica internacional .................................................................
- As consequências económicas da I Guerra Mundial ................................................
- Consequências económicas da paz ...............................................................................
- A Grande Depressão, 1929-33 .....................................................................................
- Tentativas rivais de reconstrução ..............................................................................
- As revoluções russas e a União Soviética .................................................................
- Aspectos económicos da II Guerra Mundial ............................................................
Cap. XV: Reconstruindo a economia mundial ...........................................................................
- Planeamento da economia do pós-guerra ...................................................................
- O Plano Marshall e «milagres» económicos ...............................................................
- A emergência do Bloco Soviético ................................................................................
- A economia da descolonização .....................................................................................
- As origens da Comunidade Europeia ...........................................................................
Cap. XVI: A economia mundial no fim do séc. XX ..................................................................
- O colapso do Bloco Soviético .......................................................................................
- A esfoliação da Comunidade Europeia ........................................................................
- Limites ao Crescimento? ................................................................................................
167
168
Download