VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG ANÁLISE DE UM EPISÓDIO DE PRECIPITAÇÃO INTENSA NO ANO DE 2014 NA CIDADE DE SÃO LUÍS – MA AUDIVAN RIBEIRO GARCÊS JÚNIOR1 LARISSA RODRIGUES MARQUES2 MARCO AURÉLIO NERI TORRES3 JOSÉ AQUINO JÚNIOR4 RESUMO Os eventos climáticos extremos causam grande impactos sobre áreas urbanizadas, sobretudo quando a área possui sérios problemas estruturais. Este trabalho analisa um episódio extremo de precipitação entre os dias 10 e 11 de maio de 2014 no município de São Luís, em que a estação meteorológica do INMET registrou o acumulado de 181,6 mm em 12h, sendo um dos índices mais elevados já registrado. O evento teve grande influência da Zona de Convergência Intertropical e causou vários problemas na cidade, como foi registrado em diversos meios de comunicação. Desta forma, é necessário que o planejamento urbano da cidade leve em conta o clima local e seus episódios extremos a fim de minimizar as consequências à cidade e sobretudo à população. Palavras-chave: Evento extremo. Precipitação. Área urbana. ABSTRACT Extreme climate events cause great impacts in urban areas, especially when these areas have huge structural problems. This paper analyzes the effects of an extreme episode of rainfall between 10 and 11 May 2014 in the city of São Luís in Brazil, where the meteorological station of the National Institute of Meteorology - INMET recorded 181.6 mm of rain in a period of only 12 hours, one of the highest levels ever recorded. This weather event was deeply influenced by the Inter-Tropical Convergence Zone and caused many problems in the city of São Luís, as reported in several media outlets. Therefore, it is necessary that the urban planning of the city take into account the local climate and its extreme events, in order to minimize their consequences for the city and its population. Keywords: Extreme event. Precipitation. Urban area. 1 Introdução No Brasil, tornou-se comum impactos ambientais derivados de eventos intensos de precipitação nas áreas urbanas das cidades. A cada período chuvoso são divulgadas notícias, em muitos casos que se repetem todos anos, de eventos como enchentes, inundações, deslizamentos de massas, alagamentos dentre outros. Isto se deve sobretudo pelos intensos processos de modificação do solo das cidades, os usos e ocupação de solo 1Acadêmico do programa de pós-graduação em Saúde e Ambiente da Universidade Federal do Maranhão. E-mail: [email protected] 2Graduandos do curso de Geografia da Universidade Federal do Maranhão. E-mail: [email protected]; [email protected] 3. 4 Professor convidado do Programa de Pós-graduação em Saúde e Ambiente da Universidade Federal do Maranhão. E-mail: [email protected]. 1047 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG que se modificaram ao longo dos últimos anos com os processos de urbanização e industrialização. No contexto da climatologia, o espaço urbano torna-se também relevante à medida que o modo de vida da sociedade urbana e suas características ambientais possam causar alterações nas condições climáticas, a formação de ilhas de calor e o desconforto térmico, cujas consequências atingem diretamente a qualidade de vida nas cidades. De acordo com Mendonça (2011, p. 93), nos ambientes urbanos o balanço de energia precedente sofre profundas mudanças, sendo que os elementos climáticos mais observáveis têm sido a temperatura e a umidade do ar, os ventos e, nas cidades tropicais, a precipitação. O clima constitui-se assim, segundo Zanella e Mouro (2013), “em uma das dimensões do ambiente urbano e sua alteração promove impactos sobre a saúde, o conforto e as atividades dos citadinos”. Outro evento climático de interesse para as cidades são os eventos extremos, que podem ser definidos como um evento com valores discrepantes de um estado climático médio que ocorrem em escalas temporais que variam de dias a milênios, embora os mais importantes para as atividades humanas são possivelmente os extremos de curto prazo (relacionados com o tempo) e os de médio prazo (relacionados com o clima), que são eventos com potencial para impactos significativos (MARENGO, 2009). O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) de 2012 trata os eventos extremos como sendo àqueles eventos climáticos e meteorológicos acumulados ou que individualmente causam as condições de impactos extremos, podendo ser um evento que não cause dados à sociedade, como grandes tempestades em oceanos ou eventos que ocorrem onde há ocupação, causando dados econômicos, sociais e ambientais. De acordo com Loureiro et al (2014, p. 84), as estiagens, as inundações e os deslizamentos são os desastres naturais mais frequentes no Brasil. Quando esses eventos ocorrem, provocam impactos sociais e custos econômicos que variam dependendo da intensidade e da suscetibilidade do ambiente. Os eventos de precipitações também são um dos eventos mais frequentes. A precipitação sobre um território desigual constrói diferentes espacialidades, visíveis nas distintas paisagens urbanas diante da incidência de eventos extremos (OLIVEIRA et al, 2011). O processo de urbanização desordenado presente nas grandes cidades brasileiras contribui ainda mais para o aumento dos impactos ocasionados por episódios de 1048 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG precipitações extremas, as quais atingem, principalmente, as populações mais vulneráveis (LOUREIRO, 2014). Como pontua Veyret (2007), a destruição não é explicada de forma completa pela tropicalidade e pelos fatores físicos, mas como a sociedade de terminado espaço está organizado para tal evento. Este autor exemplifica comparando que enquanto uma grande tempestade causa apenas prejuízos materiais na costa da Flórida, na América central e nas Antilhas ela ocasiona a morte de centenas de pessoas. Dentre os eventos naturais, a precipitação é um dos que mais impactam as áreas urbanas, já que o acúmulo de água, seja a partir da inundação de rio ou por outros fatores associados a infraestrutura urbana, como os alagamentos e deslizamentos de massa, irá causar problemas de circulação e comunicação urbana (REGO e BARROS, 2014). Na cidade de São Luís existem poucos estudos sobre esta temática, destaca-se o trabalho de Campos (2005) que analisou alguns elementos climáticos responsáveis pela definição do clima em São Luís com os transtornos observados a partir de notícias de jornais no período de 1993 a 2003 e o trabalho de Silva (2005) que analisou os deslizamentos de terra ocorridos entre 2009 e 2011 em um bairro da cidade e evidenciou que os grandes volumes de chuvas e a ocupação de áreas irregulares causaram grandes desastres no período. Assim, considerando a problemática, a realização da pesquisa partiu da hipótese que a falta de planejamento urbano ou de sua execução vinculada ao conhecimento e compreensão da dinâmica atmosférica no município de São Luís – MA, resulta em problemas socioambientais potencializados pela ocorrência de eventos extremos ligados às questões atmosféricas, principalmente os de precipitação. Este trabalho busca avaliar os impactos causados por um episódio de precipitação intensa entre os dias 10 e 11 de maio de 2014 na cidade de São Luís e caracterizar as condições atmosféricas que resultaram neste evento. 1.1 Caracterização da área de estudo O município de São Luís está localizado na Ilha do Maranhão, está entre as coordenadas de 02º 28’ 12” e 02º 48’ 09” de latitude sul e 44º 10’18” e 44º 35’37” de longitude oeste de Greenwich. Ocupa cerca de 57% da Ilha, tendo como limites as baías de São José e São Marcos e o município de São José de Ribamar. Está inserido na Microrregião Geográfica da Aglomeração Urbana de São Luís. É a capital do estado do Maranhão e o município mais populoso, com cerca de 1.014.837 habitantes, com área territorial de 834,785 km² e densidade demográfica de 1.215,69 hab/km² (IBGE, 2010). 1049 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG Figura 01 – Localização da área de estudo. Fonte: Malha digital do IBGE (2010). Organização: GARCÊS JÚNIOR, 2016. O município de São Luís passa por um processo acelerado de urbanização, sobretudo nos últimos 40 anos, com a implantação de grandes empreendimentos industriais, construções de grandes projetos imobiliários, como conjuntos habitacionais e construção de avenidas e pontes (SILVA, 2005). Estes fatores irão influenciar o crescimento populacional, que pode ser observado pelos censos demográficos realizados pelos IBGE (Quadro 01) e que influenciará na densidade demográfica e na configuração da área urbana da cidade. Quadro01: População residente em São Luís nos Censos Demográficos. Recenseamento População Residente Total 1960 1970 1980 1991 2000 2010 158. 292 265. 486 449. 877 655. 199 870. 028 1.014.837 Fonte: IBGE (2010). Organização: GARCÊS JÚNIOR, 2016. Esta configuração irá influenciar o espaço geográfico e a paisagem natural da cidade que passou a ter uma infraestrutura urbana que não comporta o atual contingente populacional, resultando em sérios problemas urbanos, como a ocupação de áreas irregulares, ineficaz sistema de abastecimento de água, esgoto e coleta de lixo, dentre outros problemas urbanos que também está presente nas grandes cidades brasileiras. A ocupação desordenada da cidade impacta diretamente nos recursos naturais da Ilha do Maranhão, sobretudo com os desmatamentos, com a retirada da vegetação de porte 1050 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG arbóreo e a urbanização das áreas próximas aos recursos hídricos. A caracterização deste último é relevante para compreensão deste trabalho. As bacias hidrográficas da Ilha configuram-se por rios de pequeno porte e grande parte deles são influenciados pela dinâmica da maré. As Bacias do Rio Bacanga, Anil e Paciência são as de maior povoamento e as que são mais afetadas pela ação antrópica (MARANHÃO, 1998). 1.1.2 Caracterização Climática A cidade de São Luís está localizada a 02º 28’ 12” sul da Linha do Equador, desta forma está dentro da área compreendida como zona tropical, recebendo altos índices de radiação solar, que irá refletir nas altas temperaturas médias (FEITOSA e TROVÃO, 2006). Segundo proposta de Mendonça e Danni-Oliveira (2007) para classificação dos domínicos climáticos do Brasil, o norte Maranhense, onde situa-se a cidade São Luís, caracteriza-se por um clima tropical equatorial 2a (com quatro a cinco meses secos). Para Mendonça e Danni-Oliveira (2007, p. 159) este clima “se caracteriza tanto pela influência da maritimidade quanto da continentalidade. As temperaturas, mesmo elevadas ao longo do ano, apresentam pequena variação sazonal e a pluviosidade, maior que os índices térmicos”. Em São Luís tem-se duas estações bem definidas, havendo regularidade térmica durante todo ano que são definidas pelo regime pluviométrico, há um período chuvoso, compreendido entre o verão e outono, e outro seco, entre o inverno e a primavera (MENDONÇA e DANNI-OLIVEIRA, 2007). Esta definição é possível a partir da compreensão da atuação dos sistemas atmosféricos atuantes sobre a região. Estes estão relacionados às mudanças do equador térmico. Segundo Sousa (1993), as massas Equatorial Atlântica e Equatorial Continental no sentido norte-sul e noroeste-sudeste, atua de forma preponderante na região, e é responsável pela intensa pluviosidade no verão e no outono, período que a radiação em mais intensa sobre o hemisfério sul. Segundo Feitosa (1989) “o sistema que determina a dispersão dessas massas de ar na dinâmica regional é o Anticiclone dos Açores, gerador dos ventos alísios de nordeste, além dos ventos alísios de sudeste”. Segundo Nimer e Brandão (1989 citado por ARAÚJO, 2014) “ao longo da depressão equatorial, caracterizada por uma região de pressões relativamente baixas e ventos calmos, o ar instável provoca chuvas e trovoadas bastante intensas”.A convergências das massas de ar nestas áreas de baixas pressão no equador geram a Zona de Convergência 1051 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG Intertropical (ZCIT) que é determinante para compreensão do regime pluviométrico de todo nordeste brasileiro. O período de maior influência da ZCIT é a partir do mês de janeiro, com seu deslocamento meridional, estabelecendo um regime de pluviosidade mais regular nos meses de março e abril, com elevados índices de precipitação (FEITOSA, 1996). Para Araújo (2014), as Linhas de Instabilidades (LI) também são de importante atuação na área de estudo e formam-se sobretudo nos meses de verão no hemisfério sul (dezembro a março), também são causadoras de chuvas e também estão associadas a radiação solar incidente a região, formando as nuvens de tipos cumulus. Com relação às normais climatológicas, segundo INMET a temperatura média anual fica entre 26,9°C, sendo os meses de novembro e dezembro os mais quentes e fevereiro, março e julho os mais frios. Com relação a pluviosidade, possui acumulado anual normal de 2.290mm, sendo os meses de maço e abril os mais chuvosos, com 428mm e 476mm, respectivamente, enquanto os meses mais secos é outubro com 7,6mm. Os ventos predominantes são os de nordeste e apresenta umidade relativa elevado durante todo o ano. 2 Materiais e métodos Os dados meteorológicos foram obtidos através do site no Instituto Nacional de Meteorologia – INMET (www.inmet.gov.br), gerados pelo Banco de Dados Meteorológicos para Ensino e Pesquisa – BDMEP, que dão acesos a dados digitalizados das estações convencionais a partir de 1961. A estação do INMET localiza-se na APA do Itapiracó, nas coordenadas 2,53° S e 44,21°W, está a 50m de altitude em operação desde 18/11/1924. O banco de dados analisado é composto por dados de pluviosidade a partir de 1970 até 2015. Dentre os índices pluviométricos optou-se por aprofundar-se na análise dos dias 10 e 11 de maio de 2014, considerado no banco como o terceiro maior volume acumulado de chuva em 12h. Considerou-se os dois dias, pois o banco disponibiliza os dados de pluviosidade com o acumulado das últimas 12h, ou seja, o volume de chuva analisado foi registrado entre as 12h do dia 10 de maio e as 12h do dia 11 de maio de 2014. Para identificação dos sistemas atmosféricos foram utilizadas as imagens de satélites meteorológico nas faixas do visível, as cartas sinóticas de superfície, obtidas pelo INMET e as cartas da Marinha do Brasil (www.mar.mil.br). Para a caracterização das consequências dos eventos ambientais extremos ligados a dinâmica atmosférica, foi feito uma busca nos arquivos dos principais jornais de circulação 1052 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG na cidade de São Luís (Jornal O Estado do Maranhão, Jornal Pequeno e Jornal O Imparcial) e em sites de notícias. Por fim, os dados foram analisados e trabalhados utilizando o software R, para a plotagem da série histórica de dados diários de janeiro de 1970 a dezembro de 2015, buscando verificar os eventos intensos de precipitação para o período e o pacote de planilhas do Microsoft Excel para análise dos dados mensais de precipitação e normais climatológicas. 3 Resultados e Discussão De acordo com as médias históricas meteorológicas registradas pelo INMET, o período chuvoso em São Luís se apresenta entre os meses de janeiro e junho, com períodos de transição entre a estação nos meses de dezembro e julho. Os meses de março, abril e maio são os meses que apresentam os maiores volumes de precipitação. No gráfico 1 é possível perceber que há uma variabilidade climática durante o ano, com presença de chuvas durante os seis primeiros meses e com pouca precipitação nos 6 últimos meses do ano. Figura 02: Histograma da precipitação diária entre 1970 e 2015. Fonte: INMET (2015). Organização: GARCÊS JÚNIOR, 2015. A figura 02 exibe em milímetros o acumulado de chuvas diário entre os anos e 1970 e 2015, percebe-se que eventos de precipitação ocorrem acima de 100mm, e que entre 2000 e 2010 houve um aumento na frequência destes eventos, com alguns eventos que ultrapassaram 150mm. O maior o volume de precipitação registrado foi em 1980 ultrapassando 200mm diários. Desta forma, estima-se que a variabilidade climática de São Luís também será influenciada por eventos de precipitação intensos, que acarretam em várias repercussões na cidade. As chuvas intensas, chuvas máximas ou chuvas extremas, para Araújo (2008) são consideradas aquelas que tem distribuição irregular temporalmente e espacialmente. Calvetti et al (2006) diz que as chuvas extremas a partir da categoria hidrológica cujo valores superam 55mm em 24h. 1053 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG O último evento intenso de precipitação registrado na cidade foi entre os dias 10 e 11 de maio de 2014, com acumulado de 181,6mm em 12h, como mostra o quadro abaixo, este foi o terceiro maior evento de precipitação registrado entre os anos analisados, os outros maiores eventos foram registrados nos dias 06 de fevereiro de 1980 e em 08 de janeiro de 2011, com 210mm e 187,8mm, respectivamente (Quadro 02). Quadro 02: 10 maiores registros acumulados de precipitação de 1970-2015. DATA CHUVA (mm) 06/02/1980 210 08/01/2011 187,8 11/05/2014 181,6 19/04/1974 177,2 23/02/1974 174,8 25/04/1979 165 13/03/2010 162,2 10/04/1985 161,4 19/03/2000 159,8 28/12/1993 159,7 Fonte: INMET (2015). Organização: GARCÊS JÚNIOR, 2016. Cabe ressaltar que a configuração urbana da cidade no ano de 1980, ano do principal evento intenso, a cidade tinha pouco menos da metade da população. Desta forma, a urbanização será um dos fatores que irão influenciar na intensificação nas consequências das chuvas na vida da população. O ano de 2014, a maioria dos meses apresentou regime pluviométrico abaixo das normais climatológicas, com acumulado de 1652,3mm neste ano, o acumulado normal é de 2325,1mm, considerando as normais disponibilizadas pelo INMET entre 1961 e 1990. O mês de maio (579,1mm) e junho (185,5mm) apresentaram volumes de precipitação acima da normal (Figura 03). 1054 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG Figura 03: Acumulado de precipitação em 2014 e normal climatológica (1961-1990). Fonte: INMET (2015). Organização: GARCÊS JÚNIOR, 2016. O episódio ocorrido entre as 12h do dia 10 e as 12h do dia 11 de maio de 2014, o acumulado de precipitação de 181,6mm representou 31,3% do total do mês, que foi bastante superior ao normal para o mês. Na imagem de satélite (Figura 04) é possível verificar a atuação da Zona de Convergência Intertropical - ZCIT. Segundo Barbiere (2015, p.75), a ZCIT “é responsável pelas chuvas fortes na região norte do Nordeste Brasileiro e está numa zona de forte oscilação convectiva, favorecendo ascensão do ar quente úmido do Oceano”. Figura 04 - Imagens do satélite NOAA- GOES13 do dia 10/05/2014. Fonte: www.cptec.inpe.br. Acesso: fevereiro/2016. Desta forma, é possível verificar que o episódio registrado entre os dias 10 e 11 de maio de 2014, foi influenciado por instabilidades da Zona de Convergência Intertropical que se estendia sobre toda faixa norte da região nordeste e norte brasileiro. É notório a grande nebulosidade sobre a região que deve ter influenciado no grande volume de chuva registrado nestes dias. O fenômeno de precipitação intensa gerou diversos problemas na cidade de São Luís. A partir das manchetes dos jornais das datas de ocorrência (Figura 01), pontua-se os diversos problemas ocorreram devido ao grande volume de água, a saber: alagamentos, enchentes, deslizamentos de terra, interrupção nos serviços de energia elétrica, casas interditadas e pessoas desabrigadas e até a morte de uma pessoa. Nota-se também, a atribuição de culpa dada à chuva pelos transtornos ocasionados (Figura 05). Sabe-se, porém, que as formas de ocupação e a infraestrutura urbana quando não planejadas corroboram para a origem desses problemas, que se tornam mais evidentes 1055 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG quando há um evento como esse. A drenagem urbana em São Luís é ausente na quase totalidade da cidade. Os locais onde geralmente há mais transtornos são aqueles cuja ocupação é em áreas de várzeas ou morros, notadamente vulneráveis, com perfil populacional de baixo poder aquisitivo. Essas áreas sentem muito mais os impactos de um evento extremo do que áreas mais bem servidas de infraestrutura, refletindo as desigualdades do ambiente urbano. Não é perceptível nas notícias registradas, a relação entre planejamento e gestão urbanos e os danos causados. A C B D Figura 05 - Manchetes de jornais sobre os danos causados pela chuva. Fonte: (A e B) Jornal O Estado Maranhão; (C) Jornal O Imparcial; (D) Jornal Pequeno. Edições de 12 de maio de 2014. Organização: MARQUES, 2016. Ressalta-se que as características do ambiente como o relevo, a rede de drenagem da bacia hidrográfica, propriedades do solo e o teor de umidade, a presença ou ausência da cobertura vegetal, bem como as intervenções antrópicas como o uso e ocupação irregular nas planícies e margens de cursos d’água, disposição irregular de resíduos sólidos nas proximidades ou mesmo nos cursos d’água, são fatores determinantes para o surgimento desses problemas (GOMES et al, 2014). Dentre os danos causados à população, as inundações e alagamentos foram os impactos mais representativos, tanto aos danos materiais como sociais, recebendo grande destaque nos noticiários. Quanto a este último, foram registradas duas mortes, uma por deslizamento de terra e outra por inundação. Segundo os jornais analisados, a primeira vítima era moradora de uma área de risco sujeita à deslizamentos e inundações. Situações como essas apontam para a condição de vulnerabilidade a desastres naturais em que está submetida à população, cujas desigualdades espaciais na ocupação do território podem determinar quais os grupos populacionais serão mais vulneráveis. 1056 VARIABILIDADE E SUSCEPTIBILIDADE CLIMÁTICA: Implicações Ecossistêmicas e Sociais de 25 a 29 de outubro de 2016 Goiânia (GO)/UFG “Aqueles que possuem menos recursos serão os que mais dificilmente se adaptarão e, portanto, são os mais vulneráveis” (BARBIERI, 2014). A intensidade do impacto vai depender ainda da capacidade de resposta do ambiente frente a um desastre natural, quanto menos preparada, maior serão as consequências a serem enfrentadas. Embora eventos como esse já tenham ocorridos e os problemas são quase sempre os mesmos, pouco se tem feito por parte da gestão pública para evitar ou amenizar que situações como essa voltem a acontecer. 4 Conclusão O uso e ocupação do espaço urbano é preponderante na intensidade dos impactos que podem ser ocasionados por um evento extremo. O processo de urbanização sem planejamento aliado à ausência de gestão contribui para a permanência dos problemas com fortes chuvas, ou mesmo em condições climáticas normais. É preciso que tanto os meios de notícias quanto as pessoas e gestores reconheçam a relação entre as condições urbanas e as atividades humanas com os impactos e atuem em prol de sua minimização. Assim, é necessário planejar a cidade para que eventos extremos de precipitação possam trazer o mínimo de problemas e danos à população como vem ocorrendo a cidade de São Luís. 5 Referências FEITOSA, Antônio Cordeiro e TROVÃO, José de Ribamar. 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