O Imperialismo Americano no séc. XIX Carlos Eduardo de Freitas Lima, Cynthia Stolze Trisuzzi, Paulo Victor Almeida Galvão Os Estados Unidos após a independência O Tratado de Paris estabeleceu a independência dos Estados Unidos em 1783. A partir de então, os Estados Unidos puderam se estabilizar (economicamente e politicamente), iniciando um processo de expansão territorial que chegaria até o Oceano Pacífico em menos de um século. O país das treze ex-colônias britânicas atingiu a marca dos cinquenta estados, incorporados à medida que a expansão para o Oeste seguia seu curso (além de compras e outras guerras, como veremos). Na passagem do século XVIII para o XIX, os Estados Unidos ainda formavam um pequeno país, que se estendia entre os atuais estados do Maine e do Mississipi. No primeiro censo, em 1790, o país já tinha 2,3 milhões de quilômetros quadrados e 3,9 milhões de habitantes. Porém, as terras do Oeste ainda não podiam ser colonizadas por conta da Lei do Quebec (Leis Intoleráveis, 1774), que proibia que os colonos ocupassem as terras entre os Montes Apalaches e o Mississipi. Mas em 1787, a Lei Noroeste já visava consolidar o futuro expansionismo, ao estabelecer que as terras ocupadas com população de até 60 mil habitantes formariam um novo território que seria incorporado à União como Estado. A Doutrina Monroe e suas conseqüências para a expansão Após esse início da independência estadunidense, o século XIX começou bem movimentado. Depois da derrota napoleônica, a Europa experimentava a retomada dos ideais do Antigo Regime. O maior exemplo disso é a Santa Aliança, criada no Congresso de Viena (1815) e composta por Prússia, Rússia e Império Austríaco. Esta aliança pretendia, portanto, entre outras coisas, intervir na América, recolonizando-a. Os Estados Unidos, entretanto, se defendem com “A América para os americanos.” Esta frase foi o grande lema da Doutrina Monroe (1823), que pretendia impedir todo e qualquer indício de retorno da América à condição de colônia. Com influências fornecidas pelo Iluminismo, a Doutrina Monroe foi mais além. O conhecido lema agora dizia respeito ao caráter nacionalista da doutrina. Mais que a repulsa ao intervencionismo e à recolonização, crescia o sentimento nacionalista norteamericano. “Progresso Americano”, de John Gast Columbia, a Deusa do Progresso, significando a própria América para os americanos do norte. Note que o território já visitado pela deusa é claro, e mostra ferrovias e plantações, enquanto que a parte ainda a ser conquistada se mostra escura, enevoada e cheia de índios em fuga para o Oeste. FONTE: filosofiasepoliticas.blogspot.com Enquanto os EUA realizavam sua expansão territorial em direção ao Oeste (e as antigas colônias latino-americanas da Espanha e de Portugal obtinham a independência), ocorria na Europa a restauração do absolutismo monárquico, seguindo a lógica proclamada pela Santa Aliança. Nesse mesmo período, a Rússia, uma das nações ligadas à Santa Aliança, conquistava o Alasca, no noroeste do continente americano. Todos esses fatos levaram os EUA a por em prática a Doutrina Monroe. Baseando-se nessa doutrina, os EUA deixavam claro que não tolerariam a influência de potências européias na América, e a Doutrina Monroe teria as seguintes funções: * fornecer justificativa ideológica para o expansionismo territorial estadunidense rumo ao Oeste, onde, através da compra ou da guerra, adquiriam-se terras pertencentes à Rússia, França, Inglaterra, Espanha, México e, sobretudo, territórios pertencentes aos indígenas; * promover e estabelecer a tutela dos EUA sobre as nações latino-americanas. “A expansão territorial foi conseguida, em parte, pela expropriação de terra dos índios, pela compra de territórios de potências européias e principalmente pela tomada da metade do território mexicano.” [AQUINO: 2002, p. 268] A partir da Guerra de Secessão, na qual o Norte industrial (favorável à expansão para o oeste e contra a escravidão) derrotou o Sul agrário (contrário à expansão e a favor da escravidão), os Estados Unidos começam a ter destaque no cenário internacional e sua economia começa a crescer. Além da Doutrina Monroe, o cenário político-ideológico estadunidense também foi marcado pela presença do Destino Manifesto, que apregoava a predestinação dos EUA para empreender um processo civilizatório no mundo todo, sobretudo na América. O Destino Manifesto tinha como arcabouço teórico a certeza de que o povo norteamericano fora predestinado por Deus a ocupar e colonizar as terras que se estendiam até o Pacífico. Deus o havia escolhido para propagar valores morais, religiosos e civilizadores a territórios em poder de outras nações ou pertencentes aos povos indígenas. A maior parte dos primeiros habitantes dos EUA era protestante, tendo em conta o lucro e as riquezas como conseqüências de uma escolha divina e fruto do trabalho, e não como um pecado. Essa “ética” protestante constituiria um importante fator cultural, que se tornou mais um motivo para justificar a expansão territorial norte-americana, considerada, dessa forma, como algo natural e benéfico, que deveria ser aceito pelos povos que habitavam os territórios pretendidos e nunca como uma agressão à soberania ou às tradições. Formação territorial dos Estados Unidos Algumas anexações territoriais americanas. FONTE: marlivieira.blogspot.com A formação territorial Tomando todos esses ideais acima como base, o processo de formação territorial ganhou corpo com os pioneiros, que eram aventureiros que objetivavam enriquecer rapidamente, e ganhou ainda mais força com a chegada dos imigrantes europeus. A pouca quantidade de terras cultiváveis no litoral leste, a busca por matériasprimas agroindustriais, metais preciosos e a necessidade de construção de ferrovias (visando escoar a produção da agricultura comercial) foram fatores que propiciaram a conquista do oeste. O caso do Texas, que era parte do norte do México, merece aqui destaque. Seu território foi povoado por plantadores sulistas dos EUA, que aproveitaram a situação política instável do México para se declarar independentes, desejando a integração aos EUA. A jovem república reluta em anexar o território, principalmente porque não queria mais um estado dentro de sua lógica escravista. A anexação só ocorrerá em 1845, em meio a uma guerra contra o México. No ano seguinte, pelo Tratado de GuadalupeHidalgo, os mexicanos reconhecem a perda do Texas, além de cederem os territórios hoje conhecidos como Novo México, Califórnia, Colorado, Nevada, Utah e Arizona, por 15 milhões de dólares, uma quantia ínfima, levando-se em conta a extensão de terra, que constituía quase metade do território mexicano. Retomando a questão ideológica da Doutrina Monroe, o Corolário Polk, criado pelo presidente John Knox Polk, era um conjunto de medidas que visava instrumentalizar os preceitos e ideais dessa doutrina. Essas medidas serviram de justificativas para as invasões ao México. “As treze colônias” A expansão territorial estadunidense até o fim do século XIX, na qual se observa, à direita, em salmão, o território inicial das Treze Colônias e, em direção à esquerda, as terras conquistadas (“grandes direções de penetração”). FONTE: sergiohistoria.blogspot.com Também por meio de compra, os EUA adquiriram a Luisiana à França e a Flórida à Espanha. Em 1867 foi a vez de a Rússia vender o Alasca por pouco mais de 7 milhões de dólares. Assim, o território estadunidense foi sendo formado, através de guerras ou acordos. A Guerra de Secessão e o crescimento econômico Embora o território estadunidense estivesse sendo formado, havia certas disparidades entre alguns estados. Os estados do Norte e os estados do Sul dos EUA eram essencialmente distintos. Como já foi dito, os primeiros eram majoritariamente industriais, enquanto os demais eram mais notadamente agrícolas. Isso trouxe grandes conseqüências para a nação. Essa diferença fulcral trouxe com ela uma série de divergências. Um exemplo marcante reside na diferença de opinião entre os estados nortistas e sulistas sobre a conquista do oeste. Enquanto os fabricantes e comerciantes do Norte almejavam estender as relações para o oeste, ampliando mercados e garantindo matérias-primas, os proprietários do Sul eram contra a aplicação de verbas federais nestes territórios, colocando em xeque a própria visão expansionista estadunidense. Havia ainda a divergência sobre questão da escravidão: os nortistas eram contra a manutenção do trabalho escravo (um entrave para o aumento do mercado consumidor); enquanto isso, os sulistas eram totalmente a favor da escravidão, pois se tratava da sua força principal de trabalho. O conflito iniciou-se após as eleições presidenciais de 1860, na qual Abraham Lincoln, representante dos interesses nortistas, venceu o candidato sulista John Breckinridge. Dessa forma os estados sulistas se revoltaram e criaram os Estados Confederados da América, independentes da União. Após o término dessa guerra, os estados sulistas seriam reintegrados à União, aceitando e reconhecendo os interesses nortistas. A vitória nortista desencadeou a chamada Idade do Ouro, favorecendo o desenvolvimento industrial. A Doutrina Monroe, então, ressurge repaginada e adaptada a esses novos tempos adquirindo um aspecto mais ofensivo, com uma visão da América (todo o continente americano) como área de influência dos EUA. Independência da América Espanhola O século XIX, como vimos, influenciado pela Revolução Francesa, pelo Iluminismo e pela própria Revolução Americana, se inicia com um cenário conturbado também na América Espanhola. As colônias começaram seu processo de independência, instáveis em várias esferas, tanto economicamente, como política e socialmente. Essa instabilidade motivou os Estados Unidos e a própria Europa a olhar com cobiça para os jovens países latino-americanos. A América Espanhola foi, então, alvo constante de intervenções armadas a pretexto de cobrar dívidas passadas. Com a política do Big Stick, do presidente Theodore Roosevelt, já no início do século XX, os EUA se achavam no direito de intervir nos países americanos para defender seus interesses e os de seus cidadãos e restabelecer a ordem. Os EUA, portanto, no início do século XX, começaram a intervir maciçamente no Caribe. Essa região, composta em grande parte por colônias espanholas, possuía uma frágil economia, baseada no cultivo e exportação de produtos primários, como banana e café. Os Estados Unidos iniciaram um forte investimento no Caribe, instalando na região, multinacionais que comercializam produtos primários. Os EUA foram ganhando força e, com o tempo, passaram a se achar no direito de intervir também militarmente, não só no Caribe, como em todo o continente americano. Conclusão Durante o movimento expansionista dos Estados Unidos, o avanço econômico era notado no país de forma bem diferente. Enquanto o norte assistia o crescimento do comércio e principalmente de uma indústria cada vez mais sólida, organizando a produção agrícola com base na pequena propriedade, o sul permanecia baseado na agricultura de exportação com base no trabalho escravo; já as novas terras do oeste eram marcadas pela pecuária e mineração. Ao longo da primeira metade do século XIX essas divergências entre o norte (industrial e abolicionista) e o sul (rural e escravista), serão agravadas, já que ambos tentarão impor seus respectivos modelos sócio-econômicos sobre os novos Estados incorporados. Uma poderosa burguesia industrial e comercial, juntamente com um crescente operariado fabril marcava o desenvolvimento da sociedade nortista, antagonizando-a com a sulista, que permanecia estagnada e dominada por uma aristocracia rural escravista vinculada ao latifúndio agro-exportador. Nas novas terras do Centro-Oeste nascia uma sociedade organizada a partir dos pioneiros com base na agricultura e na pecuária não baseada no trabalho escravo. A manutenção da escravidão no sul e o aumento da rivalidade (social e econômica) entre norte e sul durante a conquista do Oeste, associado a outros elementos também conflitantes, como a questão das tarifas alfandegárias e o crescimento do novo Partido Republicano, criaram condições historicamente favoráveis para a Guerra de Secessão. Após o término da guerra civil, muitos políticos norte-americanos consideraram que era tempo de os EUA construírem seu próprio império. Vê-se, então, que a conquista do oeste constitui o despertar do imperialismo estadunidense. Finalizando a fase de expansão territorial, os EUA deram início a uma fase de expansão marítima e passaram a ocupar pontos estratégicos nos oceanos Pacífico e Atlântico. Bibliografia AQUINO, Rubim; JACQUES, Francisco; FRANCO, Denize; LOPES, Oscar. “História das sociedades – Das sociedades modernas às sociedades atuais”. Rio de Janeiro: Editora Record, 2002. MCPHERSON, James M. “Grito da batalha da liberdade: A era da guerra civil.” New York: Imprensa da universidade de Oxford, 1988 (1º ed.); 2003 (ed. ilustrada). SELLERS, Charles, MAY, Henry e MCMILLAN, Neil R. Uma Reavaliação da História dos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1990. www.cafehistoria.com.br www.historianet.com.br Filmografia “A conquista do oeste”, de John Ford, Henry Hathaway e George Marshall. => O filme retrata a ação de uma família pioneira na conquista das terras a Oeste dos EUA. “Amistad”, de Steven Spielberg. => Aborda a questão do abolicionismo, pois narra a história de negros que se rebelam e assumem o controle de um navio negreiro espanhol e tentam voltar à África. “Dança com lobos”, de Kevin Costner. => Drama existencialista sobre a conquista do Oeste, sob a visão do tenente John Dunbar, que é transferido para um posto de vigilância na fronteira apache. “...E o vento levou”, de Victor Fleming. => Clássico que tem como pano de fundo a Guerra de Secessão e as transformações sociais que ela trouxe. “Pequeno grande homem”, de Arthur Penn. => É um filme que mostra, segundo a visão indígena, a batalha contra o temível general Custer. “Um homem chamado cavalo”, de Elliot Silverstein. => Um senhor inglês é capturado por uma tribo indígena, mas se apega aos seus hábitos e costumes. “O último samurai”, de Edward Zwick. => Mostra a aproximação entre Estados Unidos e Japão na segunda metade do século XIX, principalmente a questão da modernização da sociedade nipônica, sobretudo na questão militar. “Tempo de Glória”, de Edward Zwick. => Durante a Guerra de Secessão, um jovem de família influente, mas sem experiência, assume o comando de um batalhão formado por soldados negros. “Walker – Uma Aventura na Nicarágua”, de Alex Cox. => William Walker, aventureiro norte-americano bastante popular por ter tentado anexar o México aos Estados Unidos, intervém em uma guerra civil na Nicarágua.