4270 PLANTAS MEDICINAIS: UMA ANÁLISE A PARTIR DE

Propaganda
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
PLANTAS MEDICINAIS: UMA ANÁLISE A PARTIR DE CONHECIMENTOS
PRÉVIOS
Matheus Fabricio Verona (Departamento de Ciências Biológicas – FEUC)
Monica Martim Leonel (Graduanda em Ciências Biológicas – FEUC)
Resumo
Desde os tempos remotos, praticamente todos os povos relatam a utilização das plantas
medicinais. Esse uso passou por profundas modificações, desde o caráter primitivo e mágico
até o conhecimento atual, que envolve a detecção de seus princípios ativos e eventuais
toxicidades. Portanto, o presente trabalho tem como objetivo avaliar os conhecimentos
prévios dos alunos de 8º ano das escolas públicas de um município do interior paulista sobre
plantas medicinais. Os resultados evidenciam a influência do meio social, em particular da
família, na elaboração das concepções alternativas sobre essa área, bem como a necessária
reformulação da abordagem botânica nas escolas de nível básico.
Palavras chave: Plantas Medicinais, Conhecimentos Prévios, Ensino de Botânica.
Introdução
O conceito de Plantas Medicinais sempre foi utilizado para designar vegetais que
ajudam no tratamento de doenças. Seu uso vem desde nossos ancestrais, que acreditavam no
poder da cura contra as enfermidades que surgiam naquela época. Hoje, essas plantas
continuam sendo usadas para essa mesma finalidade, além de serem empregadas junto à
indústria de cosméticos.
Considerando essa breve trajetória histórica do uso das plantas medicinais, é coerente
tomarmos, como pressuposto, que a família exerce grande relevância nas informações
adquiridas pelos alunos ao longo de suas vidas e, consequentemente, esses dados passam a
compor os conhecimentos prévios dos educandos. Logo, ao chegarem à escola, trazem, de
maneira geral, uma rica rede de informações sobre esse assunto, entretanto, essas exigem uma
sistematização para que sejam coerentes com o saber de referência.
Vale destacar que o conhecimento prévio é essencial no dia a dia da
criança/adolescente, e que estabelece uma relação direta com a parte afetiva, sensorial e
cognitiva da vida. Acredita-se que, quanto à origem, existem três grandes grupos para
classificar estas ideias prévias: origem sensorial, que é baseada na interação com o mundo
natural; origem social, que está atrelada a um conjunto de crenças a qual o estudante pertence
e, por fim, a origem analógica, que se relaciona ao domínio do saber (POZO et al., 1991).
Sendo assim, o presente trabalho tem como objetivo avaliar os conhecimentos prévios
dos alunos de 8º ano das escolas públicas estaduais de um município do interior paulista sobre
plantas medicinais.
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4270
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
Nesses termos, consideramos ainda, que a escola básica representa, para muitos, a
última oportunidade para ter acesso às informações sistematizadas sobre as diferentes áreas do
conhecimento e, portanto, torna-se necessário que o trabalho ali desenvolvido apresente dados
relevantes para a vida dos alunos, pois, assim sendo, os educandos tornam-se divulgadores da
referida temática, pois com o domínio do assunto tendem a apresentar seus conhecimentos
junto aos pares e familiares. Logo, este trabalho justifica-se pela necessidade de inferirmos
sobre o papel da escola junto ao trabalho com plantas medicinais, bem como pela
contribuição em ampliar o conhecimento sobre essa temática junto aos licenciandos da área de
Ciências Biológicas.
Plantas Medicinais, uma breve apresentação
O conceito atrelado às Plantas Medicinais vem de décadas passadas, juntamente com
nossos ancestrais e, historicamente, eram utilizadas para tirar o mal-estar que atingia o corpo
humano e buscava a cura de doenças. A partir disso, começaram a aparecer interesses
econômicos e científicos sobre tais vegetais (MENGUE; MENTZ; SHENKEL, 2001).
As primeiras informações sobre essas plantas foram escritas em tábuas de barros, no
tempo babilônico, a mais ou menos 3.000 anos a.C. (CUNHA, 2003).
O homem primitivo buscou na natureza as soluções para os diversos males que o
assolava, fossem esses de ordem espiritual ou física. Aos feiticeiros, considerados
intermediários entre os homens e os deuses cabia a tarefa de curar os doentes,
unindo-se, desse modo, magia e religião ao saber empírico das práticas de saúde, a
exemplo do emprego de plantas medicinais. A era Antiga inaugurou outro enfoque,
quando, a partir do pensamento hipocrático, que estabelecia relação entre ambiente e
estilo de vida das pessoas, os processos de cura deixaram de ser vistos apenas com
enfoque espiritual e místico (ALVIM et al., 2006 apud FIRMO et al., 2011, p.91).
As antigas civilizações acreditavam que o poder das plantas vinha direto dos deuses e
que ajudavam na cura de enfermidades, portanto, tinha ligação religiosa, pois através delas o
homem ficaria mais perto dos seres superiores (GOFF, 1997).
Existe, ainda, outro documento escrito por um egiptólogo alemão de nome Georg
Ebers, que revolucionou a medicina em relação às plantas, e relatou: ‘Aqui começa o livro
relativo à preparação dos remédios para todas as partes do corpo humano’. Esse papiro foi
decifrado em 1873 e era pertencente ao ano XVI a.C. (CUNHA, 2003).
Há relatos que a medicina egípcia existira desde 2000 anos antes de surgirem os
primeiros médicos gregos. Na Medicina Chinesa já se tem indícios de uso de plantas
medicinais desde 2500 a.C. (SCHENKEL; GOSMAN; PETROVICK, 2003). No antigo Egito,
foram descobertos papiros que relatavam mais de 700 drogas encontradas juntamente com
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4271
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
extratos de plantas, metais e venenos de animais (ALMEIDA, 1993). Na Idade Média há um
processo de evolução em relação à utilização dessas plantas, ou seja, da ‘Arte de Curar’, pois
nessa época, os povos achavam que esses vegetais eram mágicos (CUNHA, 2003).
Informações de 2300 a.C. indicam que civilizações como os hebreus, assírios e
egípcios, plantavam essas ervas. Na Grécia, as plantas tinham valor terapêutico/tóxico muito
conhecido por Hipócrates, considerado como o ‘pai da Medicina’, pois através de seus
estudos, publicou a obra ‘Corpus Hipocratium’, que mostrava que para cada enfermidade
existia uma planta adequada (MARTINS et al., 2000).
No Brasil, esta cultura de utilização das plantas teve grande influência dos costumes
indígenas, europeus e africanos. Quando os escravos chegaram ao Brasil trouxeram consigo,
em embarcações, as plantas que usavam em rituais religiosos. Já os indígenas que habitavam
as terras brasileiras, consumiam os vegetais que eram passados pelos pajés de suas tribos, que
transmitiam tais informações de geração em geração. Por sua vez, os europeus que vieram ao
nosso país adquiriram essas práticas através das próprias necessidades, ou seja, conforme iam
ficando enfermos, eles mesmos descobriam plantas que os ajudavam e, também, contavam
com o auxílio dos indígenas (LORENZI; MATOS, 2002).
Com o surgimento do Renascimento, essa cultura em relação ao uso de plantas pouco
a pouco foi dando lugar a experimentações, assim como novos fármacos foram sendo
introduzidos na terapêutica (CUNHA, 2003). Dessa forma, a utilização das plantas medicinais
obteve um nome ligado ao ramo da ciência – fitoterapia (CARVALHO; CRUZ; WIEST,
2005).
A partir do isolamento dos constituintes ativos de vegetais, foi possível iniciar uma
nova fase com relação aos estudos de plantas medicinais, pois, desde então, seus compostos
foram reconhecidos como responsáveis pela ação farmacológica (CUNHA, 2003).
Segundo Pierre Pomet, citado por Cunha (2003), o estudo das plantas entra no cenário
científico, na obra ‘Histoire géneral des Drogues’ quando surge a classificação e a descrição
taxonômica, ou seja, que traduz a identificação botânica mais exata, algo essencial para uma
utilização segura (CUNHA, 2003).
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), de 65-80% da população dos
países em desenvolvimento dependiam das plantas medicinais como única forma de acesso
para cuidar de sua saúde e ressalta que era mais acessível devido ao baixo custo
(AKERELE, 1993). No Brasil existem, aproximadamente, 22% das espécies vegetais do
planeta, o que representa uma biodiversidade incomparável e, consequentemente, uma enorme
vantagem para o país (FUZÉR; SOUZA, 2003).
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4272
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
Segundo Fuzér e Souza (2003), estas plantas medicinais são utilizadas para fabricação
de medicamentos com um custo mais acessível quando comparado aos produtos sintéticos,
além de ter ação biológica eficaz, de baixíssima toxidade e efeitos colaterais.
No Brasil, essas plantas são consumidas, mas, na maioria vezes, não se tem uma
comprovação de suas propriedades farmacológicas (BLUMENTAHL, 1998). Substâncias
contidas nas plantas medicinais, quando usadas na fitoterapia, podem apresentar benefícios,
mas, também, podem ser muito prejudiciais à saúde, pois o uso inadequado dessas ervas pode
causar danos irreparáveis (MENGUE; MENTZ; SHENKEL, 2001). Em nosso país, pesquisas
para avaliação do uso seguro de plantas medicinais e fitoterápicos ainda são principiantes,
assim como o controle da comercialização pelos órgãos oficiais em feiras livres, mercados
públicos ou lojas de produtos naturais (MENGUE; MENTZ; SHENKEL, 2001).
Segundo Schenkel, citado por Mengue, Mentz e Shenkel (2001), algumas dessas
plantas com toxinas estão no nosso dia a dia: comigo ninguém pode, coroa de cristo, mamona,
cartucheira, entre outras. Um dos aspectos mais importantes que se deve ressaltar é que
muitas plantas ainda tem toxinas desconhecidas (CUNHA, 2003). Para se ter um produto
adequado ao uso, é necessário fazer rigorosamente, um controle de qualidade, pois o Brasil é
o país que mais tem espécies de plantas medicinais e mais exporta também. No ano de 2004
foi aprovada, em nosso país, a Resolução de nº 48, que aborda sobre as etapas que a planta
passa para fabricação do medicamento, e o controle que se deve ter (ANVISA, 2004).
O Decreto nº 5.813, de 22 de junho de 2006, apresenta alguns aspectos que devem ser
seguidos, visando à segurança do produto, qualidade e eficácia ao consumo. Também faz
inferências sobre a prática de cultivo, de produção e a sua manipulação (SIMÕES;
GOSMANN; SCHENKEL, 2004).
Plantas Medicinais e Conhecimentos Prévios
Admitimos, a priori, que a escola é o local em que os professores devem fornecer as
‘ferramentas’, para que os alunos desenvolvam conhecimentos e que, assim, se tornem
cidadãos ‘de bem’, que tenham ciência dos deveres e diretos que possuem na sociedade.
De certa forma, a unidade escolar tem, entre outros papéis, de utilizar as concepções
prévias do aluno como um ponto de partida para a construção do conhecimento e, também,
como uma forma de se fazer a análise diagnóstica para ter ciência das informações que o
aprendiz já conhece, independentemente da coerência ou não em relação ao saber de
referência. Nesse sentido, conhecer o que o aluno já sabe significa colocá-lo diante de uma
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4273
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
situação problema para que sinta a necessidade de buscar novas informações afim de que se
torne capaz de chegar à solução. Dessa forma, é possível cogitar a remodelação dos
conhecimentos prévios (SFORNI; GALUCH, 2006).
Segundo Companario, citado por Carretero (1997), as concepções alternativas podem
influenciar muito no processo de ensino e aprendizagem, pois, como ressaltado anteriormente,
o aluno já chega à escola com informações sobre os assuntos que serão trabalhados
(principalmente em relação àqueles que se associam às Ciências Naturais por, direta ou
indiretamente, fazerem parte do seu cotidiano), podemos destacar, também, o papel das
diversas mídias que abordam tais temas. Porém, o mesmo autor salienta que, às vezes, os
conceitos são empregados (fora do contexto escolar) de forma inadequada e, neste caso, o
professor deve, por meio de diferentes estratégias, mostrar ao aluno uma visão mais ampla do
assunto e, assim, buscar desestabilizar as informações que ele apresentava para que,
ativamente, possa modificar/ampliar/remodelar essas informações.
Neste caso, o Ensino de Ciências tem, como uma de suas principais funções, ajudar o
aluno a reorganizar suas ideias sobre os conceitos naturais para que possa utilizá-las, de
maneira correta e eficiente, em suas ações diárias (DRIVER, 1985).
Carretero (1997), entretanto, chama a atenção para o fato de que podemos encontrar
denominações diferentes para o conhecimento prévio dos alunos, como: concepções
espontâneas, concepções errôneas, concepções alternativas.
Sendo assim, é fundamental a escola valorizar o saber popular como forma de
incentivar e de abrigar a participação da comunidade e, principalmente, dos alunos. Quando o
aluno escuta o que o professor ensina e tem a lhe dizer, se torna mais seguro de si mesmo, de
seus atos, tanto na sociedade como em relação ao ambiente (ACHCAR, 2004). Pinsk (1998)
ressalta, sobre esse assunto, que exercer o direito de cidadania é votar, é não sujar a cidade, é
dar opinião, ser crítico, é respeitar o outro. E, certamente, a escola exerce papel importante na
concretização de tais objetivos.
Castro (2010) adverte que, de maneira geral, observa-se uma lacuna entre o
conhecimento escolar e o espontâneo justamente pelo fato de que os professores do primeiro
nível da educação básica (alvo de seus estudos de mestrado) ao trabalharem com conceitos
científicos não apresentam todas as informações necessárias para suprir a curiosidade dos
alunos. Ressalta, ainda, que os livros didáticos (um dos mais importantes recursos
pedagógicos utilizado na escola) também não contribuem de forma significativa nesse
sentido. Tudo isso gera, consequentemente, uma falta de conexão entre as informações que os
alunos já apresentam e aquelas que são acrescentadas durante a vida escolar.
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4274
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) salientam, entretanto, que nem todas as
crianças possuem um conhecimento prévio sobre todos os diversos assuntos trabalhados na
educação básica, para isso o professor deverá apresentar ideias, situações problemas, textos
informativos ou, ainda, trabalhar com as concepções que, eventualmente, algum aluno
apresenta para que, assim, possa auxiliar os outros a construir um conceito sobre a temática
em questão. O mesmo documento indica, como algo oportuno, valorizar as dúvidas e
questionamentos dos educandos, porque eles podem representar uma forma de exteriorização
dessas informações prévias (BRASIL, 1998a).
Buscando compreender as informações que os alunos trazem para a escola acerca da
temática ‘plantas medicinais’ desenvolvemos uma pesquisa junto às cinco escolas públicas
estaduais de Vargem Grande do Sul, interior do estado de São Paulo.
O Ministério da Educação, via PCN, salienta que é no terceiro ciclo da educação
básica (6º e 7º anos, antigas 5ª e 6ª séries), que se amplia o estudo sobre o ambiente e seus
problemas, bem como os seres vivos. Sendo assim, é o momento em que se faz a
[...] caracterização dos estratos herbáceo, arbustivo e arbóreo, presentes em
diferentes ambientes, o que representa avanço significativo no reconhecimento dos
componentes vegetais das paisagens, permitindo uma descrição interessante da
vegetação e a identificação, em alguns casos, de diferentes fases do processo de
recomposição do ambiente natural. A descrição e comparação de plantas
significativas de determinados ambientes estudados também é importante [...]
(BRASIL, 1998b, p.69-70).
Partindo dessa recomendação oficial e tendo como princípio o fato de que durante a 6ª
série (7º ano) os alunos tiveram contato com diversos assuntos botânicos, optamos por
realizar a coleta de dados junto à 7ª série (8º ano) do Ensino Fundamental.
Utilizamos, como instrumento para a coleta de dados, um questionário estruturado
contendo questões abertas e fechadas (apresentadas e discutidas a seguir), sobre Plantas
Medicinais, em que os alunos deveriam responder com suas palavras, o que era pedido. Sendo
assim, obtivemos um total de quatrocentos e três (403) questionários respondidos.
Para que essa aplicação fosse realizada, primeiramente, solicitou-se autorização junto
à direção de cada uma das unidades escolares. A partir do momento em que essa foi
concedida, o questionário era aplicado durante o horário de aula, com o acompanhamento e
supervisão dos professores de Ciências de cada uma das turmas. Ainda que o professor
estivesse em sala, previamente, tínhamos solicitado que não fornecesse qualquer ajuda aos
alunos, pois, caso contrário, não encontraríamos dados condizentes com a realidade.
O preenchimento do questionário teve caráter voluntário e realizado de maneira
individual. A avaliação dos resultados obtidos fundamentou-se na análise descritiva das
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4275
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
respostas a cada uma das questões, logo, a partir de uma abordagem qualitativa (BOGDAN;
BIKLEN, 1994) os dados foram analisados com base nos referenciais teóricos.
O gráfico 1, apresentado a seguir, mostra a distribuição percentual das respostas dos
alunos quando questionados sobre ‘Qual planta medicinal você mais utiliza em casa?’. A
análise gráfica permite-nos considerar que há grande predominância de plantas que,
historicamente, fazem parte da cultura popular quanto à capacidade dos vegetais combaterem
certos problemas de saúde.
Percebemos aqui a interação direta entre as informações trazidas pelos alunos ao
contexto escolar e seu cotidiano e, consequentemente, às interações estabelecidas com a
família, certamente, responsável direta pela associação entre essas plantas e o possível efeito
medicinal por elas apresentado.
40
37,96
35
Percentual
30
25
20,34
20
15
9,67
10
5
0
0,99
8,28
7,44
6,2
2,48
0,99 0,99 1,24
0,99
2,43
Gráfico 1: Percentual de respostas quanto à planta medicinal rotineiramente mais utilizada, segundo alunos do
8º ano de escolas públicas estaduais de Vargem Grande do Sul – SP.
Dessa forma, é possível observar que a grande maioria dos alunos mencionou Hortelã,
Erva cidreira e Boldo. Porém, vale destacar que um número considerável de educandos ficou
em dúvida em relação ao conceito de planta medicinal, ou seja, da definição do que,
realmente, seria medicinal e, por consequência, não responderam a essa pergunta, o que
poderia justificar as respostas ‘em branco’. Inserimos na categoria ‘outros’ as referências em
relação à abobreira, arruda, carqueja, eucalipto (com 0,24% para cada uma delas), alfavaca,
Cannabis e limão, com 0,49% para cada um desses vegetais.
Essa influência do contexto social dos alunos pôde ser, também, evidenciada quando
foram questionados se ‘acreditavam no poder das plantas medicinais no tratamento de
doenças’. Isso porque, como podemos verificar no gráfico 2, a grande maioria dos avaliados
acredita nos benefícios que as plantas trazem ao corpo humano. Esse dado encontra respaldo
quando associado com as informações apresentadas no gráfico anterior, quando foi possível
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4276
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
verificar a apresentação de uma elevada variedade de vegetais utilizados com fins medicinais
no cotidiano desses alunos. Logo, pela nossa avaliação, há coerência em acreditar no efeito
das plantas e, consequentemente, ser capaz de citar exemplos de algumas delas.
80
72,45
70
Percentual
60
50
40
30
20
15,65
10
5,95
5,95
0
Sim
Não
Não sei
Em branco
Gráfico 2: Percentual de respostas quanto à crença do poder das plantas medicinais para o tratamento de
doenças, segundo alunos do 8º ano de escolas públicas estaduais de Vargem Grande do Sul – SP.
Os dados supracitados são totalmente coerentes com a análise da pergunta que
indagava aos alunos ‘O que você entende por PLANTA MEDICINAL?’, pois 65,5% das
respostas mostram associações que pudemos inserir em uma categoria genérica referente ao
‘poder de cura’ desses vegetais, ou seja, grande parte dos educandos associa, de maneira
direta, o conceito de plantas medicinais à cura. Além disso, 2,7% dos respondentes fizeram
associações com o nome de plantas medicinais; 0,24% responderam ter relação com culinária
e 0,49% associaram à ideia de vegetais de laboratório que são plantados em casa. Vale
salientar que 18,3% dos questionários não apresentavam respostas para essa questão.
Tivemos, com a análise da pergunta ‘Tudo o que você conhece sobre plantas, quem
lhe ensinou?’ uma confirmação dos aspectos indicados e discutidos no gráfico 2. Isso porque,
como apresentado no gráfico 3 a seguir, há um elevado percentual de alunos que indica a
família como sendo a responsável por compartilhar as informações associadas às plantas
medicinais.
Dessa forma, temos fortes indícios para admitirmos que os conhecimentos prévios dos
alunos em relação a essa temática são fortemente influenciados pelo contexto em que vivem,
logo, são úteis para resolver seus problemas cotidianos, mas, não necessariamente, são
coerentes com o conhecimento científico. Algo que deveria ser trabalhado e melhor explorado
pela escola, onde poderíamos, partindo dessas informações trazidas pelos alunos e, adquiridas
por suas interações sociais, serem remodelas, enriquecidas, para, por exemplo, fornecer
significado e aplicabilidade para as aulas direcionadas ao tratamento dos conteúdos botânicos,
trabalhados de maneira geral, de forma teórica, com excesso de terminologia e, portanto,
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4277
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
distante de uma aprendizagem significativa, pois não mobiliza as informações já presentes na
rede cognitiva dos alunos.
60
Percentual
50
50,1
40
30
26,49
20
12,51
10
6,94
3,22
0,74
Televisão
Internet
0
Familiares
Escola
Ninguém
Em branco
Gráfico 3: Percentual de respostas quanto à origem das informações sobre plantas medicinais, apresentadas por
alunos do 8º ano de escolas públicas estaduais de Vargem Grande do Sul – SP.
Dados semelhantes a esses foram encontrados por Macedo, Oshiwa e Guarido (2007)
ao analisarem informações sobre o uso de plantas medicinais em um bairro na cidade de
Marília – SP. Nessa pesquisa, encontraram que 55,17% das indicações de uso de plantas
medicinais eram feitas por amigos e parentes.
Vale destacarmos, também, a baixa indicação dos meios de comunicação nas respostas
dos alunos, algo que consideramos coerente, uma vez que os temas atrelados às plantas
medicinais não são abordados com elevada frequência quando comparados a temas como
drogas, violência, aborto, entre outros. Nesse sentido, consideramos ainda mais importante o
papel da escola para trabalhar com coerência e rigor científico junto a essa temática.
Outra informação de grande relevância foi obtida ao analisarmos as respostas à
pergunta ‘Hoje em dia, em sua casa, são utilizados com maior frequência os remédios
manipulados ou as ervas naturais?’, pois, conforme dados apresentados no gráfico 4, existe
uma proximidade percentual bastante elevada entre a utilização de remédios manipulados e,
portanto, provenientes da indústria farmacêutica em relação ao uso da ervas medicinais.
Esses dados evidenciam que as plantas medicinais apresentam uma relevância no
cotidiano das pessoas, porém seu uso, de maneira geral, está atrelado, também, à medicação
convencional que, via de regra, apresenta um custo mais elevado em relação à primeira.
Entretanto, consideramos importante destacar, que essas informações também
apresentam relevância já que a utilização dos remédios convencionais se faz, na maioria das
vezes, com a orientação de um médico, algo de grande importância para a preservação da
vida/saúde das pessoas. Nesse mesmo sentido, não podemos esquecer que muitas plantas tidas
como medicinais carecem de estudos científicos para a confirmação de suas reais
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4278
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
propriedades. Logo, o acompanhamento médico (indiretamente associado ao uso dos
remédios manipulados) mostra-se algo necessário.
40
37,22
35
32,75
Percentual
30
25
19,85
20
15
10,18
10
5
0
Planta Medicinal
Método
Convencional
Não sei
Em branco
Gráfico 4: Percentual de respostas quanto a prevalência de utilização entre plantas medicinais e remédios da
industria farmacêutica, segundo alunos do 8º ano de escolas públicas estaduais de Vargem Grande do Sul – SP.
O questionário indagava ainda ‘Você já ouviu falar em fitoterapia? Caso a sua
resposta foi sim, escreva duas palavras relacionadas ao termo FITOTERAPIA’. Nossas
análises revelaram que a grande maioria – 71,4% dos alunos questionados – disse nunca ter
ouvido o referido termo. Entretanto, 14,1% responderam ‘sim’, sugerindo conhecer o
conceito. Porém, ao analisarmos as palavras indicadas como relacionadas a esse termo,
encontramos ‘plantas que curam’ e ‘fisioterapia’. Vale salientar, então, que muitos alunos
buscam estabelecer relações de sentido / fonética entre os termos que lhes são apresentados
com outras palavras que fazem parte de sua estrutura cognitiva, algo que já foi evidenciado
em trabalhos que buscaram avaliar concepções alternativas de alunos em relação a outras
temáticas (VERONA, 2006).
Consideramos importante evidenciar que fitoterapia é o estudo em que se utilizam
extratos de origem natural, ou seja, ‘fito’ é planta e ‘terapia’, cura, portanto, ‘plantas que
curaram’. Já fisioterapia é uma palavra de origem grega que vem de ‘phýsis’, um conjunto de
técnicas que ajuda na prevenção de lesões. Encontramos, ainda, entre as respostas, muitos
alunos que apesar de afirmarem já ter ouvido falar o termo fitoterapia, não foram capazes de
associar palavras relacionadas a elas.
Portanto, embora haja uma grande quantidade de informações relativas à Ciência e
Tecnologia em diversos tipos de mídia, essas são cada vez mais complexas e distantes do
entendimento dos alunos e, possivelmente, dos cidadãos comuns, de tal modo que é preciso
haver uma socialização maior de conhecimentos específicos (LEGEY, 2009). E é justamente
nesse ponto que o papel da escola deve ser realçado, fazendo um elo entre os conhecimentos
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4279
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
prévios dos alunos, adquiridos pelo convívio familiar e/ou por meio das diversas mídias, com
o conhecimento de referência, nesse caso em particular, com a botânica.
Considerações Finais
A utilização da fitoterapia, ou seja, o tratamento pelas plantas é algo que vem de
épocas remotas e, consequentemente, faz parte da história da humanidade. O uso dessa, e de
outras práticas alternativas, precisa ser analisada, também, como uma opção à falta de
atendimento às necessidades básicas de grande parte da população.
Logo, a exemplo de dados apresentados pela literatura, encontramos junto aos alunos
aqui avaliadas, que a transmissão das informações relativas às plantas medicinais, apresenta
um cunho intergeracional, ou seja, passada ao longo das gerações e tendo forte influência
familiar. Destacamos, também, que isso se associa ao fato de que muitos dos vegetais
utilizados não apresentam comprovação de seu efeito fitoterápico.
A análise dos conhecimentos prévios apresentados pelos alunos que participaram da
presente pesquisa revelou que a escola tem fornecido uma contribuição pouco relevante
quanto a essa temática para o desenvolvimento intelecto-social dos educandos. Entretanto,
indicamos que o trabalho com as plantas medicinais poderia constituir uma rica oportunidade
para aproximar o Ensino da Botânica à realidade dos discentes e, portanto, ser uma alternativa
ao trabalho com conceitos, geralmente, abstratos e pouco motivantes para essa faixa etária.
Referências
ACHCAR, T. Ciência e saber popular de mãos dadas. Revista Nova Escola, São Paulo, 2004.
AKERELE, O. Summary of WHO guidelines for assessment of herbal medicines.
HerbalGram, Austin, n.28, p.13-19, 1993.
ALMEIDA, E.R. Plantas medicinais brasileiras. São Paulo: Hemus, 1993.
ANVISA. Resolução RDC nº 48, de 16 de março de 2004. Dispõe sobre o registro de
medicamentos
fitoterápicos.
Disponível
em:
<http://elegis.anvisa.gov.br/leisref/public/showAct.php?id=10230>. Acesso em: 12 set.2014.
BLUMENTAHL, M. The Complete German Commission e Monographs: Therapeutic
Guide to Herbal Medicines. American Botanical Council: New York, 1998.
BOGDAN, R. C.; BIKLEN, S. K. Investigação Qualitativa em Educação: uma introdução
à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994.
BRASIL. Ministério da Educação, Secretaria da Educação Média e tecnológica. Parâmetros
Curriculares Nacionais do Ensino Médio. Ministério da Educação, Brasília, 1998a.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Ciências Naturais. Brasília: MEC/SEF, 1998b.
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4280
Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
CARRETEREO, M. Construtivismo e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
CASTRO, D. R. Estudo de Conceitos de Seres Vivos nas Séries Iniciais. 2010. 160 f.
Dissertação (Mestrado em Ensino, Filosofia e História das Ciências) – Universidade Federal
da Bahia, Salvador, 2010.
CARVALHO, H.H.C.; CRUZ, F.T.; WIEST, J.M. Atividade antibacteriana em plantas com
indicativo etnográfico condimentar em Porto Alegre, RS/Brasil. Revista Brasileira de
Plantas Medicinais, v.7, n.3, p.25-32, 2005.
CUNHA, A.P.M.A. Aspectos históricos sobre plantas medicinais, seus constituintes ativos e
fitoterapia. In: CUNHA, A.P.; ROQUE, O.R.; SILVA, A.P. Plantas e produtos vegetais em
fitoterapia. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003. Disponível em:
<http://www.esalq.usp.br/siesalq/pm/aspectos_historicos.pdf>. Acesso em: 17 out.2014.
DRIVER, R. Children’s ideas in science. Milton Keynes, UK: Open University Press, 1985.
FIRMO, W.C.A. et al. Contexto histórico, uso popular e concepção científica sobre plantas
medicinais. Cadernos de Pesquisa, São Luís, v. 18, n. especial, p.90-5, dez. 2011.
FUZÉR, L.; SOUZA, I. IBAMA dá início a núcleo de plantas medicinais. Bionotícias, Rio de
Janeiro, n. 57, p.6-7, jan./fev. 2003.
GOFF, J. As doenças têm história. Lisboa: Terramar, 1997.
LEGEY, A. Educação científica na mídia imprensa brasileira: Avaliação da divulgação
de biologia celular em jornais e revistas selecionados. Revista de Educação em Ciência e
Tecnologia, volume 2, nº 3, p.35-52, novembro, 2009.
LORENZI, H.; MATOS, F.J.A. Plantas medicinais no Brasil: nativas e exóticas. São
Paulo: Instituto Plantarum, 2002.
MACEDO, A.F.; OSHIWA, M.; GUARIDO, C.F. Ocorrência do uso de plantas medicinais
por moradores de um bairro do município de Marília – SP. Revista de Ciências
Farmacêuticas Básica e Aplicada, Araraquara, v.28, n.1, 2007.
MARTINS, E. R. et al. Plantas Medicinais. Viçosa: UFV, 2000.
MENGUE, S.S.; MENTZ, L.A.; SHENKEL, E.P. Uso de plantas medicinais na gravidez.
Revista Brasileira de Farmacognosia, Curitiba, v.11, p.21-35, 2001.
PINSKY, J. Cidadania e educação. São Paulo: Contexto, 1998.
POZO, J. A.; SANZ, A.; GÓMEZ CRESPO, M. A.; LIMÓN, M. Las ideas de los alumnos
sobre la ciencia: un interretación desde la psicología cognitiva. Enseñanza de las Ciências,
Barcelona, v.9, n.1, p.83-94, 1991.
SCHENKEL, E.P.; GOSMAN, G.; PETROVICK, P.R. Produtos de origem vegetal e o
desenvolvimento de medicamentos. In: SIMÕES, C.M.O. et al. (Ed.). Farmacognosia: da
planta ao medicamento. Porto Alegre: UFSC, 2003.
SFORNI, M. S. F.; GALUCH, M. T. B. Aprendizagem Conceitual nas Séries Iniciais do
Ensino Fundamental. Educar em revista, Curitiba, n. 28, jul/dez. 2006.
SIMÕES, C.M.O.; GOSMANN, G.; SCHENKEL, E.P. Farmacognosia: da planta ao
medicamento. Porto Alegre/ Florianópolis: Ed. Universidade/ UFRGS/ Ed. da UFSC, 2004.
VERONA, M.F. A Metodologia da Problematização aplicada ao Ensino de Parasitologia
nos níveis Fundamental e Médio. 2006. 111f. Monografia (Bacharelado em Ciências
Biológicas) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2006.
SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia
4281
Download