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MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO
SECRETARIA DA AGRICULTURA FAMILIAR
DEPARTAMENTO DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL
CONTROLE BIOLÓGICO DE PRAGAS
ATRAVÉS DO MANEJO DE
AGROECOSSISTEMAS
Brasília, 2007
MDA - endereço
www.pronaf.gov.br/dater
Tiragem:
exemplares
REFERÊNCIA:
CONTROLE BIOLÓGICO DE PRAGAS ATRAVÉS DO MANEJO DE AGROECOSSISTEMAS. Brasília: MDA,
2007. 31p
(Catalogação na publicação Biblioteca da EMATER/RS - ASCAR)
A281
CONTROLE BIOLÓGICO DE PRAGAS ATRAVÉS DO MANEJO DE
AGROECOSSISTEMAS. Brasília : MDA, 2007
33 p. : il.
Conteúdo: Projeto e implantação de uma estratégia de manejo de habitats para
melhorar o controle biologico de pragas em Agroecossistemas / Clara Ines Nicholls
e Miguel Altiere Melhorando o manejo de pragas através da saúde do solo:
direcionando uma estratégia de manejo do habitat solo / Miguel A. Altieri, Luigi Ponti
e Clara I. Nicholls.
1. Agroecologia. 2. Solo. 3. Praga de Planta. 4. Controle Biologico. I. Nicholls,
Clara Ines. II. Altiere, Miguel A. III. Ponti, Luigi.
CDU 631.588.9
ÍNDICE
Projeção e implantação de uma estratégia de manejo de habitats para
melhorar o controle biológico de pragas em Agroecossistemas
02
Por Clara Inês Nicholls e Miguel A. Altieri
Melhorando o manejo de pragas através da saúde do solo: direcionando uma
estratégia de manejo do habitat solo
Por Miguel A. Altieri, Clara Inês Nicholls e Luigi Ponti
17
APRESENTAÇÃO
O Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural - DATER, da
Secretaria da Agricultura Familiar - SAF do MDA, vem fazendo um esforço no sentido
da formação de Agentes de Ater visando a qualificação das ações junto à agricultura
familiar brasileira com base na nova Política Nacional de Ater - PNATER.
Um dos pilares da PNATER é a adoção dos pricípios da Agroecologia, como
eixo orientador das ações técnicas, o que tem determinado a realização de muitos
eventos de capacitação além da distribuição de material didático sobre o tema.
Dando continuidade a esta ação, o DATER vem apresentar dois textos de
aurtores renomados na área da Agroecologia. Ambos tratam de processos que ajudam
no controle ecológico de pragas a partir de formas agroecológicas de manejo de
agroecossistemas.
O primeiro texto, de autoria de Clara Nicholls e Miguel Altieri, informa sobre
estratégias de manejo da biodiversidade que contribuem para o controle biológico de
pragas. O segundo texto, de Miguel Altieri, Luigi Ponti e Clara Nicholls, aporta uma
importante contribuição na medida em que relaciona a saúde do solo com o manejo de
pragas.
Esperamos que a divulgação destes textos possa ser mais uma contribuição
para a implementação de agriculturas de base ecológica apoiadas nos principios da
transição proposta pela Agroecologia.
Brasília, janeiro de 2007.
Francisco Roberto Caporal
Coordenador Geral de Ater
MDA / SAF / DATER
1
APRESENTAÇÃO
Projeção e Implantação de uma Estratégia de Manejo de Habitats
Para Melhorar o Controle Biológico de Pragas em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
Os agricultores podem melhorar a
resistência e resiliência de seus cultivos
por meio do reforço de suas defesas
intrínsecas contra pragas a pragas. Isso
pode ser alcançado por duas estratégias:
o aumento da biodiversidade acima e
abaixo do solo e a melhoria da saúde do
solo. Este trabalho enfoca o papel da
diversidade de insetos benéficos nas
propriedades agrícolas e formas de
melhorar a biodiversidade funcional em
agroecossistemas, a fim de promover o
controle biológico de insetos-praga.
A biodiversidade é crucial para as defesas
dos cultivos: quanto mais diversificadas as
plantas, animais e organismos do solo que
ocuparem um sistema agrícola, maior será
a diversidade da comunidade de inimigos
naturais de pragas que a unidade de
produção poderá sustentar. Um grupo os
predadores benéficos ingere os insetos
fitófagos e ácaros ou suga os líquidos
deles. Outro grupo
os parasitóides
benéficos colocam seus ovos dentro dos
ovos e/ou das larvas de pragas. Um
terceiro grupo
os organismos
entomopatogênicos que incluem fungos,
bactérias, vírus, protozoários e
nematóides fazem com que as pragas
fiquem fatalmente doentes ou sejam
impedidas de se alimentar ou se
reproduzir. As plantas também formam
associações complexas com organismos
em torno de suas raízes, o que oferece
proteção contra doenças. Fungos e
besouros que vivem no solo podem
danificar as sementes de ervas daninhas
que competem com as plantas. Além
disso, a rica fauna do solo realiza papéis
fundamentais na decomposição e
mineralização da materiais orgânicos,
disponibilizando assim nutrientes para as
plantas. A biodiversidade, sob a forma de
policultivos, também pode tornar as
plantas menos "visíveis" para as pragas;
os cultivos crescendo em monoculturas
podem ser tão óbvios para as pragas que
as defesas das plantas não são incapazes
de protegê-las.
Os agricultores podem melhorar
a biodiversidade de suas terras com as
seguintes medidas:
. aumento da diversidade de
plantas, através da rotação de culturas ou
de policultivos de culturas comerciais ou
de plantas de cobertura, na mesma área e
ao mesmo tempo;
. manejo da vegetação em torno
dos campos para atender às
necessidades de organismos benéficos;
. fornecimento de recursos
suplementares aos organismos benéficos,
como estruturas artificiais para
nidificação, alimento extra e presas
alternativas;
. estabelecimento de "corredores"
de plantas que atraiam organismos
benéficos de matas próximas ou da
vegetação natural para áreas centrais das
lavouras, hortas ou pomares;
. seleção e implantação no campo
de faixas de plantas diferentes dos
cultivos, cujas flores respondam às
exigências dos organismos benéficos.
Solos saudáveis também são
essenciais para a defesa das plantas.
Solos não-saudáveis limitam a
capacidade natural dos cultivos utilizarem
suas próprias defesas, e os deixam
vulneráveis a pragas potenciais. Por outro
lado, solos saudáveis são capazes de
municiar as plantas com nutrientes, que
melhoram suas defesas, e de otimizar o
desenvolvimento das raízes e uso da
água. O aumento da susceptibilidade a
pragas é geralmente reflexo da diferenças
na saúde da planta, causadas pelo mau
manejo da fertilidade do solo. Muitos
estudos mostram uma menor abundância
de várias pragas de insetos em sistemas
com baixo uso de insumos, e atribuem tais
reduções parcialmente ao menor
conteúdo de nitrogênio em cultivos
orgânicos. Além disso, os organismos
2
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
saudáveispodem aumentar o aproveitamento de nutrientes, liberar substâncias
químicas que estimulam o crescimento e
agir como antagonistas a patógenos.
Solos saudáveis também podem expor
sementes de plantas espontâneas a um
número maior e mais diversificado de
predadores e decompositores, e a
liberação mais lenta de nitrogênio durante
a primavera pode atrasar a germinação
das plantas espontâneas com sementes
pequenas que muitas vezes precisam de
um grande suprimento de nitrogênio para
germinar e iniciar um rápido crescimento
dando assim vantagem aos cultivos, que
têm sementes maiores.
Os agricultores podem melhorar
a saúde do solo:
. diversificando as rotações de
cultivos, incluindo leguminosas e
forragens perenes;
. mantendo o solo coberto durante
todo o ano com vegetação e/ou resíduos
das culturas;
. adicionando material orgânico de
origem animal, de palhas ou de outras
fontes;
. reduzindo a intensidade de
aração e gradagem, e protegendo os solos
da erosão e da compactação;
. usando técnicas de manejo
adequadas para fornecer nutrientes às
plantas de forma equilibrada, sem poluir a
água.
Quando agricultores adotam
práticas que aumentam a quantidade e
diversidade de organismos acima e dentro
do solo, eles também fortalecem a
capacidade dos cultivos para tolerar
pragas. Neste processo, os agricultores
também aumentam a fertilidade do solo e a
produtividade dos cultivos.
A Biodiversidade e sua Função em
Unidades Agrícolas
A biodiversidade em unidades
agrícolas se refere a todos os organismos
vegetais e animais (cultivos, plantas
espontâneas, criações animais, inimigos
naturais, polinizadores, fauna do solo,
etc.) presentes na unidade de produção e
no seu entorno. A biodiversidade pode ser
tão variada quanto os vários cultivos,
plantas espontâneas, artrópedes, ou
microorga-nismos envolvidos, de acordo
com fatores relacionados à localização
geográfica, ao clima, ao solo, além dos
humanos e socioeconômicos. Em geral, o
grau de biodiversidade em
agroecossistemas depende de quatro
características principais:
- a diversidade da vegetação dentro
e em torno do agroecossistema;
- a permanência dos vários cultivos
dentro do agroecossistema;
- a intensidade do manejo;
- o grau de isolamento do
agroecossistema em relação à vegetação
natural.
O grau de diversidade da
vegetação dentro e em torno da unidade
de produção, a quantidade de cultivos que
compõem a rotação, a proximidade a uma
floresta, a existência de cercas vivas e
pastagens ou de outras formas de
vegetação natural são fatores que
contribuem para o nível de biodiversidade
de uma unidade agrícola.
Os componentes de biodiversidade dessas unidades podem ser
classificados em relação ao papel que têm
no funcionamento dos sistemas de cultivo.
Sendo assim, a biodiversidade agrícola
pode ser agrupada da seguinte
maneira:
- biota produtiva: cultivos, árvores e
animais escolhidos pelos agricultores, que
têm papel determinante na biodiversidade
e na complexidade do agroecosistema;
- biota de recursos: organismos que
contribuem para a produtividade através
da polinização, controle biológico,
decomposição, etc.
- biota destrutiva: plantas
espontâneas, insetos praga, patógenos
microbianos, etc., que os agricultores
visam reduzir através de manejo cultural.
Dois componentes distintos da
biodiversidade podem ser reconhecidos
3
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
como agroecossistemas. O primeiro
componente, a biodiversidade planejada,
inclui os cultivos e criações animais com
finalidade produtiva no agroecossistema,
e que variam de acordo com o manejo de
insumos e diferentes arranjos
espaço/temporais do cultivo. O segundo
componente, a biodiversidade associada,
inclui toda a flora e fauna do solo herbívoros, carnívoros, decompositores,
etc. - que coloniza o agroecossistema a
partir do ambiente circundante e que irão
predominar no agroecossistema,
dependendo de seu manejo e estrutura. O
relacionamento entre os tipos de
componentes da biodiversidade é
ilustrado na Figura 1. A biodiversidade
planejada tem uma função direta, como
ilustrado pela seta contínua ligando a
caixa de biodiversidade planejada com a
caixa de função do ecossistema. A
biodiversidade associada também tem
uma função, mas é mediada pela
biodiversidade planejada. Portanto, a
biodiversidade planejada também tem
uma função indireta, ilustrada pela seta
pontilhada na figura, realizada através de
sua influência sobre a biodiversidade
associada. Por exemplo, as árvores em
sistemas agroflorestais criam sombra,
tornando possível o cultivo de espécies
intolerantes à radiação solar direta. A
função direta destas árvores é, portanto,
criar sombra, mas com as árvores poderão
vir vespas que buscam o néctar das flores.
Essas vespas podem, por sua vez, ser
parasitóides naturais de pragas que
normalmente atacam os cultivos. As
vespas fazem parte da biodiversidade
associada. As árvores então criam sombra
(função direta) e atraem vespas
(função indireta).
Figura 1. Relacionamentos entre vários tipos de biodiversidade e seu papel na função do
Agroecossistemas.
Manejo do
Agroecossistema
Biodiversidade
Planejada
Função do Ecossistema
(ex. Regulação de pragas,
ciclagem de nutrientes, etc )
Biodiversidade
no Entorno
Biodiversidade
Associada
Interações complementares entre os
vários componentes da biodiversidade
também podem ser de natureza múltipla.
Algumas destas interações podem ser
usadas para indução de efeitos positivos e
diretos sobre o controle biológico de
pragas de cultivos específicos,
restabelecimento da fertilidade e/ou
melhoria e conservação do solo. O
aproveitamento dessas interações em
situações reais envolve novas maneiras
de planejar e manejar agroecossistemas,
requerendo um entendimento das
relações entre solo, microorganismos,
plantas, insetos herbívoros e inimigos
naturais. De fato, o desempenho ótimo
dos agroecossistemas depende do nível
de interação entre os vários componentes
bióticos e abióticos. Ao reunir uma
biodiversidade funcional, ou seja, um
conjunto de organismos com interações
que têm funções-chave na unidade de
produção, é possível iniciar sinergias que
fortaleçam os processos agrícolas,
prestando serviços ecológicos como a
ativação da biologia do solo, a ciclagem
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Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
dos nutrientes, a potencialização dos
artrópodes e antagonistas benéficos,
entre outros, todos importantes para
determinar a sustentabilidade dos
agroecossistemas (Figura 2).
Em agroecossistemas modernos, as
evidências experimentais sugerem que a
biodiversidade deve ser utilizada para um
melhor manejo de pragas. Vários estudos
têm demonstrado que é possível
estabilizar as comunidades de insetos dos
agroecossistemas, planejando sistemas
de cultivo que suportem populações de
inimigos naturais ou que tenham efeitos
restritivos a pragas herbívoras. O
fundamental é identificar o tipo de
biodiversidade desejável para se manter
e/ou otimizar as funções ecológicas, e
então determinar as melhores práticas de
manejo que favoreçam os componentes
desejados da biodiversidade. Existem
muitas práticas e projetos agrícolas que
potencializam a biodiversidade funcional,
e há outros que a afetam negativamente. A
idéia é aplicar as melhores práticas de
manejo para otimizar ou recuperar o tipo
de biodiversidade, fortalecendo a
sustentabilidade de agroecossistemas,
por desempenhar funções ecológicas
como o controle biológico de pragas, a
ciclagem de nutrientes, a conservação da
água e do solo, etc. O papel dos
agricultores e pesquisadores deverá ser
promover práticas agrícolas que
aumentem a quantidade e diversidade de
organismos que estão dentro do solo e
sobre ele, os quais desempenham
funções ecológicas fundamentais nos
Agroecossistemas (Figura 3).
Figura 2. Componentes, funções e estratégiaspara potencializar a biodiversidade funcional em
Agroecossistemas.
Componentes
Polinizadores
Predadores e
Parasitóides
Herbívoros
Minhocas
Micro, Macro e me
sofa una do solo
Estrutura do Solo,
Ciclagem de
Nutrientes
Decomposição,
predação, supressão
de doenças
BIODIVERSIDADE
Polinização
Regulação de
Pragas
Consumo de
Biomassa
Funções
POLICULTURA
AGROFLORESTAMENTO
ROTAÇÕES
PLANTAS DE COBERTURA
ARAGEM ZERO
COMPOSTO
ADUBAÇÃO VERDE
Técnicas
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Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
Figura 3. Os efeitos do manejo de agroecossistemas e práticas culturais associadas sobre a
diversidade de inimigos naturais e a abundância de insetos praga.
Aumento da Diversidade de Espécies de Inimigos Naturais Densidades Populacionais de Praga mais Baixa
Cercas vivas, cordões de vegetação,
quebra ventos
Policultivos
Rotações
Diversificação do Habitat
Plantas de Cobertura
Manejo orgânico do solo
Baixa perturbação do solo
MANEJO DO
AGROECOSSISTEMA
6
Pesticidas
Práticas Culturais
Aração Convencional
Remoção de todas as plantas espontâneas
Monocultura
Fertilização Química
Diminuição dos Inimigos Naturais e da Diversidade das Espécies - Aumentos das Populações
de Espécie Praga
Assim, uma importante estratégia
na agricultura é explorar a
complementaridade e sinergias que
resultem das várias combinações de
cultivos, árvores e animais em
agroecossistemas detentores de arranjos
espaciais e temporais tais como
policultivos, sistemas agroflorestais e
integrações lavoura-pecuária. Em
situações reais, a exploração dessas
interações envolve a projeção e manejo de
sistemas agrícolas e requer uma
compreensão das numerosas relações
entre solo, microorganismos, plantas,
insetos herbívoros e inimigos naturais.
Controle biológico de pragas: uma
estratégia para aumentar a
biodiversidade em unidades agrícolas
Estudos demonstram que
agricultores podem fazer com que pragas
e inimigos naturais cheguem a um
equilíbrio natural em unidades de
produção com grande biodiversidade.
Uma das maneiras mais eficientes e
duradouras de impedir que as pragas
causem danos econômicos à unidade de
produção é favorecer os organismos
benéficos existentes ou que ocorram
naturalmente, dando a eles um habitat
apropriado com fontes alternativas de
alimento. Um número menor de
organismos benéficos
predadores,
parasitas e patógenos de insetos vive em
monoculturas ou em áreas tratadas
rotineiramente com agrotóxicos do que em
agroecossistemas mais diversificados,
onde são utilizados menos produtos
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
tóxicos. Em geral, unidades de produção
que agrupam muitas dessas
características reúnem vários fatores
benéficos:
- os campos são pequenos e
circundados por vegetação natural;
- os sistemas de cultivo são
diversificados e as populações de plantas
dentro ou em torno dos campos incluem
plantas perenes e produtoras de flores;
- os cultivos são manejados
organicamente ou com um mínimo de
agentes agroquímicos sintéticos;
- os solos têm alto conteúdo de
matéria orgânica e alta atividade biológica
e estão sempre cobertos por matéria
vegetal, em decomposição ou não.
Fatores benéficos que ocorrem
naturalmente, em níveis suficientes,
podem eliminar boa parte das populações
de pragas. Para explorá-los de forma
eficaz, os agricultores devem:
- identificar os organismos
benéficos presentes;
- entender os ciclos biológicos
deles e suas necessidades de recursos
individuais.
Com essa informação,
agricultores podem desenvolver
esquemas de manejo que aumentarão o
tamanho e a diversidade dos complexos
de inimigos naturais e diminuir os
problemas relacionados a pragas.
Predadores
Unidades de produção com alta
biodiversidade são ricas em insetos,
aranhas e ácaros predadores. Estes
artrópodes benéficos são predadores de
outros insetos, ácaros e aranhas, sendo
fundamentais para o controle biológico
natural. A maioria dos predadores se
alimenta de maneira "generalista",
atacando uma grande variedade de
insetos em diversos estágios de vida. Os
predadores se encontram, principalmente,
nas ordens Coleoptera, Odonata,
Neuroptera, Hymenoptera, Diptera e
Hemiptera. Seus impactos têm sido
destacados em todo o mundo por
explosões demográficas de ácaros, em
locais onde inseticidas químicos
eliminaram seus predadores. Ácaros
Tetraniquídeos, por exemplo, são
geralmente muito abundantes em
pomares de macieiras nos quais
pesticidas destruíram as populações de
predadores naturais.
Características principais dos
predadores artrópodes:
- Adultos e juvenis são freqüentemente
g e n e r a l i s ta s , e n ã o e s p e c i a l i s t a s ;
- São geralmente maiores do que as suas
presas;
- Matam ou consomem muitas presas;
- Machos, fêmeas, juvenis e adultos podem
ser predadores;
- Atacam presas juvenis e adultas;
- Necessitam de pólen, néctar e recursos
alimentares adicionais.
A diversidade de espécies de
predadores em agroecossistemas
específicos pode ser impressionante.
Pesquisadores têm relatado mais de 600
espécies de 45 famílias de artrópodes
predadores nos campos de algodão do
estado de Arkansas e cerca de mil
espécies nos campos de soja do estado da
Flórida. Tal diversidade pode causar
grandes pressões reguladoras sobre
pragas. Na realidade, muitos entomólogos
consideram os predadores naturais, ou
indígenas, como uma espécie de
regulador do complexo praga/inimigo
natural, porque eles tendem a se alimentar
de qualquer praga existente em grande
quantidade. Mesmo onde os predadores
não podem forçar as populações de
pragas abaixo dos níveis causadores de
prejuízo econômico, eles diminuem o
crescimento populacional das pragas em
potencial. Em pomares de macieiras livres
de inseticidas, no Canadá, cinco espécies
de insetos predadores de árvores foram
responsáveis por 44 a 68 por cento da
mortalidade de ovos da traça da maçã
(Carpocapsa pomonella).
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Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
Parasitóides
A maioria dos parasitóides insetos que matam seus hospedeiros por
parasitismo vivelivre e independente
quando adultos; eles são letais e
dependentes apenas em seus estágios
juvenis. Os parasitóides podem ser
especialistas, utilizando apenas uma
espécie hospedeira ou algumas interrelacionadas, ou podem ser generalistas,
desenvolvendo-se em vários tipos de
hospedeiros. Normalmente, eles
parasitam espécies maiores que eles,
consumindo parte ou todo o corpo do
hospedeiro antes de entrar em estado de
pupa dentro ou fora dele. Com sua grande
capacidade de localizarem hospedeiros,
utilizando sinais químicos, até mesmo em
populações esparsas, parasitóides
adultos são muito mais eficientes do que
os predadores em encontrar suas presas.
A maioria dos parasitóides
utilizados no controle biológico de insetos
pragas inclui moscas (Diptera)
especialmente da família Tachinidae e
vespas (Hymenoptera) das superfamílias
Chalcidoidea, Ichneumonoidea e
Proctotrupoidea.
A diversidade dos
parasitóides está diretamente relacionada
à diversidade de plantas: diferentes
cultivos, coberturas do solo, plantas
espontâneas e vegetação adjacente
mantêm diferentes pragas, as quais, por
sua vez, atraem seus próprios grupos de
parasitóides. Em monoculturas de larga
escala, a diversidade de parasitóides é
suprimida pela simplificação vegetacional;
em agroecossistemas menos perturbados
e livres de pesticidas: não é raro encontrar
onze a quinze espécies de parasitóides
"trabalhando firme". Em muitos casos,
apenas uma ou duas espécies de
parasitóides dentre estes complexos
provam ser vitais para o controle biológico
natural das pragas de insetos primários.
Nos campos de alfafa da Califórnia, a
vespa braconídea (Cotesia medicaginis)
realiza um papel chave na regulação da
l a g a r ta d a a l f a f a ( C o l i a s l e s b i a
pyrrhothea). Este sistema naturla
borboleta-vespa aparentemente
estabeleceu-se na alfafa irrigada a partir
dos trevos nativos.
Características principais dos insetos
Parasitóides:
- São especializados na sua escolha do
hospedeiro
- São menores do que o hospedeiro
- Apenas a fêmea busca um hospedeiro
- Espécies parasitóides podem atacar o
hospedeiro em diferentes estágios de vida
- Ovos ou larvas geralmente são
depositados dentro, sobre ou próximo ao
hospedeiro
- Juvenis permanecem sobre ou dentro do
hospedeiro; adultos vivem livremente, são
móveis e podem ser predadores
·Juvenis quase sempre matam o
hospedeiro
- Adultos necessitam de pólen e néctar
A potencializando insetos benéficos
através do planejamento de unidades
de produção biodiversificadas
Inimigos naturais não se
desenvolvem bem em monoculturas.
Tratos culturais convencionais como
aração e gradagem, eliminação de plantas
espontâneas, pulverização de inseticidas,
além de colheitas têm um efeito destrutivo,
fazendo com que faltem aos sistemas
excessivamente simplificados muitos dos
recursos essenciais para a sobrevivência
e reprodução dos fatores benéficos.
Para completar seus ciclos de
vida, os inimigos naturais necessitam mais
do que presas e hospedeiros: eles
precisam de locais de refúgio e
alternativas para a alimentação,
hospedeiros e presas, que geralmente
estão ausentes em monoculturas. Por
exemplo, muitos parasitas adultos,
enquanto procuram hospedeiros,
sustentam-se com pólen e néctar de
plantas espontâneas floridas nas
proximidades, Besouros predadores
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Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
Para conservar e desenvolver
complexos ricos em inimigos naturais, os
agricultores devem evitar práticas de
cultivo que prejudiquem os insetos
benéficos: devem substituí-las por
métodos que auxiliem a sobrevivência
deles. Um começo é a reversão das
práticas prejudiciais ao controle biológico
natural, que incluem aplicações de
inseticidas, remoção da cobertura e a
utilização de herbicidas para remover
plantas espontâneas.
benéficos ao permitir que populações
permanentes de presas alternativas
oscilem abaixo do nível de dano utilizando
plantas, hospedeiras dessas presas, em
torno de seus campos ou em fileiras dentro
deles. No repolho, a abundância relativa
de pulgões ajuda a determinar a
efetividade dos predadores gerais que
consomem lagartas de curuquerê-dacouve. Da mesma forma, em muitas
regiões, insetos antrocóridos beneficiamse de presas alternativas quando há
escassez de sua presa preferida, os tripes.
Outra estratégia potencializar os
níveis do hospedeiro preferido do
organismo benéfico tem controlado as
traças (curuquerê) em cultivos de couve.
Suplementadas continuamente com
fêmeas, populações dessa praga
multiplicaram-se em quase dez vezes na
primavera. Isso permitiu às populações de
dois de seus parasitas Trichonograma
evanescens e Apanteles rebecula
aumentarem rapidamente e se manterem
em níveis efetivos durante toda a estação.
Devido a seus riscos óbvios, a estratégia
deve-se restringir a situações nas quais os
recursos de pólen, néctar ou presas
alternativas não possam ser facilmente
obtidos.
Fornecimento de recursos
suplementares
Aumento da diversidade de plantas
nos campos
Os inimigos naturais de pragas se
beneficiam de vários tipos de recursos
suplementares. Na Carolina do Norte, a
construção de estruturas artificiais para a
vespa-vermelha (Polises annularis)
intensificou sua atividade predatória sobre
lagartas do algodão e do tabaco. Nos
campos de alfafa e algodão da Califórnia,
a aplicação de mistura de proteínas
hidrolisadas, açúcar e água multiplicou por
seis a ovoposição de hemerobídeos
(Neuroptera) e aumentou as populações
de sirfídeos predadores, joaninhas e
besouros.
Agricultores podem aumentar a
sobrevivência e reprodução de insetos
Ao diversificar as plantas nos
agrossistemas, agricultores podem
aumentar as condições ambientais para
inimigos naturais, e assim melhorar o
controle biológico de pragas. Uma maneira
de fazer isso é a utilização de policultivos
dois ou mais cultivos crescendo
simultaneamente em grande proximidade.
Os agricultores também podem permitir
que algumas plantas espontâneas
floresçam e permaneçam em níveis
toleráveis ou utilizar plantas de cobertura
sob pomares e vinhedos.
Muitos pesquisadores têm
demonstrado que aumentar a diversidade
de plantas
e, portanto, do habitat
como muitos outros inimigos naturais não
se dispersam longe de seus refúgios de
inverno: o acesso ao habitat permanente
próximo ou dentro da lavoura, horta ou
pomar, dá a eles uma vantagem sobre as
primeiras populações de pragas.
Os agricultores podem minimizar
os impactos negativos da produção
agrícola moderna, conhecendo e suprindo
as necessidades biológicas dos inimigos
naturais. Com esse mesmo
conhecimento, eles podem também
projetar habitats de cultivos que sejam
mais favoráveis aos inimigos naturais.
Melhoria dos habitats para inimigos
naturais
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Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
favorece a abundância e efetividade dos
inimigos naturais. Por exemplo, em
campos de algodão com fileiras de alfafa e
sorgo, maiores populações de inimigos
naturais têm causado uma diminuição
significativa nas pragas das plantas. No
estado americano da Geórgia, organismos
benéficos reduziram o número de pragas
abaixo do nível de dano econômico
mínimo no algodão cultivado em sucessão
ao trevo vermelho, eliminando assim a
necessidade de inseticidas. Em pomares
canadenses de macieiras, as pragas
foram parasitadas de quatro a dezoito
vezes a mais quando havia uma grande
quantidade de flores silvestres, em
comparação com situações em que havia
poucas delas. Nessa pesquisa, várias
plantas espontâneas provaram ser
essenciais para vários parasitóides. Em
vinhedos orgânicos da Califórnia, os
predadores generalistas e o parasita dos
ovos de grilos (Anagrus), que controlam os
grilos e os tripes da videira, prosperam na
presença de trigo-mourisco e girassóis.
Quando essas plantas de cobertura
florescem cedo, permitem que populações
de organismos benéficos apareçam antes
das pragas. Quando continuam a florescer
durante a estação de crescimento,
provêem suprimentos constantes de
pólen, néctar e presas alternativas. Assim,
roçar fileiras alternadas dessas plantas de
cobertura uma prática ocasionalmente
necessária
força esses organismos
benéficos a saírem dos cultivos ricos em
recursos e entrarem nos vinhedos.
Em policultivos, além do aumento
evidente das espécies de plantas e da
biodiversidade, há mudanças na
densidade e altura das plantas, e,
portanto, na diversidade vertical. Todas
essas mudanças afetam a densidade das
pragas e outros organismos. A
combinação de culturas de porte alto e
baixo também pode afetar a dispersão de
insetos em um sistema de cultivos. Por
exemplo, em Cuba, agricultores cultivam
fileiras de milho ou sorgo a cada dez
metros entre hortaliças ou feijoeiros, para
formar barreiras físicas a fim de reduzir a
dispersão de tripes (Tripes palmi).
Na China, pesquisadores
trabalhando com agricultores em dez
municípios em Yumman, cobrindo uma
área de 5350 hectares, incentivaram
agricultores a mudarem os sistemas de
monoculturas de arroz para o plantio de
diversas variedades locais de arroz alto
com híbridos mais baixos. Plantas altas
serviram como barreira para a dispersão
de inóculos de patógenos, e, ainda, a
potencialização da diversidade genética
reduziu o acamamento em 94 por cento e
aumentou as colheitas totais em 89 por
cento Depois de dois anos, concluiu-se
que fungicidas não eram mais
necessários.
Manejo da vegetação em torno do
campo
Cercas vivas e outros tipos de
vegetação nas margens de campos
podem servir como reservatórios de
inimigos naturais. Esses habitats podem
ser importantes abrigos de inverno para os
predadores de pragas, além de
fornecerem pólen, néctar e outros
recursos adicionais aos inimigos naturais.
Muitos estudos têm demonstrado
que artrópodes benéficos movem-se para
os cultivos a partir das margens dos
campos, e o controle biológico geralmente
é mais intenso em fileiras de plantas
próximas à vegetação selvagem do que no
centro dos campos:
- Na Alemanha, o parasitismo do
besouro Meligethes aeneus é
aproximadamente 50 por cento maior nas
margens dos campos do que no seu
centro;
- Em Michigan, a broca-européiado-milho nas áreas em torno dos campos é
mais susceptível ao parasitismo pela
vespa icneumônide Eriborus terebrans;
- Na cana-de-açúcar havaiana,
plantas produtoras de néctar nas margens
de campos aumentam o número e a
eficiência do parasita (Lixophaga a
10
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
sphenephori) do gorgulho da cana-deaçúcar.
Estratégias de manejo prático
derivam da compreensão destes
relacionamentos. Um exemplo clássico
vem da Califórnia, onde o parasita de ovos
Anagrus epos controla o grilo das videiras
em vinhedos adjacentes aos cultivos de
ameixas. As ameixeiras hospedam um
grilo economicamente insignificante cujos
ovos provêem o Anagrus com a sua única
alimentação e abrigo durante o inverno.
Criação de corredores para inimigos
naturais
O cultivo de várias plantas com
flores em fileiras, que atravessam campos
a cada 50 a 100 metros, pode servir de
estradas no habitat de inimigos naturais.
Insetos benéficos podem utilizar esses
corredores para circularem e se
dispersarem para os centros dos campos.
Estudos europeus têm confirmado que
essa prática aumenta a diversidade e
quantidade de inimigos naturais. Quando
campos de beterraba açucareira foram
intercalados com corredores de facélia
(Phacelia tanacetifolia) a cada vinte ou
trinta fileiras, foi intensificada a destruição
de afídios pelas moscas da família
Syrphidae. Da mesma forma, fileiras de
trigo-mourisco e facélia em campos de
repolho na Suíça aumentaram as
populações da vespa parasitóide que
ataca o pulgão do repolho. Devido ao seu
longo período de florescimento durante o
verão, a facélia também tem sido utilizada
como fonte de pólen para aumentar as
populações de moscas da família
Syrphidae em campos de cereais. Em
grandes campos orgânicos na Califórnia,
fileiras de Alyssum são comumente
plantadas a cada 50 a 100 metros em
campos de cultivos de alface e brássicas
para atrair as moscas da família Syrphidae
que controlam os pulgões.
Algumas espécies de gramíneas
podem ser importantes para os inimigos
naturais, pois podem, por exemplo, criar
habitats com temperatura mais estável
para os besouros predadores passarem o
inverno. Na Inglaterra, pesquisadores
estabeleceram "bancos de besouros",
semeando montes de terra com
gramíneas nos centros dos campos de
cereais. Ao recriar as qualidades das
margens dos campos que favorecem as
altas densidades de predadores invernais,
tais bancos tiveram um impacto particular
sobre o aumento das populações de
Dometrias atricapillus e Tachyporus
hypnorium, dois importantes predadores
de pulgões de cereais. Um estudo, em
1994, descobriu que os inimigos naturais
abrigados nos bancos de besouros eram
tão efetivos na prevenção do surgimento
dos pulgões de cereais que a economia
com pesticidas era maior que os custos
com trabalho e sementes necessários
para estabelecê-los. Os montes podem
chegar a 0,4 metro de altura, 1,5 metro de
largura e 290 metros de comprimento.
Para efeitos mais prolongados, é
recomendado plantar corredores de
plantas com arbustos que possuam
período de florescimento mais longo. No
norte da Califórnia, pesquisadores ligaram
uma floresta ciliar com o centro de um
grande vinhedo de monocultura usando
um corredor vegetal de sessenta espécies
de plantas. Esse corredor incluía muitas
espécies lenhosas e herbáceas perenes,
florescendo durante toda a estação de
crescimento, dando aos inimigos naturais
um suprimento constante de alimentos
alternativos e quebrando sua dependência
estrita de pragas da videira. Um complexo
de predadores entrou no vinhedo mais
cedo, circulando continuamente entre as
plantas. As interações subseqüentes da
cadeia alimentar enriqueceram as
populações de inimigos naturais e
diminuíram os números de grilos e tripes.
Esses impactos foram medidos em
vinhedos em extensões de 30 a 45 metros
a partir do corredor.
Seleção das flores certas
11
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
Quando se escolhem plantas com
flores para atrair insetos benéficos, é
importante também se observar o
tamanho e o formato das flores, pois é isso
que determina quais insetos poderão ter
acesso ao pólen e néctar das flores. Para a
maioria dos organismos benéficos,
incluindo as vespas parasitóides, as flores
mais úteis são pequenas e relativamente
abertas. Plantas das asteráceas
(compositae), apiaáceas (umbelliferae) e
poligináceas são especialmente úteis
(Tabela 1).
Deve-se ainda observar quando a
flor produz pólen e néctar: o tempo dessas
produções é tão importante para os
inimigos naturais quanto o tamanho e o
formato dela. Muitos insetos benéficos
estão ativos somente quando adultos e em
períodos curtos durante o período de
crescimento: eles precisam de pólen e
néctar durante esses períodos ativos,
particularmente no início da estação,
quando as presas são escassas. Uma das
maneiras mais fáceis para os agricultores
ajudarem é estabelecer misturas de
plantas com tempos de florescimento
relativamente longos e sobrepostos.
Estão longe de estarem
completos os atuais conhecimentos sobre
quais plantas são as fontes mais úteis de
p ó l e n , n é c t a r, h a b i t a t e o u t r a s
necessidades críticas Claramente, muitas
plantas encorajam os inimigos naturais,
mas os cientistas têm muito mais a
aprender sobre quais plantas estão
associadas a determinados organismos
benéficos, e como e quando disponibilizar
plantas desejáveis aos organismos alvo.
Já que as interações benéficas ocorrem
em lugares específicos, a localização
geográfica e o gerenciamento global da
unidade de produção são variáveis
críticas. Na falta de recomendações
universais, impossíveis de se fazer, os
agricultores podem descobrir muitas
respostas investigando a utilidade de
plantas florescentes alternativas em suas
unidades de produção.
Aumento da biodiversidade - lista para
agricultores
- Diversifique as atividades incluindo mais
e s p é c i e s d e p l a n ta s e a n i m a i s .
- Utilize rotações de cultivos de legumes e
pastagens mistas.
- Intercale cultivos ou coloque fileiras de
outros cultivos, quando viável.
- Misture variedades da mesma cultura.
- Utilize variedades que carreguem muitos
genes ao invés de apenas um ou dois
para tolerância à mesma doença.
- Enfatize cultivos de polinização aberta,
ao invés de híbridos, devido à sua
adaptabilidade aos ambientes locais e
maior diversidade genética.
- Estabeleça cultivos de cobertura em
pomares, vinhedos e campos de cultivo.
- Deixe faixas de vegetação nativa nas
margens dos campos.
- Crie corredores para vida selvagem e
insetos benéficos.
- Implante e mantenha sistemas
agroflorestais; quando possível, combine
árvores e arbustos com cultivos ou
criações de animais para melhorar a
continuidade do habitat para os inimigos
naturais.
- Plante árvores modificadoras do
microclima e plantas nativas como quebra
-ventos ou cercas vivas.
- Disponibilize uma fonte de água para
pássaros e insetos.
- Deixe áreas de reserva na propriedade
como um habitat para a diversidade de
plantas e animais.
Estabelecimento de uma estratégia de
manejo de habitat
Para desenvolver um plano efetivo
para o manejo de habitat, deve-se procurar
obter o máximo de informações. Faça uma
lista das pragas economicamente mais
importantes em sua unidade de produção.
Para cada praga, tente descobrir:
- Quais são seus requisitos de alimentação
e habitat;
12
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
- Que fatores influenciam a sua
abundância;
- Quando e a partir de onde ela entra no
campo; o que a atrai para a cultura.
- Como ela se desenvolve na cultura e
quando de torna economicamente
danosa;
- Quais são os predadores, parasitas e
patógenos mais importantes;
·Quais são as necessidades primárias
desses organismos benéficos;
- Onde esses organismos benéficos
passam o inverno, quando eles aparecem
no campo, de onde eles vêm, o que os
atrai às culturas, como eles se
desenvolvem na cultura e o que os
mantém no campo;
- Quando os recursos críticos do
organismo benéfico - néctar, pólen,
hospedeiros e presas alternativas aparecem e por quanto tempo
permanecem disponíveis; se fontes de
alimentação alternativa são acessíveis
nas proximidades, e, nos momentos
certos, quais plantas anuais e perenes
nativas podem compensar lacunas
críticas no tempo, especialmente quando
há escassez de presas.
2) TEMPO
Informações-chave necessárias para
desenvolver um plano de manejo do
habitat:
- Fomentar habitats de cultivos que
suportem uma fauna benéfica;
- Desenvolver solos ricos em matéria
orgânica e atividade microbiana.
- Estratégias bem consideradas e bem
implementadas para o manejo do solo e
habitat levam a populações de inimigos
naturais diversas e abundantes embora
nem sempre suficientes. Na medida em
que os agricultores forem desenvolvendo
um sistema mais saudável e mais
resiliente a pragas em suas unidades de
produção, eles podem se perguntar:
- Como a diversidade de espécies pode ser
aumentada a fim de melhorar o manejo de
pragas e compensar os danos causados
por elas, além de utilizar recursos de forma
mais correta?
- Como a longevidade do sistema pode ser
aumentada com a inclusão de plantas
arbóreas que capturam e re-circulam
I) ECOLOGIA DE PRAGAS E ORGANISMOS BENÉFICOS
- Quais são as pragas economicamente
mais importantes e que exigem manejo?
- Quais são os predadores e parasitas
mais importantes da praga?
- Quais são as fontes primárias de
alimento, habitat e outros requisitos
ecológicos tanto das pragas quanto dos
organismos benéficos? (De onde vem a
praga para infestar o campo, como ela é
atraída ao cultivo, e como se desenvolve
na cultura de interesse? De onde vêm os
organismos benéficos, como são atraídos
ao cultivo, e como se desenvolvem na
cultura?
- Em geral, quando as populações de
pragas aparecem primeiro e quando essas
populações se tornam economicamente
danosas?
- Quando aparecem os predadores e
parasitas da praga?
- Quando aparecem as fontes de alimento
(néctar, pólen, hospedeiros alternativos e
presas) para os organismos benéficos,
primeiro? Quanto tempo duram?
- Que plantas anuais e perenes nativas
podem prover essas necessidades do
Habitat?
Colocando em prática a estratégia
Este trabalho apresenta algumas
idéias e princípios para o planejamento e
implementação de sistemas agrícolas
saudáveis e menos suscetíveis a pragas.
Foi explicado porque reincorporar a
complexidade e diversidade é o primeiro
passo em direção ao manejo sustentável
de pragas, e o trabalho descreve os dois
pilares da saúde dos agroecossistemas
(Figura 4):
13
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
nutrientes que dão suporte mais
s u s t e n ta d o pa r a o s o r g a n i s m o s
benéficos?
- Como uma quantidade maior de matéria
orgânica pode ser adicionada para ativar a
biologia do solo, aumentar a nutrição do
solo e melhorar a estrutura do solo?
- Finalmente, como a paisagem pode ser
diversificada com mosaicos de
agroecossistemas em diferentes estágios
de sucessão e com quebra-ventos, cercas
vivas, etc?
Uma vez que os agricultores
tenham um amplo conhecimento das
características e necessidades das
pragas chave e inimigos naturais, eles
estarão prontos para começar a delinear
uma estratégia de manejo de habitat
específica para a sua unidade de
produção. Escolha plantas que ofereçam
benefícios múltiplos por exemplo, plantas
que melhorem a fertilidade do solo,
suprimam plantas espontâneas e regulem
pragas e que não atrapalhem as práticas
agrícolas desejáveis. Evite conflitos
potenciais: na Califórnia, o plantio de
amoras pretas em torno de vinhedos
aumenta as populações do grilo dos
vinhedos, mas pode também exacerbar
populações de cigarrinhas,
Graphocephala atropunctata, que
transmitem a doença de Pierce, que mata
as videiras. Ao distribuir plantas
selecionadas no espaço e no tempo,
utilize o nível de escala, campo ou
paisagem, que seja mais coerente com os
resultados pretendidos. E, finalmente,
mantenha as coisas simples: o plano deve
ser fácil e de baixo custo para
implementação e manutenção, e deve ser
fácil de modificar, à medida que as
necessidades mudem ou os resultados
exijam mudanças.
Figura 4. Pilares da saúde dos agroecossistemas
Princípios agroecológicos
Desenho do agroecossistema
Habitat Subterrâneo
Manejo e diversificação
Habitat sobre a terra
Manejo e diversificação
- Matéria orgânica do solo
- Manejo de nutrientes e
compactação
- Policultivo
- Plantas de cobertura
- Rotações
Saúde do Cultivo
Saúde do Agroecossistema
14
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
Diretrizes para o planejamento de sistemas agrícolas saudáveis e
resilientes a pragas
- Aumente o número de espécies no tempo e no espaço com rotações de culturas,
policultivos, agroflorestas e sistemas de cultivos e criações de animais.
- Aumente a diversidade genética com mistura de variedades, multilinhas e germoplasma
Local.
- Conserve ou introduza inimigos naturais e antagonistas, pela melhoria do habitat ou pelo
aumento das introduções.
- Aumente a atividade biótica do solo e melhore sua estrutura com aplicações regulares de
matéria orgânica.
- Melhore a reciclagem de nutrientes com leguminosas e criações animais.
·Mantenha a cobertura vegetal com redução da aração, plantas de cobertura e resíduos
vegetais (palhadas).
- Aumente a diversidade com corredores biológicos, diversidade vegetal nas margens dos
Tabela 1. Plantas que atraem insetos benéficos
Aranha
Muitos insetos
Funcho, alcarávia, endro, tagetes (cravo-de-defunto),
hortelã
Ácaro predador
Ácaros
manter plantios constantes
Mosca (família Syrphidae)
Pulgões
Plantas das famílias da cenoura (umbelífera = apiáceas
como salsa, funcho, coentro; do girassol (compostas =
asteráceas); do trigo-mourisco (poligonáceas), da família
do girassol como margarida, mil-folhas, tagetes; Alyssum
doce; cerejeira (Prunus ilicifolia); hortelã; carqueja.
Mosca (família Tachinidae)
Lagartas, pulgões de
brássicas, traças, corós, broca
das cucurbitáceas, fede-fede,
isópodes.
Família da cenoura (Ammi, coentro, endro, salsa,
funcho); trevo doce; Phacelia spp., Alyssum doce; trigomourisco; amaranto, cáscara (Rhamnus purshiana);
Heteromeles arbutifolia
Besouro (família
Cicindelidae)
Muitos insetos
Manter plantios permanentes e algumas áreas expostas
de terra ou areia.
Percevejo predador (Família Tripes, aranhas, ácaros,
Anthocoridae),
grilos, gafanhotos, lagarta do
(Orius spp)
cartucho, pequenas lagartas,
muitos outros insetos
Predadores efetivos de ovos de lagarta do cartucho.
Família da cenoura (Daucus carota, Phacelia spp.,
coentro, Ammi, cerefólio), família do girassol [cosmos,
Layia, margaridas, mil-folhas; ervilhaca peluda; alfafa;
milho; trevo vermelho; trigo-mourisco; Sambucus
caerulea; salgueiros; arbustos. Manter plantios ou cercasvivas permanentes.
Nematóides parasitas
Nematóides
Tagetes, crisântemo, gailárdia, anileira, mamona, sorgo,
tremoços, siratro, feijão-de-porco
Louva-a-deus (Mantis spp)
Qualquer inseto
Proteja as espécies nativas evitando pesticidas.
Ácaro predador
(Typhlodromus spp.)
Ácaros
Há muitas espécies de ácaros predadores com requisitos
ecológicos, especialmente em relação à umidade e
temperatura, que são específicos da espécie. Evite o uso
de inseticidas. Ofereça refúgios benéficos como habitat
fora do cultivo de presas/ácaros de fora do cultivo.
Tripes predadores
(Família Thripidae)
Ácaros, pulgões, tripes, traça
das frutas, mariposa de
botões, broca de galhos de
pessegueiro, gorgulho da
alfafa, mosca branca,
minadores, cochonilha
Há muitos tipos de tripes predadores. As populações de
tripes predadores podem ser conservadas/mantidas
tendo-se populações fora do cultivo de ácaros que se
alimentem de plantas (ex. ácaro vermelho europeu, ácaro
de duas manchas), cochonilhas, afídios, ovos de
mariposa, grilos e outros tripes.
15
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Clara Ines Nicholls e Miguel A. Altieri
Potó (besouro estafilinídeo)
(Família Staphylinidae)
Pulgões, colêmbolas,
nematóides, moscas. Alguns
são parasitas da larva da raiz
do repolho
Plantios permanentes; intercale fileiras de centeio, grãos e
cultivos de cobertura, e fileiras de vegetais em
decomposição; faça alguns caminhos com pedras ou
plantas para prover refúgios.
Mosquito-pólvora
(Aphidoletes aphidimyza)
(Larvas são predadores
afídeos)
Pulgões
Endro, mostarda, tomilho, trevo doce. Proteja a horta de
ventos fortes; disponibilize água em uma panela cheia de
cascalho.
Afídeos parasitas (Aphidius
matricariae e outros)
Pulgões
Plantas ricas em néctar com flores pequenas (anis,
alcarávia, endro, salsa, família da mostarda, trevo branco,
cenoura, mil-folhas).
Pecevejo assassino (Família Muitos, insetos, incluindo
Reduviidae)
moscas, broca do tomate,
lagartas grandes
Zoiudo (Geocoris spp.)
Muitos insetos, incluindo
(Família Lyagaidae)
besouros/pulgas, ácaros, ovos
de insetos e pequenas
lagartas. Também comem
sementes.
Plantios permanentes para abrigo (ex. cercas-vivas).
Vespa braconídea
(Família Braconidae)
Plantas produtoras de néctar com flores pequenas
(alcarávia, endro, salsa, Daucus carota, funcho, mostarda,
trevo branco, Phacelia spp., mil-folhas), girassol,
ervilhaca, trigo-mourisco, feijão-miúdo, sanguinária
comum, açafrão (Crocus sativus), hortelã.
Lagarta de cereais, lagarta do
repolho, traças pequenas
cujas larvas destroem maçãs,
mariposa, broca européia do
milho, larvas de besouros,
moscas, afídios, lagartas,
outros insetos.
Podem acumular em cultivos de cobertura de estação fria,
tais como trevo alexandrino e trevo subterrâneo. Pode ser
encontrado na sanguinária comum (Polygonum
aviculare).
"Damsel"
(Família Nabidae)
P u l g õ e s , t r i p e s , g r i l o s , Qualquer uma da família do girassol, alfafa.
cigarrinhas e pequenas
lagartas
Besouro
(Família Carabidae)
Lesma, caracol, traça da raiz Plantios permanentes, amaranto, trevo branco em
do repolho; algumas atacam o pomares, plantas em decomposição.
besouro da batata do
Colorado, mariposas e
lagartas que tecem casulos em
forma de tendas.
Hemerobídeos (Família
Neuroptera)
(Chrysperla e Chrysopa
spp.)
Insetos de corpo macio
incluindo afídios, tripes,
cochonilhas, lagartas,
pequenos ácaros.
Joaninha
(Hippodamia spp. e outros)
(Família Coccinellidae)
P u l g õ e s , c o c h o n i l h a s e Uma vez que os pulgões deixem o cultivo, as joaninhas
também deixarão. Para reter as joaninhas ativas,
ácaros.
mantenha cultivos de cobertura ou outros hospedeiros de
afídio, ou ainda presas alternativas. Família da cenoura
(funcho, angélica, endro, Phacelia spp.), família do
girassol (margaridas, macelinha, dente-de-leão, girassol,
mil-folhas), trevo vermelho, ervilhaca peluda, grãos e
gramíneas nativas, Asclepias, trigo-mourisco, centeio,
Sesbania Exaltata, Quillaja saponaria, Rhamnus, Atriplex
spp., Robinia pseudoacacia.
Joaninha (Cryptolaemus
montrouzieri)
(Família Coccinellidae)
Cochonilhas
Família da cenoura (alcarávia, Phacelia spp., endro,
angélica), família do girassol (girassóis, dente-de-leão),
trigo-mourisco, milho. Disponibilize água em épocas
secas.
Família da cenoura (funcho, endro, angélica, tanaceto)
família do girassol (tango, coreópsis, girassol, milfolhas)
Clara I. Nicholls e Miguel A. Altieri são pesquisadora bolsista e professor, respectivamente,
na Divisão de Biologia de Insetos ESPM, Universidade da Califórnia, Berkeley.
16
Projeção e
Implantação de uma
Estratégia de Manejo
de Habitats Para
Melhorar o Controle
Biológico de Pragas
em Agroecossistemas
Melhorando o Manejo de Pragas através da Saúde do Solo:
Direcionando uma Estratégia de Manejo do Habitat Solo
Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
Introdução
Como constatado previamente, a
saúde de um agroecossistema pode ser
otimizada através do manejo de dois
pilares: manipulação do habitat e
incremento da fertilidade do solo (Nicholls
and & Altieri, 2005). Este artigo foca o
segundo pilar, introduzindo informações
detalhadas sobre o incremento da
qualidade da fertilidade do solo através do
manejo das substâncias orgânicas e a
conservação da biodiversidade presente
no solo de ecossistemas agrícolas.
Tradicionalmente considerados isolados
um do outro, componentes de
biodiversidade acima e abaixo da
superfície do solo estão agora sendo cada
vez mais inter-relacionados do que se
supunha previamente (Wardle et al.,
2004). De fato, a planta parece funcionar
como um integrador dos componentes
abaixo e acima da superfície do solo que
compõe o agroecossistema, que de outra
maneira seriam grandemente separados
espacialmente, com a planta como um
conector. Este reconhecimento das
relações entre a biota acima e abaixo da
superfície do solo constitui um passo
chave para no qual uma verdadeira nova
estratégia no manejo ecológico de pragas
(MEP) possa ser construído.
MEP considera os habitats
acima e abaixo da superfície do solo
igualmente importantes, porque a
intensificação das interações ecológicas
entre solos e pragas pode prover uma
forma robusta e sustentável para otimizar
a função total do agroecossistema (Figura
1). A integridade do agroecossistema
depende das sinergias de diversidades de
plantas e da função contínua da
comunidade microbiana suportada por um
solo rico em matéria orgânica (Altieri &
Nicholls, 1990). Apesar das potenciais
ligações entre fertilidade do solo e
proteção das culturas, a evolução do
manejo integrado de pragas (MIP) e do
manejo integrado da fertilidade do solo
(MIFS) procedeu separadamente (Altieri &
Nicholls, 2003). Desde que muitas práticas
de manejo de solo já são conhecidas por
influenciar as interações do manejo de
Figura 1. Sinergismo potencial entre fertilidade do solo e manejo integrado de pragas.
Biofertilizantes
Culturas de Cobertura
Adubação Verde
Cobertura do Solo
Aumento da
Fertilidade
do solo
Composto
Rotação de Culturas, etc
Interações
Positivas
Diversidade de Culturas
Práticas Culturais
Controle Biológico
Modificação do Habitat
Melhor
Controle de
Pragas
SINERGISMO
Cultura
Saudável
Agroecossistema
Saudável
17
Melhorando o Manejo
de Pragas através da
Saúde do Solo:
Direcionando uma
Estratégia de Manejo
do Habitat Solo
Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
pragas, não faz sentido ecológico
continuar com tais abordagens
diferenciadas.
Uma nova pesquisa mostra
que a habilidade de uma planta de lavoura
em resistir ou tolerar insetos praga e
doenças está associado a propriedades
físicas, químicas e, mais particularmente,
biológicas do solo. Solos com alta
quantidade de matéria orgânica e
atividade biológica geralmente exibem
boa fertilidade bem como complexas
redes tróficas e organismos benéficos que
previnem infecções. De outra forma,
práticas agrícolas que causam
instabilidade nutricional podem reduzir a
resistência a pragas (Magdoff & van Es,
2000). Adicionalmente, estudos recentes
mostraram como interações bióticas no
solo podem regular a estrutura e
funcionalidade de comunidades acima da
superfície do solo (Wardle et al., 2004).
Conseqüentemente torna-se claro que o
componente abaixo da superfície do solo
de um agroecossistema pode ser
manejado através de um conjunto de
práticas utilizadas por agricultores
orgânicos que podem aplicar um
substancial impacto na dinâmica de
pragas (Altieri & Nicholls, 2003). Apesar da
pressão de pragas em sistemas orgânicos
ser o resultado do uso de rotações de
culturas e/ou preservação de insetos
benéficos esperados pela ausência de
pesticidas (Lampkin, 1990), uma nova
evidencia sugere que reduzidas
populações de pragas também estão
ligadas ao incremento da biologia e
fertilidade do solo.
Solos Saudáveis Plantas Saudáveis
O manejo da fertilidade do
solo pode diretamente reduzir a
susceptibilidade de plantas a pragas, se
neste caminho tiver como indicador a
"saúde da planta" (Phelan et al.,1995).
Muitos pesquisadores e agricultores
passaram a observar que práticas
saudáveis podem fortalecer mantendo o
nível alto de matéria orgânica no solo e
aumentando o nível e a diversidade da
macrobiota e microbiota encontrados,
promovendo um ambiente que, através de
vários processos, apresente melhoria na
saúde das plantas (McGuiness,1993).
Como visto acima, a resistência ou
tolerância de plantas frente às doenças e
pragas, parece estar intimamente
relacionada com as várias propriedades
do solo.
Estudos comparando
métodos de agricultura orgânica e
convencional, analisando os diversos
efeitos em específicas populações de
pragas, nos mostram
muito do que
sabemos hoje em dia sobre a relação
entre nutrição das plantas e a incidência
de pragas (Altieri & Nicholls, 2003).
Contudo, as práticas que visam a
fertilidade do solo podem estar
relacionadas diretamente com a fisiologia
de susceptibilidade de culturas de plantas
a pragas, afetando em principio a
resistência da planta ao ataque destas
pragas, e podendo também alterar a sua
tolerância a certos herbívoros (Barker,
1975; Scriber, 1984). Além disso, alguns
estudos têm mostrado como a transição
do manejo orgânico do solo para o uso de
fertilizantes químicos resultam no
aumento da incidência de insetos e
doenças nas plantas, gerando perdas
econômicas. Estudos realizados por
cientistas do USDA (Beltsville Agricultural
Research Center in Maryland) contribuem
fortemente na construção das bases do
conhecimento para um maior
entendimento da relação entre saúde da
planta e fertilidade do solo (Kumar et al.,
2004). Esses cientistas demonstraram as
bases moleculares para o atraso da
senescência das folhas e a tolerância às
doenças, a partir de um experimento com
cultivo alternativo de tomates tratado com
18
Melhorando o Manejo
de Pragas através da
Saúde do Solo:
Direcionando uma
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do Habitat Solo
Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
Inimigos Naturais
Herbívoros
1
Palhada
19
Herbivoria
Pragas
Doenças
Mutualismo
(Rhizobium,
Micorrhizae)
Patógenos
6
Nutrição
5
Antagonistas
Matéria orgânica do
solo
2
7
Biota do solo
4
Predação
3
Figura 2. Vias complexas em que a biodiversidade acima e abaixo do solo interagem no
agroecossistema: (1) restos culturais aumentam o teor de matéria orgânica MO no solo; (2) MO fornece
substrato para micro, meso e macro biota do solo; (3) predadores reduzem o número de pragas no solo;
(4) MO favorece antagonistas que reprimem o aparecimento de patógenos no solo; (5) a lenta
mineralização do carbono e nitrogênio ativam genes que promovem a tolerância a doenças e a
longevidade das plantas, bem como o nitrogênio livre contido nos tecidos; (6) mutualistas aumentam a
fixação de N, absorção de P, eficiência do uso da água etc.; (7) certos invertebrados (Collembola e
detritívoros) servem como alimento alternativo para inimigos naturais quando da ausência ou escassez
de pragas.
Melhorando o Manejo
de Pragas através da
Saúde do Solo:
Direcionando uma
Estratégia de Manejo
do Habitat Solo
Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
cobertura orgânica de uma leguminosa,
ervilhaca peluda (Vicia villosa) comparado
a um cultivo de tomate com tratamento
convencional com plástico preto de
polietileno. Provavelmente ganhando para
regular a presença de metabólico C e N
encontrado na cobertura orgânica, as
culturas de tomate apresentaram
diferentes expressões de genes, os quais,
finalmente, atendendo assim uma
utilização e mobilização mais eficiente de
C e N, promovendo defesa contra doenças
e aumentando a longevidade das culturas.
Estes estudos confirmaram que na
produção intensiva de tomates do modo
convencional, o uso de cobertura orgânica
oferece vantagens como alternativa aos
fertilizantes comerciais, além disso
minimizam a erosão do solo e a perda de
nutrientes, aumentam a infiltração de
água, reduzem a perda e propiciam uma
interação "natural" entre
Praga-predator.
Interações entre a Biodiversidade
acima e abaixo do Solo
As plantas desenvolvem-se em
um complexo ambiente multitrófico.
Todavia, assim como mostra um recente
trabalho (Van der Putten et al., 2001), a
maioria dos estudos multitróficos focam
quase que exclusivamente interações que
ocorrem acima do solo, negligenciando,
geralmente, o fato de que organismos
acima e abaixo do solo interagem entre si
de formas um tanto complexas (Figura 2).
Diversos estudos apontam a
interdependência da dinâmica
populacional de herbívoros que vivem no
solo e sobre ele, e inimigos naturais como
respostas de defesa de diferentes órgãos
da planta (acima e abaixo do solo). Devido
aos meios de defesa química da planta
contra herbívoros e patógenos poderem
interagir, a herbivoria da raiz pode
acarretar na indução de compostos de
defesa da planta nas folhas. Não obstante,
como sustentado no trabalho acima
citado, as interações entre ambos os
compartimentos (acima e abaixo do solo)
são ainda mais complexos, devido aos
mecanismos subjacentes (nutrição e
defesa da planta) estarem tipicamente
interligados. Na verdade, a produção de
ambas as defesas da planta (direta e
indireta) são dependentes da absorção de
nutrientes pelas raízes. A evidência a favor
de tais interações benéficas está
crescendo.
Um estudo recente mostra que a
atividade de organismos do solo pode
afetar o fenótipo da planta (acima do solo),
induzindo tolerância a herbívoros e
patógenos (Blouin et al., 2005). Neste
mesmo estudo, um decréscimo de 82% na
incidência de nematóides foi
documentado quando minhocas estavam
presentes. Mesmo que as minhocas não
afetassem diretamente o tamanho da
população de nematóides, na sua
presença a biomassa da raiz não foi
afetada pelos nematóides e a inibição
esperada da fotossíntese foi suprimida.
Esta foi a primeira vez que minhocas foram
mostradas como agentes de redução dos
efeitos de nematóides em plantas
infestadas. Aparentemente, a presença de
minhocas na rizosfera induziu mudanças
sistêmicas na expressão gênica da planta,
levando ao aumento da atividade
fotossintética e da concentração de
clorofila nas folhas (Blouin et al., 2005).
Tais achados indicam que atividades da
fauna do solo são, provavelmente, mais
importantes do que estudos, até então
realizados, preocupados em determinar
respostas individuais da planta ao
estresse.
Comunidades que estão acima do
solo são afetadas tanto por interações
diretas como indiretas com a cadeia trófica
de organismos do solo (Wardle et al.,
2004). Atividades alimentares desta
cadeia na detritosfera estimulam a
20
Melhorando o Manejo
de Pragas através da
Saúde do Solo:
Direcionando uma
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do Habitat Solo
Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
ciclagem e absorção de nutrientes, bem
como o desenvolvimento da planta, e,
dessa forma, influenciam diretamente
também os herbívoros. Estudos em
agroecossistemas de arroz irrigado na
Ásia evidenciam que o acréscimo de
matéria orgânica em parcelas
experimentais auxilia populações de
detritívoros e organismos que se
alimentam de plâncton, os quais, por sua
vez, auxiliam na abundância de
predadores generalistas acima do solo
(Settle et al., 1996). Além disso,
Collembola que habita o solo é
considerado importante pois constitui uma
população que interage como uma fonte
alternativa de presas para predadores
como besouros carabídeos quando
pragas são escassas (Bilde et al., 2000).
Por outro lado, a biota do solo
exerce efeitos diretos nas plantas por se
alimentarem das raízes e formarem
relações antagônicas ou mutualísticas
com suas plantas hospedeiras (e.g.,
mycorrhizae). Essas interações com
plantas influenciam não somente o
desempenho próprio das plantas
"hospedeiras", como também de
herbívoros e, potencialmente, seus
predadores. Vestergard et al. (2004)
observaram que interações entre afídeos
e organismos da rizosfera foram
influenciados pelo desenvolvimento da
planta e pela condição nutricional do solo.
Esse estudo é um dos primeiros a
confirmar que a biota acima e abaixo do
solo são capazes de interagir entre si
tendo a planta como mediador.
Fertilidade do Solo e Resistência das
Plantas a Pragas
A resistência de plantas a insetos
praga varia com a idade e o estágio de
crescimento da planta (Slansky, 1990),
sugerindo que a resistência está
diretamente ligada com a fisiologia da
planta. Portanto, qualquer fator que afete
fisiologicamente a planta (ex. fertilização)
está potencialmente ligado com
mudanças na resistência a insetos praga.
De fato, a fertilização tem mostrado afetar
todas as três categorias de resistência
propostas por Painter (1951): preferência,
antibiose e tolerância. Ademais, respostas
morfológicas óbvias de culturas a
fertilizantes, como mudanças na taxa de
crescimento, aceleração ou atraso na
maturação, tamanho de partes da planta, e
espessura ou rigidez da cutícula, podem
indiretamente influenciar o sucesso de
muitas espécies de pragas na utilização da
planta hospedeira. Por exemplo, Adkisson
(1958) reportou aproximadamente três
vezes mais larvas do bicudo do algodoeiro
(Anthonomas grandis) em algodão
recebendo pesadas aplicações de
fertilizantes em comparação com algodão
que não os recebeu, provavelmente
devido a um aumento no período de
crescimento do algodão resultante do
aumento de fertilizantes. Klostermeyer
(1950) observou que fertilizantes
nitrogenados aumentam o tamanho e a
coesão da palha do milho doce, o que
reduz os níveis de infestação da lagarta da
espiga (Heliothis zea). Hagen e Anderson
(1967) observaram que a influência do
zinco reduz a pubescência em folhas de
milho, o que permite um subseqüente
aumento no forrageamento por adultos da
broca da raiz do milho (Diabrotica
virgifera).
Efeitos de práticas de fertilidade
do solo na resistência de pragas podem
ser mediados através de mudanças no
conteúdo nutricional das culturas. Para
quantidades equivalentes de nitrogênio
aplicado (47 kg/ha e 94 kg/ha), Baker
(1975) descobriu que concentrações de
nitrato-N em folhas de espinafre foram
mais altas quando recebendo amônia
nitrato do que quando recebendo
fertilizantes orgânicos. Em um estudo
comparativo de agricultores
convencionais e orgânicos do meio leste
21
Melhorando o Manejo
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Saúde do Solo:
Direcionando uma
Estratégia de Manejo
do Habitat Solo
Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
americano, Lckeretz et al. (1981)
reportaram que milho organicamente
produzido (OP) teve menores níveis de
todos os aminoácidos (exceto metionina)
do que milhos convencionalmente
produzidos (CP). Eggert e Kahrmann
(1984) também mostraram que feijões
secos CP tem mais proteínas do que
feijões OP. Níveis altos de N nos tecidos do
pecíolo também foram encontrados em
feijões CP. Níveis de potássio e fósforo,
entretanto, foram maiores nos pecíolos de
feijões OP do que em CP. Em um estudo
comparativo a longo prazo entre efeitos de
fertilizantes orgânicos e sintéticos no
conteúdo nutricional de farinha de
vegetais (espinafre, repolho, batatas e
cenouras), Schuphan (1974) demonstrou
que vegetais OP contiveram níveis
consistentemente menores de nitrato e
maiores de potássio, fósforo e ferro do que
vegetais CP.
Pesquisas mostram que a
fertilidade do solo influencia a habilidade
de uma cultura de responder aos ataques
de pragas de muitas formas. Embora
alguns estudos pareçam indicar uma falta
de resposta de insetos mordedores e
mastigadores a aplicações de fertilizantes
(Jansson e Smilowitz, 1985), outros
( M e y e r, 2 0 0 0 ) s u g e r e m q u e a
disponibilidade de nutrientes no solo não
apenas afeta quanto a uma planta ser
prejudicada por herbívoros, como também
a habilidade das plantas de se
recuperarem da herbivoria. O estudo de
Meyer reportou a influência de fertilidade
do solo nos graus de desfolha e
compensação em plantas de Brassica
nigra afetadas por larvas de Pieris rapae
(Meyer, 2000). Neste estudo, a
porcentagem de desfolha foi mais do que
duas vezes maior em solos com baixa
fertilidade em relação aos de alta
fertilidade, embora plantas crescidas em
solos de alta fertilidade tenham perdido
grande quantidade de área foliar em
termos absolutos. Tanto em solos com alta
fertilidade, quanto em solos com baixa
fertilidade, o número total de sementes e a
massa média por semente de plantas
afetadas foram equivalentes aos das
plantas não afetadas. Aparentemente, a
fertilidade do solo não influencia a
compensação das plantas em termos de
ajuste material.
Efeitos indiretos de nitrogênio no solo
em danos causados por artrópodes
em plantas
Práticas de fertilização
apresentam, possivelmente, efeitos
indiretos na resistência de plantas a
insetos pragas, por modificar sua
composição nutricional. O nitrogênio total
(N) tem sido considerado um fator
nutricional crítico mediante a abundância
e aptidão de herbívoros (Mattson, 1980;
Scriber, 1984; Slansky & Rodriguez,
1987). A maioria dos estudos reporta
dramáticos aumentos no número de
afídeos e ácaros em resposta ao aumento
da taxa de fertilização com nitrogênio.
Segundo van Emden (1966), acréscimos
nas taxas de fertilidade e desenvolvimento
do pulgão-verde (Myzus persicae), foram
amplamente correlacionados aos níveis
de acréscimo de nitrogênio solúvel em
tecidos foliares. Fato este também já
indicado por diversos outros autores, onde
mostram o aumento da população de
ácaros e afídeos devido à fertilização com
nitrogênio (Luna, 1988). Aumentos em
populações de insetos herbívoros
associados com brássicas também têm
sido documentados pelo mesmo motivo
(Letourneau,1988). Em dois anos de
estudo, Brodbeck et al. (2001) observaram
que populações do tripes (Frankliniella
occidentalis) foram significativamente
maiores em tomates que haviam recebido
altas taxas de fertilização com nitrogênio.
Outras populações de insetos foram
encontradas com o aumento subseqüente
à fertilização nitrogenada, incluindo
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Melhorando o Manejo
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Saúde do Solo:
Direcionando uma
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Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
lagartas militares em milho, lagartas da
espiga do milho em algodão, Psylla
pyricola em pêra, cochonilha vermelha
(Pseudococcus comstocki) em maçã e
broca do colmo do milho (Ostrinia
nubilalis) em milharais (Luna, 1988).
Devido as plantas serem uma
fonte de nutrientes a insetos herbívoros,
um aumento no conteúdo de nutrientes da
planta poderia aumentar sua
aceitabilidade como fonte de alimento
para populações de pragas. Variações nas
respostas de herbívoros podem ser
explicadas pelas diferenças nas condutas
de alimentação desses animais (Pimentel
& Warneke, 1989). Por exemplo, com o
aumento nas concentrações de nitrogênio
em arbustos (Larrea tridentata),
populações de insetos sugadores
aumentaram, enquanto que o número de
insetos mastigadores diminuiu. É
plausível que com maior fertilização com
nitrogênio a soma de nutrientes na planta
aumente, bem como a quantidade de
metabólitos secundários, os quais podem
afetar seletivamente herbívoros que se
alimentam de modo padrão. Em particular,
inibidores da digestão de proteínas, que
são encontrados acumulados em
vacúolos de células vegetais, não são
consumidos por herbívoros sugadores,
mas sim por herbívoros mastigadores
(Mattson, 1980), conquanto essa resposta
diferencial não pareça mudar a direção
global quando se vê estudos de nutrição
de plantas ou ataque de pragas.
Revisando pesquisas dos últimos
50 anos sobre a nutrição de plantas e
ataques de insetos, Scriber (1984)
encontrou 135 estudos mostrando o
aumento de danos e/ou de insetos
mastigadores e ácaros em culturas onde
utilizou-se adubação nitrogenada, contra
menos de 50 estudos relatando uma
diminuição dos danos causados pela
herbivoria de insetos. Em adição, estes
resultados sugerem uma hipótese com
implicações para um modelo de uso de
fertilizantes para a agricultura, isto é,
grandes adições de N podem resultar em
altos níveis de danos por herbivoria. Como
conseqüência, espera-se que as plantas
tornem-se menos propensas a insetos
pragas e doenças se práticas de
fertilização orgânica forem utilizadas, visto
que geralmente resulta em menores
concentrações de N nos tecidos vegetais.
Contudo, Letourneau (1988) questiona se
tal hipótese, baseada nos estudos de
Scriber, pode ser extrapolada como norma
geral sobre a adição de fertilizantes
associada a ataque de insetos pragas em
agroecossistemas.Letourneau revisou
100 estudos e encontrou que dois terços
(67) dos estudos sobre insetos e ácaros
mostraram um aumento no crescimento,
sobrevivência, taxa reprodutiva,
densidade populacional ou níveis de
danos em plantas em resposta ao
acréscimo de fertilizantes nitrogenados. O
terço restante dos estudos sobre
artrópodes mostrou ou um decréscimo
nos danos quando da utilização de
fertilizantes nitrogenados ou nenhuma
mudança significativa. O autor concluiu
ainda que o desenho experimental pode
afetar os tipos de respostas observadas.
A maioria dos agricultores
Cakchiquel não reconheceu insetos
herbívoros como um problema em suas
milpas (consórcio entre milho (Zea mays),
feijão (Phaseolus vulgaris), fava (Vicia
faba) e ou abobrinha (Cucurbita maxima,
C. pepo)) em estudo conduzido em
Patzun, Guatemala (Morales et al., 2001).
Os agricultores atribuíram o baixo número
de insetos a medidas preventivas
incorporadas a suas práticas agrícolas,
incluindo técnicas de manejo do solo.
Agricultores desta localidade
tradicionalmente misturavam cinzas,
restos alimentares, resíduos culturais,
plantas espontâneas, folhas secas e
esterco para a produção de composto.
Entretanto, a partir da década de 1960,
fertilizantes sintéticos foram introduzidos
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Melhorando o Manejo
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Direcionando uma
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Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
na região, sendo rapidamente adotados.
Hoje, a maioria dos agricultores tem
substituído fertilizantes orgânicos por
uréia (CO(NH2)2), embora alguns deles
reconheçam as conseqüências negativas
da mudança e queixem-se do aumento
das populações de pragas em suas milpas
desde a sua introdução.
Em seus estudos, nas áreas
montanhosas da Guatemala, Morales et
al. (2001) também observaram que
milharais tratados com fertilizantes
orgânicos (aplicados por dois anos)
sofreram menor incidência de afídeos
(Raopalosiphum maidis) do que aqueles
tratados com fertilizantes sintéticos. Esta
diferença foi atribuída a alta concentração
de nitrogênio foliar nas parcelas tratadas
com fertilizantes sintéticos, embora o
número de Spodoptera frugiperda tenha
mostrado uma pequena correlação
negativa com o aumento do nível de
nitrogênio.
Dinâmica de insetos herbívoros em
sistemas organicamente fertilizados
A menor abundância de muitos
insetos herbívoros em sistemas de baixo
aporte tem sido parcialmente atribuída a
um menor conteúdo de nitrogênio nos
cultivares organicamente produzidos
(Lampkin, 1990). Nesse sentido, métodos
de produção utilizando adição de solo
orgânico, significativamente promovem a
conservação de espécies de artrópodes
em todos os grupos funcionais e aumenta
a abundância de inimigos naturais em
comparação com práticas convencionais
(Moreby et al., 1984; Basedow, 1995;
Drinkwater et al., 1995; Pfiffner e Niggli,
1996; Berry et al., 1996; Letourneau e
Goldstein, 2001; Mader et al., 2002; Hole
et al., 2005). Isso sugere que populações
de pragas reduzidas em sistemas
orgânicos são a conseqüência tanto de
mudanças nutricionais induzidas na
cultura pelos fertilizantes orgânicos,
quanto pelo aumento do controle natural
de pragas. Independente do caso, existem
muitos exemplos nos quais menores
populações de insetos herbívoros têm
sido documentadas em sistemas de baixo
aporte, com a variedade de possíveis
mecanismos propostos.
No Japão, a densidade de
imigrantes de cigarrinha (Sogatella
furcifera) foi significativamente menor, a
taxa de colonização das fêmeas adultas e
a taxa de sobrevivência dos imaturos na
geração seguinte foi geralmente menor,
em sistemas orgânicos de arroz em
comparação com sistemas convencionais.
Conseqüentemente, as densidades de
ninfas de cigarrinha e de adultos na
geração seguinte foram decrescendo nos
campos orgânicos (Kajimura, 1995). Na
Inglaterra, campos convencionais de trigo
de inverno exibiram uma maior infestação
de um afídeo (Metopotophium dirhodum)
em relação ao seus equivalentes
orgânicos. A cultura de trigo
convencionalmente fertilizada também
teve maiores níveis de aminoácidos livres
em suas folhas durante junho, o que foi
atribuído a aplicação de nitrogênio em
toda a planta no começo de abril.
Entretanto, a diferença nas infestações de
afídeos entre culturas foi atribuída a uma
resposta dos afídeos a proporções
relativas entre certos aminoácidos não
protéicos e protéicos presentes nas folhas
no momento da colonização dos afídeos
na cultura (Kowalski e Visser, 1979). Os
autores concluíram que culturas de trigo
de inverno usando fertilizantes químicos
foram mais palatáveis que suas
equivalentes orgânicas, daí o maior nível
de infestação.
Altieri et al. (1998) conduziram
uma série de experimentos comparativos
em diferentes épocas de plantio entre
1989-1998, nos quais brócolis foi sujeito a
diferentes regimes de fertilização
(convencional e orgânico), com objetivo
de testar os efeitos de diferentes fontes de
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Melhorando o Manejo
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nitrogênio na abundância de importantes
pragas, afídeo do repolho (Brevicoryne
brassicae) e besouro (Phyllotrila
cruciferae). Monoculturas
convencionalmente fertilizadas
consistentemente desenvolveram uma
maior infestação de besouros (Phyllotrila
cruciferae) e em alguns casos do afídeo do
repolho, do que os sistemas de brócolis
orgânico. A redução das infestações de
afídeos e besouros nas parcelas
orgânicas foi atribuída a menores níveis
de nitrogênio livre nas folhas das plantas.
Aplicações de fertilizantes químicos em
um indivíduo de brócolis dentro de um
campo orgânico, fez disparar a densidade
de afídeos na planta tratada, mas não nas
plantas ao redor (Figura 3). Estes
resultados corroboram a visão de que a
preferência dos insetos pode ser
modificada por alterações no tipo e na
quantidade de fertilizantes utilizados.
Por contraste, um estudo
comparando respostas de populações
depragas de Brassica sujeitas a
fertilizantes orgânicos verso sintéticos,
obteve maiores populações de besouros
Phyllotreta em parcelas de couve
(Brassica oleraceae) que receberam
adição de lama no começo da estação, em
comparação com aquelas que receberam
fertilizantes minerais e as que não foram
fertilizadas (Culliney e Pimentel, 1986).
Porém, com aplicação no final da estação
nestas mesmas parcelas, os níveis das
populações de besouros, afídeos e
lepidópteros foram mais baixos nas
parcelas orgânicas. Isso sugere que o
efeito do tipo de fertilizante varia com o
estágio de crescimento da planta e que
fertilizantes orgânicos não
necessariamente diminuem as
populações de pragas durante toda a
estação.
Figura 3. Resposta da população de afídeos ao tratamento individual de plantas de brócolis orgânicos
com N químico em área organicamente manejada na cidade de Albany, Califórnia (Altieri, dados não
publicados).
Plantas organicamente tratadas com N Químico
Plantas organicamente tratadas
800
600
400
06/Ago
30/Jul
23/Jul
16/Jul
09/Jun
0
02/Jun
200
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Por exemplo, em uma entrevista
com produtores de tomates da Califórnia,
independente das pronunciadas
diferenças nas qualidades das plantas
(conteúdo de N nas folhas e caules), tanto
dentro como fora dos campos de tomate,
Letourneau et al. (1996) não encontraram
nenhuma indicação de que grandes
concentrações de N nos tecidos do tomate
estavam associadas com mais altos níveis
de danos devido a insetos observados na
colheita.
Conclusão
O manejo da fertilidade do solo pode causar efeitos diversos sobre a qualidade e
composição da planta que, por sua vez, pode influenciar no número de insetos e
subseqüentes níveis de danos por herbivoria. A realocação de minerais em culturas agrícolas
pode afetar a ovoposição, taxa de crescimento, sobrevivência e reprodução de insetos pragas
(Jones, 1976). Maiores pesquisas são necessárias, contudo, evidências preliminares
sugerem que práticas de fertilização do solo podem influenciar a resistência relativa de
culturas agrícolas a insetos pragas. Altos níveis de nitrogênio solúvel no tecido vegetal
resultaram num decréscimo na resistência a pragas, embora não se trate de uma regra geral
(Phelan et al., 1995).
Fertilizações químicas podem influenciar grandemente o balanço de elementos
nutricionais nas plantas e, este fenômeno correlaciona-se, provavelmente, ao seu uso em
excesso, o que resultaria num desequilíbrio nutricional, que por sua vez, reduz a resistência a
pragas. Em contraste, práticas orgânicas promovem um aumento na matéria orgânica do solo
e na atividade microbiológica e a uma gradativa liberação de nutrientes que poderiam,
teoricamente, proporcionar à planta, uma nutrição mais balanceada. Assim, quando a porção
de nitrogênio prontamente disponível para a cultura pode ser menor quando práticas de
fertilização orgânica são aplicadas. Assim, enquanto a porção de nitrogênio imediatamente
disponível para a cultura pode ser menor quando aplicados fertilizantes orgânicos, o status
nutricional das plantas parece ser melhorado. Práticas de fertilização orgânica do solo podem
ainda fornecer a suplementação de microelementos e elementos secundários,
ocasionalmente ausentes em sistemas de produção convencional baseados primariamente
em fontes artificiais de N, P e K. Além das concentrações de nutrientes, fertilizações ótimas,
que forneçam uma nutrição balanceada, podem estimular a resistência a ataques de insetos
(Luna, 1988). Fontes orgânicas de nitrogênio podem conferir grande tolerância a danos
vegetativos por liberarem nitrogênio mais lentamente ao longo de vários anos.
Phelan et al. (1995) reforçam que é necessário considerar outros mecanismos quando
se examina a ligação entre o manejo da fertilização do solo e a susceptibilidade das plantas ao
ataque de insetos. Seus estudos demonstraram que a preferência para a oviposição de
pragas de folhas pode ser mediada por diferenças no manejo da fertilidade do solo. Assim, o
menor número de insetos-praga encontrados em sistemas de produção orgânica pode, em
parte, advir de resistências mediadas por diferenças bioquímicas e nutrição mineral nas
culturas conduzidas sob estas práticas. De fato, observa-se que os resultados fornecem uma
interessante evidência para reforçar a teoria de que o manejo da matéria orgânica do solo por
um longo período de tempo pode melhorar a resistência de plantas contra insetos-pragas.
Esta visão é corroborada pela recente pesquisa sobre as relações entre os componentes que
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estão sobre e sob o solo dos ecossistemas, a qual sugere que a atividade biológica no solo é
provavelmente muito mais importante que os atuais conhecimentos sobre a determinação de
respostas individuais das plantas aos estresses causados pelos insetos (Blouin et al., 2005), e
que esta resposta é mediada por uma série de interações esboçadas na Figura 2. Estes
resultados ressaltam nosso entendimento sobre o papel da biodiversidade na agricultura e as
estreitas relações entre a biota encontrada sobre e sob a camada superficial do solo. Tal
entendimento constitui o passo-chave para a construção de uma verdadeira inovação na
estratégia do manejo de pragas com bases ecológicas, que combina diversificação de
culturas e incremento da qualidade do solo.
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Miguel A. Altieri, Luigi Ponti, e Clara I. Nicholls
Referências
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Miguel A. Altieri is a Professor, and Luigi Ponti, and Clara I. Nicholls
are Research Fellows in the Department of Environmental Science, Policy
and Management, Division of Insect Biology, University of California
at Berkeley. The group can be contacted at the Department, 137 Mulford
Hall3114, Berkeley, CA 94720-3114; 510-642-9802. Miguel Altieri
can also be reached by e-mail at <[email protected]>.
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