SOLUÇÕES INOVADORAS Os autores são pesquisadores do Laboratório de Aerodinâmica Industrial e Engenharia do Vento do IPT GILDER NADER é dr. em Engenharia - Poli/USP Domando o vento Quando se realiza o projeto de uma edificação, é necessário que as forças do vento nas paredes e coberturas sejam dimensionadas com muita segurança. Projetos incorretos ocasionam dois problemas típicos: obras superdimensionadas, que trazem gastos elevados e desnecessários à construção, ou subdimensionadas, que poderão ruir em parte ou totalmente, quando ocorrer uma rajada de vento. O túnel de vento (Figura 1) é a ferramenta adequada para se determinar com segurança as ações do vento numa estrutura da construção civil. Seu uso é ainda mais amplo, pois é utilizado também para estudos de conforto ambiental, dispersão de contaminantes e avaliação de projetos de helipontos sobre edificações. A Norma Técnica ABNT NBR 6123:1988 – Forças Devidas ao Vento em Edificações traz os parâmetros para dimensionamento de várias estruturas, tais como casas, galpões, silos e reservatórios cilíndricos, chaminés, edifícios de múltiplos pavimentos e estruturas reticuladas (como torres de transmissão). A norma atende muito bem aos formatos clássicos dessas construções, pois estes foram exaustivamente ensaiados em túneis de vento em diversos países, e então se estabeleceram os valores padrões de coeficientes de pressão e força nessas estruturas. Com os aprimoramentos tecnológicos dos materiais e sistemas construtivos, os projetos de edificações puderam ser cada vez mais ousados, apresentando, por exemplo, superfícies curvas e coberturas que vencem grandes vãos. Tais aprimoramentos também permitiram a construção de edifícios cada vez mais altos e esbeltos, mantendo uma relação de largura por altura acima de 1/10, como, por exemplo, edifícios com 13 m de largura por 130 m de altura, ou edifícios com alturas superiores a 200 m, havendo uma tendência a se construírem edifícios com alturas superiores a 1.000 m. Nestes casos o comportamento dinâmico da edificação, devido à ação do vento, pode gerar problemas na estrutura, nos revestimentos, nos sistemas de vedação das janelas e também de desconforto (mal-estar) dos usuários devido às oscilações. Ensaio avalia também itens como conforto ambiental e helipontos PAULO JOSÉ SAIZ JABARDO é doutor em Engenharia - Poli/USP GABRIEL BORELLI MARTINS é mestrando em Engenharia - Poli/USP Envie seus comentários, críticas, perguntas e sugestões de temas para esta coluna: noticias@ sindusconsp.com.br 40 revista notícias da construção / Março 2015 Túnel de vento Para realização de ensaios de edificações em túnel de vento há necessidade de se simular o vento natural do local. A Norma 6123 faz a divisão em cinco tipos de rugosidade do terreno, que influenciam nas características do perfil de velocidades do vento e, consequentemente, na distribuição de forças que o vento realiza sobre uma estrutura. As rugosidades do terreno são divididas entre as Categorias I e V, onde a primeira se refere ao mar calmo e a última aos grandes centros de cidades. Outro fator que altera as características do perfil de velocidades do vento é a topografia do terreno. Se uma edificação será construída no alto de um talude ou morro, por exemplo, haverá um aumento da velocidade do vento nesta região, acarretando maiores forças do vento na estrutura. Por outro lado, se for construída em vales protegidos do vento em quaisquer direções, os esforços serão menores. Para se determinar Figura 1 - Túnel de vento do IPT com maior exatidão as ações do vento em regiões com topografia acidentada, como as descritas, deve-se construir um modelo reduzido reproduzindo a topografia do terreno para então realizar o ensaio em túnel de vento. A capacidade de modelar as edificações, a topografia do terreno e o vento natural do local garantem ao túnel o fornecimento de valores com boa exatidão de carregamento estático do vento e de resposta dinâmica da edificação, permitindo dimensionar uma estrutura de forma otimizada e com segurança. No entanto, a Norma 6123 sugere que se faça o cálculo do carregamento com o valor sempre crescente com altura do edifício de múltiplos pavimentos. Portanto, somente por este resultado do túnel de vento é possível perceber que se pode utilizar um menor dimensionamento, por exemplo, nos caixilhos e janelas, assim como se obtém também um menor momento fletor. Figura 2 - Modelo reduzido posicionado sobre a mesa giratória do túnel de vento Túnel de vento permite edificar construções altas com segurança Carregamento estático do vento Nos ensaios de carregamento estático do vento são instalados sensores de pressão e de força no modelo reduzido. Procura-se ter uma maior concentração de sensores de pressão próximos às quinas das edificações e na cobertura, pois nestas regiões ocorrem sucções elevadas. Para que se realize o ensaio incidindo o vento no modelo por todas as direções, este é fixado sobre uma mesa giratória (Figura 2) e tipicamente são realizados ensaios de 0º até 360º, com medições efetuadas a cada 15º. Assim, determina-se a distribuição de pressões estáticas sobre o modelo. Os ensaios em túnel de vento indicam que na face a barlavento o carregamento máximo do vento está em cerca de 3/4 e 2/5 da altura do edifício, como indicado pela cor vermelha na Figura 3. Acima dessa altura o carregamento diminui (Figura 3). Ensaios em túneis de vento indicam também regiões onde há um carregamento acima do calculado por norma, pois muitas vezes a influência de edificações vizinhas causa um aumento na sucção ou sobrepressão sobre uma determinada área da edificação. A torre da TV Digital de Brasília (Figura 4), projeto de Oscar Niemeyer, demonstra a importância do uso de túnel de vento para determinação com segurança das forças devidas ao vento. A torre possui 182m de altura por 10m de diâmetro em sua base. É uma estrutura alta e esbelta. Projetos deste tipo podem necessitar de fundações muito bem estruturadas para evitar a queda da construção devido à ação do vento. Os resultados obtidos no túnel de vento do IPT indicaram que os esforços causados pelo vento eram cerca de 4 vezes menores que os calculados pelo projetista estrutural, baseado em normas. Neste caso, a fundação da torre foi construída com os valores maiores, que haviam sido calculados previamente, pois garantiam a segurança da estrutura. revista notícias da construção Figura 3 - Mapa de distribuição de pressão obtida em túnel de vento para edifício de 180 m de altura / Março 2015 41 Figura 4 - Modelo da torre da TV Digital de Brasília no túnel de vento Ensaios dinâmicos A Norma 6123 afirma que edificações com frequências naturais abaixo de 1 Hz podem apresentar significativa resposta flutuante na direção do vento médio e, nestes casos, devem-se realizar ensaios em túnel de vento para se obter a resposta dinâmica da edificação. tados com excelente exatidão. No entanto, ela é utilizada somente para edifícios, pois os deslocamentos devem ser pequenos, de modo que não haja alterações significativas na interação do vento com a estrutura. Utilizando a técnica HFPI se determinam os modos de vibração da edificação devido à ação do vento. Na Figura 6 são mostrados o primeiro e o sexto modo de vibração. Nota-se que o sexto modo apresentava torção da edificação, e de acordo com os resultados obtidos das frequências e amplitudes de vibração, podem ser necessários dimensionamentos do revestimento e dos elementos de vedação diferentes dos sugeridos por normas, pois o comportamento dinâmico da estrutura pode induzir rachaduras e quebras desses elementos de construção. Ensaios de estruturas em túnel de vento são realizados desde o fim do século 19 e foram aprimorados ao longo das décadas. Especificamente na década de 1960 foi desenvolvida a metodologia de ensaio de edificações utilizada nos dias atuais. A evolução desde então se deu nos sensores de pressão e força, obtendo-se assim resultados cada vez mais confiáveis e possibilitando a realização de ensaios em pouco tempo. O que permite atender uma grande demanda, já que as edificações atuais têm sido cada vez mais ousadas e altas, necessitando de ensaios em túnel para se ter maior segurança e economia na execução de um projeto. Figura 5 - Edifício de múltiplos pavimentos ao vento e a vizinhança modelada Ensaio pode levar a mudanças no revestimento e nas vedações Desde o acidente ocorrido com a ponte de Tacoma Narrows nos EUA em 1940, que ruiu sob uma ventania a cerca de 60 km/h devido ao fenômeno de drapejamento, todas as pontes pênseis e estaiadas são ensaiadas previamente em túnel de vento. Para tais ensaios são construídos modelos aeroelásticos, que reproduzem, em escala, as características de inércia, rigidez e amortecimento da ponte. Desta forma, podem ser determinadas as velocidades críticas em que ocorrem as vibrações induzidas por vórtices (VIV), galope, martelamento (ou golpe) e drapejamento. No caso de edifícios de múltiplos pavimentos (Figura 5), utilizam-se duas técnicas para determinação da resposta dinâmica da edificação: a de modelo aeroelástico, similar ao utilizado em pontes, e o método denominado High Frequency Pressure Integration (HFPI). Graças à melhoria dos sensores de pressão de múltiplos canais, a técnica HFPI tem sido a mais utilizada e fornece resul- 42 revista notícias da construção / Março 2015 Figura 6 - Exemplos dos modos 1 e 6 de vibração de um edifício alto e esbelto ensaiado em túnel de vento