A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Circuito Espacial de Produção Têxtil e uso do território nos municípios de Caicó e Jardim de Piranhas - Região do Seridó Potiguar IGOR RASEC BATISTA DE AZEVEDO1 Resumo: O artigo analisa o uso do território pelo circuito espacial de produção têxtil nos municípios de Caicó e Jardim de Piranhas, região do Seridó Potiguar, os quais se destacam na fabricação de artefatos têxteis para uso doméstico. Atualmente, a atividade têxtil consolida-se como uma das principais do setor industrial da região. Esta produção é desenvolvida, em sua grande maioria, em pequenos estabelecimentos industriais, cuja disseminação no território seridoense expressa uma verdadeira capilaridade social. Outrossim, esta lógica produtiva, portanto, o uso intensivo de capital vincula-se mais aos contornos da escala local e regional, apesar dos vetores globais que incidem no território. Nesta perspectiva, o trabalho busca problematizar como se configuram resistências territoriais, levando em consideração que esses agentes constituem uma contra-racionalidade ao processo de globalização do capital. Palavras-chave: Circuito espacial de produção têxtil; território; Seridó Potiguar Abstract: The article analyzes the use of the territory by the spatial circuit textile production in the municipalities Jardim de Piranhas and Caicó - Seridó Potiguar region - which stand in the manufacture of textile articles for home use. Currently, the textile activity is consolidated as one of the leading industrial sector in the region. This production is mostly developed in small industrial establishments, whose spread in Seridó territory expresses a true social capillarity. Furthermore, this productive logic, so the intensive use of capital is linked more to the contours of the local and regional level, despite the global vectors that affect the territory. In this perspective, the work seeks to question how to configure territorial resistance, taking into account that these agents constitute a counter-rationality to the capital from the globalization process. Key-words: Spatial circuit textile production; territory; Seridó Potiguar 1 – Introdução O presente artigo é fruto das reflexões a respeito do trabalho de dissertação de Mestrado, provisoriamente intitulado, Reflexos da reestruturação produtiva no Seridó Potiguar: o uso do território de Caicó e Jardim de Piranhas pelo circuito espacial da produção têxtil, em curso no Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte2. Contudo, vale 1 Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail de contato: [email protected] 2 Este trabalho está sendo desenvolvido sob a orientação do Prof. Dr. Francisco Fransualdo de Azevedo, docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 7007 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO ressaltar o caráter inicial deste processo, que é de consolidação paulatina das bases teóricas, empíricas e temporais3. Nosso interesse investigativo ulterior consiste em analisar o uso do território do Seridó Potiguar pelo circuito espacial da produção têxtil, a se cumprir com a execução das etapas posteriores de nossa pesquisa. Para tal, traçaremos um percurso cujo objetivo é construir uma periodização da atividade têxtil no Seridó Potiguar e analisar o seu papel e nexos com o processo de reestruturação produtiva; identificar os agentes envolvidos no circuito espacial de produção têxtil, analisando as articulações empreendidas entre eles nos círculos de cooperação do espaço; culminando na análise de como o circuito espacial da produção têxtil usa e organiza o território seridoense4. Nessa perspectiva, o artigo em tela tem como questão central analisar o uso do território pelo circuito espacial de produção têxtil nos municípios de Caicó e Jardim de Piranhas, localizados na região do Seridó Potiguar, os quais se destacam na fabricação de artefatos têxteis para uso doméstico. Destarte, objetivamos tecer um panorama sintético do que já foi desenvolvido, do que vislumbramos realizar e, portanto, de que modo estruturamos, em termos de pesquisa científica, nosso horizonte investigativo. Discorreremos, a seguir, em linhas gerais, sobre a forma com a qual a nossa problemática está atrelada ao paradigma contraditório da produção que, em nossos dias, torna cada vez mais espesso o fenômeno da divisão territorial do trabalho através de seu espraiamento, concomitante ao acúmulo de sobreposições advindas da materialidade pretérita somando-se à pulverização de novas atividades e vetores de modernização. Este panorama vincula-se, sobremaneira, à estruturação do meio técnico-científico-informacional. 3 As reflexões geradas nas disciplinas cursadas no período de 2015.1, junto ao Programa, nos foram de suma importância neste sentido. 4 A região do Seridó Potiguar está localizada na mesorregião central do Estado do Rio Grande do Norte e subdivide-se nas microrregiões Seridó Ocidental e Seridó Oriental e compreende os municípios, a saber: Caicó, Ipueira, Jardim de Piranhas, São Fernando, São João do Sabugi, Serra Negra do Norte e Timbaúba dos Batistas – Seridó Ocidental; Acari, Carnaúba dos Dantas, Cruzeta, Currais Novos, Equador, Jardim do Seridó, Ouro Branco, Parelhas, Santana do Seridó e São José do Seridó – Seridó Oriental. 7008 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Abordaremos, por conseguinte, as implicações desse processo para o Estado do Rio Grande do Norte que, em uma de suas manifestações, perpassa os nexos com a reestruturação produtiva. Desta, salientamos um dos eixos da indústria potiguar que é o têxtil, especificamente da fabricação de produtos têxteis, excetuando-se o vestuário, na qual o Seridó Potiguar assume notoriedade. Esta produção é desenvolvida, em sua grande maioria, em pequenos estabelecimentos, cuja disseminação no território seridoense expressa uma verdadeira capilaridade social. Outrossim, esta lógica produtiva, portanto, o uso intensivo de capital vincula-se mais aos contornos da escala local e regional, apesar dos vetores globais que incidem no território. Neste momento, emerge a hipótese de que se configuram resistências territoriais, levando em consideração que esses agentes constituem uma contra-racionalidade ao processo de globalização do capital. Em seguida, faremos uma breve reflexão sobre a teoria dos circuitos espaciais de produção e dos círculos de cooperação do espaço, cujo objetivo é propiciar uma interpretação propriamente geográfica da produção e do movimento. À luz de sua ampla perspectiva de análise, delinearemos as pretensões de nossa pesquisa através de apontamentos referentes à escolha de categorias analíticas, conceitos e noções fundadoras específicas. 2 – Desenvolvimento O entendimento do paradigma atual da produção passa por uma ampla discussão, que escapa aos contornos da produção propriamente dita. Ora, as heranças pretéritas se esmaecem, apesar de não se anularem, para serem incorporadas uma série de vetores, de ordens distintas e naturezas diversificadas, cujas marcas denotam a urgência de algo novo. Na realidade, interessa vislumbrar, minimamente, a forma como o mundo se estrutura na história atual. Neste sentido, Silveira (2012) discute como a técnica transforma, incessantemente, o uso do território no período atual da globalização. Cujo entendimento deve passar por três tendências, que lhe são constitutivas - também chamadas de unicidades. A autora fundamenta o desenvolvimento de suas ideias 7009 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO em Santos (2012), para quem a compressão do mundo passa pelo papel do fenômeno técnico e por suas manifestações atuais, engendradas no processo de constituição de uma inteligência planetária. A primeira dessas tendências é a unidade técnica, isto é, a planetarização de um sistema técnico que abrange todos os lugares. A segunda trata-se da convergência dos momentos, ou seja, o conhecimento instantâneo dos eventos que nos possibilita a percepção da simultaneidade, cuja base material é a técnica da informação, culminando no que Milton Santos chamou de cognoscibilidade do planeta. A terceira delas é a unicidade do motor ou a mais-valia tornada mundial, legitimada por um denso aparato normativo. “Essas três unicidades são a base do fenômeno de globalização e das transformações contemporâneas do espaço geográfico.” (SANTOS, 2012, p. 189). Ademais, outro dado extremamente relevante para a compreensão do meio geográfico atual, apontado pela autora, cuja emergência aflora exatamente da explicação dos elementos acima elencados, é a assertiva de que a história se tornou universal. Universal no sentido de ser concreta; fundamentada por uma base material, organizacional e financeira planetária, diferente de outrora. Este fenômeno está imbricado à consolidação, iniciada no momento póssegunda guerra mundial, do meio técnico-científico-informacional. Trata-se da “cara geográfica da globalização” (SANTOS, 1999, p. 11). Para este autor, o período em que vivemos se diferencia dos demais pela vicissitude de um casamento perfeito entre técnica e ciência, ungidos pela égide do mercado, tornado global, graças a condições propiciadas por essa união. Nesta lógica, a informação triunfa como o “nexo fundamental”, uma vez que, ela não só está presente no espaço, nos objetos e nas coisas que o constituem, como as realizações das ações que nele se desenvolvem lhes são tributárias; todo o território tende a ser equipado em favor da livre circulação desses nexos. A implicação direta desse processo é a tendência à requalificação abrupta dos espaços (SILVEIRA 2010), reformulando os seus atributos, intentando amparar as demandas dos atores hegemônicos da economia, da política e da cultura, em detrimento dos demais (SANTOS, 2012; SANTOS, 1999). 7010 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Desse modo, “Ao mesmo tempo em que aumenta a importância dos capitais fixos [...] e dos capitais constantes [...], aumenta também a necessidade de movimento, crescendo o número e a importância dos fluxos [...]” (SANTOS, 1999, p.11). Nesta perspectiva, o capitalismo está sempre movido pelo ímpeto de acelerar o tempo de giro do capital, apressar o ritmo de circulação e, em consequência, de revolucionar os horizontes temporais do desenvolvimento, conforme explicita Harvey (2009). Ou seja, “[...] não basta produzir, mas pôr a produção em movimento, sobretudo porque não é mais a produção que preside à circulação, mas esta é que conforma a produção” (SANTOS, 2012, p. 275). Observa-se, neste sentido, uma verdadeira irrupção no paradigma da produção, pois, “[...] diminui a arena da produção, enquanto a respectiva área se amplia. Restringe-se o espaço das outras instâncias da produção, circulação, distribuição e consumo” (Idem). Em outros termos, temos no período atual uma divisão territorial do trabalho mais esparsa, estendida; não obstante aos avanços técnicos que possibilitaram à concretização da previsão de Marx – assinalada pelo autor – relativa à redução da área e do tempo necessários à produção das mesmas quantidades. Outra contradição aparente é observada por Silveira (2010), para quem este “centrifuguismo” é paralelo ao “centripetismo” de nexos extrovertidos emanados das metrópoles; onde, em geral, são realizadas “as principais tarefas de concepção técnica, informacional, mercadológica e a transformação dos instrumentos financeiros em outros” (SILVEIRA, 2010, p. 78). É necessário frisar, ainda, conforme aponta a autora, que não se trata apenas de uma simples ampliação dos contextos, onde todos os lugares são convidados a produzir ativamente. Há, na realidade, uma pluralidade e coexistência de divisões do trabalho, sobrepondo-se no uso do território; tendo como condição e resultado as infraestruturas, os movimentos de população, as dinâmicas agrícolas, industriais e de serviços, a estrutura normativa e a extensão da cidadania. Neste sentido, podemos afirmar com Santos (2009) que o espaço é uma acumulação desigual de tempos; cada lugar abrigando, ao mesmo tempo, temporalidades distintas. Seguindo este raciocínio, temos de concordar com Silveira (2010, p.74) que o espaço geográfico é “um rendilhado de divisões territoriais, um 7011 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO sinônimo de território usado”. Ou mesmo, para finalizar, que o espaço é “a soma dos resultados da intervenção humana sobre a terra” (SANTOS, 2009, p. 29). Sempre segundo Santos (2012), os novos subespaços, inseridos nessa lógica, não detêm capacidade uniforme de rentabilizar determinada produção, pois, cada combinação possui sua respectiva lógica, autorizando formas de ação e agentes econômicos específicos para cada situação. Dessa maneira, os lugares seriam diferenciados pela sua capacidade particular, maior ou menor, de rentabilizar investimentos, a depender das condições locais de ordem técnica e organizacional. Esta “rentabilidade” não é, para o autor, um dado absoluto do lugar. A eficácia mercantil estaria, na realidade, ligada ao produto, mais precisamente à um produto específico, isto é, à uma atividade predominante específica. Isso abre margem para que os lugares se especializem, adrede, em determinado(s) ramo(s), em que pese as virtualidades naturais, a capacidade técnica e organizacional e as vantagens de cunho social. Aflora, entrementes, uma extrema competitividade entre os lugares e suas forças, repercutindo. Esses lugares [...] repercutem os embates entre os diversos atores e o território como um todo revela os movimentos de fundo da sociedade. A globalização, com a proeminência dos sistemas técnicos e da informação, subverte o antigo jogo da evolução territorial e impõe novas lógicas (SANTOS, 2004, p. 79). Depreende-se disso um agravamento galopante da necessidade de acumulação, engendrada pelo parâmetro atual da produção, que dá especial relevo ao movimento, implicando à circulação um ritmo frenético. Isto requer dos subespaços um denso aparato técnico, organizacional e normativo viabilizando essa mobilidade. É evidente que não há uma uniformidade de resposta aos reclamos acima citados, implicando numa segmentação do mercado. Segundo Arroyo (2008), isso acontece pelo fato de existirem diferentes formas de produzir que, por usa vez, correspondem a diferentes formas de consumir, autorizando a convivência de uma ampla variedade de formas de realização econômica, que trabalham segundo diversas taxas de lucro, produtividade, rendimentos e salários. 7012 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Em suma, o mundo encontra-se organizado em subespaços articulados em uma lógica global, cada lugar sendo resultado de uma ordem global e de uma ordem local, convivendo dialeticamente. Como decorrência dos inúmeros fluxos de todos os tipos, intensidades e direções, rompem-se os equilíbrios precedentes. O desenlace deste processo consiste numa significativa alteração na estruturação da produção, cujas etapas estão organizadas, atualmente, na forma de circuitos espaciais produtivos (SANTOS, 2008). A emergência destes novos aspectos, logicamente, também trouxeram implicações para o Estado do Rio Grande do Norte, cuja economia era tradicionalmente de base rural, onde, com as crises instaladas, sobretudo nos anos 1980, se inicia um processo de solapamento. Isto é, um dos nexos do novo período manifesta-se através do processo de reestruturação produtiva. Para Azevedo (2013, p. 114), “O processo de reestruturação produtiva compreende um conjunto de transformações de caráter estrutural, organizacional e técnico, fazendo-se refletir no espaço geográfico em sua totalidade”. No Rio Grande do Norte, “esse processo impôs a reestruturação do território, marcado dentre outros aspectos, pela falência de determinadas atividades econômicas, redefinição e reestruturação de outras, mas sobretudo o surgimento de „novas‟” (AZEVEDO, p. 114). O autor explica que um dos eixos da reestruturação produtiva no Rio Grande do Norte é o industrial, que se desenvolve, principalmente, a partir da agroindústria, do extrativismo e do setor têxtil. Segundo Azevedo (2007), no tocante à região do Seridó Potiguar, é importante considerar a relevância do setor industrial, especialmente o têxtil, o de alimentos e o cerâmico, surgindo com alternativas de reestruturação econômica do território. Ele destaca que a cidade de Caicó logra considerável evidência nesse processo, se constituindo em um importante centro de produção de bonés e, no setor têxtil, com a confecção de redes, panos de prato, mantas, cobertores etc., através das fábricas de tecelagem. Ainda segundo o autor, em que pese a infraestrutura e a logística de funcionamento das tecelagens inadequadas, a cidade de Jardim de Piranhas se constitui atualmente como uma importante produtora de 7013 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO produtos têxteis, sendo essa a mais importante fonte de geração de emprego e renda do município. Neste momento, uma distinção nos parece necessária em relação à indústria têxtil. Esta se conforma, principalmente, a partir das atividades de fabricação de produtos têxteis, exceto vestuário (envolvendo preparação e fiação de fibras têxteis; tecelagem, excetuando-se malha; fabricação de tecidos de malhas; e fabricação de artefatos têxteis, exceto vestuários) e a confecção de artigos do vestuário e acessórios (envolvendo confecção de artigo do vestuário e acessórios; e fabricação de artigos de malharia e tricotagem). Queremos jogar luz ao fato de que ambas possuem lógicas de localização distintas, por envolverem lógicas de produção também distintas. Portanto, a indústria têxtil envolve principalmente os circuitos espaciais do vestuário e da produção têxtil. Nosso trabalho trata deste último, apesar de ambos estarem imbricados - todavia, são inconfundíveis, por envolverem produtos específicos e, sobretudo, uma atividade predominante específica. A relevância do Seridó Potiguar para a fabricação têxtil, e vice versa, é bastante nítida, tendo uma sensível expressividade em termos relativos. Se levarmos em conta o Estado do Rio Grande do Norte, observaremos uma especialização nítida da região em relação ao setor, equiparada apenas à região metropolitana do Estado, que concentra a maior parte das empresas da indústria de transformação no geral. Do total de 160 empresas do setor industrial de fabricação têxtil no Rio Grande Norte, 95 estão na região do Seridó (FIERN, 2015). Isto representa mais de 59% das empresas, ou seja, mais da metade das indústrias de todo o Estado se concentram no Seridó Potiguar. Isto revela, ao mesmo tempo, a expressão do Seridó no setor e a especialização regional, relativo ao fenômeno de especialização dos lugares a que nos referíamos anteriormente. Isto conjectura um dos elementos há serem explorados em nossa análise, referente às Regiões Produtivas (SANTOS, 2008). 7014 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Municípios Nº de Empresas Jardim de Piranhas 71 Caicó 17 Currais Novos 03 Timbaúba dos Batistas 02 São José do Seridó 01 Serra Negra do Norte 01 TOTAL 95 Figura 01 – Tabela do número de empresas de fabricação têxtil do Seridó Potiguar por município. Fonte: Cadastro Industrial, 2015. Na Zona Homogênea de Caicó, 99,6% das indústrias são de micro e pequeno porte, com 94,0% dos empregados; e 0,4% das indústrias são de médio porte, com 6,0% do total de empregados – inexistem grandes indústrias (FIERN 2014). Sendo 97,6% das indústrias formais do Rio Grande do Norte classificadas como micro ou pequenas empresas, abrigando 48,8% dos empregos formais do setor (Idem, 2014). Estes números demonstram a relevância dos pequenos empreendedores na formação do setor industrial, na dinâmica econômica e na própria estrutura do trabalho do Estado. Isso evidencia que a produção é desenvolvida, em sua grande maioria, em pequenos estabelecimentos, cuja disseminação no território seridoense expressa uma verdadeira capilaridade social. Outrossim, esta lógica produtiva, portanto, o uso intensivo de capital vincula-se mais aos contornos da escala local e regional, apesar dos vetores globais que incidem no território. Neste momento, emerge a hipótese de que se configuram resistências territoriais, levando em consideração que esses agentes constituem uma contra-racionalidade ao processo de globalização do capital. Em relação a teoria que nos propomos à alicerçar nosso estudo, por compreender que se trata de uma maneira propiamente geográfica de se analisar a produção, o movimento e o uso do território, Castillo e Frederico (2010) detalham que ela enfatiza, à um só tempo, a centralidade da circulação (circuito) no 7015 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO encadeamento das diversas etapas da produção; a condição do espaço (espacial) como variável ativa na reprodução social; e o enfoque centrado no ramo, ou seja, na atividade produtiva dominante (produtivo). Castillo e Frederico (2010) detalham essa noção, evidenciando que ela enfatiza a centralidade da circulação (circuito) no encadeamento das diversas etapas da produção; a condição do espaço (espacial) como variável ativa na reprodução social; e o enfoque centrado no ramo, ou seja, na atividade produtiva dominante (produtivo). Contemplas itens distintos do processo, tais como: [...] sobre a matéria prima – local de origem, formas de seu transporte, tipo de veículo transportador etc.; sobre a mão de obra -, qualificação, origem, variação das necessidades nos diferentes momentos da produção etc.; sobre estocagem – quantidade e qualidade dos armazéns, dos silos, proximidade da indústria, relação entre estocagem e produção etc.; sobre transportes – qualidade, quantidade e diversidade das vias de transportes, dos meios de transportes etc.; sobre a comercialização – existência ou não de monopólio de compra, formas de pagamento, taxação de impostos etc.; sobre o consumo – quem consome, onde, tipo de consumo, se produtivo ou consumitivo etc. [...] (SANTOS, 2008, p. 56, grifos nossos) Os autores sugerem diretrizes para análise desses circuitos. Primeiramente, eles estabelecem que é necessário o reconhecimento da atividade produtiva dominante, analisando os seus principais aspectos técnicos e normativos. Da mesma forma, deve-se compreender a logística – definida por Castillo (2008), como a expressão geográfica da circulação corporativa. Ela permite analisar as condições materiais e o ordenamento dos fluxos que perpassam os circuitos espaciais produtivos. É necessário, igualmente, identificar os principais agentes envolvidos e as formas como estabelecem os círculos de cooperação. Estes [...] tratam da comunicação, consubstanciada na transferência de capitais, ordens e informação [...] garantindo os níveis de organização necessários para articular lugares e agentes dispersos geograficamente, isto é, unificando, as diversas etapas, espacialmente segmentadas, da produção (CASTILLO; FREDERICO, 2010, p. 464-465). 7016 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Para Silveira (2010) as tessituras destes círculos de cooperação cingem o território sob a forma de ordens, informações, propaganda, dinheiro e outros instrumentos financeiros. Destarte, para manter e reproduzir esse sistema de produção e circulação no território são necessários abundantes conteúdos organizacionais, com importante e prévio trabalho intelectual. Ou seja, tratam dos fluxos imateriais, uma vez que os circuitos espaciais de produção pressupõem, para os autores, os fluxos de matérias. A interpretação conjunta dessas duas noções possibilita verificar a interdependência dos espaços produtivos, compreendendo, ao mesmo tempo, a unidade e a circularidade do movimento. Outra indicação de Castillo e Frederico (2010) é examinar atentamente a organização e o uso do território das diversas etapas do circuito espacial produtivo. O ato de definição de uma teoria central para o desenvolvimento de nosso trabalho está imbricado a um encadeamento epistemológico particular. Acreditamos que isso nos conduzirá a um caminho original, de acordo com as variáveis por nós estabelecidas, no qual contemplará as instâncias de nossa pesquisa. Nesta perspectiva lançaremos mão das categorias forma - função - processo estrutura, enquanto unidades de um todo, na concepção de categorias estruturantes da abordagem geográfica. Iremos nos alicerçar, ao mesmo tempo, nos pares dialéticos, horizontalidades x verticalidades, sucessões x coexistências, fixos x fluxos. Além da categoria de divisão territorial do trabalho, que, acreditamos, permeará todo o nosso trabalho. Ademais, nosso conceito-geográfico-chave será Território, apesar de não abrirmos mãos de tratar, principalmente, dos de Lugar e Espaço. Tomaremos como noções fundadoras, para tal: território usado, as instâncias da produção, o meio técnico-científico-informacional, dentre outras. Referências ARROYO, M. A economia invisível dos pequenos. Le Monde: diplomatique Brasil. [s. L.], 04 out. 2008. Disponível em: <http://www.diplomatique.org.br/artigo.php?id=283>. Acesso em: 10 dez. 2014. 7017 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO AZEVEDO, F. F. de. ENTRE A CULTURA E A POLÍTICA: uma Geografia dos "currais" no sertão do Seridó Potiguar. 2007. 446 f. Tese (Doutorado) - Curso de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2007. AZEVEDO, Francisco Fransualdo de. Reestruturação produtiva no Rio Grande do Norte. Mercator, Fortaleza, v. 12, n. 2, p.113-132, ago. 2013. CASTILLO, R. Sustentabilidade, globalização e desenvolvimento. In: OLIVEIRA, M. P. de et al. (Org). O Brasil, a América Latina e o mundo: espacialidades contemporâneas. Rio de Janeiro: Anpege/Clacso/Faperj/Lamparina, 2008. p. 401410. CASTILLO, R.; FREDERICO, S. Espaço geográfico, produção e movimento: uma reflexão sobre o conceito de circuito espacial produtivo. Sociedade & Natureza, Uberlândia, v. 3, n. 22, p.461-474, dez. 2010. SANTOS, M. 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