Circuito Espacial de Produção Têxtil e uso do território

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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
Circuito Espacial de Produção Têxtil e uso do território nos municípios
de Caicó e Jardim de Piranhas - Região do Seridó Potiguar
IGOR RASEC BATISTA DE AZEVEDO1
Resumo: O artigo analisa o uso do território pelo circuito espacial de produção têxtil nos municípios
de Caicó e Jardim de Piranhas, região do Seridó Potiguar, os quais se destacam na fabricação de
artefatos têxteis para uso doméstico. Atualmente, a atividade têxtil consolida-se como uma das
principais do setor industrial da região. Esta produção é desenvolvida, em sua grande maioria, em
pequenos estabelecimentos industriais, cuja disseminação no território seridoense expressa uma
verdadeira capilaridade social. Outrossim, esta lógica produtiva, portanto, o uso intensivo de capital
vincula-se mais aos contornos da escala local e regional, apesar dos vetores globais que incidem no
território. Nesta perspectiva, o trabalho busca problematizar como se configuram resistências
territoriais, levando em consideração que esses agentes constituem uma contra-racionalidade ao
processo de globalização do capital.
Palavras-chave: Circuito espacial de produção têxtil; território; Seridó Potiguar
Abstract: The article analyzes the use of the territory by the spatial circuit textile production in the
municipalities Jardim de Piranhas and Caicó - Seridó Potiguar region - which stand in the manufacture
of textile articles for home use. Currently, the textile activity is consolidated as one of the leading
industrial sector in the region. This production is mostly developed in small industrial establishments,
whose spread in Seridó territory expresses a true social capillarity. Furthermore, this productive logic,
so the intensive use of capital is linked more to the contours of the local and regional level, despite the
global vectors that affect the territory. In this perspective, the work seeks to question how to configure
territorial resistance, taking into account that these agents constitute a counter-rationality to the capital
from the globalization process.
Key-words: Spatial circuit textile production; territory; Seridó Potiguar
1 – Introdução
O presente artigo é fruto das reflexões a respeito do trabalho de dissertação
de Mestrado, provisoriamente intitulado, Reflexos da reestruturação produtiva no
Seridó Potiguar: o uso do território de Caicó e Jardim de Piranhas pelo circuito
espacial da produção têxtil, em curso no Programa de Pós-Graduação e Pesquisa
em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte2. Contudo, vale
1
Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte. E-mail de contato: [email protected]
2
Este trabalho está sendo desenvolvido sob a orientação do Prof. Dr. Francisco Fransualdo de
Azevedo, docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte.
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ressaltar o caráter inicial deste processo, que é de consolidação paulatina das bases
teóricas, empíricas e temporais3.
Nosso interesse investigativo ulterior consiste em analisar o uso do território
do Seridó Potiguar pelo circuito espacial da produção têxtil, a se cumprir com a
execução das etapas posteriores de nossa pesquisa. Para tal, traçaremos um
percurso cujo objetivo é construir uma periodização da atividade têxtil no Seridó
Potiguar e analisar o seu papel e nexos com o processo de reestruturação produtiva;
identificar os agentes envolvidos no circuito espacial de produção têxtil, analisando
as articulações empreendidas entre eles nos círculos de cooperação do espaço;
culminando na análise de como o circuito espacial da produção têxtil usa e organiza
o território seridoense4.
Nessa perspectiva, o artigo em tela tem como questão central analisar o uso
do território pelo circuito espacial de produção têxtil nos municípios de Caicó e
Jardim de Piranhas, localizados na região do Seridó Potiguar, os quais se destacam
na fabricação de artefatos têxteis para uso doméstico. Destarte, objetivamos tecer
um panorama sintético do que já foi desenvolvido, do que vislumbramos realizar e,
portanto, de que modo estruturamos, em termos de pesquisa científica, nosso
horizonte investigativo.
Discorreremos, a seguir, em linhas gerais, sobre a forma com a qual a nossa
problemática está atrelada ao paradigma contraditório da produção que, em nossos
dias, torna cada vez mais espesso o fenômeno da divisão territorial do trabalho
através de seu espraiamento, concomitante ao acúmulo de sobreposições advindas
da materialidade pretérita somando-se à pulverização de novas atividades e vetores
de modernização. Este panorama vincula-se, sobremaneira, à estruturação do meio
técnico-científico-informacional.
3
As reflexões geradas nas disciplinas cursadas no período de 2015.1, junto ao Programa, nos foram
de suma importância neste sentido.
4
A região do Seridó Potiguar está localizada na mesorregião central do Estado do Rio Grande do
Norte e subdivide-se nas microrregiões Seridó Ocidental e Seridó Oriental e compreende os
municípios, a saber: Caicó, Ipueira, Jardim de Piranhas, São Fernando, São João do Sabugi, Serra
Negra do Norte e Timbaúba dos Batistas – Seridó Ocidental; Acari, Carnaúba dos Dantas, Cruzeta,
Currais Novos, Equador, Jardim do Seridó, Ouro Branco, Parelhas, Santana do Seridó e São José do
Seridó – Seridó Oriental.
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Abordaremos, por conseguinte, as implicações desse processo para o Estado
do Rio Grande do Norte que, em uma de suas manifestações, perpassa os nexos
com a reestruturação produtiva. Desta, salientamos um dos eixos da indústria
potiguar que é o têxtil, especificamente da fabricação de produtos têxteis,
excetuando-se o vestuário, na qual o Seridó Potiguar assume notoriedade.
Esta produção é desenvolvida, em sua grande maioria, em pequenos
estabelecimentos, cuja disseminação no território seridoense expressa uma
verdadeira capilaridade social. Outrossim, esta lógica produtiva, portanto, o uso
intensivo de capital vincula-se mais aos contornos da escala local e regional, apesar
dos vetores globais que incidem no território. Neste momento, emerge a hipótese de
que se configuram resistências territoriais, levando em consideração que esses
agentes constituem uma contra-racionalidade ao processo de globalização do
capital.
Em seguida, faremos uma breve reflexão sobre a teoria dos circuitos
espaciais de produção e dos círculos de cooperação do espaço, cujo objetivo é
propiciar uma interpretação propriamente geográfica da produção e do movimento. À
luz de sua ampla perspectiva de análise, delinearemos as pretensões de nossa
pesquisa através de apontamentos referentes à escolha de categorias analíticas,
conceitos e noções fundadoras específicas.
2 – Desenvolvimento
O entendimento do paradigma atual da produção passa por uma ampla
discussão, que escapa aos contornos da produção propriamente dita. Ora, as
heranças pretéritas se esmaecem, apesar de não se anularem, para serem
incorporadas uma série de vetores, de ordens distintas e naturezas diversificadas,
cujas marcas denotam a urgência de algo novo. Na realidade, interessa vislumbrar,
minimamente, a forma como o mundo se estrutura na história atual.
Neste
sentido,
Silveira
(2012)
discute
como
a
técnica
transforma,
incessantemente, o uso do território no período atual da globalização. Cujo
entendimento deve passar por três tendências, que lhe são constitutivas - também
chamadas de unicidades. A autora fundamenta o desenvolvimento de suas ideias
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em Santos (2012), para quem a compressão do mundo passa pelo papel do
fenômeno técnico e por suas manifestações atuais, engendradas no processo de
constituição de uma inteligência planetária.
A primeira dessas tendências é a unidade técnica, isto é, a planetarização de
um sistema técnico que abrange todos os lugares. A segunda trata-se da
convergência dos momentos, ou seja, o conhecimento instantâneo dos eventos que
nos possibilita a percepção da simultaneidade, cuja base material é a técnica da
informação, culminando no que Milton Santos chamou de cognoscibilidade do
planeta. A terceira delas é a unicidade do motor ou a mais-valia tornada mundial,
legitimada por um denso aparato normativo. “Essas três unicidades são a base do
fenômeno de globalização e das transformações contemporâneas do espaço
geográfico.” (SANTOS, 2012, p. 189).
Ademais, outro dado extremamente relevante para a compreensão do meio
geográfico atual, apontado pela autora, cuja emergência aflora exatamente da
explicação dos elementos acima elencados, é a assertiva de que a história se tornou
universal. Universal no sentido de ser concreta; fundamentada por uma base
material, organizacional e financeira planetária, diferente de outrora.
Este fenômeno está imbricado à consolidação, iniciada no momento póssegunda guerra mundial, do meio técnico-científico-informacional. Trata-se da “cara
geográfica da globalização” (SANTOS, 1999, p. 11).
Para este autor, o período em que vivemos se diferencia dos demais pela
vicissitude de um casamento perfeito entre técnica e ciência, ungidos pela égide do
mercado, tornado global, graças a condições propiciadas por essa união. Nesta
lógica, a informação triunfa como o “nexo fundamental”, uma vez que, ela não só
está presente no espaço, nos objetos e nas coisas que o constituem, como as
realizações das ações que nele se desenvolvem lhes são tributárias; todo o território
tende a ser equipado em favor da livre circulação desses nexos.
A implicação direta desse processo é a tendência à requalificação abrupta
dos espaços (SILVEIRA 2010), reformulando os seus atributos, intentando amparar
as demandas dos atores hegemônicos da economia, da política e da cultura, em
detrimento dos demais (SANTOS, 2012; SANTOS, 1999).
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Desse modo, “Ao mesmo tempo em que aumenta a importância dos capitais
fixos [...] e dos capitais constantes [...], aumenta também a necessidade de
movimento, crescendo o número e a importância dos fluxos [...]” (SANTOS, 1999,
p.11). Nesta perspectiva, o capitalismo está sempre movido pelo ímpeto de acelerar
o tempo de giro do capital, apressar o ritmo de circulação e, em consequência, de
revolucionar os horizontes temporais do desenvolvimento, conforme explicita Harvey
(2009). Ou seja, “[...] não basta produzir, mas pôr a produção em movimento,
sobretudo porque não é mais a produção que preside à circulação, mas esta é que
conforma a produção” (SANTOS, 2012, p. 275).
Observa-se, neste sentido, uma verdadeira irrupção no paradigma da
produção, pois, “[...] diminui a arena da produção, enquanto a respectiva área se
amplia. Restringe-se o espaço das outras instâncias da produção, circulação,
distribuição e consumo” (Idem). Em outros termos, temos no período atual uma
divisão territorial do trabalho mais esparsa, estendida; não obstante aos avanços
técnicos que possibilitaram à concretização da previsão de Marx – assinalada pelo
autor – relativa à redução da área e do tempo necessários à produção das mesmas
quantidades.
Outra contradição aparente é observada por Silveira (2010), para quem este
“centrifuguismo” é paralelo ao “centripetismo” de nexos extrovertidos emanados das
metrópoles; onde, em geral, são realizadas “as principais tarefas de concepção
técnica, informacional, mercadológica e a transformação dos instrumentos
financeiros em outros” (SILVEIRA, 2010, p. 78).
É necessário frisar, ainda, conforme aponta a autora, que não se trata apenas
de uma simples ampliação dos contextos, onde todos os lugares são convidados a
produzir ativamente. Há, na realidade, uma pluralidade e coexistência de divisões do
trabalho, sobrepondo-se no uso do território; tendo como condição e resultado as
infraestruturas, os movimentos de população, as dinâmicas agrícolas, industriais e
de serviços, a estrutura normativa e a extensão da cidadania.
Neste sentido, podemos afirmar com Santos (2009) que o espaço é uma
acumulação desigual de tempos; cada lugar abrigando, ao mesmo tempo,
temporalidades distintas. Seguindo este raciocínio, temos de concordar com Silveira
(2010, p.74) que o espaço geográfico é “um rendilhado de divisões territoriais, um
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sinônimo de território usado”. Ou mesmo, para finalizar, que o espaço é “a soma dos
resultados da intervenção humana sobre a terra” (SANTOS, 2009, p. 29).
Sempre segundo Santos (2012), os novos subespaços, inseridos nessa
lógica, não detêm capacidade uniforme de rentabilizar determinada produção, pois,
cada combinação possui sua respectiva lógica, autorizando formas de ação e
agentes econômicos específicos para cada situação. Dessa maneira, os lugares
seriam diferenciados pela sua capacidade particular, maior ou menor, de rentabilizar
investimentos, a depender das condições locais de ordem técnica e organizacional.
Esta “rentabilidade” não é, para o autor, um dado absoluto do lugar. A eficácia
mercantil estaria, na realidade, ligada ao produto, mais precisamente à um produto
específico, isto é, à uma atividade predominante específica. Isso abre margem para
que os lugares se especializem, adrede, em determinado(s) ramo(s), em que pese
as virtualidades naturais, a capacidade técnica e organizacional e as vantagens de
cunho social.
Aflora, entrementes, uma extrema competitividade entre os lugares e suas
forças, repercutindo. Esses lugares
[...] repercutem os embates entre os diversos atores e o território
como um todo revela os movimentos de fundo da sociedade. A
globalização, com a proeminência dos sistemas técnicos e da
informação, subverte o antigo jogo da evolução territorial e impõe
novas lógicas (SANTOS, 2004, p. 79).
Depreende-se disso um agravamento galopante da necessidade de
acumulação, engendrada pelo parâmetro atual da produção, que dá especial relevo
ao movimento, implicando à circulação um ritmo frenético. Isto requer dos
subespaços um denso aparato técnico, organizacional e normativo viabilizando essa
mobilidade.
É evidente que não há uma uniformidade de resposta aos reclamos acima
citados, implicando numa segmentação do mercado. Segundo Arroyo (2008), isso
acontece pelo fato de existirem diferentes formas de produzir que, por usa vez,
correspondem a diferentes formas de consumir, autorizando a convivência de uma
ampla variedade de formas de realização econômica, que trabalham segundo
diversas taxas de lucro, produtividade, rendimentos e salários.
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Em suma, o mundo encontra-se organizado em subespaços articulados em
uma lógica global, cada lugar sendo resultado de uma ordem global e de uma ordem
local, convivendo dialeticamente. Como decorrência dos inúmeros fluxos de todos os
tipos, intensidades e direções, rompem-se os equilíbrios precedentes. O desenlace
deste processo consiste numa significativa alteração na estruturação da produção,
cujas etapas estão organizadas, atualmente, na forma de circuitos espaciais
produtivos (SANTOS, 2008).
A emergência destes novos aspectos, logicamente, também trouxeram
implicações para o Estado do Rio Grande do Norte, cuja economia era
tradicionalmente de base rural, onde, com as crises instaladas, sobretudo nos anos
1980, se inicia um processo de solapamento. Isto é, um dos nexos do novo período
manifesta-se através do processo de reestruturação produtiva.
Para Azevedo (2013, p. 114), “O processo de reestruturação produtiva
compreende um conjunto de transformações de caráter estrutural, organizacional e
técnico, fazendo-se refletir no espaço geográfico em sua totalidade”. No Rio Grande
do Norte, “esse processo impôs a reestruturação do território, marcado dentre outros
aspectos, pela falência de determinadas atividades econômicas, redefinição e
reestruturação de outras, mas sobretudo o surgimento de „novas‟” (AZEVEDO, p.
114).
O autor explica que um dos eixos da reestruturação produtiva no Rio Grande
do Norte é o industrial, que se desenvolve, principalmente, a partir da agroindústria,
do extrativismo e do setor têxtil. Segundo Azevedo (2007), no tocante à região do
Seridó Potiguar, é importante considerar a relevância do setor industrial,
especialmente o têxtil, o de alimentos e o cerâmico, surgindo com alternativas de
reestruturação econômica do território.
Ele destaca que a cidade de Caicó logra considerável evidência nesse
processo, se constituindo em um importante centro de produção de bonés e, no
setor têxtil, com a confecção de redes, panos de prato, mantas, cobertores etc.,
através das fábricas de tecelagem. Ainda segundo o autor, em que pese a
infraestrutura e a logística de funcionamento das tecelagens inadequadas, a cidade
de Jardim de Piranhas se constitui atualmente como uma importante produtora de
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produtos têxteis, sendo essa a mais importante fonte de geração de emprego e
renda do município.
Neste momento, uma distinção nos parece necessária em relação à indústria
têxtil. Esta se conforma, principalmente, a partir das atividades de fabricação de
produtos têxteis, exceto vestuário (envolvendo preparação e fiação de fibras têxteis;
tecelagem, excetuando-se malha; fabricação de tecidos de malhas; e fabricação de
artefatos têxteis, exceto vestuários) e a confecção de artigos do vestuário e
acessórios (envolvendo confecção de artigo do vestuário e acessórios; e fabricação
de artigos de malharia e tricotagem).
Queremos jogar luz ao fato de que ambas possuem lógicas de localização
distintas, por envolverem lógicas de produção também distintas. Portanto, a indústria
têxtil envolve principalmente os circuitos espaciais do vestuário e da produção têxtil.
Nosso trabalho trata deste último, apesar de ambos estarem imbricados - todavia,
são inconfundíveis, por envolverem produtos específicos e, sobretudo, uma
atividade predominante específica.
A relevância do Seridó Potiguar para a fabricação têxtil, e vice versa, é
bastante nítida, tendo uma sensível expressividade em termos relativos. Se
levarmos em conta o Estado do Rio Grande do Norte, observaremos uma
especialização nítida da região em relação ao setor, equiparada apenas à região
metropolitana do Estado, que concentra a maior parte das empresas da indústria de
transformação no geral.
Do total de 160 empresas do setor industrial de fabricação têxtil no Rio
Grande Norte, 95 estão na região do Seridó (FIERN, 2015). Isto representa mais de
59% das empresas, ou seja, mais da metade das indústrias de todo o Estado se
concentram no Seridó Potiguar. Isto revela, ao mesmo tempo, a expressão do
Seridó no setor e a especialização regional, relativo ao fenômeno de especialização
dos lugares a que nos referíamos anteriormente. Isto conjectura um dos elementos
há serem explorados em nossa análise, referente às Regiões Produtivas (SANTOS,
2008).
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Municípios
Nº de Empresas
Jardim de Piranhas
71
Caicó
17
Currais Novos
03
Timbaúba dos Batistas
02
São José do Seridó
01
Serra Negra do Norte
01
TOTAL
95
Figura 01 – Tabela do número de empresas de fabricação têxtil do Seridó Potiguar
por município. Fonte: Cadastro Industrial, 2015.
Na Zona Homogênea de Caicó, 99,6% das indústrias são de micro e pequeno
porte, com 94,0% dos empregados; e 0,4% das indústrias são de médio porte, com
6,0% do total de empregados – inexistem grandes indústrias (FIERN 2014). Sendo
97,6% das indústrias formais do Rio Grande do Norte classificadas como micro ou
pequenas empresas, abrigando 48,8% dos empregos formais do setor (Idem, 2014).
Estes números demonstram a relevância dos pequenos empreendedores na
formação do setor industrial, na dinâmica econômica e na própria estrutura do
trabalho do Estado.
Isso evidencia que a produção é desenvolvida, em sua grande maioria, em
pequenos estabelecimentos, cuja disseminação no território seridoense expressa
uma verdadeira capilaridade social. Outrossim, esta lógica produtiva, portanto, o uso
intensivo de capital vincula-se mais aos contornos da escala local e regional, apesar
dos vetores globais que incidem no território. Neste momento, emerge a hipótese de
que se configuram resistências territoriais, levando em consideração que esses
agentes constituem uma contra-racionalidade ao processo de globalização do
capital.
Em relação a teoria que nos propomos à alicerçar nosso estudo, por
compreender que se trata de uma maneira propiamente geográfica de se analisar a
produção, o movimento e o uso do território, Castillo e Frederico (2010) detalham
que ela enfatiza, à um só tempo, a centralidade da circulação (circuito) no
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encadeamento das diversas etapas da produção; a condição do espaço (espacial)
como variável ativa na reprodução social; e o enfoque centrado no ramo, ou seja, na
atividade produtiva dominante (produtivo).
Castillo e Frederico (2010) detalham essa noção, evidenciando que ela
enfatiza a centralidade da circulação (circuito) no encadeamento das diversas
etapas da produção; a condição do espaço (espacial) como variável ativa na
reprodução social; e o enfoque centrado no ramo, ou seja, na atividade produtiva
dominante (produtivo).
Contemplas itens distintos do processo, tais como:
[...] sobre a matéria prima – local de origem, formas de seu
transporte, tipo de veículo transportador etc.; sobre a mão de obra -,
qualificação, origem, variação das necessidades nos diferentes
momentos da produção etc.; sobre estocagem – quantidade e
qualidade dos armazéns, dos silos, proximidade da indústria, relação
entre estocagem e produção etc.; sobre transportes – qualidade,
quantidade e diversidade das vias de transportes, dos meios de
transportes etc.; sobre a comercialização – existência ou não de
monopólio de compra, formas de pagamento, taxação de impostos
etc.; sobre o consumo – quem consome, onde, tipo de consumo, se
produtivo ou consumitivo etc. [...] (SANTOS, 2008, p. 56, grifos
nossos)
Os autores sugerem diretrizes para análise desses circuitos. Primeiramente,
eles estabelecem que é necessário o reconhecimento da atividade produtiva
dominante, analisando os seus principais aspectos técnicos e normativos. Da
mesma forma, deve-se compreender a logística – definida por Castillo (2008), como
a expressão geográfica da circulação corporativa. Ela permite analisar as condições
materiais e o ordenamento dos fluxos que perpassam os circuitos espaciais
produtivos. É necessário, igualmente, identificar os principais agentes envolvidos e
as formas como estabelecem os círculos de cooperação. Estes
[...] tratam da comunicação, consubstanciada na transferência de
capitais, ordens e informação [...] garantindo os níveis de
organização necessários para articular lugares e agentes dispersos
geograficamente, isto é, unificando, as diversas etapas,
espacialmente
segmentadas,
da
produção
(CASTILLO;
FREDERICO, 2010, p. 464-465).
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Para Silveira (2010) as tessituras destes círculos de cooperação cingem o
território sob a forma de ordens, informações, propaganda, dinheiro e outros
instrumentos financeiros. Destarte, para manter e reproduzir esse sistema de
produção e circulação no território são necessários abundantes conteúdos
organizacionais, com importante e prévio trabalho intelectual. Ou seja, tratam dos
fluxos imateriais, uma vez que os circuitos espaciais de produção pressupõem, para
os autores, os fluxos de matérias. A interpretação conjunta dessas duas noções
possibilita verificar a interdependência dos espaços produtivos, compreendendo, ao
mesmo tempo, a unidade e a circularidade do movimento.
Outra indicação de Castillo e Frederico (2010) é examinar atentamente a
organização e o uso do território das diversas etapas do circuito espacial produtivo.
O ato de definição de uma teoria central para o desenvolvimento de nosso
trabalho está imbricado a um encadeamento epistemológico particular. Acreditamos
que isso nos conduzirá a um caminho original, de acordo com as variáveis por nós
estabelecidas, no qual contemplará as instâncias de nossa pesquisa.
Nesta perspectiva lançaremos mão das categorias forma - função - processo estrutura, enquanto unidades de um todo, na concepção de categorias estruturantes
da abordagem geográfica. Iremos nos alicerçar, ao mesmo tempo, nos pares
dialéticos, horizontalidades x verticalidades, sucessões x coexistências, fixos x
fluxos. Além da categoria de divisão territorial do trabalho, que, acreditamos,
permeará todo o nosso trabalho.
Ademais, nosso conceito-geográfico-chave será Território, apesar de não
abrirmos mãos de tratar, principalmente, dos de Lugar e Espaço. Tomaremos como
noções fundadoras, para tal: território usado, as instâncias da produção, o meio
técnico-científico-informacional, dentre outras.
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