Diagnóstico Diferencial de Tosse A tosse constitui um sintoma de uma grande variedade de patologias, pulmonares e extrapulmonares, e por isto mesmo é muito comum, sendo, com certeza, uma das maiores causas de procura por atendimento médico. A tosse é classificada conforme o tempo de persistência dos sintomas: Aguda: presença dos sintomas por até 3 semanas Sub-aguda: tosse persistente por 3 a 8 semanas Crônica: tosse com duração maior do que 8 semanas Tosse aguda Figura 1. Fluxograma Tosse Aguda Resfriado comum - Quadro clínico: pacientes com doenças de vias aéreas superiores caracterizada predominantemente por tosse, sintomas nasais como rinorréia mucosa ou hialina, espirros, obstrução nasal e drenagem pós nasal de secreções, concomitantes a lacrimejamento, irritação da garganta, ausculta pulmonar normal, com ou sem febre. - Etiologia: rinovirus, coronavírus, parainfluenza, vírus respiratório sincicial, adenovírus, enterovírus - Exames complementares: em estudos tomográficos o acometimento dos seios da face ocorrem em aproximadamento 80%, e as alteraçõe são indistinguíveis de sinusite bacteriana, mas regridem sem tratamento em menos de 20 dias. Por isto é melhor não investigar. - Tratamento: anti-histamínicos associados a descongestionantes de longa duração são os medicamentos eficazes para o tratamento. Antitussígenos periféricos, expectorantes e mucolíticos têm pouco valor na tosse aguda. Antibióticos não devem ser usados a menos nas super-infecções bacterianas que ocorrem em 1-5% dos casos. Traqueobronquite aguda - Quadro clínico: infecção respiratória aguda manifestada predominantemente por tosse, com ou sem expectoração, que pode ou não ser purulenta com duração inferior a três semanas e sem evidência clínica e ou radiológica de resfriado comum, sinusite, exacerbação de DPOC ou crise de asma. Pode haver broncoespasmo em 40% dos pacientes - Etiologia:viral na maioria dos casos, em 10% etiologia bacteriana - Tratamento: não há tratamento específico, antibióticos estão indicados em situações especiais como epidemia por bactérias atípicas e ou quadro sugestivo de coqueluche, contato com infectados, tosse emetizante e guincho com duração de sintomas inferior a duas semanas. Broncodilatadores podem ser úteis na presença de broncoespasmo. Mucolíticos e antitussígenos não são indicados. Sinusite aguda - Quadro clínico: A rinosinusite viral é 20 vezes mais freqüente que a bacteriana. A rinosinusite bacteriana deve ser suspeitada quando os sintomas de uma virose das vias aéreas superiores pioram após o quinto dias ou persistem por mais de 10 dias. - Diagnóstico: dois ou mais sinais maiores ou 1 sinal maior e 2 menores Sinais maiores: cefaléia, dor ou pressão facial, obstrução ou congestão nasal, secreção nasal ou pós-nasal purulenta, hiposmia ou anosmia. Sinais menores: febre, halitose, odontalgia, otalgia ou pressão nos ouvidos e tosse. Rx de seios da face: não é acurado para várias regiões da face, tem pouca utilidade para diferenciar infecção bacteriana de viral ou de alterações alérgicas e baixa relação entre custo e benefício. - Tratamento: Para a risosinusite viral, apenas tratamento sintomático, para a bacteriana recomenda-se amoxacilina por 7-10 dias. Outras possibilidades: amoxacilina+clavulanato; macrolídeos, cefalosporinas de 2ª geração, quinolonas respiratórias. Recomenda-se SF nasal. Vasoconstritores sistêmicos podem ser usados por poucos dias. Corticóides orais devem ser reservados para os casos mais graves por poucos dias (menos que 7) Exacerbação de doença pré-existente: avaliar história de doenças crônicas respiratórias, asma e DPOC. Exposição a fatores irritantes ou alérgicos: a suspensão da exposição pode fazer desaparecer a tosse. Medicamentos: - Inibidores da ECA: tosse irritativa e sem expectoração em 10-20% dos usuários geralmente diagnosticada antes de 3 semanas de uso. - β-bloqueadores: pioram a obstrução das vias aéreas em pacientes com DPOC e asma, inclusive quando usados em colírios. Tosse Sub-aguda Figura 2. Fluxograma Tosse Sub-aguda A causa mais comum de tosse subaguda é a tosse pós-infecciosa, na qual existe história de infecção de vias aéreas nas últimas três semanas antes do início da tosse. Fisiopatologia: multifatorial, com extensa inflamação e lesão epitelial das vias aéreas, com ou sem hiper-responsividade transitória. Outros fatores que podem contribuir são: a drenagem pós-nasal, o acúmulo de secreções nas vias aéreas inferiores e agravamento do refluxo gastroesofágico devido a alterações no gradiente pressórico toraco-abdominal durante a tosse. Não há tratamento específico para a tosse pós-infecciosa. Tosse crônica Figura 3. Fluxograma Tosse Crônica A história clínica detalhada permite o diagnóstico na maior parte das vezes (70% dos casos). Os dados relevantes são: História de tabagismo: a tosse é relacionada ao consumo de cigarros é dose relacionada, pode ser produtiva (bronquite crônica) ou seca (efeitos irritativos da fumaça). Escarro muito volumoso (mais que 1 xícara por dia) sugere bronquiectasias, é associada com halitose, estertores localizados e difusos, sinais de obstrução do fluxo aéreo e às vezes baqueteamento digital. Tosse seca e pouco produtiva pode ser associada ao uso de medicamentos (inibidores da ECA) ou se não for o caso, a três causas mais freqüentes, responsáveis por 50% dos casos de tosse crônica: asma, rinosinusite ou doença do refluxo gastroesofágico. Quando o Rx de tórax é normal, estas 3 patologias respondem por 93% dos diagnósticos de tosse crônica. Estas patologias podem ter sinais discretos ou ausentes. A asma costuma se manifestar por cansaço fácil, opressão no peito e chiado. A rinosinosite com história de obstrução nasal, congestão, espirros e eritema da faringe e atapetamento da mucosa da faringe posterior. O refluxo pode apresentar pirose, voz rouca e afonia, tosse durante ou após refeições, ou na posição supina. É mais comum em pessoas obesas. A bronquite eosinofílica é definida como a presença de tosse crônica, presença de eosinófilos no escarro na ausência de broncoconstrição reversível ou hiper-reatividade das vias aéreas e é a causa de 10% da tosse crônica. Esta condição responde a corticóides inalados. Curiosamente a tosse crônica sem a presença de eosinófilos no escarro responde à corticosteróides inalados em 3% dos casos Complicações As complicações da tosse podem ser classificadas como agudas ou crônicas. As agudas incluem a síncope causada pela tosse, episódios de síncope quando as tosses são prolongadas e forçadas, e causadas pela diminuição do fluxo sanguíneo no cérebro, secundariamente à pressão intratorácica aumentada devido à tosse. Outras complicações agudas incluem insônia, vômito induzido pela tosse, dor peitoral devido à strain muscular de tosses incessantes e ruptura de uma bolha causando pneumotórax. Em casos severos, a tosse prolongada pode causar lesões de fatiga nas costelas inferiores e costocondrite (inflamação do tecido conjuntivo entre o esterno e as costelas). As complicações crônicas são comuns. Em certos casos, elas podem resultar até em hérnias abdominais ou pélvicas. Em mulheres com prolapso uterino pode haver uma tosse seguida de micção, o que pode ser um fator de embaraçamento social. Uma defecação durante a tosse também pode ocorrer. Fisiologia da tosse A ação fisiológica de tossir é responsável em parte ao nervo vago. O nervo vago é ativado quando a capsaicina é liberada, o que estimula as terminações nervosas sensoriais. Supressores de tosse de ação central, como a codeína e dextrometorfano, reduzem a vontade de tossir ao inibir o nervo sensorial induzido pela capsaicina por despolarização do nervo vago. Referências bibliográficas F. Dennis McCool, MD, FCCP. Global Physiology and Pathophysiology of Cough . ACCP Evidence-Based Clinical Practice Guidelines. Chest 2006; 129:48S-53S Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. II diretrizes Brasileiras no Manejo da Tosse Crônica, J Bras Pneumol 2006. 32 (supp 6): S 403-446. Irvin, RS; Baumann, MH; Boulet, LP; Braman, SS; et alli. 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