Professor Germano da Fonseca Sacarrão, Muse~ Bocage, Lisboa, 1994, pp. 23-71. DO GENE AO EMBRIÃO - A DIFERENCIAÇÃO CELULAR E A MORFOGÉNESE por E. G. CRESPO Departamento de Zoologia e Antropologia, faculdade de Ciências. C2. Campo Grande. 1700 Lisboa, Portugal ABSTRACT From gene to embryo - cell differentiation and morphogenesis After reviewing the historical events that led to the appearance of Developmental Biology as an independent field of modem biology, some recent data on lhe mechanisms behind the generation of cell diversity (cell differentiation) and the spacial organization of Ihat diversity (morphogenesis) are discussed. A few topics relevant to these subjects are then expanded upon, namely positional information, homeobox genes, and selective cell adhesion. RESUMO Depois da reVlsao dos acontecimentos históricos que levaram ao aparecimento da Biologia do Desenvolvimento como uma disciplina independente da biologia moderna, são discutidos alguns dados recentes sobre o mecanismo do desenvolvimento da diversidade celular (diferenciação celular) e organização espacial desta diversidade (morfogénese). São desenvolvidos alguns tópicos relevantes para estes assuntos, nomeadamente, informação de posição. genes homeobox e adesão celular selectiva. 24 E. G. Crespo INTRODUÇÃO A questão do desenvolvimento animal (ontogenia) esteve durante muito tempo associada a outras questões de âmbito mais geral, como a da origem da própria vida. Aristóteles (séc. III a.C.), como outros autores .da antiguidade, acreditava na existência de uma semente fêmea que, misturando-se com o esperma, daria origem ao feto - teoria da «semente dupla» (Théodoridés 1965). Contudo, admitia também, em alternativa, a existência de geração espontânea. Esta alternativa foi aliás critério para uma sua classificação dos seres vivos (Horder et ai 1985). A teoria aristotélica da «semente dupla» era ainda perfilhada no séc. XVII por Bacon e Descartes. Na segunda metade do séc. XVII, a teoria «ovista» defendia que só o ovo, engendrado pela mãe, constituiria o elemento reprodutor. O esperma apenas emitiria uma espécie de vapor, a aura seminalis. Esta concepção baseada sobretudo na observação do desenvolvimento de ovíparos, aves e anfíbios, admitia, naturalmente, sem contudo o provar que os vivíparos também provinham de um ovo. Crê-se que esta comprovação foi um dos objectivos que orientou, pelo menos em parte, os trabalhos de investigação de William Harvey e que o levaram a que formulasse o célebre postulado Ex ovo omnia (na origem de todos os seres vivos está o ovo). É legítimo considerar-se que foi a partir do século XVII e, sobretudo, com o contributo dos trabalhos de W. Harvey que se entrou decisivamente na via que viria a conduzir à moderna Embriologia. Repare-se que, nesta época, estava longe de estar resolvida a polémica entre os que acreditavam na geração espontânea e os que a negavam e, por outro lado, mais em particular no que respeitava à interpretação do desenvolvimento embrionário, se confrontavam as teses da preformação e da epigénese. A teoria da preformação defendia numa versão inicialmente «ovista» que o indivíduo estava prefigurado, em miniatura, no ovo. Nesta perspectiva, o de.senvolvimento embri.onário apenas resultaria do crescimento dessa miniatura. Como principais advogados desta teoria contam-se, entre outros, Malebranche, von Haller, Swammerdam. Os epigeneticistas, por sua vez, interpretavam o desenvolvimento como uma Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 25 construção progressiva a partir de um estádio inicialmente indeferenciado. Esta visão estava implícita nas conclusões dos trabalhos de W. Harvey e mesmo, mais remotamente, nas observações de Aristóteles que foi aliás quem introduziu o termo epigénese para descrever a emergência de novas estruturas no decurso do desenvolvimento (fig. 1). A - Preformação: o homun- contido na cabeça do espermatozóide-representação de Hartsoeker - 1694. B - Epigénese: representação do desenvolvimento a partir de um estádio inicialmente indeferenciado. cu/um Nesta fase histórica, as questões da origem da vida e as da reprodução e desenvolvimento, estavam ainda portanto intimamente associadas. W. Harvey ao afirmar na sua obra Exercitationes de generatione anima/ium (1651) que todos os seres vivos tinham origem no ovo, refutava explicitamente a geração espontânea. Por outro lado, através das observações que realizou do desenvolvimento do embrião de Gal/us, que interpretou como uma construção progressiva das estruturas, assumiu-se como um dos precursores das modernas teorias epigenéticas do desenvolvimento. Também neste período, Redi, no seu trabalho Expériences sur la génération des insectes (1668), começou por rebater a teoria da geração espontânea embora sem grande sucesso. É natural que, de uma maneira geral, os adeptos da preformação repudiassem a teoria da geração espontânea por ser incompatível com a sua doutrina, e é também óbvio que os defensores da geração espontânea 26 E. G. Crespo tendessem mais facilmente a admitir o processo epigenético de desenvolvimento (ver: Caspar 1991). Num plano teórico, a preformação, considerando o desenvolvimento embrionário como o simples crescimento de um adulto miniaturizado - em que as sucessivas gerações pré-existiriam, como que encapsuladas, no interior dos gâmetas, de modo semelhantes ao das conhecidas «bonecas russas» - explicava perfeitamente a constância morfológica das sucessivas gerações. Tinha, porém, como ponto fraco, a explicação da variabilidade. Era de facto difícil explicar à luz desta teoria o já conhecido fenómeno dos híbridos e o caso das monstruosidades provenientes de pais normais. A teoria epigenética respondia melhor às observações efectuadas da formação progressiva dos orgãos e à variabilidade em geral, mas defrontava-se com o problema de explicar qual o motor, qual a força, que dirigia a organização estrutural a partir de um estádio aparentemente indiferenciado. Tinha para tal de evocar a existência de uma força desconhecida - «força essencial». A descoberta do microscópio, em 1677, por Leewenhoek, ao contrário do que seria de esperar veio, numa primeira fase, reforçar a teoria da preformação. Malpighi, por exemplo, julgou ver nas primeiras etapas do desenvolvimento, o crescimento do tal adulto em miniatura. Entretanto, descobriram-se os vectores hereditários - os espermatozóides, Ham e Leewenhoek em 1677 e os folículos ováricos (não ainda os ovócitos) - de Graaf em 1670/72. A descoberta dos espermatozóides introduziu uma nova variante na teoria da preformação, a versão «animaculista» que sugeria que a miniatura do adulto não estaria contida no ovo mas sim na cabeça do espermatozóide (designado na altura por animaculum). Ficou célebre a representação de um homunculum agachado na cabeça do espermatozóide, apresentada em 1694 por Hartsoeker. Já no século XVIII, a observação do fenómeno da partenogénese realizada por Bonnet, em 1740, veio dar novo ímpeto aos adeptos da preformação «<ovistas»). Paralelamente, contudo, novos factos começaram a surgir que viriam a abalar as teses preformista até aí prevalecentes. Entre estes, conta-se a descoberta e estudo do fenómeno de regeneração, em que estiveram envolvidos Bonnet e Trembley, a partir de 1740. Se bem que Bonnet, Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 27 um fervoroso partidário da preformação, tentasse interpretar a regeneração na perspectiva da sua corrente de pensamento, os seus argumentos revelaram-se débeis e a sua descoberta serviu, pelo contrário, de óptimo argumento a favor das teses epigenéticas. Em 1770, os trabalhos de Spallanzani, reforçando as conclusões de Redi, vieram contribuir, embora ainda não definitivamente. para o descrédito da teoria da geração espontânea. Esta questão, como se sabe, só viria a ser definitivamente esclarecida, no século XIX, com os trabalhos de Pasteur. Contributo que, de certo modo, se pode considerar decisivo para a implantação da teoria epigenética foi dado, a partir de meados do século XVIII, por Wolff. Através de cuidadosas e detalhadas observações que fez do embrião de Gal/us demonstrou claramente que o desenvolvimento é efectivamente uma construção progressiva: existem estruturas embrionárias que não têm correspondência nos adultos; o tubo digestivo forma-se a partir de estruturas inicialmente planas, etc.. Continuou, porém, a ter de admitir a existência de uma força misteriosa que obviamente desconhecia, e que dirigia o desenvolvimento. A este propósito é interessante assinalar que, numa primeira tentativa de conciliação das teorias da preformação e da epigénese, o filósofo Kant e o biologista Blumenbach sugeriram a existência de uma «força de desenvolvimento» inerente à própria matéria do embrião (ver: Gillbert 1991 a). O desenvolvimento desenrolar-se-ia através de um processo epigenético, mas seria dirigido por essa força que, sendo susceptível de variar, explicaria a variabilidade observada nas sucessivas gerações. É curioso que esta concepção não se afasta muito do que hoje se admite, ou seja, que o desenvolvimento é epigenético mas dirigido por instruções pré-determinadas (código genético). Há que recordar que, mesmo no fim do século XVIII, não havia ainda o conceito de célula, não se conheciam ainda os processos da fecundação, da divisão celular, etc .. Foi já no século XIX que foi introduzida a noção de tecido e se fez a sua classificação (Bichat), se fez a descrição do núcleo (Brown), se descreveram os folhetos embrionários (Von Baer), se formulou a teoria celular (Schleidem & Schwann), se descreveu o processo da fecundação (Thuret, Hertwig, Foi), se identificou a natureza celular do ovo (Kolliker) e do espermatozóide (Kolliker, Schweigger e St. George), se estudou a 28 E. G. Crespo mitose (Strassburger, Fleming), se descreveu a meiose (Van Beneden, .Boveri) e se identificaram os cromossomas (Waldeyer) (Théodoridés 1965, Horder et ai 1985, Jahn et ai 1990) . Todos estes passos foram condição necessária para que se viesse a considerar o núcleo como suporte das qualidades hereditárias e proporcionaram um notável salto qualitativo na· investigação dos processos de desenvolvimento, nomeadamente a introdução da embriologia experimental. Para tal, ajudou também o aperfeiçoamento dos instrumentos e das técnicas de micromanipulação. Uma vez identificado o ovo como célula e o núcleo como suporte das qualidades hereditárias, à embriologia punha-se a questão de como, a partir daquela célula original, se formaria o organismo, composto por tão grande variedade celular assegurando tantas e diversificadas funções. Foi neste contexto que Weismann, em 1883, propôs um modelo mecânico, explicativo da diferenciação celular, conhecido como «teoria da continuidade do plasma germinal». Este modelo assentava basicamente nos pressupostos de que: 1) os organismos são formados por dois tipos celulares - soma e gérmen completamente independentes; 2) o esperma e o ovo dariam contributos cromossómicos, quali-quantitativamente idênticos para o novo organismo; 3) os cromossomas transportariam os potenciais hereditários (determinantes nucleares) do novo organismo. É de assinalar que parte dos fundamentos da teoria da hereditariedade estavam já contidos nestes postulados de Weismann, cerca de quinze anos antes da redescoberta das <<leis de Mende1»,. O autor afirmava que os «determinantes nucleares» transportados pelos cromossomas produziriam substâncias que se tornariam activas no citoplasma. Acreditava todavia, erradamente, que esses «determinantes» (genes) se repartiriam de maneira diferente pelas várias células somáticas. Só as células germinais conservariam todos os tipos de «determinantes». A diferenciação celular resultaria portanto da segregação dos «determinantes nucleares» (genes) pelas várias células. Os cromossomas das células somáticas ~mbora parecessem iguais seriam, no entanto, diferentes nas suas qualidades. Foi fundamentalmente procurando confirmar esta teoria que se desenvolveu a nova etapa experimental da embriologia, em que se Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 29 destacaram, em fins do século XIX, nomes como os de Roux e Driesch. Roux delineou, em 1888, um programa de investigação que designou por «mecânica do desenvolvimento», que se pode considerar como uma primeira abordagem fisiológica da embriologia. Os trabalhos destes autores vieram introduzir importantes conceitos embriológicos tais como o desenvolvimento em mosaico (Roux) e o desen'volvimento regulador (Driesch), abrindo caminho a um vasto campo de investigação prosseguido no século seguinte por embriologistas como Horstadius, Spemman, Mangold, entre outros. A formulação da teoria celular e, mais tarde, a descoberta da totipotencialidade dos blastómeros (Driesch), foram acontecimentos que vieram deitar definitivamente por terra os pressupostos iniciais da já nesta altura muito abalada teoria da preformação. No começo deste século, a redescoberta das leis de Mendel (de Vries, Correns, Tschermak), a identificação dos factores mendelianos com os cromossomas (teoria cromossómica da hereditariedade Wilson, Sutton, Cannon, Boveri) e o desenvolvimento do conceito de gene (Morgan, Strutevart, Bridges, Muller), vieram fornecer uma base genética às teorias do desenvolvimento. No entanto, quando seria de esperar uma progressivamente maior interligação das duas áreas, assistiu-se, pelo contrário, a um declarado divórcio entre embriologistas e geneticistas. A obra de Morgan Theory of lhe gene (1926) ilustra este facto. Nesta, a Embriologia é apresentada como o estudo do desenvolvimento das potencialidades genéticas em realidades do adulto enquanto a Genética se reportaria ao estudo da transmissão dos elementos hereditários dos pais para a descendência. Quando Lillie, em 1927, põe em relevo a dualidade núcleocitoplasma do gérmen, os geneticistas tendem a tomar para seu campo de investigação, o núcleo (mecanismos da hereditariedade) e os embriologistas, o citoplasma (realização de fenótipo). Pode dizer-se que, até aos anos 40, muitos embriologistas praticamente ignoraram a genética, centrando a sua atenção no programa que Needham, em 1936, designou por «regras da ordem morfológica». A sua actividade polarizou-se no estudo dos processos de criação de formas organizadas, na morfogénese no sentido lato. Nesta linha de actuação, embriologistas como os já citados Horstadius, Spemman, Mangold e ainda outros, como Holtfreter, Ham- 30 E. G. Crespo burg, Gurdon, Harrison, Rawles, etc., recolheram detalhadas e valiosas informações do modo como os folhetos embrionários se organizam nos diferentes orgãos. A Embriologia assumiu-se durante este período essencialmente como uma ciência do fen6tipo. Por outro lado, neste lapso de tempo, os geneticistas faziam grandes progressos no estudo de mecanismos de transmissão herec\itária. Tornava-se no entanto cada vez mais claro, que o inv6lucro nuclear não constitui a uma «barreira» capaz de justificar a separação daquelas duas áreas científicas. A Embriologia tinha de ser compreendida como resultado de acção dos genes e, como tal, redefinida em termos do gen6tipo (ver: Gilbert 1991 b). Significativamente, também por esta altura, a evolução (filogenia), tradicionalmente apoiada no estudo do fen6tipo, foi redefinida em termos do génotipo - mudanças nas frequências dos genes através do tempo (Dobzhansky). Deve-se, sobretudo a Waddington, a incorporação definitiva da Genética na Embriologia. Como dizia aquele autor « ••• agora que se conhecem os mecanismos da transmissão da informação hereditária importa atacar o problema de como os genes influenciam o desenvolvimento embrionário ... ». Entretanto, também a Bioquímica se interligou, cada vez mais, com a Embriologia, particularmente ap6s a publicação por Needham, em 1931, da Chemica/ Embri%gy. A nova perspectiva de uma Embriologia genética não deixou porém, pelo menos inicialmente, de levantar algumas objecções por parte de alguns embriologistas do fen6tipo (ver: Sáxen 1973, Oyama 1985). Segundo estes, e neste aspecto tinham razão, não se podia admitir, como tendiam a fazer crer alguns geneticistas mais radicais, que o DNA contivesse, em si mesmo, todas as potencialidades necessárias para a formação de um novo organismo. Haveria nisto aquilo que proclamavam ser uma subtil recuperação do antigo dogma da preformação, em que o homuncu/um seria, neste caso, corporizado pelo c6digo genético. O ambiente celular e supracelular onde a informação genética se consubstancia para a realização dos fen6tipos é, obviamente, também determinante do processo de desenvolvimento. A cooperação Genética/Bioquímica/Embriologia mostrou-se fundamentaI para os espectaculares avanços na compreensão dos fen6menos do desenvolvimento conseguidos nas últimas décadas. Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 31 Historicamente, foram contribuições particularmente significativas, a introdução do conceito «um gene - um enzima», mais tarde modificado para «um gene - um polipeptido» (Beadle e Tatum), a identificação do DNA como material genético (Avery, McLeod, McCarty, Harshey, Chase), a descoberta da estrutura tridimensional do DNA (Watson e Crick), a identificação e o isolamento das polimerases do~ ácidos nucleicos (Komberg, Ochoa), o estudo dos mecanismos de regulação génica e da síntese proteica (Jacob, Monod), o estudo na natureza do código genético para as proteínas - Nirenberg, Mathaei, Crick, Barnett, Brenner, Watts, Tobin, Banzer, Khorana - (Stahl 1964, Taylor 1965, Hartman & Susk:ind 1965,Horder et aI 1985). O rápido desenvolvimento das técnicas da biologia molecular electroforese, hibridação de ácidos nucleicos, imunocitoquímica, clonagem de genes, sequenciação do DNA, PCR (Polymerase Chain Reaction), a utilização de animais transgénicos, etc. , vieram permitir não só o isolamento e caracterização de genes individuais, mas também conhecer a sua intervenção nos fenómenos do desenvolvimento. Esta verdadeira revolução tecnológica permite-nos começar agora a compreender em termos moleculares, muitos dos processos envolvidos no desenvolvimento do embrião. A molecularização da Embriologia veio, por outro lado, consolidar a perspectiva da corrente geneticista que vê o desenvolvimento embrionário baseado fundamentalmente no que se pode designar por paradigma da «expressão génica diferencial» e nos mecanismos que a regulam. Nesta óptica, o principal tópico de estudo dos embriologistas tradicionais, a morfogénese, passa, em larga medida, a ser considerada como mero epifenómeno do processo mais abrangente da expressão génica diferencial. Esta última, explica não só a diversidade celular (citodiferenciação) como também a sua organização tridimensional (morfogénese). Dando expressão a esta maior pujança actual da corrente geneticista (molecularista), algumas revistas de Embriologia, até há pouco de carácter predominantemente fenotípico, têm vindo, nos últimos anos, a modificar as suas prioridades editoriais e, inclusivamente, a alterar os seus próprios títulos. São, por exemplo, os casos do Journal of Embryology and Experimental Morphology que passou, em 1987, a designar-se por Development e da revista Cell Differentiation and Deve- 32 E. G. Crespo /opment que mudou, em 1990, o seu título para Mechanisms of Deve/opment (Gilbert 1991 b). Em consequência da evolução operada nesta área do conhecimento, a Embriologia encontra-se agora integrada num domínio científico muito mais vasto e em grande expansão actual, o da Biologia do Desenvolvimento. Nele, associam-se a Genética, Biologia ·Celular e Molecular, Biologia Evolutiva, Anatomia e Fisiologia, Bioquímica, Imunologia, Regeneração, Senescência, pesquisa sobre o cancro (Gilbert 1991 a, Brown 1993). A Biologia do Desenvolvimento assume assim um papel unificador de diversificadas áreas da Biologia, tomando-se fundamental para a compreeensão de praticamente todos os fenómenos biológicos. DIFERENCIAÇÃO CELULAR E MORFOGÉNESE UM TEMA CENTRAL DA BIOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO O problema de como o ovo fertilizado dá origem à diversidade e complexa organização celulares do organismo adulto envolve duas questões que, muitas vezes, e por várias razões, se consideram separadamente, embora na realidade estejam intimamente associadas: I) a da génese da diversidade celular, ou seja, a formação dos diferentes tecidos - citodiferenciação; 2) a da organização tridimensional destes diferentes tipos celulares para formarem orgãos e formas características das diferentes espécies-morfogénese. A abordagem da primeira daquelas questões tende a restringir-se ao estudo das interacções núcleo-citoplasma (nível celular). Na segunda, perspectiva-se o processo global da diferenciação no contexto, muito mais complexo, das interacções célula-célula e das células com o seu ambiente (nível supracelular). Citodiferenciação A citodiferenciação tem por base a expressão gemca diferencial, como aliás também, como veremos, a morfogénese. São os mecanismos que no embrião inicialmente a determinam e posteriormente a regulam que importa portanto referir. O que se convencionou designar por paradigma da citodiferenciação (Gilbert 199Ia), a expressão génica diferencial, pressupõe admitir-se que: I) Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 33 os núcleos das células somáticas contêm o genoma completo estabelecido no ovo fertilizado - em termos moleculares, que o DNA de todas as células, mesmo as já totalmente diferenciadas, é idêntico; 2) os genes não-activos não são destruídos ou mutados, retendo as suas potencialidades de expressão; 3) só uma pequena parte do genoma é expressa em cada célula, sendo o RNA sintetizado, específico de cada tipo celular. Todos estes pressupostos, com o desenvolvimento das modernas técnicas da biologia molecular, podem ser agora fácil e objectivamente testados. Existem evidências experimentais da equivalência genómica a nível embriológico (morfológico) e a nível molecular. Entre as primeiras, na sequência das antigas experiências de Driesch que, demonstrando a totipotência dos primeiros blastómeros implicitamente confirmavam o princípio de equivalências genómica, citam-se as clássicas experiências de Briggs e King . Através da transplantação para ovos de anfíbios, previamente anucleados e activados, de núcleos de outras células embrionárias, em vários estádios de desenvolvimento, concluiram que, pelo menos até certa altura do desenvolvimento (gastrulação), os núcleos transplantados mantêm a capacidade de controlar um desenvolvimento normal (totipotentes) . Posteriormente, Gurdon verificou que, mesmo os núcleos de células completamente diferenciadas, como as do epitélio intestinal, eram ainda capazes de dar origem a diversos tipos de linhagens celulares (células nervosas, sanguíneas, etc.). Isto naturalmente só se compreende se os genomas forem idênticos. Por outro lado, as modernas técnicas da biologia molecular vieram permitir não só a identificação dos genes presentes em determinadas células mas ainda verificar se os mesmos estão ou não activos, transcrevendo-se nos respectivos RNAm. A hibridação DNA/DNA levada a efeito por McCarty e Hayer, em 1964, em células de rato, pode considerar-se o primeiro teste molecular confirmativo do postulado da equivalência genómica. Verificou-se que o DNA (genes) das diferentes células é realmente idêntico em todas elas. É de referir, contudo, que existem excepções a este princípio, embora muito pontuais. Uma das mais conhecidas é a dos linfócitos B (produtores de anticorpos), em que se registam rearranjos do genoma relacionados com a sua especificidade imunológica. 34 E. G. Crespo Outra técnica, a hibridação in situ, desenvolvida na década de 70 por Gall e Pardue, que permite visualizar a actividade génica em termos da sua transcrição selectiva em diferentes tipos de células, veio também possibilitar a confirmação dos outros pressupostos anteriormente referidos. Esta técnica utiliza fragmentos de DNA ou RNAm complementares, marcados com átomos radioactivos, capazes de se filiarem ao RN Am resultante da transcrição dos genes em estudo. Admitido O princípio da equivalência gen6mica, isto é, que os genomas de todas as células embrionárias são idênticos, a questão que a seguir se coloca é a de como se desencadeia e regula a sua diferente expressão. À primeira vista pode parecer difícil compreender como a partir de uma célula-ovo, aparentemente homogénea, que reparte o material genético de forma igual, pelas sucessivas células-filhas no decurso da sua celularização, se consegue obter a diversidade e a complexa organização topográfica do organismo adulto. Grande parte da resposta a esta questão está, como veremos, implícita no facto do citoplasma ovular não ser realmente homogéneo mas, em geral, e pelo contrário, altamente heterogéneo. Em vários tipos de ovos esta heterogenidade é até evidente por simples observação externa. Traduz-se pela diferente distribuição de pigmentos, substâncias de reserva, rnitocõndrias, RNA, proteínas, etc., que podem mesmo definir eixos e planos de simetria bilateral (p.ex. anfíbios: ver Sacarrão & Tavares 1978-79). Para a diferenciação (e morfogénese) são particularmente importantes, como veremos, alguns tipos de RNA e de proteínas. No ovo coexistem com as informações hereditárias contidas no genes nucleares, outras informações difundidas no citoplasma, de herança materna, sob a forma de RNA mensageiros e determinados tipos de proteínas. São estes «determinantes» citoplasmáticos que diferentemente repartidos pelos blast6meros, vão actuar como agentes primários da citodiferenciação. Directamente ou através dos produtos a que dão origem, vão estimular ou inibir, nos genomas blastulares, potencialmente idênticos, diferentes grupos de genes, ou seja, determinar-lhes uma expressão diferencial. Nalguns casos, estes «determinantes» citoplasmáticos estão bem localizados e são visíveis em certas regiões do ovo (ou do embrião Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 35 precoce). É o caso do lobo polar de alguns Moluscos e, mais generaIizadamente, dos grânulos germinais (precursores dos gonócitos). Existem evidências experimentais das interacções deste «determinantes» citoplasmáticos com o núcleo, não só nas fases iniciais do desenvolvimento, mas até em fases mais tardias (células já diferenciadas). A descoberta do designado a1elo O, no anfíbio neoténiGo Ambystoma mexicanum, veio proporcionar um excelente exemplo deste tipo de interacções. Os embriões das fêmeas homozigóticas O/O desta espécie, atingem o estádio de blástula, mas não gastrulam. Não se regista, neste caso, o aumento da síntese proteica normalmente observado após a fase média da segmentação. A injecção de proteínas obtidas de ovócitos imaturos ou de citoplasma de ovócitos maduros que possuem o alelo normal, 0·/0· ou 0+/0, consegue, porém, recuperar a síntese proteica nos embriões mutantes e levá-los a um desenvolvimento normal. Deduz-se, portanto, que o alelo O' específicará uma proteína materna necessária para a activação dos genes nucleares e, consequentemente, para que se consiga um desenvolvimento normal a partir da média - blástula (Steward & Hunt 1982). O caso da proteína bicóide da drosófi1a é também muito esclarecedor destas interacções núcleo-citoplasma, em fases precoces do desenvolvimento (Lethuillier 1989, lngham 1989, Lipshitz 1991). Aos embriões provenientes de mães que possuem a forma mutada do gene que codifica a proteína bicóide, faltam-lhes a cabeça e o tórax; a parte posterior do corpo (télson) desdobra-se e substitui aquelas estruturas. Ficou demonstrado que esta deformidade não depende do genoma do embrião que a manifesta, mas sim do genoma da mãe - efeito materno. Conforme verificaram Nussleim e Driver, este gene exprime-se nas células nutritivas do ovário que envolvem a região do ovo correspondente à futura cabeça. O respectivo ARNm transfere-se então das células nutritivas do ovário para o citoplasma do ovo. Após a postura, distribuise em gradiente decrescente de concentrações ao longo do futuro eixo ântero-posterior. São as diferentes concentrações da proteína bicóide que regulam a expressão de um gene (hunkbach, do grupo dos genes precoces da segmentação) responsável pela especificação primária das estruturas cefálicas. 36 E. G. Crespo Foi possível demonstrar por via experimental que, efectivamente, esta proteína, regulando a expressão daquele gene, intervém na diferenciação primária da cabeça da drosófila. Verificou-se, através de técnicas de controle da transcrição do respectivo gene que variações programadas dos gradientes de concentração daquela proteína, determinam correlativos deslocamento~ do sulco cefálico, estrutura embrionária que marca o limite posterior· da cabeça, ao longo do eixo ântero-posterior. Em fases mais avançadas do desenvolvimento, nomeadamente em células já diferenciadas, é igualmente possível obter exemplos da influência citoplasmática na regulação da actividade génica. A fusão celular por acção viraI, proporciona uma demonstração experimental desta influência. A infecção viraI, como se sabe, pode provocar a fusão das células vizinhas numa única célula multinucleada. Numa destas experiências, provocou-se a fusão de células tumorais humanas (com núcleos activos) com eritrócitos de Gal/us (com núcleos inactivos), obtendo-se assim uma célula híbrida cujo citoplasma é praticamente todo de origem tumoral, dado que o vírus utilizado lisa o eritrócito durante a fusão. O resultadó desta fusão é a reactivação do núcleo do eritrócito, que se manifesta pelo aumento do seu volume, perda progressiva das condensações heterocromáticas e pelo aumento paralelo da sua actividade biossintética - síntese do RNA - que pode ser detectada por autorradiografia. Não se observam modificações deste tipo quando a fusão ocorre entre células com núcleos inactivos, pelo que esta reactivação não pode ser atribuída a qualquer acção viraI. Conclui-se portanto, que o citoplasma das células tumorais conterá substâncias, provavelmente proteínas e/ou RNAm, que activarão os genes nucleares dos eritrócitos. Estes determinantes de expressão materna e/ou de expressão zigótica precoce, que anteriormente referimos, são particularmente importantes no tipo do desenvolvimento dito de «mosaico» (muitos Protostómios), em que os programas de citodiferenciação se determinam numa via aparentemente irreversível . e independente de influências externas (células vizinhas, indutores, etc.), em fases iniciais da embriogénese. Pelo contrário, no tipo de desenvolvimento regulador (muitos Deuterostómios), a realização destes programas de Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 37 diferenciação está dependente, até fases relativamente avançadas, do ambiente extracelular. Reconhecido o papel dos chamados «determinantes» citoplasmáticos no seu diálogo com os genes nucleares para a citodiferenciação, surge agora a questão do mecanismo através do qual afectam a sua expressão, e a que níveis a podem regular. Muitos dos «determinantes citoplasmáticos», como nomeadamente a proteína bicóide a que já nos referimos, revelaram possuir homeodomínios específicos, semelhantes aos das proteínas reguladoras da transcrição do DNA nuclear. Estes domínios são susceptíveis de se ligarem a determinadas sequências do DNA, activando ou inibindo, deste modo, determinados genes alvo. O número destas proteínas reguladoras é, no entanto, relativamente reduzido face à infinidade de processos em que estão envolvidas. É a acção combinada de muitas destas proteínas e também o facto de possuirem diferentes e específicos domínios que determina a vasta gama de variação da expressão génica e, paralelamente, dos processos diferenciativos dos vários tipos celulares. Nos organismos multicelulares existem em média cinco locais reguladores por cada gene (Beardsley 1991). A acção reguladora destes determinantes citoplasmáticos, como aliás a de muitos outros reguladores da expressão génica, pode exercer-se não só a nível da transcrição do DNA, mas a todos os níveis da cascata de processos que medeiam a síntese proteica - processamento, transporte e tradução do RNA - e ainda também dos processos pós-tradução. Se a expressão génica diferencial perspectivada, como acabámos de fazer, num restrito contexto de interacções núcleo-citoplasma, já nos proporciona uma certa compreensão da génese da diversidade celular, é óbvio, por outro lado, que o organismo não é uma simples colecção de vários tipos celulares distribuídos mais ou menos ao acaso. Embora os tecidos epiteliais, ósseos musculares, nervosos, por exemplo, de um rato, sejam praticamente idênticos aos de uma rã, organizam-se de maneira muito diferente para dar origem aos orgãos e às formas características destas espécies. Como é que os tecidos se organizam para formarem os orgãos? Como é que estes se estabelecem em determinadas topografias e adquirem formas bem definidas? Em síntese, como se opera a morfogénese? 38 E. G. Crespo Morfogénese A morfogénese é considerada um epifenómeno da diferenciação celular e, implicitamente, tem igualmente por base a expressão génica diferencial. Todavia, neste caso, a regulação desta expressão tem de ser compreendida no contexto de um complexo ecossistema lJlolecular, tridimensional, que extravasando o ãmbito celular, envolve moléculas da superfície das membranas, bem como da matriz e dos fluidos extracelulares. São as dinâmicas e complexas interacções dos componentes deste ecossistema embrionário, entre si e com os genes, que explicam a morfogénese e os fenómenos que a nível tridimensional a consubstanciam, tais como a multiplicação celular, adesão selectiva, migração, mudança de forma das células, etc .. A progressiva organização espacial das células que decorre da morfogénese, na medida em que vai criando novas topografias, novos ambientes, vai também simultaneamente influenciando de forma muito dinâmica o processo que intrinsecamente lhe está na base, a expressão génica diferencial e, correlativamente, a própria citodiferenciação. O que vamos passar a expor acerca da morfogénese aplica-se, mais generalizadamente, aos processos de desenvolvimento ditos «reguladores» , em que os programas de diferenciação se realizam progressivamente através de múltiplas interacções das células entre si e com o seu ambiente - por meio de substâncias difusíveis ou por contactos directos, célula-célula ou célula-matriz extracelular. No caso particular dos processos de desenvolvimento ditos em «mosaico», de diferenciação precocemente pré-programada, o papel destas interacções na diferenciação e na morfogénese não é tão óbvio. Uma questão prévia e fundamental para a compreensão da morfogénese é a de como as células são <<informadas» dos locais que ocupam no embrião de modo a que, no tempo próprio e em relação às suas topografias particulares. realizem os adequados programas genéticos. Informação de posição Como é que as células se organizam ao longo de determinados eixos e planos de simetria? Como é que, por exemplo, num insecto, as células se organizam em tempos e nos lugares próprios, ao longo do eixo ântero-posterior, para formarem uma cabeça, um tórax e um abdómen? Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 39 Foi Morgan, na segunda década deste século, quem primeiramente sugeriu uma teoria explicativa deste processo - teoria dos gradientes morfogenéticos. O estudo do processo de regeneração em Planaria conduziu-o à ideia de que existiriam, ao longo do eixo ântero-posterior do animal, gradientes de determinadas substâncias que controlariam aquele processo e , consequentemente, a morfogénese. Já no fim da década de 60, Wolpert reformulou -está ieoria, introduzindo o actual conceito de <<informação de posição». Segundo este autor, a arquitectura do embrião desenvolver-se-ia em duas etapas: I) as células receberiam uma informação de posição espacial através das concentrações locais de determinados morfogenes; 2) face a esta informação desencadeariam programas genéticos diferenciados. Faltava porém à teoria uma base objectiva, ou seja, a identificação desses morfogenes. Isto foi finalmente conseguido na década de 80, quando Nusslein e Driever, a quem já atrás nos referimos, descobriram e isolaram o gene da proteína bic6ide da dros6fila (Lethuillier 1989). Esta proteína assumia efectivamente todas as características de um morfogene, isto é, através de um gradiente de concentração, informava as células embrionárias da sua posição espacial ao longo do eixo ântero-posterior. Posteriormente, outras proteínas (e várias substâncias) foram detectadas pensando-se que poderiam igualmente actuar como morfogenes . Interessava, a partir daí, identificar as células e os genes alvo da sua acção, bem como os processos de regulação da sua expressão. Genes que controlam a morfogénese A dros6fila constitui um bom e bem estudado modelo dos mecanismos de controle genético da morfogénese. Durante as primeiras fases do desenvolvimento deste díptero, vários grupos de genes intervêm na especificação da sua morfogénese, numa hierarquia de actuação espácio-temporal bem definida, ao longo do eixo ântero-posterior (Prochiantz 1988, Anderson 1989, Levine & Harding 1989, Browder et a1 1991, Gilbert 1991 a). Um grupo de genes de expressão materna, ditos «coordenadores» que incluem o já referido gene bic6ide e outros como o nanas e o oskar (Browder et a1 1991), actuando por intermédio dos respectivos RNAm que se transferem das células ováricas para o citoplasma ovular, determinam, já no ovo-virgem, as regiões anterior e posterior do futuro embrião. 40 E. G. Crespo As proteínas que codificam vão regular, no começo do estádio de blastoderme sincicial, a expressão de um outro grupo de genes, estes já de expressão zig6tica, chamados genes Gap (genes precoces da segmentação) que incluem entre outros, os genes hk (hunkback), kr (kruppel), kni (knirps), tll (tailless). Estes genes estão envolvidos na especificação das regiões anterior, média e posterior do. embrião. As mutações destes genes dão como resultado a eliminação de segmentos. Regulados por estes últimos, e imediatamente antes do estádio de blastoderme celular, vão entrar em jogo os genes ditos de «controle-par» (p. ex.: h-hairy, ftz-fushitarazu) que, por sua vez, vão definir sete regiões no embrião cada uma delas correspondente a dois para-segmentos (ver: desenvolvimento embrionário da dros6fila Browder et aI 1991, pp 595596). Mutações dos genes deste grupo dão aso a defeitos (ou faltas) em segmentos alternados (pares ou ímpares) ; frequentemente a larvas com metade do número normal de segmentos. Finalmente, sob controle dos genes do grupo anterior, começam a transcrever-se entre o estádio de blastoderme e a gastrulação, o grupo de genes de «polaridade segmentar» (p. ex.: en-engrailed; wg-wingIess) que são responsáveis pela diferenciação de certas estruturas repetidas dentro de cada segmento. Genes mutados deste grupo levam à perda de uma parte de cada segmento, a qual é substituída pela duplicação da parte restante, por vezes assumindo uma estrutura correspondente à da sua imagem reflectida num espelho. Estes últimos grupos de genes que influenciam, como vimos, o processo de segmentação do embrião, interactuam ainda para regular a expressão dos genes home6ticos, que vão posteriormente determinar a estrutura específica de cada segmento. Fen6tipos curiosos podem resultar da mutação dos genes home6ticos, moscas com dois pares de asas (em vez do par normal), com quatro pares de patas (em vez das três habituais), com patas na cabeça (no lugar das normais antenas). Um grupo particular de genes, grupo terminal, participa também na especificação estrutural ao longo do eixo ântero-posterior da dros6fila. Estes genes definem os lintites da região segmentada do corpo, controlando a formação das estruturas não segmentadas anterior (ácron) e posterior (télson). Na sua ausência não se formam nem o ácron nem o télson; as partes segmentadas expandem-se até às extremidades. Deste grupo fazem parte genes de expressão materna, como por exemplo o gene torso, cuja Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 41 proteína actuando sobre alguns genes Gap, nomeadamente o tailless, cria condições para a expressão dos genes específicos do ácron e do té1son. Contrariamente ao que acontece com a especificação estrutural ao longo do eixo ântero-posterior, em que estão implicados, como vimos, distintas hierarquias genéticas, a especificação dorso-ventral parece ser controlada por uma simples hierarquia em que os principais agentes são os genes dorsal, cactus e toll (Lipshitz 1991). Em contraste com o que se sabia acerca dos processos morfogenéticos ao longo do eixo ântero-posterior, pouco se conhecia até há poucos anos, sobre os genes envolvidos na especificação da simetria bilateral, em parte porque o modelo drosófila não se revelava adequado para este estudo. Alguns trabalhos recentes vieram porém dar um primeiro, mas significativo contributo, para o esclarecimento do assunto (Brown 1991, Ewing 1993, Yokoyama et aI 1993). A aparência de simetria bilateral (lado direitollado esquerdo) é, na maior parte dos casos, apenas externa. Muitos orgãos internos, são, como se sabe, bilateralmente assimétricos. No Homem, cerca de 1 em 10.000 indivíduos manifesta uma anomalia designada por situs inversus, isto é, uma reversão da localização normal, direita ou esquerda, de certos orgãos: pulmões, coração, estômago, figado, baço, etc .. Em 1959, foi descoberto por Hummel e Chapman, no rato, um gene, (iv), cuja mutação se revelou responsável por anomalias do tipo atrás mencionado. Como, porém, só metade dos mutantes homozigóticos as expressavam, concluiu-se não ser aquele gene o seu determinante directo. Muito recentemente, Overback e Yokoyama, quando tentavam introduzir um gene para a tirosina no genoma do ratinho albino, verificaram, por mero acaso, que os homozigóticos transgénicos evidenciavam uma reversão da simetria bilateral que afectava, em 95% dos casos, o estômago, coração e baço. Tornava-se óbvio que o gene inserido influenciava a expressão de um gene próximo, que designaram por inv, certamente importante na especificação da simetria bilateral. Este gene é diferente do iv anteriormente identificado, dado localizar-se no cromossoma 4, enquanto aquele se localiza no 12. As mutações homeóticas da drosófila, a que atrás nos referimos, talvez pelas suas expressões, por vezes espectacular~s, foram objecto de particular atenção por parte dos investigadores. 42 E. G. Crespo Assim, veio a demonstrar-se que muitos desses genes homeóticos formam dois conjuntos que se localizam em dois segmentos distintos do cromossoma 3 deste insecto. Um dos conjuntos foi designado por complexo Antennapedia (Ant-c), o outro por complexo Bithorax (Bx-c). As mutações dos genes do primeiro complexo afectam as estruturas cefálicas e o 1.0 segmento torácico, as do segundo atingem o 2.° e 3.segmentos torácicos e todos os abdominais. Quando Mc Ginnis e Gehring, na década de 80, conseguiram isolar e sequenciar alguns destes genes homeóticos, verificaram, com surpresa, que a maioria possuia um segmento de DNA muito semelhante em todos eles. Esta sequência de nucleótidos foi baptizada de homeobox. Foi desmonstrado que a sequência homeobox especifica uma região de cerca de sessenta aminoácidos (homeodomínio) das proteínas codificadas por aqueles genes, designadas por esse motivo, homeoproteínas. Estes homeodomínios têm uma estrutura tridimensional que inclui quatro hélices-a, o que os aproxima das já conhecidas proteínas reguladoras da transcrição genética. É através deles que, como naquelas, se dá a ligação ao DNA e, deste modo, se regula a expressão de determinados genes alvo. Técnicas, como a hibridação in situ, que utiliza RNAm complementares, marcados radioactivamente, como sondas moleculares, têm permitido a identificação de homeobox semelhantes aos do Ant-c da drosófila, em genes de muitos outros grupos animais, nomeadamente Vertebrados (incluindo o próprio Homem). Nos mamiferos conhecem-se hoje algumas dezenas de genes-homeobox (Duboule et aI 1990). No rato e no Homem, estes genes formam também complexos que se repartem, neste caso, por quatro cromossomas diferentes. Estes complexos são abreviadamente designados por Hox - Hox A, Hox B, Hox C, Hox D - correspondentes aos quatro cromossomas em que se localizam (ver nomenclatura dos genes homeobox em Scott 1992). Um algarismo é adicionado para indicar cada um dos genes do complexo. O número I é atribuído ao gene do complexo de expressão topográfica mais anterior (extremidade cefálica); os números 2, 3, .. n, aos genes de expressão sucessivamente mais posterior. Por exemplo Hox A I designará o gene do complexo A que se expressa nas estruturas mais anteriores da cabeça da drosófila, do rato, etc ... Como se toma óbvio, nas diversas espécies, estes complexos estão localizados em diferentes cromossomas. O complexo Hox A localiza-se, Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 43 por exemplo, no rato, no cromossoma 6, enquanto no Homem se localiza no cromossoma 7. Factos interessantes e significativos resultam da comparação da estrutura (sequências de nudeótidos) dos genes dos vários complexos. Verifica-se assim que, dentro do mesmo complexo, os genes vizinhos têm maiores semelhanças entre si do que com os genes mais ~fastados (a semelhança entre Hox AI e Hox A, é maior do que entre Hox AI e Hox A,). Por outro lado, quando se comparam genes que ocupam as mesmas posições relativas nos diferentes complexos, por exemplo, Hox A, com Hox B" as semelhanças encontradas são, em geral, ainda maiores, do que as observadas relativamente aos seus vizinhos mais próximos dentro do mesmo complexo. Esta organização dos genes Hox veio dar uma boa sugestão do seu provável processo evolutivo. É de admitir que, numa primeira fase, a partir de um gene homeobox ancestral, presente em grupos evolutivamente muito primitivos, sucessivas duplicações lineares tenham dado origem a um complexo de genes localizado num único cromossoma. Mais tarde, através de duplicações, desta vez de todo o genoma (poliploidização), obter-se-iam os quatro complexos dos mamíferos. Nesta perspectiva, a drosófila representaria uma fase evolutiva mais atrasada, com este tipo de genes localizados num só cromossoma, embora segregados nos dois conjuntos - Ant-c e Bx-c - já mencionados. O escarabídeo, Tribo/ium castaneum, poderá, eventualmente, ilustrar uma situação ainda mais primitiva, dado possuir um único complexo aparentemente homólogo do conjunto Ant-c e Bx-c da drosófila. É de assinalar que, estudos mais profundos, demonstram que os genes destes complexos a que nos temos vindo a referir, salvo no que respeita aos homeobox, não manifestam, nas restantes sequências, grandes semelhanças entre si. Mesmo os homeobox revelam algumas diferenças. Só alguns aminoácidos «chave», dos homeodomínios proteicos, parecem ser sistematicamente conservados. O que mais interessante resulta de tudo aquilo que foi exposto, é que a lógica funcional destes complexos se conservou através de muitos milhões de anos de evolução. Existe uma estreita relação entre a localização destes genes Hox nos cromossomas e os locais onde se expressam ao longo dos eixos corporais. Os genes localizados nas extremidades cromossómicas do complexo exprimem-se nas extremidades cefálicas ou caudais, os que ocupam posições inter- 44 E. G. Crespo médias, em topografias embrionárias espacialmente correspondentes às suas posições relativas ao longo do cromossoma. A ordem por que se expressam corresponde também à ordem por que estão dispostos ao longo do cromossoma, o que pressupõe que sejam alvo de um processo de activação sequencial. Se esta representação molecular das topografias embrionárias «<homuncu/um» molecular) é assombrosa, também é extraordinário o facto de se ter conservado ao longo de tanto tempo de evolução. Técnicas moleculares como a hibridação in situ, vieram efectivamente mostrar que os genes dos complexos Hox dos mamíferos, tal como na drosófila, manifestam fronteiras de expressão bem definidas e obedecem à mesma lógica funcional (fig. 2) Confirmando também este facto, Mc Ginnis (em Bearsdley 1991), introduzindo um gene homeohox humano que deliberadamente sobreexpressou, na drosófila, verificou que se provocavam deformidades na região da cabeça do animal praticamente idênticas às produzidas pela sobrexpressão do gene homólogo daquela espécie. A sobreposição dos produtos da expressão diferencial destes genes homeobox - diferentes qualidades e/ou concentrações de RNAs, proteínas, etc., - cria, portanto, um complexo sistema de coordenadas moleculares susceptível de informar, muito especificamente, as células da sua topografia no embrião, levando-as, em sua função, a realizar adequados programas genéticos de diferenciação. A acção destes complexos de homeogenes não se restringe, todavia, apenas às fases mais precoces do desenvolvimento ontogenético. Podem também intervir, mais tarde, através de uma lógica funcional idêntica à assumida na definição dos grandes planos estruturais, a nível da organização de estruturas mais particulares, como é o caso da formação dos membros. A circunstância oe ser ter verifiéáõo que os genes homeobox- são também especificamente · expressos em tecidos já diferenciados, veio sugerir a possibilidade do seu papel não se reduzir ao da simples <<informação de posição» mas de estarem igualmente envolvidos em processos mais generalizados. A partir de 1988, quando pela primeira vez se conseguiram purificar factores de transcrição, verificou-se que muitos deles, caso por exemplo, dos factores octaméricos, Oct 1 e Oct 2, continham homeodomínios semelhantes aos das proteínas codificadas pelos genes-homeobox (homeoproteínas). Ficou, deste modo, estebelecida uma ligação molecular objectiva entre a morfogénese e a regulação da expressão génica. Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 45 DROSÓFllA er3 ANT-CE{] LAS. O 000 G:]·O O ~BX-C ANT. ABO. B RATO erl1 ~H~~:P, rJ O 81 12 .91 _ OOOBOO~ _ 86 12.2) _ 89 12.5) Fig. 2 - Ilustra-se a correspondência entre os locais onde se expressam alguns genes homeobox dos complexos Ant-c e Bx-c (localizados no cromossoma 3) ao longo do eixo ântero-posterior, da drosófila e os locais onde se expressam os genes homólogos do complexo Hox B (cromossoma 11), ao longo do mesmo eixo. no embrião do rato. Repare-se, igualmente, na correspondência que existe entre a localização dos genes ao longo do cromossoma e os locais onde se expressam ao longo do eixo ântero-posterior. LAB-Iabial, ANT-antennapedia, ABD-B - abdominal B. Entre parênteses, figuram as antigas designações dos genes representados do rato (ver: Scott 1992). O sentido indicado pelas setas corresponde à ordem por que são transcritos os genes destes complexos nos Vertebrados (adaptado de De Robertis et ai 1990. com modificações baseadas em Gilbert 1991a e Scott 1992). A ideia inicial de que o homeobox seria um motivo único dos genes reguladores da morfogénese, tende a ser reformulada, passando a considerar-se que o homeobox é, provavelmente. um domínio proteico conservador. primariamente envolvido na regulação génica que foi usado. com sucesso, na especificação regional, em certos processos da morfogénese (Goulding & Gruss 1989, Affolter et aI 1990). 46 E. G. Crespo A família dos genes homeobox, por aquilo que agora se sabe, é potencialmente muito vasta. Proteínas com homeodomínios próximos do protótipo Ant-c (da drosófila) e inicialmente reconhecidos como factores reguladores da transcrição, ocorrem nos genes de várias famílias proteicas dos mamíferos como a POU (PitlOct./Unc.), (L F)-Bl / (HNF) -I e IsI-1 (Wright 1991). Estas homeoproteínas regulam não só a actividade dé outros genes homeobox como também a de outros genes que importa ir descobrindo. Na regulação dos genes homeobox, têm também papel muito importante outras substâncias como o ácido retinóico e os factores peptídicos do crescimento (PGF). A adição de ácido retin6ico ao meio de cultura de células embrionárias activa vários genes homeobox. Da mesma maneira actuam o FGF (Fibroblast Growth Factor) que activa selectivamente homeobox de genes de expressão posterior e o TGF[31 que, pelo contrário, activa homeobox de genes de expressão anterior (De Robertis et ai 1990). Pensou-se que estas substânci as poderiam também actuar como agentes de transmissão de <<informação de posição», isto é, como morfogenes. Haveria para tal que provar que os seus efeitos eram dosedependentes, ou seja, que actuariam através de gradientes de concentração. No caso do ácido retinóico parece assim não acontecer. Actuará mais através de um mecanismo dependente da sua concentração absoluta do que através de gradientes (Tabin 1991, Green & Smith 1991). Pelo contrário, experiências recentes parecem vir demonstrar que as células embrionárias podem, em certos casos, interpretar gradientes de concentração de alguns factores peptídicos de crescimento de acordo com o modelo morfogene. Em Xenopus (anfíbios) os efeitos indutores de uma activina (factor de crescimento do grupo dos indutores mesodérmicos) designada por XTC-MIF, são, conforme verificaram Green e Smith (1991), dose-dependentes. Não foi também surpresa total o ter-se verificado que muitos oncogenes são formas mutadas de genes do desenvolvimento. Muitos oncogenes codificam factores de transcrição e outros tipos de moléculas envolvidos nos processos de diferenciação e morfogénese. Muitos dos aspectos a que acabámos de nos referir relativos aos agentes e aos mecanismos envolvidos na realização e na transdução de «informação de posição» , ilustram uma das duas vias pelas quais as células podem interagir, ou seja, através de substâncias difusíveis, neste Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 47 caso concreto - morfogenes, homeoproteínas, ácido retinóico, factores de crescimento, etc. - e, deste modo, influenciar a diferenciação e a morfogénese. Uma segunda via de interacção celular, igualmente decisiva para a diferenciação e para a morfogénese, é a dos contactos directos célula-célula e célula substrato (matriz extracelular) - a adesão celular. Papel da adesão celular na moifogénese Se o paradigma da citodiferenciação é a expressão génica diferencial, o paradigma da morfogénese envolve as afinidades celulares diferenciais (Gilbert 1991 a) Esta diferente afinidade depende, sobretudo, da expressão, variável no tempo e no espaço, no decurso do desenvolvimento, de certas moléculas da superfície das membranas celulares, sob controle intra - e extracelular. É a expressão diferencial destas moléculas que leva as células a reconhecerem-se e a ligarem-se (ou não) entre si e com o seu substrato (matriz extracelular) - adesividade diferencial ou selectiva influenciando fenómenos de agregação, migração, multiplicação e mudanças de forma das células que, a nível tridimensional, consubstanciam a morfogénese. A importância do processo de adesividade selectiva no desenvolvimento embrionário foi pela primeira vez claramente demonstrada, em 1955, por Townes e Holtfreter. Através de experiências realizadas in vitro, de dissociação I reassociação de embriões de anfíbios (mais tarde repetidas, por Moscona, em aves e mamíferos) verificaram que, após dissociação: 1) as células ectodérmicas tendem a reassociar-se às células ectodérmicas, as meso - às mesodérmicas e as endo - às endodérmicas; 2) as posições relativas dos diferentes reagrupamentos são idênticas às que são observadas no embrião, isto é, as células ectodérmicas dispõem-se externamente, as endodérmicas internamente e, entre ambas, as mesodérmicas. Conclui-se, portanto, que as células são capazes não só de reconhecerem e interagir com as que lhes são afins, mas também com as que são diferentes. Sabe-se hoje, que neste reconhecimento e adesão selectivas, estão envolvidas determinadas moléculas proteicas das superfícies das membranas celulares. Estas participam não só no processo de adesão célula-célula, mas também das células com o seu substrato (matriz extracelular). 48 E. G. Crespo Adesão célula-célula Existem dois grupos principais de moléculas envolvidas no processo de ligação célula-célula: as moléculas de adesão celular - CAM (Cellular Adhesion Molecules) e as moléculas da junção celular - CJM (Cellular Junction Molecules). As primeiras são importantes no estabelecimento primário dos contactos intercelulares, as segundas actuam na sua estabilização (Edelman 1988). Vários critérios podem ser evocados para a classificação das CAM: cronologias e topografias particulares de expressão; tipos de ligação que estabelecem - homo ou heterofílicas; dependência ou não do cálcio para a realização das suas funções adesivas; semelhança estrutural. De acordo com alguns destes critérios, podem ser agrupadas em três famílias (ou superfamílias): imunoglobulinas, caderinas e CAM(s) mediadas por sacáridos (Gilbert 1991 a). O grupo das imunoglobulinas inclui, actualmente, muitas moléculas estruturalmente semelhantes, mas funcionalmente muito diversas, cujos domínios de ligação celular se assemelham às moléculas dos anticorpos e que não dependem do cálcio para a adesão. Além das moléculas primeiramente identificadas, directamente envolvidas no processo de adesão, como as CAM-N (neurais) e as CAMNg (neurogliais), estão incluídas nesta família outras moléculas, com funções distintas, nomeadamente receptores de factores de crescimento, antigénios de histocompatibilidade e precursores de imunoglobulinas (anticorpos do sistema imunitário) (fig. 3). A descoberta de que as moléculas de adesão celular têm grandes semelhanças estruturais com os anticorpos, foi, biologicamente, muito interessante. Como as CAM existem não só nos Vertebrados como noutros grupos animais, nomeadamente nos insectos, e os anticorpos se limitam aos Vertebrados, torna-se muito plausível a hipótese de que o nosso sistema imunitário tenha derivado de um primitivo sistema de adesão celular (Edelman 1989). Existe, aliás, uma certa lógica funcional nesta hipótese, se atendemos ao facto de ambos os sistemas se basearem no mesmo processo básico de reconhecimento celular. É de assinalar, a este propósito que, ao que parece, certas CAM-N podem, em determinadas circunstâncias, destacar-se das membranas celulares onde habitualmente se inserem, incorporando-se na matriz extracelular (Edelman 1988, Rutishauser 1989 em Thorsteinsdóttir 1992). Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 49 No que se refere mais em particular às CAM-N, as moléculas de adesão mais bem estudadas desta fanulia, verifica-se que são proteínas transmembranares com domínios extracelulares através dos quais se dão as ligações às células vizinhas, domínios intrarnembranares e domínios citoplasmáticos, Estes últimos faltam nalguns tipos de CAM-N, O seu mecanismo de ligação é homofílico, isto é, a ligação decorre entre domínios estruturalmente idênticos das moléculas de adesão de células vizinhas (fig, 4), ' " "b '",'m COOH CAM-N CAM- Ng - - COOH IgM Fig. 3 Três membros da superfamília das imunoglobulinas . A molécula IgM pertence ao grupo dos anticorpos enquanto que a CAM-N e a CAM-Ng são ambas moléculas de adesão celular. A CAM-N pode ser formada por uma cadeia glicoproteica transmemhranar como a CAM-Ng ou estar ligada a um componente lipídico da membrana. Ambas são formadas por uma série de domínios globulares extracelulares, estabelecidos por pontes dissulfureto (conforme Gilbert 1991 a). CÉLULA 1 CÉlULA 2 Fig. 4 - Tipos de ligação homo-e heterofílicos A - no tipo homofOico a ligação faz-se através de moléculas idênticas das células vizinhas; B - no tipo heterofOico esta ligação ocorre entre moléculas diferentes E. G. Crespo 50 Nos Vertebrados, em geral, as CAM-N começam a expressar-se no estádio de gastrulação, podendo contudo a sua expressão variar no decurso do desenvolvimento. Muitas vezes, células que expressam CAM-N deixam de as expressar ao adquirirem um «fenótipo» migratório, retomando essa expressão quando termina a migração e as células se reagrupam. Há também diferenças estruturais entre as CAM-N embrionárias e as dos adultos. Nos embriões, estão associadas aos domínios extracelulares moléculas de ácido siálico que desaparecem nos adultos (Le Moigne 1989). Quanto às caderinas, são uma família de moléculas de adesão celular cálcio-dependentes (fig. 5). São, na maioria dos casos, o sistema de adesão funcionalmente mais importante. Todos os tecidos compactados expressam algum tipo de caderina. Em muitas circunstâncias verifica-se que a inactivação de outros sistemas de adesão tem um efeito reduzido na adesividade das estruturas (Magee & Buxton 1991). m N2H -I ., ' r.2. '3."4. '5 c COOH ....... Co++ Fig. 5 - Esquema da estrutura de uma caderina. O seu segmento extracelular é formado por 4 domínios El - E4 repetidos (o E5 é diferente). O domínio citoplasmático C, muito conservativo, segue-se à região transmemhranar. No segmento EI, o mais conservativo dos segmentos extracelulares, localiza-se o tripéptido HAV, importante na adesão intercelular. Nos segmentos extracelulares existem também vários locais (3) de ligação ao cálcio. (Kemler & Ozawa 1989. em Thorsteinsdóttir 1992, Pouliot 1992). m-membrana celular Ao número relativamente reduzido de caderinas conhecidas até há poucos anos, caderina-E (Epitelial = Uvomorulina = antiga CAM-L, fígado), caderina-P (Placentária), caderina-N (Neural), caderina-R (Retinal), caderina-B (Cerebral), foram nos últimos anos adicionadas várias outras que diferem daquelas em diversos pormenores estruturais. É o caso de diversas glicoproteínas desmossómicas, desmogleínas e desmocolinas Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 51 (Hynes 1992 b) e outras como as caderinas-M (Musculares) e as caderinas-T (Truncadas) (Pouliot 1992). A algumas destas últimas falta-lhes o domínio HAV (His-Ala-Val) importante nas ligações intercelulares. As caderinas são importantes nos fenómeno de transição mesênquima - epitélio, migração e mudanças de forma celular. Um caso que ilustra a possível intervenção deste grupo de moléculas no processo de multiplicação celular, é o da proteína codificada pelo gene supressor de tumores da drosófila lfat). A mutação desta proteína, cuja semelhança estrutural com as caderinas sugere que intervenha no processo de adesão celular (Hynes 1992 b, Pouliot 1992), conduz a defeitos no controle da multiplicação celular (tumores). Também nos Vertebrados, defeitos nas ligações mediadas pelas caderinas parecem estar relacionadas com fenómenos anormais de proliferação (cancros) e de migração (metástases) celulares. A terceira e última família de CAM(s) é constituída por proteínas de membrana, que reconhecem (e se ligam) a resíduos glucídicos das células vizinhas, neste caso, por um mecanismo heterofílico - CAM(s) mediadas por sacáridos. O membro mais conhecido desta família é a ~ 1,4 galactosiltransferase (Galtase) . É uma enzima associada à membrana que se liga à galactose da superfície celular oposta. Em certos casos, pode também ligar-se à galactose de moléculas da matriz extracelular. São particularmente importantes nos processos de adesão e de migração celulares. Outras moléculas da superfície da membrana, igualmente importantes para a adesão célula-célula, são, como já referimos, as CJM (Cellular Junction Molecules) . Localizam-se em varias áreas de junção e comunicação intercelulares, como as designadas «junções oclusivas» (zonulae occludens), <<junções de aderência» (p . ex. desmossomas, hemidesmossomas) e «junções de comunicação» (p. ex. junções lacunares = gap junctions). Os dois primeiros tipos de formações contêm, além de certas proteínas específicas, nomeadamente a ZO-l, muitas moléculas do grupo das caderinas, como é o caso das desmossomas a que atrás nos referimos. Estes dispositivos, embora assumindo um papel eminentemente estrutural de reforço da aderência entre células vizinhas têm, nalguns, casos, importância funcional, na medida em que podem determinar restrições ao fluxo das proteínas intramembranares e, portanto, definir compartimentos funcionalmente distintos. 52 E. G. Crespo No epitélio intestinal, por exemplo, as fosfatases e hidrolases digestivas distribuem-se pela superfície apical, enquanto as «bombas» sódio e potássio se circunscrevem à superfície basal. A destruição destes dispositivos conduz à mistura das proteínas dos dois compartimentos membranares e a consequentes disfunções. As junções de comunicação, neste caso interessa-nos apenas as de tipo lacunar (gap junction), desempenham papel importante na morfogénese, não pela sua acção adesiva, mas pelo seu papel na intercomunicação celular. Os canais justapostos que formam através das membranas das células vizinhas - cada canal está rodeado por seis proteínas transmembranares - permitem a passagem de pequenas moléculas (AMPc, GMPc, etc.) e iões, que são importantes na difusão e coordenação das informações morfogenéticas. Experiências recentes demonstraram que a organização das moléculas CJM nos dispositivos atrás referidos é CAM - dependente. Na ligação das células em vias de compactação intervêm primariamente as CAM(s) e só, posteriormente, estabilizando estas ligações , se organizam molecularmente aqueles dispositivos. Adesão célula-substrato (matriz) Os organismos não são apenas compostos por células. Uma parte substancial do seu volume é preenchido por uma vasta e complexa rede macromolecular, produzida pelas células, a matriz extracelular. Esta matriz não só mantém a coesão dos tecidos (e orgãos) como proporciona um substrato sobre e através do qual, as células podem interagir e migrar. Durante o desenvolvimento observam-se constantes alterações nesta matriz, as quais exercem um papel instrutivo na diferenciação celular e na morfogénese. É a natureza particular desta matriz e o papel decisivo que desempenha no desenvolvimento embrionário, que levaram Morris (1993), a considerá-la como o principal carácter que une todos os animais num reino monofilético, bem discriminado das plantas e dos fungos. Existem dois tipos principais de matrizes extracelulares: a intersticial e a pericelular. A primeira corresponde senso lato, à matriz dos tecidos conjuntivos; a segunda à rede macromolecular que está em íntimo Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 53 contacto com as células, incluindo as membranas basais das células epiteliais, endoteliais, musculares e nervosas e as matrizes de fibronectinas.É este segundo tipo de matrizes que é muito importante para a modulação da morfogénese. No decurso do desenvolvimento, novas moléculas são constantemente adicionadas à matriz, outras degradadas ou transformadas . . COll}O todo este processo é regulado pelas próprias células (por moléculas e enzimas por elas produzidas), a matriz é pois um modo indirecto., mas muito eficiente, das células influenciarem os comportamentos das que .se encontram na sua vizinhança (Alberts et ai 1989, Gilbert 199Ia). Entre as principais moléculas das matrizes extracelulares - SAM (Substrate Adhesion Molecules) contam-se: colagénios, glicoproteínas e proteoglicanos. Os colagénios, presentes em todos os animais, correspondem a quase 50% da massa de todas as proteínas estruturais. Dos mais de quinze tipos de colagénios conhecidos, são particularmente importantes para a morfogénese, os tipos I, III e IV. Estes colagénios podem, através de determinados domínios, aderir entre si, a outras moléculas da matriz e a receptores celulares. Assumindo funções adesivas e anti-adesivas, influenciam processos de migração e mudanças de forma das células. Da matriz extracelular fazem ainda parte numerosas glicoproteínas adesivas, susceptíveis, tal como os glicogénios, de se ligarem, através de múltiplos domínios de ligação a outras moléculas da matriz e às células. São glicoproteínas deste tipo: a fibronectina, laminina, vitronectina, condronectina, osteonectina (= SPARC), tenascina, enctatina (= nidogénio), trombospondina, etc .. As mais importantes são as fibronectinas e as lamininas. A fibronectina está presente nos dois tipos de matrizes já referidos, existindo também de forma solúvel no plasma. É formada por duas subunidades polipeptídicas de aproximadamente 220 KD cada.Liga-se, através de domínios específicos que possui , a várias moléculas da matriz e a diversos receptores da superfície da membrana (integrinas). O primeiro destes domínios a ser identificado foi o RGD (correspondente à sequência tripeptídica «Arg-Gli-Asp.»). Posteriormente, outros domínios adesivos foram descritos, como por exemplo, o LDV «<Leu-Asp.-Va1»). 54 E. G. Crespo Estas moléculas estão envolvidas numa grande variedade de fenómenos morfogenéticos. mediando sobretudo processos de ligação celular (adesão) e de migração (fig. 6). A laminina é a glicoproteína mais importante das membranas basais. É formada por três cadeias polipeptídicas ligadas por pontes dissulfureto: uma cadeia A (400 KD) e duas cadeias B. B 1 (225 KD) e B2 (205 KD). Na sua forma mais frequente. aquelas cadeias dispõem-se de modo a formarem uma cruz. É também uma proteína com múltiplos domínios de ligação as células e a outras moléculas da matriz (fig. 7). O primeiro domínio adesivo a ser referido para esta molécula foi o YIGSR. Tem igualmente domínios RGD. Alguns dos domínios que possui têm semelhanças com o factor EGF (Epidermal Growth Factor). presumindo-se que estejam implicados na transdução de sinais para a proliferação e diferenciação celulares (Engel 1989. Yamada 1991). Além da sua eventual influência no processo de proliferação celular. a laminina assume grande importância na diferenciação dos epitélios processos de conversão do mesênquima em epitélio (aquisição de polaridade) (Ekblom 1989). Por fim. os proteoglicanos. outro dos componentes da matriz extracelular. são proteínas que estão ligadas a uma ou mais cadeias de glicosaminoglicanos (p. ex. ácido hialurónico. sulfato de condroitina. sulfato de dermatano. sulfato de queratano. sulfato de heparano/heparina). São grandes estruturas. muito ramificadas e versáteis. que ocupam grandes Fig. 6 - Esquema da molécula da fibronectina. É formada por duas cadeias polipeptídicas ligadas por pontes dissulfureto. Representam-se alguns dos seus domínios de ligação a outras moléculas da matriz (colagénios e heparina) e à célula (domínio RGD de ligação às integrinas das membranas celulares) - baseado em Alberts el ai 1989. COLAGÉNIO CÉLULA RGD HQaC COOH Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 55 espaços na matriz e manifestam grande capacidade para atrair água. Localizam-se tanto na matriz intersticial como na pericelular. Quando associados à superfície das células podem funcionar como receptores de outras moléculas da matriz. Podem assim influenciar a ligação célula-matriz. Além disso, na matriz intersticial podem também ligar-se e imobilizar certos factores difusíveis, como factores de crescimento, e influenciar assim, indirectamente, o processo de proliferação celular. São, deste modo, importantes agentes de regulação dos processos de adesão, migração e de multiplicação celulares. Como vimos, todos estes componentes da rede macromolecular que constitui a matriz extracelular podem interagir, através de domínios mais ou menos específicos, entre si e com as células. Como se faz a ligação das moléculas da matriz à superfície celular? A B1 I RGD fgr.E8~ B2 COLAGÉNIO HEPAR INA Fig. 7 - Esquema da molécula da laminina.É formada por três cadeias glicoproteicas que geralmente se dispõem em forma de cruz - uma cadeia A e duas B, B 1 e B2. Indicam-se alguns dos seus domínios de ligação a outras moléculas adesivas da matriz (colagénio e heparina) e à célula (domínios RGD). Por círculos indicam-se as principais regiões de ligação à célula. frg E8 - fragmento 8 (importante na polarização das células epiteliais: ver adiante) (baseado em Browder et ai 1991, Yamada 1991 e Thorteinsdóttir 1992). E. G. Crespo 56 Receptores celulares da matriz extracelular - integrinas A ligação entre as moléculas da matriz e a célula faz-se através de determínadas moléculas proteicas .(receptores) localizadas na membrana celular. O grupo mais importante de receptores celulares da matriz é o das integrinas. As integrinas são heterodímeros compostos por dIJas sub-unidades glicoproteicas, em geral transmembranares, a e /3, que se associam de modo não-covalente (Hynes 1987,1992 a). São moléculas evolutivamente muito conservativas (particularmente a subunidade /3), presentes em todos os animais e nos fungos (fig. 8). As integrinas estão divididas em oito subfanu1ias consoante a natureza da sua subunidade /3. Entre outras, podem citar-se as /31 ou VLA (Very Late Antigens), /32 ou Leu-CAM e /33 ou citoadesivas (Hogervost 1993). A maior parte das integrinas estão fundamentalmente envolvidas na ligação aos componentes da matriz através do reconhecimento de domínios, como o RGD, existente na fibronectina, laminina, vitronectina, etc .. Algumas, podem participar, contudo, nalguns processos interactivos celulares, como é o caso da a4 /31 e a4 /37 em relação a ligandos da famflia das imunoglobulinas (CAM -I, CAMI-V). -oe IJ) t ~ ••••••• •• ••• .m HOO~ lALINA COOH Fig. 8 - Esquema da molécula de uma integrina. É um heterodímero constituído por duas cadeias glicoproteicas, sub-unidades o. e ~. em geral, transmembranares. Liga-se através de domínios RGD a vária-s moléculas adesivas da matriz extracelular. Ao domínio citoplasmático da sub-unidade ~ ligam-se proteínas citoplasmáticas (talina. vinculina, a-actinina) que estabelecem a sua conexão com o citosqueleto (aetina). m-membrana celular (baseado em Ruoslahti 1988, em Browder et ai 1991). Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 57 Foi também demonstrado que, em casos muito particulares, podem mesmo actuar directamente na adesão célula-célula, mimetizando a acção das CAM(s). Verificou-se haver ligação directa entre os receptores 0.2 ~1 e 0.3 ~1 de célula vizinhas (Symington et ai 1993). Existem evidências de que, no caso das integrinas, podem ocorrer modificações na conformação dos seus domínios externos de ligação e, portanto, da sua acessibilidade a eventuais ligandos, moduladas por factores internos. Talvez através da fosforilação dos seus domínios citoplasmáticos, por intervenção de um factor -1 (lipídico) ou mesmo por meio de determinadas proteínas citoplasmáticas (Ginsberg et ai 1992, Hogervorst 1993). Isto vem demonstrar que as moléculas de adesão da membrana são receptores de informações, não só do exterior para o interior da célula, mas também no sentido inverso, muitas vezes em cooperação com receptores de factores de crescimento e receptores ligados à proteína G (Hynes 1992 a, Damsky & Werb 1992). Muito recentemente, foi identificado um grupo de moléculas na superfície das membranas, desintegrinas, que parecem exercer funções antagónicas das das integrinas, promovendo a disrupção da ligação célula-matriz. Estas moléculas, descobertas no veneno de Serpentes, embora também se encontrem na superfície celular, são, na sua maioria, proteínas solúveis (Blobel & White 1992). A formação dos túbulos renais dos mamíferos constitui um bom exemplo da importância da adesividade diferencial (ou selectiva) e do papel desempenhado pelas moléculas de adesão na morfogénese (Ekblom 1989, Thorsteinsdóttir 1992). Adesividade selectiva e moifogénese - A conversão mesênquimal /epitélio durante a formação do rim dos mamíferos Como se sabe, durante o desenvolvimento do rim dos mamíferos, por indução do divertículo ureteral (derivado do canal de Wolff embrionário), o mesênquima metanefrogénico condensa-se, formando o epitélio dos túbulos renais (nefrónios). No rato, utilizado como modelo neste estudo, antes da indução, expressam-se no mesênquima metanefrogénico a CAM-N (célula) e a fibronectina, a cadeia ~ da laminina e colagénios tipos I e III (matriz). 58 E. G. Crespo À medida que este mesênquima se vai condensando para formar o epitélio tubular, ocorrem profundas alterações na natureza das moléculas de adesão que são expressas. A CAM-N, bem como os colagénios, deixam de se expressar, enquanto a fibronectina, após redução inicial, aumenta mais tarde a sua expressão. Posteriormente, com o decorrer do processo de condensação epitelial, começam a expre&sar-s!l a caderina-E, a cadeia A da laminina, a integrina a6 ~l (tipo específico· de ligação à cadeia A da laminina), colagénio tipo IV e o proteoglicano de sulfato de heparano. A cadeia B da laminina expressa-se ao longo de todo o processo. O esquema e quadro que abaixo se apresentam sintetizam este processo (baseado em Ekblom 1989). mb - membrana basal. 24 h h 72 Tempoapós indução Moléculas expressas em cada fase Colagénios I e m + + + + + + + + + + Fibronectina + ± ± CAM-N + + + + + + + + + + Caderina·E Laminina B Laminina A Integrina a6 pi A utilização de anticorpos específicos veio demonstrar que as moléculas-chave deste processo de conversão do mesênquima em epitélio são a cadeia A da laminina e a caderina-E. Ambas começam a expressarse quando as células mesenquimatosas se começam a polarizar (primeiro passo para a sua transformação em epitélio). Todavia, só a primeira parece ser essencial para o processo inicial de polarização. Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 59 Anticorpos contra a caderina-E não inibem esta fase inicial do processo. O mesmo não acontece com anticorpos contra a extremidade carboxil da cadeia A da laminina (o designado fragmento E8) que inibem especificamente a polarização celular. Descobriu-se recentemente que o receptor específico deste fragmento E8 é a integrina a6 I}I. A sub-unidade a6 desta integrina expressa-se nos mesmos locais e simultaneamente com a cadeia A da laminina (Sorokin et ai 1990). O esquema que a seguir se apresenta constitui um modelo do papel desempenhado por aquelas moléculas de adesão no desenvolvimento da polarização celular. @@.~o I CAOERINA-E • ClM o -O CAOoEIAA(LAMININA) \l O INTEGRINA"'661 (Baseado em Thorsteinsdóttir 1992) Após a indução (36h~) as células começam a produzir caderina-E, a cadeia A da laminina e a integrina a6 I}I. A laminina é secretada para o futuro pólo basal das células. A interacção laminina - integrina leva à redistribuição lateral da caderina-E (inicialmente dispersa por toda a superfície lateral). Esta última, une-se às moléculas homólogas das superfícies das células vizinhas, estabelecendo o contacto primário entre as células, posteriormente estabilizado por intermédio das CIM. Apresentadas as moléculas que mais directamente intervêm no processo de adesão e descrito um modelo ilustrativo da importância da adesividade diferencial na morfogénese, põe-se a questão de como estas moléculas da adesão influenciam certos comportamentos celulares, tais como a mudança de forma das células, migrações (e outros movimentos morfogenéticos), multiplicação celular, etc., que, a nível tridimensional, consubstanciam a morfogénese, e como podem também influenciar a própria expressão génica. 60 E. G. Crespo Influência das moléculas de adesão no comportamento celular e na expressão génica Muito da influência das moléculas de adesão no comportamento celular e na própria expressão génica resulta da possibilidade de, directa ou indirectamente, se poderem ligar e interagir COIl). o "itosqueleto. Sabe-se pouco do modo como as moléculas da' família das imunoglobulinas interagem com o citosqueleto. Sabe-se algo mais sobre as caderinas. Estas, ligam-se aos microfilamentos citosqueléticos de actina por meio de pequenas proteínas, designadas cateninas. Nas desmossomas podem também ligar-se aos filamentos intermédios através de certas proteínas existentes naquela região, as placoglobinas. A ligação das moléculas da matriz extracelular ao citosqueleto por meio das integrinas das membranas é, porém, o modelo mais conhecido. Embora as duas sub-unidades u e ~ possuam, em geral, domínios citoplasmáticos, só a segunda parece ligar-se ao citosqueleto. A esta subunidade liga-se uma proteína citoplasmática, a talina, que por sua vez, se liga aos microfilamentos citosqueléticos de actina por meio de duas outra proteínas, a vinculina e a u- actinina. Como se verificou há pouco tempo, esta subunidade ~ também se pode ligar directamente à u- actinina e, por seu intermédio, ao citosqueleto (fig. 9) À semelhança do que acontece com as caderinas, também alguns tipos de sub-unidades ~, ~ I e ~4 se podem ligar, neste caso nas hemidesmossomas, aos filamentos intermédios. Na mudança da forma das células, na migração celular e noutros movimentos morfogenéticos (epibolia, invaginação, formação de estruturas tubulares, etc.), são fundamentalmente importantes os múltiplos e coordenados contactos que se estabelecem e desfazem quer entre células, quer entre estas e a matriz, quer ainda entre os diferentes componentes da matriz. São estes contactos que, por via mecânica - deformação física directa - ou por via química - polimerização diferencial das moléculas citosqueléticas de actina, tubulina, etc.; controle da interacção actinamiosina I (Egelhoff & Spudich 1991); mobilização do Ca2+; alteração do pH - , vão influenciar a arquitectura do citosqueleto e daí os supracitados fenómenos. É óbvio que nestes intervêm igualmente muitos outros factores além das moléculas de adesão. Nalguns movimentos morfogenéticos é também, muitas vezes, decisiva a intervenção damultiplicação (e/ou morte) celular (figs. 10-12). Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 61 Fig. 9 - Esquema da ligação das moléculas adesivas da matriz ex~ tracelular (fibronectina, laminina, colagénio, etc.), ao citosqueletõ (microfilamentos de actina), por intermédio das integrinas das membranas e de proteínas citoplasmáticas (lalina, vinculina, a-actinina). m-membrana celular (baseado em Gilbert faminina, colagénio. 1991 aj. , FASE ESTACIONARIA 00 o FASE MIGRADORA o "o ....... ACTlNA, oe: ACTININA ~. o . .. "O . '::r.-........ P ~ ~ -::C' :_C1 ::r'jl':C:O ....." •• ., 0'" o VINCULlNA o ~- ..," .. TA UNA oa =t~;:::t;;::~'!=f=t~:=~f o __ 000 o o o o o o o FIBRONECTlNA ~;..;;..::;..;........;...~;.....,.g;",.- Fig. 10 - Modelo teórico das relaçôes da célula com a matriz extracelular numa fase estacionária e numa fase migradora (baseado em Le Moigne 1989). Na fase estacionária estabelece-se uma forte ligação do citosqueleto celular (actina) às moléculas de adesão da matriz (neste caso representa-se apenas a fibronectina), por meio das proteínas citoplasmáticas, talina, vinculina e a-actinina e das integrinas da membrana. Na fase migragradora desfaz-se, melhor dizendo, dinamiza-se, esta ligação. 62 E. G. Crespo - o IGALTASE 9°' \. NA eglc / ~at J'..; " NAcglc / 9°' NAcglc / 901 NAcglc / 901 I Fig. 11 - Modelo da migração de uma célula mesênquimatosa em que intervem a galactosiltransferase (Galtase) da superfície da membrana. Neste caso, este tipo de CAM enzimática, reconhece e adere a resíduos expostos galactose-N-acetilglucosamina (NAcgl) da matriz extracelular. A célula desloca-se (no sentido indicado pelas setas) catalizando a adição da galactose (gal) àqueles resíduos, desligando assim a célula da matriz e levando as Galtases da superfície celular a procurarem novos locais não-galactosilados da matriz (baseado em Shur 1982 cf. Gilbert em Developmental Biology, 2,- ed. 1988). A B b·I·l·I·I~1·J '. Fig. 12 - Esquema, muito simplificado, do papel desempenhado pela contracção dos microfilamentos apicais na formação de estruturas tubulares (p. ex., tubo neural). No que se refere à proliferação celular, já tivemos oportunidade de referir que, determinadas moléculas da matriz - alguns tipos de colagénio, proteoglicanos - e ainda outras glicoproteínas como a osteonectina (SPARCl, tenascina e trombospondina, tinham a capacidade de se ligar a certos factores de crescimento como o EGF - Epidermal Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 63 Growth Factor (En gel 1989) e o PDGF - Platelet Derived Growth Factor e o TGF - ~ I - Transforming Growth Factor (Sage e Bomstein 1991), modulando assim a sua acção naquele processo. Nalgumas moléculas da matriz que se ligam às integrinas, nomeadamente nas lamininas (Engel 1989) e nas caderinas (Hynes 1992 b, Pouliot 1992), foram identificados domínios relacionados .c om a proliferação celular. Admite-se que possam de algum modo influenciar as vias de transdução do sinal que actuam no processo da divisão celular, através da sua ligação, mediada pelas integrinas, ao citosqueleto. Sistema de transdução do sinal Muitas das informações externas, veículadas por agentes que não atravessam as membranas celulares, como certas proteínas indutoras, hormonas proteicas, factores de crescimento, etc., são transduzidas para o interior da célula, através de determinados receptores proteicos localizados nas membranas. Existem três grupos principais de receptores deste tipo: ligados a canais, catalíticos e ligados à proteína G (Alberts et ai 1989). Durante o desenvolvimento, os sinais morfogenéticos são sobretudo canalizados através destes dois últimos. Os catalíticos, caso dos receptores de factores de crescimento (EGF, PDGF, etc.), quando activados pelos sinais exteriores, operam directamente como enzimas. Quase todos são proteínas transmembranares com um domínio citoplasmático que funciona como uma proteína-cinase específica da tirosina. Quando actuados externamente, transferem o grupo fosfato terminal do ATP para o grupo hidroxil do resíduo tiro sina da proteína seleccionada e, através da sua activação, regulam a transcrição génica. Os receptores ligados à proteína G activam (ou desactivam) indirectamente determinadas enzimas ligadas à membrana celular ou a determinados canais iónicos. Esta acção é mediada por uma proteína, designada por proteína reguladora da ligação GTP (ou proteína G). Existem duas vias principais pelas quais os receptores ligados à proteína G, podem produzir segundos mensageiros intracelulares - a via dl AMPc e a via do Ca'·. Na primeira destas vias, a proteína G actua sobre a adenilato cic1ase, levando-a a produzir AMPc que vai, por sua vez, alterar a actividade de 64 E. G. Crespo outras proteínas alvo e, através de uma cascata de interacções mais ou menos complexas, influenciar também proteínas reguladoras da transcrição do DNA. Na segunda via, a proteína G vai activar uma fosfalipase C que, por sua vez, vai agir sobre um grupo de fosfolípidos da membrana (fosfolípidos do inositol). O mais importante é o PI P2 (fosfatidilinositol - bis-fosfato) localizado na superfície interna da membrana. Por acção da fosfolipase C, o PI P2 cinde-se então em dois produtos: trifosfato de inositol (InsP3) e diacilglicerol. O InsP3, uma pequena molécula solúvel, vai promover a libertação do Ca'+ «sequestrado» em determinados compartimentos intracelulares, abrindo os respectivos canais membranares, aumentando assim a sua concentração no citosol. Quanto ao diacilglicerol pode, por um lado, ser utilizado na síntese de prostaglandinas (moléculas sinalizadoras Iipídicas) ou activar proteína-cinases específicas - neste caso proteína-cinases C (cálcio - dependentes).Quando simultaneamente activadas pelo diacilglicerol e pelo cálcio, estas proteína-cinases transferem o grupo fosfato do ATP para resíduos específicos serina ou treonina de determinadas proteínas-alvo, activando-as e, paralelamente, podem fosforilar e activar «bombas» Na+ - H+ que controlam O pH intracelular, aumentando o seu nível, o que pode constituir sinal estimulador da proliferação celular. O que foi dito acerca do «sistema de transdução do sinaI» pode ajudar-nos a explicar uma última questão que se nos coloca - como é que as moléculas de adesão poderão influenciar a expressão génica? Influência da adesão na expressão génica Torna-se quase óbvio que as alterações do citosqueleto, provocadas pelas múltiplas interacções das moléculas de adesão, influenciam a forma das células, as migrações e outros movimentos morfogenéticos de que já falámos. É talvez mais difícil perceber como estas moléculas influenciam a expressão génica, isto é, induzem as células a produzir proteínas diferentes de acordo com as novas topografias, os novos fenótipos que progressivamente se vão construindo. Como está demonstrado que as moléculas de adesão não interagem directamente como os receptores do sistema de transdução do sinal a que Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a moifogénese 65 atrás nos referimos, resta a possibilidade de influenciarem a expressão génica através da sua ligação com o citosqueleto. Existem várias evidências que sugerem que, não s6 os microfilamentos citosqueléticos como também os componentes da designada «placa de adesão» (associação talina-vinculina - a-actinina) estão envolvidos nos mecanismos de transdução do sinal que .regulam a expressão génica (Ben Ze'ev 1991). Na periferia dos locais de lig~ção da placa de adesão ao citosqueleto existem numerosas moléculas que intervêm no sistema de transdução do sinal, tais como tirosina-cinases, proteína-cinases C, proteases cálcio-dependente, fosfatases e, até, reguladores da transcrição. Estas moléculas poderiam estar como que sequestradas através da sua associação ao citosqueleto e à placa de adesão e serem libertadas (activadas), em função de eventuais alterações da sua organização. Esta é, portanto, uma das possibilidades das moléculas de adesão da matriz influenciarem a expressão génica por meio de alterações que, por via mecânica ou química, provoquem na organização do citosqueleto (e placa de adesão). Uma outra possível via de influência baseia-se no facto de se ter verificado que, algumas das moléculas que constituem a placa de adesão, vinculina e a -actinina, por exemplo, têm capacidade de interagir com lípidos. Poderiam, neste caso, influenciar a expressão génica, por interferência com a via de transdução do sinal dos fosfolípidos do inositol a que atrás nos referimos (fig. 13). De futuro, interessará identificar, em vários sistemas de desenvolvimento, toda a sequência de acontecimentos que vão desde um determinado tipo de acção adesiva, aos novos produtos génicos a que eventualmente dará origem, a fim de se poderem tirar conclusões mais objectivas e gerais àcerca do papel da adesão celular na regulação da expressão génica. De tudo aquilo que foi exposto, pode considerar-se que a diferenciação celular e a morfogénese são dois fenómenos estritamente interdependentes. Numa certa perspectiva, pode mesmo considerar-se que a morfogénese é apenas um epifenómeno da diferenciação celular. Ambas, têm por fundamento a expressão génica diferencial e os mecanismos que a regulam no decurso do desenvolvimento. 66 E. G. Crespo C-CITOSOUElETO F1-FOS"ATASES 1- INTl:ORIN A. mC-MEIIIB. CELULAR M- " ATAIZ EXTRACELULAR N- NÚCLEO Pa-PLACA DE ADESÃO ftalin.,vlnculln.,ETC .. 1 Pr- PROTEíNA'-CINASES Rt- REGULADORES OE tran scrição Fig. 13 - Modelo das e.ventuais interacções entre as moléculas reguladoras do sistema de transdução do sinal e os componentes da via de ligação das moléculas de adesão da matriz extracelular ao citosqueleto - ver texto (baseado em Ben Ze'ev 1991) Na citodiferenciação e na organização espacial das células embrionárias desempenham papel importante os designados genes homeobox e uma vasta gama de moléculas - homeoproteínas, RNAm, ácido retin6ico, factores peptídicos de crescimento, CAM, CJM, SAM, integrinas e outros tipos de receptores das membranas celulares, certas proteínas citoplas-máticas (talina, vinculina, a-actinina) e o citosqueleto. São as dinãmicas e complexas interacções deste ecossistema molecular que, em tempos e em topografias bem definidos, contribuem para a regulação da expressão não s6 dos genes homeobox, mas também, naturalmente, de muitos outros genes envolvidos em processos específicos de diferenciação celular (e morfogénese) . Do Gene ao Embrião - a diferenciação celular e a morfogénese 67 SíNTESE Como introdução histórica ao tema deste trabalho referem-se algumas das principais questões e etapas da via que conduziu à modema Biologia do Desenvolvimento. Na sua essência, esta via traduz todo O processo que levou o fenótipo (embrião) a ser compreendido em termos das interrelações genótipo/ambiente (celular e supracelular). De uma embriologia puramente fenotípica (morfológica), passou-se para uma embriologia genética (molecular), que interpreta o desenvolvimento como resultado da expressão génica diferencial (e dos mecanismos que a controlam). A génese da diversidade celular (citodiferenciação) e a sua organização espacial (morfogénese) são dois fenómenos intimamente interdependentes. Ambos têm por base a expressão génica diferencial. A diferença resulta apenas de facto da citodiferenciação ser, por vezes, arbitrariamente circunscrita ao diálogo núcleo-citoplasma. Na morfogénese, o problema da regulação da expressão génica tem de ser sempre perspectivado no contexto de complexas interacções, que envolvem não só as próprias células, mas também um vasto ecossistema molecular, por elas produzido, que inclui moléculas da superfície das membranas, moléculas da matriz e dos fluídos extracelulares. São as dinâmicas e complexas interacções dos componentes deste ecossistema molecular embrionário, entre si e com os genes, que explicam a morfogénese e muitos dos fenómenos que, a nível tridimensional, a consubstanciam, tais como a multiplicação celular, adesão selectiva, migração e mudanças de forma das células. Esta progressiva organização espacial das células, que se vai operando durante a morfogénese, na medida em que cria novas topografias, novos ambientes, vai por sua vez influenciar o processo que intrinsecamente lhe está na base, a expressão génica diferencial e, correlativamente, a citodiferenciação. Uma das questões fulcrais da morfogénese é a de como as células obtêm informação das suas topografias embrionárias de modo a que, em sua função, realizem os adequados programas de diferenciação. Excluindo o caso de certas vias de citodiferenciação precocemente determinadas (desenvolvimento em mosaico), e portanto relativamente independentes do meio externo, a maior parte das linhas celulares realizam os seus programas de diferenciação, progressivamente, através de 68 E. G. Crespo sucessivas informações que vão trocando com as células vizinhas através de certos factores difusíveis - morfogenes, hormonas, factores de crescimento, etc. - e/ou por contactos (adesão) que estabelecem entre si ou com a matriz extracelular. No âmbito da problemática da informação de posição faz-se referência à teoria dos gradientes morfogenéticos e ao envolvimento de determinados genes (genes homeobox) na especificação topográfica do embrião. É destacada a circunstância dos mecanismos de acção destes genes homeobox se terem conservado durante muitos milhões de anos de evolução. Por fim, é abordado o papel de adesão celular, através da vasta gama de moléculas envolvidos neste processo na morfogénese e em certos comportamentos celulares que a consubstanciam, e na própria expressão génica. AGRADECIMENTOS A Dr.' Solveig Thorsteinsdóttir agradeço a cedência de muita da bibliografia que utilizei neste trabalho. REFER~NCIAS AFFOL1ER, M., SCHIER, A. & GEHRING, W. J. 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