Formação Econômica do Brasil - Teca CECIERJ

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Alexis Toríbio Dantas
Angela Moulin S. Penalva Santos
Volume 1
Formação Econômica do Brasil
Formação Econômica do Brasil
Volume 1
Apoio:
Alexis Toríbio Dantas
Angela Moulin S. Penalva Santos
Fundação Cecierj / Consórcio Cederj
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Material Didático
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Alexis Toríbio Dantas
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MATERIAL DIDÁTICO
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AVALIAÇÃO DO MATERIAL
DIDÁTICO
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REDATOR FINAL
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Carlos Gustavo Barros Jaimovich
Fernanda Veneu
Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio
eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Fundação.
D192f
Dantas, Alexis Toríbio.
Formação Econômica do Brasil. v. 1./ Alexis Toríbio
Dantas; Angela Moulin S. Penalva Santos. - Rio de Janeiro:
Fundação CECIERJ, 2009.
149p.; 19 x 26,5 cm.
ISBN: 85-7648-150-2
1. Condições econômicas. 2. Economia cafeeira. 3. Crise
econômica. 4. República velha. I. Penalva, Angela Moulin
S. Santos. II. Título.
2009/1
CDD: 330.981
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Governo do Estado do Rio de Janeiro
Governador
Sérgio Cabral Filho
Secretário de Estado de Ciência e Tecnologia
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NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO
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RIO DE JANEIRO
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UNIRIO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO
DO RIO DE JANEIRO
Reitora: Malvina Tania Tuttman
Formação Econômica do Brasil
SUMÁRIO
Volume 1
Aula 1 – Formação econômica do Brasil colonial .......................................... 7
Angela Moulin S. Penalva Santos
Aula 2 – Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam
o povoamento do interior..............................................................29
Angela Moulin S. Penalva Santos
Aula 3 – A crise da economia colonial no Brasil.......................................... 47
Alexis Toríbio Dantas
Aula 4 – Economia cafeeira escravista........................................................ 71
Alexis Toríbio Dantas
Aula 5 – Economia cafeeira com trabalho livre........................................... 85
Alexis Toríbio Dantas
Aula 6 – Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha ....................................................................... 99
Alexis Toríbio Dantas
Aula 7 – Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil............................ 119
Angela Moulin S. Penalva Santos
Referências ........................................................................................... 143
Todos os dados apresentados nas atividades desta disciplina são fictícios, assim como os nomes de empresas que não
sejam explicitamente mencionados como factuais.
Sendo assim, qualquer tipo de análise feita a partir desses dados não tem vínculo com a realidade, objetivando apenas
explicar os conteúdos das aulas e permitir que os alunos exercitem aquilo que aprenderam.
1
AULA
Formação econômica
do Brasil colonial
Meta da aula
objetivos
Apresentar a dinâmica da empresa colonial agrícola
no Brasil nos séculos XVI e XVII, destacando a
economia canavieira no Nordeste como modelo de
atividade típica.
Esperamos que, ao final desta aula, você seja
capaz de:
1
Descrever o contexto econômico em que
ocorreu a expansão comercial européia nos
séculos XV e XVI.
2
Caracterizar a ocupação portuguesa do Brasil
nos séculos XVI e XVII.
3
Identificar as principais características da
economia canavieira no Nordeste brasileiro.
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
INTRODUÇÃO
O estudo da formação econômica do Brasil é muito importante para um
curso de graduação em Administração, porque permite o conhecimento
da estrutura econômica e dos negócios que sustentaram o país em sua
ATIVIDADES
PRIMÁRIAS
Ao estudar os efeitos
do progresso técnico
sobre o desenvolvimento
econômico, o
economista Colin Clark
identificou três tipos de
atividades: as primárias
(agricultura); as
secundárias (indústria)
e as terciárias (serviços).
Países muito dependentes
das atividades primárias,
isto é, dos seus recursos
naturais, são menos
desenvolvidos do que
aqueles que se sustentam
mais nas atividades
secundárias e terciárias.
etapa inicial de desenvolvimento. Ao analisar o contexto econômico e os
negócios mais rentáveis em cada período histórico, você, estudante de
Administração, desenvolve a habilidade de identificar as relações entre o
ambiente econômico, a presença – apoio –, em maior ou menor grau do
governo, o desenvolvimento tecnológico e o mercado de trabalho.
Na disciplina Formação Econômica do Brasil (FEB), você estudará o período
que vai da chegada dos portugueses à Colônia até o início dos anos 1960,
quando a economia brasileira deixou de estar sustentada nas
PRIMÁRIAS,
ATIVIDADES
tornando-se uma economia industrial. Você analisará a dinâmica
atual na disciplina Economia Brasileira Contemporânea.
Não por acaso, o nome desta disciplina é
homônimo de uma das principais obras de
CELSO FURTADO, o mais importante economista
brasileiro do século XX. Em 1959, foi publicada
EMPRESA
(COLONIAL)
AGRÍCOLA
Modelo econômico de
colonização adotado
por países europeus
nos séculos XV e
XVI. Consistia em
transformar a colônia
em produtora de
especiarias, que não
podiam ser obtidas na
Europa, principalmente
devido ao clima:
açúcar, cacau, canela,
por exemplo. Segundo
este modelo, toda a
produção colonial estava
destinada à metrópole,
que a comprava a baixos
preços e a revendia na
Europa, acumulando os
lucros desta transação.
a primeira edição de Formação Econômica do
Brasil, livro considerado uma das mais influentes
interpretações da história do Brasil, analisando
desde a ocupação da Colônia, no século XVI,
até a relação entre a crise da economia cafeeira
e as origens da indústria, na primeira metade do
século XX.
Nesta primeira aula, você verá, antes de tudo, que
a ocupação econômica da América foi uma das
conseqüências da expansão comercial da Europa.
Vamos tratar um pouco deste tema, com ênfase à
colonização portuguesa e ao Brasil. Você iniciará
uma viagem pela história econômica da maior
colônia portuguesa, identificando como a EMPRESA
AGRÍCOLA,
implantada pelos colonos portugueses
no Nordeste, foi importante para a expansão
mercantilista européia nos séculos XVI e XVII e
quais suas conseqüências para o desenvolvimento
da economia colonial em nosso país.
8
CEDERJ
CELSO FURTADO
(1920-2004)
Nascido na Paraíba,
o economista Celso
Furtado influenciou
mais de uma geração
de economistas
preocupados com
o desenvolvimento
econômico na
América Latina, no
Brasil e na estagnada
Região Nordeste. Sua
influência manifestase por meio de sua
vasta produção
bibliográfica
e no exercício
de importantes
cargos públicos,
aliando a teoria à
prática em prol do
desenvolvimento
econômico com
justiça social.
A empresa colonial agrícola, iniciada com a introdução da
monocultura do açúcar no Nordeste pelos portugueses, foi uma
experiência de grande sucesso e única durante o século XVI. Para
que você possa entendê-la, vamos situar o contexto em que ela se
desenvolve.
A expansão comercial européia, iniciada em fins da Idade
Média, rompeu com o isolamento econômico típico do
FEUDAL.
PERÍODO
O mar Mediterrâneo tornou-se a mais importante rota de
comércio, beneficiando, principalmente, as cidades italianas, dentre
elas Gênova e Veneza. Dado o elevado custo de transporte e de risco
do empreendimento comercial, apenas a comercialização de produtos
de grande valor de mercado – com pouco volume e peso, como as
especiarias orientais (pimenta-do-reino e canela, por exemplo) – era
!
economicamente viável.
Feudalismo hoje
Em junho de 2004, a Estação
Ciência, da Universidade de São Paulo
(USP), reabriu a exposição O Castelo Medieval
e o Feudalismo, disponível em:
http://www.eciencia.usp.br/Exposicao/feudalismo/.
Leia, na apresentação da exposição, o texto do Prof.
Hilário Franco Junior, do Departamento de História
da Universidade de São Paulo (USP). Ele afirma que
alguns tipos de relação social característicos
do feudalismo, como o favorecimento
de amigos em detrimento da lei,
perduram até hoje.
1
PERÍODO
FEUDAL/
AULA
COMO SURGIU A EMPRESA COLONIAL AGRÍCOLA?
FEUDALISMO
Chamamos feudalismo
ou sistema feudal o
modo com que a vida
em sociedade estava
organizada na Europa
durante a Idade Média.
Esta organização variou
muito segundo a época
e o local. Em linhas
gerais, podemos dizer
que a sociedade feudal
tinha como bases o
poder descentralizado, a
economia agropastoril e
o trabalho dos servos.
Em termos de
organização social,
havia três estamentos:
clero, nobreza e servos.
As relações entre
estes grupos eram
extremamente desiguais.
Clero e nobreza ditavam
as regras sociais e
econômicas, bastante
desfavoráveis para
os servos. A Igreja
Católica controlava
as idéias religiosas da
época e os reis ainda
não eram figuras fortes,
seu poder era muito
descentralizado.
Saiba mais sobre o
feudalismo em http://
www.saberhistoria.hpg.ig
.com.br/feudalismo1.htm
Veneza
Gênova
Constantinopla
Espanha
Portugal
Jerusalém
Figura 1.1: Você pode verificar que a tomada de Constantinopla dificultou o acesso ao Oriente pelo Mediterrâneo,
levando à busca por rotas alternativas, o que favoreceu os povos ibéricos em sua rota através do oceano Atlântico.
CEDERJ
9
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
A tomada de Constantinopla (atualmente Istambul, Turquia) pelos
turcos, em 1453, dificultou a manutenção da rota comercial que ligava
as cidades mediterrâneas às fontes de especiarias. Os turcos passaram
a controlar o comércio na região, impedindo o acesso de portugueses e
espanhóis, desestruturando o comércio de longa distância e estimulandoos a descobrir novas rotas comerciais. Iniciou-se, assim, uma nova etapa
da história mundial: 1453 é considerado o ano que marca o fim do
feudalismo (396-1453) e o início da era moderna (1453-1789).
PORTUGAL ENTRA EM CENA
Desde meados do século XV, os portugueses já vinham explorando
a rota do Atlântico, estabelecendo-se em algumas localidades da costa
africana, onde cultivavam a cana-de-açúcar. Seu objetivo, porém, era
alcançar os fornecedores de especiarias localizados nas Índias utilizando
a rota do oceano Atlântico. Para isso, aprimoraram a tecnologia de
construção de navios, o que lhes permitiu vencer a travessia daquele que
era chamado “mar Tenebroso”, que ganhou este nome por ser muito mais
difícil de navegar do que as águas calmas do Mediterrâneo. Essa conquista
ocorreu durante o século XV, auge do império marítimo português – que
marcou profundamente a cultura do país, como exemplifica o poema
Mar Portuguez, do poeta Fernando Pessoa (1888-1935).
?
Você deve estar se
perguntando por que Portugal
foi o primeiro país a desenvolver a
tecnologia naval necessária para grandes
navegações. O primeiro motivo está relacionado
à atividade econômica: a necessidade de pesca para
alimentar a população. A organização do grupo de
estudos chamado Escola de Sagres – integrando
cientistas e navegadores de diversos credos e
formações – foi, segundo os historiadores,
outra razão para o pioneirismo
português.
10
CEDERJ
!
AULA
1
Para saber mais sobre a
tecnologia desenvolvida para as
grandes navegações, veja os itens: Razões
do Pioneirismo e Os Instrumentos dos Pilotos,
em http://novaescola.abril.uol.com.br/ed/118_dez98/
html/multi.htm.
Agora, se você quiser saber as diferenças entre
caravelas, galeras e naus, viaje até http:
//educaterra.terra.com.br/voltaire/500br/
br_descoberta9.htm.
Atividade 1
Navegando com Fernando Pessoa
O poeta português Fernando Pessoa imortalizou a façanha de seus conterrâneos na
conquista dos mares em poemas como este:
Mar Portuguez
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão resaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abysmo deu,
Mas nelle é que espelhou o céu.
Identifique duas passagens em que o poeta indica a dificuldade do empreendimento
marítimo português. Relacione-as com as circunstâncias da época que levaram os
portugueses a enfrentarem o desafio da navegação a mar aberto.
_________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Versos como “Quanto do seu sal são lágrimas de Portugal” ou “Quem quer
passar além do Bojador tem que passar além da dor” sugerem a dificuldade
do empreendimento pela dor que causou. Essa dificuldade seria justificada pela
perspectiva dos ganhos comerciais que o descobrimento de novas rotas mercantis
poderia proporcionar aos controladores da nova rota comercial para as Índias.
Na verdade, se você prestar atenção, verá que, em quase todos os versos,
revela-se a dificuldade desse empreendimento português.
CEDERJ
11
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
A OCUPAÇÃO PORTUGUESA NA COLÔNIA
G RRAANNDDEESS
N AAVVEEGGAAÇÇÕÕEESS
Este
Este éé oo nome
nome consagrado
consagrado
pela
pela historiografia
historiografia para
para
referir-se
referir-se àà expansão
expansão
marítima
marítima ocorrida
ocorrida nos
nos
séculos
séculos XV
XV ee XVI
XVI que
que
ampliou
ampliou as
as rotas
rotas comerciais,
comerciais,
unindo
unindo aa Europa
Europa àà África
África
ee Ásia.
Ásia. As
As Grandes
Grandes
Navegações
Navegações tiveram
tiveram por
por
maior
maior conseqüência
conseqüência aa
ocupação
ocupação do
do continente
continente
americano,
americano, então
então chamado
chamado
“Novo
“Novo Mundo”.
Mundo”.
O descobrimento do Brasil foi uma etapa da conquista do
oceano Atlântico, fazendo parte do grande movimento expansivo
deflagrado pelas
GRANDES NAVEGAÇÕES.
A partir do século XV, o
Mediterrâneo perdeu a centralidade no comércio mundial, que se
deslocou para o Atlântico.
M EERRCCAANNTTIILLIISSM
MO
O
Política
Política econômica
econômica de
de
caráter
caráter protecionista,
protecionista, oo
mercantilismo
mercantilismo se
se desenvolveu
desenvolveu
na
na Europa
Europa ao
ao longo
longo dos
dos
séculos
séculos XVI,
XVI, XVII
XVII ee XVIII.
XVIII.
Sua
Sua base
base éé oo acúmulo
acúmulo de
de
capital
capital –– representado,
representado,
naquele
naquele período,
período, por
por
metais
metais preciosos
preciosos (ouro
(ouro ee
prata,
prata, principalmente),
principalmente),
protecionismo
protecionismo alfandegário
alfandegário
ee balança
balança de
de comércio
comércio
favorável.
favorável. Com
Com oo
absolutismo,
absolutismo, formava
formava os
os
alicerces
alicerces do
do Antigo
Antigo Regime.
Regime.
Segundo
Segundo oo pensamento
pensamento que
que
vigorava
vigorava àquela
àquela época,
época, os
os
governos
governos precisavam
precisavam crescer,
crescer,
expandir-se,
expandir-se, ir
ir além
além das
das
fronteiras
fronteiras nacionais.
nacionais. Para
Para
isto,
isto, era
era preciso
preciso acumular
acumular
recursos.
recursos. Como
Como os
os países
países
europeus
europeus não
não dispunham
dispunham
de
de ouro
ouro ee prata,
prata, planejaram
planejaram
conquistar
conquistar outros
outros territórios
territórios
para
para obtê-los,
obtê-los, as
as colônias.
colônias.
Lá,
Lá, poderiam
poderiam também
também
manter
manter sua
sua balança
balança
comercial
comercial favorável,
favorável,
forçando
forçando oo monopólio
monopólio ee
mantendo
mantendo taxas
taxas elevadas
elevadas de
de
comércio
comércio para
para suas
suas colônias.
colônias.
Foi
Foi oo que
que aconteceu
aconteceu com
com
Portugal,
Portugal, Espanha,
Espanha, França
França
ee Inglaterra,
Inglaterra, entre
entre outros
outros
países.
países.
12
CEDERJ
Figura 1.2: O Monumento aos Descobrimentos foi construído à beira do
rio Tejo, em Lisboa, em 1960, como homenagem a D. Henrique, patrono
das navegações. Segundo os historiadores, desse lugar saiu, em março de
1500, a esquadra comandada por Cabral que chegaria ao Brasil em 22 de
abril do mesmo ano.
Portugal era, a essa época, uma monarquia absolutista.
Era um dos vários estados absolutistas europeus que surgiram
como a estrutura política que a burguesia – que ascendia no
cenário econômico – encontrou para garantir o apoio oficial
a seus interesses comerciais. Esses interesses caracterizaram o
MERCANTILISMO,
garantindo os lucros do comércio por meio de um
modelo de comércio exterior protecionista.
1
AULA
Estados
absolutistas
Ao final da Idade Média, o crescimento
da população, o desenvolvimento do
comércio e das cidades, assim como a ausência dos
senhores feudais – então nas Cruzadas – provocaram
o enfraquecimento do poder local e o fortalecimento do
poder dos reis.
Os estados absolutistas foram a nova organização política a partir
do século XV. Alicerçados no poder do rei e da Igreja, tiveram como
características a centralização do poder, o crescimento do nacionalismo
e a unificação territorial.
A burguesia comercial foi uma importante aliada neste processo, apoiando
política e financeiramente os monarcas. Em troca, estes criaram um sistema
administrativo mais organizado, unificando moedas e impostos, o que
proporcionou, à burguesia, facilidades no comércio.
?
Burguesia
Classe social que surgiu, na Europa, com o renascimento comercial e das cidades
ao fim do período feudal. Os que mais tarde foram chamados burgueses
– médicos, artesãos, comerciantes, entre outros – viviam em aglomerados à
volta dos castelos medievais, os burgos.
Segundo os historiadores, ao longo de toda a sua história, a burguesia
esteve associada ao poder. Aliada aos reis das nações que começavam a
formar-se no século XV, ajudou a diminuir a influência do clero e da
nobreza na sociedade. Financiou, entre outras realizações, as grandes
navegações do século XVI e as atividades artísticas do século XVII
(Renascimento).
A burguesia passou a dominar a vida social, política e
econômica após a Revolução Francesa, no século
XVIII, ocasião em que viu atendido seu principal
interesse de classe: a garantia dos direitos
de propriedade, fundamento de uma
sociedade capitalista.
Um
Umdos
doscompositores
compositoresmais
maispolêmicos
polêmicosda
dadécada
décadade
de1980
1980no
noBrasil,
Brasil,Cazuza
Cazuzatrata
tratado
do
tema
temaem
emsua
suamúsica
música"Burguesia".
"Burguesia".Entre
Entreoutras
outrasafirmações,
afirmações,está
estáaade
deque
que“enquanto
“enquanto
houver
houverburguesia
burguesianão
nãovai
vaihaver
haverpoesia.”
poesia.”EEvocê,
você,ooque
queacha?
acha?
CEDERJ
13
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
A consolidação de Portugal como Estado Nacional moderno
ocorreu no século XVI. O governo absolutista lusitano financiou as
grandes navegações, conquistando novos territórios e submetendo-os
PPAACCTTOO
CCOOLLOONNIIAALL
“Conjunto
“Conjunto de
de
relações
relações econômicas
econômicas
ee políticas
políticas que
que
subordinavam
subordinavam aa
colônia
colônia àà metrópole.
metrópole.
No
No plano
plano político,
político,
aa dominação
dominação era
era
exercida
exercida por
por meio
meio
da
da presença
presença de
de
autoridades
autoridades civis
civis
nomeadas
nomeadas pela
pela
metrópole
metrópole ee cujo
cujo
desempenho
desempenho era
era
assegurado
assegurado pela
pela
ocupação
ocupação militar.
militar. No
No
campo
campo econômico,
econômico,
oo Pacto
Pacto Colonial
Colonial
significava
significava uma
uma série
série
de
de obrigações
obrigações de
de
compra
compra ee venda
venda da
da
colônia
colônia para
para com
com
aa metrópole,
metrópole, sendo
sendo
os
os mecanismos
mecanismos
desse
desse comércio
comércio
controlados
controlados de
de
forma
forma monopolista
monopolista
pelas
pelas companhias
companhias de
de
comércio”.
comércio”.
Paulo
Paulo Sandroni
Sandroni
–– Novíssimo
Novíssimo
Dicionário
Dicionário de
de
Economia.
Economia.
ao PACTO COLONIAL.
A ocupação do Brasil no período colonial (1500 a 1822)
está intimamente ligada à expansão comercial e colonial européia.
Inicialmente, esta era uma disputa que envolvia os países ibéricos.
Segundo Celso Furtado (1971), a luta entre Espanha e Portugal pelas
terras americanas foi muito difícil em função da quantidade de terras
a defender.
A Espanha encontrou ouro e prata em suas colônias, o que lhe
permitiu financiar a defesa contra possíveis invasões estrangeiras. Seu
sistema de defesa estendia-se da Flórida à embocadura do rio da Prata.
Mesmo com a abundância dos recursos de que dispunha, a Espanha
não conseguiu evitar que seus inimigos invadissem as Antilhas e o norte
do continente sul-americano, onde ingleses, franceses e holandeses
estabeleceram-se, fundando as Guianas Inglesa e Francesa e o Suriname
(ex-Guiana Holandesa).
Figura 1.3: No Museu do Ouro, em Bogotá (Colômbia), podemos observar
como os povos indígenas que habitavam a América espanhola trabalhavam
a riqueza mineral ali existente.
14
CEDERJ
1
AULA
?
A divisão do
continente americano
Espanhóis e portugueses disputaram
as terras do novo continente americano. Essa
disputa foi mediada pelo papa – que, àquela época,
tinha autoridade equivalente à da Organização das Nações
Unidas (ONU) para dirimir conflitos internacionais.
O resultado dessa negociação foi a assinatura do tratado de
Tordesilhas (1494). Com esse documento, convencionou-se que
as terras a oeste do meridiano que corta o Brasil desde o Pará até
Santa Catarina ficavam sob o domínio espanhol. Já os portugueses
ficavam com as terras situadas a leste dessa linha imaginária.
Assinado seis anos antes da chegada de Pedro Álvares Cabral ao
Brasil, parecia que o tratado tinha beneficiado os espanhóis,
quanto às terras americanas. Estes imaginavam estar
cedendo apenas oceano aos portugueses. Entretanto,
o fato de os portugueses terem assinado o
tratado pode ser considerado um indicador
de que eles já deviam ter indícios da
existência do Brasil.
Figura 1.4: O Tratado de Tordesilhas dividia, com uma linha vertical, o Novo Mundo entre
Espanha (à esquerda da linha) e Portugal (à direita). Repare que a parte reservada para
Portugal era muito menor do que a área destinada à Espanha. Será que os portugueses
teriam aceito essa divisão totalmente desigual sem reclamar ou sem saber que havia outras
terras além das conhecidas pelos espanhóis? O mapa à esquerda é um planisfério de 1545,
disponível no site da Biblioteca Nacional de Lisboa. Repare que a linha do tratado passava
bem no meio do que hoje é o território brasileiro. Compare as figuras. No mapa à direita,
constam algumas cidades que ainda não existiam. Não se assuste, isto é só para você ter
uma noção de por onde passava a linha do tratado.
Fonte da figura à esquerda: http://bnd.bn.pt/ed/viagens/brasil/iconografia/antecedentes/
tratado_tordesilhas/index.html
Fonte da figura à direita: http://pt.wikipedia.org/wiki/Tratado_de_Tordesilhas
CEDERJ
15
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
!
Quer ler o tratado de
Tordesilhas na íntegra? Ele está
disponível no site da Biblioteca Nacional de
Lisboa: http://bnd.bn.pt/ed/viagens/brasil/obras/
tratado_tordesilhas/index.html. Vale a pena dar uma
olhada. Repare a linguagem utilizada e como é
forte a presença de referências religiosas,
marca da época em que foi
Por não encontrar metais preciosos em seus novos domínios,
Portugal enfrentou mais dificuldades para defender seu território
americano, o Brasil. Como não tinha recursos suficientes, precisou
implantar uma atividade muito lucrativa para financiar a defesa da
própria colônia, além de permitir a transferência de lucros mercantis
para a metrópole. Assim, introduziu o cultivo de um produto tropical, a
cana-de-açúcar, que já vinha explorando em ilhas do Atlântico Sul e era
um produto que contava com um mercado em expansão na Europa.
O elemento que assegurou a lucratividade do empreendimento foi
o monopólio comercial, determinado pela metrópole.
Analisando o sistema de exploração colonial na etapa da expansão
comercial européia, o historiador Fernando Novais (1990), argumenta que:
o monopólio do comércio das colônias pela Metrópole define o
sistema colonial porque é através dele que as colônias preenchem a
sua função histórica, isto é, respondem aos estímulos que lhes deram
origem, que foram a sua razão de ser, enfim, que lhes dão sentido.
CARACTERÍSTICAS DA COLONIZAÇÃO PORTUGUESA NO
BRASIL
A empresa colonial agrícola introduzida na colônia não se reduzia
a extrair riquezas naturais para revenda nos mercados europeus. Era um
empreendimento muito mais complexo, que envolvia o desenvolvimento
de uma atividade agrícola que seria explorada segundo critérios que
proporcionassem o máximo de lucratividade possível aos portugueses.
16
CEDERJ
1
O historiador Fernando Novais (1990) destaca as principais
AULA
diferenças entre a instalação da empresa colonial agrícola no Nordeste
brasileiro e as tradicionais feitorias, entrepostos comerciais que
funcionavam como pontos de apoio dos comerciantes metropolitanos
ao longo das costas africana e asiática, onde eles recolhiam os produtos
nativos da região para serem revendidos na Europa. Em suas palavras:
A atividade colonizadora dos povos europeus na época moderna,
inaugurada com a ocupação e utilização das ilhas atlânticas, e logo
desenvolvida em larga escala com o povoamento e valorização
econômica da América, distingue-se da empresa de exploração
comercial que desde o século XV já vinham realizando os
portugueses nos numerosos entrepostos do litoral atlântico-africano
e no mundo indiano. Efetivamente, a empresa colonial é mais
complexa, envolvendo povoamento europeu, organização de uma
economia complementar voltada para o mercado metropolitano.
Em outras palavras, pode-se dizer que nos entrepostos africanos
e asiáticos a atividade econômica dos europeus (pelo menos
nesta primeira fase) se circunscreve nos limites da circulação de
mercadorias: a colonização promoverá a intervenção direta dos
empresários europeus no âmbito da produção (p. 47).
O sentido da colonização era cultivar produtos tropicais de forma
lucrativa para o comércio europeu, de modo a não competir com as
culturas de clima temperado existentes na Europa. Os produtos seriam
tropicais porque a produção colonial deveria ser complementar, e nunca
competitiva, à produção européia.
?
O sentido da colonização
Deve-se ao historiador Caio Prado Junior a
noção de sentido da colonização. Em sua obra Formação
do Brasil Contemporâneo: colônia (1969), cuja primeira edição
data de 1942, ele defende a tese de que a estrutura da economia
colonial, baseada em três elementos principais – o latifúndio,
a monocultura e o trabalho escravo –, foi pensada com
um único sentido: fornecer gêneros tropicais
ao comércio europeu.
CEDERJ
17
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
A lucratividade da empresa colonial agrícola estava assentada
em três elementos principais, que asseguravam os baixos custos de
produção:
• o latifúndio: necessário para permitir o crescimento extensivo da
produção, uma vez que a atividade não se expandia com base no
aumento da produtividade, mas sim no uso extensivo de terra.
A grande propriedade era, além disso, importante para atrair
colonos portugueses, que viam a colônia como uma possibilidade
de enriquecimento, mas não como local para se estabelecer
definitivamente, como nas colônias de povoamento;
• a monocultura: como a empresa colonial agrícola visava
à lucratividade comercial, era mais interessante para o
colonizador mobilizar recursos para o produto a ser exportado
do que diversificar a produção considerando o mercado interno
(praticamente inexistente, dada a baixa circulação de dinheiro
na economia colonial, como você vai ver mais adiante no
boxe explicativo sobre economia de subsistência x economia
mercantil);
• o trabalho escravo: a dificuldade de acesso à mão-de-obra barata
diante da necessidade de conter custos de produção levou à
introdução da escravidão na colônia, ainda que estivesse em vias de
desaparecimento na Europa. O recurso à escravidão decorria de:
a) inexistência de excedentes populacionais em Portugal;
b) insuficiência de trabalhadores indígenas;
c) ambiente desfavorável na Colônia, fazendo com que os
salários necessários para atrair trabalhadores europeus
fossem elevados demais, o que comprometeria a lucratividade
do empreendimento;
d) uma experiência lucrativa do tráfico de escravos oriundos das
colônias africanas, o que levou à utilização dessa espécie de
mão-de-obra como relação básica de produção na empresa
colonial agrícola.
18
CEDERJ
AULA
1
A existência da
escravidão caracteriza a
colonização do Brasil como feudal?
O uso de trabalho escravo na economia
colonial agrícola não pode ser interpretado como
uma manifestação da existência de relações feudais de
produção. O Brasil nunca foi feudal, ainda que sua ocupação
estivesse associada à empresa colonial agrícola, sustentada no
trabalho escravo. O sentido da colonização foi proporcionar lucros
mercantis aos comerciantes metropolitanos, favorecendo o acúmulo
de capitais na Europa e a afirmação da burguesia. A utilização do
trabalho escravo tinha a finalidade de baratear os custos de produção,
o que permitia à burguesia comercial ampliar seus lucros mercantis.
?
O conceito de produtividade
e o uso extensivo de recursos
O crescimento da produção pode ocorrer em decorrência de dois
fatores: aumento da produtividade, pelo uso mais eficiente dos
recursos ou aumento extensivo dos recursos, isto é, utilização de
mais trabalhadores, mais capital ou mais terras. Esse foi o caso
do Brasil. A empresa colonial agrícola contava com terras
abundantes, o que lhe permitia aumentar a produção
pela simples incorporação de territórios, em
vez de tornar mais eficiente o uso dos
recursos.
ECONOMIA CANAVIEIRA: ELEMENTO-CHAVE NO SUCESSO
DA EMPRESA COLONIAL AGRÍCOLA
O sucesso da empresa colonial agrícola implantada no Nordeste
no século XVI está relacionado à introdução da cultura da cana-deaçúcar, especiaria cultivada em clima tropical que contava com grande
mercado consumidor na Europa. A cultura da cana foi o maior êxito
experimentado pela economia colonial agrícola. Ela permitiu associar
a experiência portuguesa do cultivo da cana nas ilhas do Atlântico Sul
à utilização da mão-de-obra escrava nas colônias africanas, e ao uso de
terras férteis da costa do Nordeste para produção de uma cultura tropical
que desfrutava de crescente mercado consumidor na Europa.
Um elemento fundamental que explica esse sucesso foi a implantação de uma rota comercial entre as colônias da Coroa portuguesa,
criando uma interdependência entre dois negócios: a exploração de
produtos primários na colônia brasileira voltados para o mercado
externo, e a exportação de escravos pelas colônias africanas.
CEDERJ
19
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
Em uma época (séculos XVI e XVII) em que a navegação dependia
do regime de ventos e correntes marítimas, um fato fundamental a
considerar é que, em função das correntes marítimas, era mais fácil a
comunicação entre o Nordeste brasileiro e a costa africana, do que entre
estas regiões e outras partes dos respectivos continentes. Tal proximidade
estimulou um novo fluxo comercial entre as colônias portuguesas.
Ampliavam-se, assim, as receitas resultantes dos tributos cobrados pela
Coroa, somando-se os tributos cobrados de duas de suas colônias: a
venda de escravos africanos e a venda do açúcar brasileiro. Além disso,
os colonos do Brasil tinham de se sujeitar à metrópole por causa do
suprimento de mão-de-obra, dado o controle exercido pelo reino sobre
o comércio de escravos nas colônias africanas.
Figura 1.5: O fluxo de navios entre o
Nordeste brasileiro e as colônias portuguesas na África foi favorecido pelos
ventos e pelas correntes marítimas. Por
esta razão, era mais fácil a comunicação entre estas duas regiões do que
dentro dos próprios continentes.
A proximidade entre Brasil e África,
apesar do Oceano Atlântico, ainda
hoje está presente no imaginário
popular, como atesta uma recente
propaganda da cerveja Nova Schin,
na qual um homem sedento entra em
um bar africano, pede uma cerveja e o
balconista lhe diz que o produto está
em falta, mas que ele pode encontrar
a cerveja em um bar “logo ali em
frente” (no Brasil). O homem, então,
entra no mar e nada em direção ao
bar brasileiro.
A partir da metade do século XVI, a produção de açúcar passou
a ser cada vez mais um empreendimento conjunto entre portugueses
e holandeses. Estes recolhiam o produto em Lisboa, refinavam-no e o
distribuíam por toda a Europa. Participavam também do financiamento
da atividade, que dependia da mobilização de capital para implantar o
engenho de açúcar e adquirir os escravos (FURTADO, 1971). Os gastos
operacionais, entretanto, eram bem modestos, já que as fazendas de
cana-de-açúcar eram praticamente auto-suficientes.
20
CEDERJ
AULA
1
Atividade 2
2
3
Cana-de-açúcar no Nordeste: um negócio rentável?
Descreva o modo de produção de açúcar no Nordeste do Brasil, considerando:
1. a comercialização do produto (mercado interno ou externo?);
2. a lucratividade do negócio, tendo em vista os custos de produção e os ganhos
obtidos;
3. o tipo de terreno (fértil ou não) e de que tamanho (grandes ou pequenas extensões
de terra);
4. a mão-de-obra utilizada.
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Resposta Comentada
Produzir açúcar no Nordeste do Brasil era, de fato, uma atividade lucrativa para
os donos de terras na nova colônia. Em primeiro lugar, porque os custos de
produção eram baixos: em grandes parcelas de terra, cultivava-se cana utilizando
mão-de-obra escrava para o plantio e a colheita, além de gado como força motriz
dos engenhos. O solo era fértil, não precisando de cuidados especiais, e o clima
– tropical –, favorável.
Em segundo lugar, os lucros eram altos, já que a produção estava voltada para o
mercado externo, onde o açúcar era uma especiaria, alcançando preços elevados.
Daí provinha o lucro. Para a metrópole, ainda era vantajoso pela possibilidade de
articular os interesses da Coroa portuguesa ao tornar interdependentes a cultura
do açúcar no Nordeste brasileiro e o abastecimento de mão-de-obra escrava
das colônias africanas.
A parceria com os holandeses terminou com a anexação de
Portugal pela Espanha (1580-1640). Lutando contra a Espanha, que
não reconhecia sua independência, a Holanda resistiu à perda do negócio
do açúcar e invadiu o Brasil em 1630, estabelecendo-se no Nordeste. A
expulsão dos holandeses, em 1654, trouxe conseqüências econômicas
graves e duradouras, já que, com os conhecimentos adquiridos na
cultura da cana, eles estabeleceram um empreendimento concorrente
nas Antilhas, acabando com o monopólio na oferta do produto pelos
colonos do Nordeste brasileiro.
CEDERJ
21
!
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
Atividade 3
Você sabia que as primeiras
moedas do Brasil foram cunhadas
pelos holandeses, quando ocuparam o Nordeste?
A economia da colônia, então, era mais
pautada por trocas do que por metal
circulante.
Conseqüências econômicas da expulsão dos holandeses
O economista Celso Furtado afirmou que as conseqüências econômicas da expulsão
dos holandeses do Nordeste brasileiro, em 1654, foram muito mais duradouras do que
as conseqüências da vitória militar. Em sua opinião, quais as razões que o levaram a
sustentar essa afirmativa?
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Resposta Comentada
As conseqüências econômicas seriam mais duradouras, porque a expulsão dos
holandeses resultou na implantação de outra área agroexportadora de cana-deaçúcar nas Antilhas, o que quebrou o monopólio do açúcar nordestino. A quebra do
monopólio destruirá um dos pilares sobre os quais estava sustentada a economia
colonial agrícola no Nordeste do Brasil.
A partir de meados do século XVII, com o declínio do preço
da cana no mercado externo –devido ao aumento da oferta, com a
produção antilhana –, a economia canavieira deixou de ser lucrativa.
Os baixos custos operacionais permitiram apenas manter o negócio,
mas não ampliá-lo.
A crise da economia canavieira não foi superada. Até que a
mineração substituísse a cultura de cana-de-açúcar como principal
fonte de renda de exportações, no século XVIII, a Colônia enfrentou
uma crise provocada pela queda dos preços da cana, enfraquecendo a
economia da metrópole.
Essa incapacidade de superação da crise da economia canavieira
esteve relacionada à forma como circulava a renda gerada pela atividade
canavieira. A lucratividade do negócio estava na comercialização, e não
na produção da cana. O comércio (e o transporte) da cana era controlado
por comerciantes portugueses, associados aos holandeses, os maiores
beneficiários da economia canavieira.
22
CEDERJ
1
Nesse negócio, a renda interna ficava extremamente concentrada
AULA
nas mãos dos grandes proprietários fundiários. Esses proprietários
mantinham uma produção alimentar de subsistência, adquirindo
apenas animais e madeira no mercado interno. Tratava-se, assim,
de uma atividade em que prevalecia a pouca circulação de dinheiro
– o que lhe conferia alto grau de resistência a crises. Assim, mesmo
enfrentando declínio dos preços internacionais da cana, o produto seguia
sendo cultivado, pois os gastos monetários para manter em operação o
engenho eram modestos (animais e madeira).
?
Economia de
subsistência
x
economia mercantil
Economia de subsistência, como o próprio nome
sugere, é aquela produzida para autoconsumo, em que o
produtor não se distingue do consumidor, sendo desnecessário
o uso de dinheiro. Economia mercantil, ao contrário, é aquela em
que o produto é direcionado ao mercado; a conseqüente separação
entre produtores e consumidores torna necessária a intermediação
monetária.
Uma família de pequenos proprietários de terra pode produzir verduras
para sua alimentação, mas essa cultura será de pequenas proporções, já que
voltada apenas para o consumo da família. Não estará sujeita, portanto, a
crises econômicas, porque não haverá produção excedente para ser vendida
em mercado.
A economia colonial caracterizou-se pela baixa circulação interna de dinheiro,
já que a empresa que produzia a monocultura para exportação era autosuficiente, produzia quase todos os bens necessários para sua operação,
demandando apenas madeira e animais no mercado interno. Portanto, os
colonos que não fossem latifundiários agroexportadores, mas simples
criadores de gado, por exemplo, recebiam uma parte muito pequena
da renda que circulava na Colônia, resultante das compras internas
animais e madeira).
A maior parte da renda ficava concentrada nas mãos dos
colonos latifundiários (os senhores de engenho), o que
permitia que eles consumissem produtos de luxo
importados. Esta divisão não favorecia a
circulação de moeda, nem tampouco a
produção mercantil.
CEDERJ
23
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
Ainda assim, a economia colonial mergulhou em uma crise da
qual só saiu quando houve a descoberta de ouro e diamante, no século
XVIII, na região correspondente ao atual Estado de Minas Gerais. Do
mesmo modo que a economia canavieira, tampouco a mineradora
logrou gerar condições para o surgimento de uma atividade sustentável.
O mesmo ocorreu com outros produtos, como o algodão e a borracha,
que conheceram o auge dinamizados pela renda das exportações. Na sua
decadência, o desenvolvimento da região onde eles se situavam retrocedia,
declinando o grau de monetização (de circulação de dinheiro), resultando
em transferência de recursos para a economia de subsistência, de baixa
produtividade.
A percepção desse padrão, que perdurou durante todo o período
colonial, levou os historiadores a identificar o desenvolvimento da
economia colonial como uma sucessão de ciclos.
A noção de ciclos de produtos coloniais tem caráter apenas
descritivo; entretanto, tem o mérito de sugerir que, esgotada a
potencialidade de um produto colonial, retoma-se o processo de
desenvolvimento praticamente do mesmo ponto de partida. A estrutura
socioeconômica permaneceu a mesma, baseada no latifúndio, na
monocultura e no trabalho escravo. Essa foi a natureza da economia
colonial, incapaz de suscitar a sua superação e o advento de outra
estrutura econômica internamente mais dinâmica.
CONCLUSÃO
Você iniciou o estudo da história econômica do Brasil desde a
chegada dos portugueses, no século XVI. Inicialmente, você acompanhou
o empreendimento da economia canavieira, que se tornou o paradigma
da empresa colonial agrícola instalada na colônia pelos portugueses. Nas
duas próximas aulas, continuaremos analisando a economia colonial no
período que se estende até 1822.
24
CEDERJ
1
2
AULA
Decidindo novos rumos para o seu reino
1
Atividade Final
3
Europa, séculos XV e XVI. Imagine que você é um monarca e que precisa decidir sobre
os rumos do seu reino. Notícias de outras terras chegam até você. Surgem novas nações:
Portugal, Espanha, França, Inglaterra... Unificadas, elas criam exércitos, defendem seus
territórios e buscam expandir-se. Você sabe, porém, que organizar uma expansão
territorial desse porte não é tão simples quanto possa parecer.
Está lançado o desafio. De acordo com as idéias da sua época, os estados nacionais
deveriam se expandir, levando a salvação e a maneira européia de viver a outras
partes do mundo.
Que tipo de investimento você considera necessário para:
1. manter o seu Estado-Nação e defendê-lo de invasores;
2. enviar exploradores de seu país para a busca e a conquista de novas terras;
3. ocupar e colonizar os territórios conquistados;
4. proteger a nova terra da invasão por estrangeiros;
5. possibilitar o crescimento da colônia e fazer dela um negócio lucrativo.
Neste momento, lembre-se de levar em conta o mercantilismo, política econômica de
sua época.
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Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
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Resposta Comentada
Como um bom soberano, dotado de direito divino, primeiramente você deve ter pedido
ajuda a Deus para orientá-lo neste trabalho. Em segundo lugar, ao avaliar a situação em
sua época, você deve ter pensado nos pontos a seguir:
1. com o surgimento dos estados nacionais, era preciso organizar e defender sua nação
(criação de exércitos). Uma ideologia que unisse os estamentos (veja o boxe sobre
feudalismo) ao redor de uma só figura ou personalidade, como a do rei, também ajudaria
bastante;
2. com a “casa” arrumada, você já pode pensar em expandir os seus domínios. Para
isso, você vai precisar de caravelas que possam enfrentar o mar Tenebroso sem afundar.
Instrumentos de navegação também serão úteis, e aperfeiçoá-los é uma medida prudente,
já que o mar, bravio e misterioso, “não estava para peixe”. Navegadores bem preparados
são fundamentais, e a idéia de uma escola de navegação pode ser interessante;
3. feito tudo isto, rumo à expansão! As colônias, territórios desconhecidos e ainda sem dono,
principalmente em outras regiões do mundo, são ideais para expandir seus domínios;
4, 5. lá, você poderia encontrar produtos para explorar – como os metais preciosos – ou
desenvolver monoculturas para exportação. No caso do Brasil, o que os portugueses
buscaram, em primeiro lugar, foi ouro e prata. Por não terem encontrado esse tipo
de riqueza, estabeleceram, no território conquistado, a empresa colonial agrícola. São
exemplos dessa exploração o pau-brasil (da mata nativa), e a cana-de-açúcar (monocultura
desenvolvida pelos colonos portugueses), em um primeiro momento. O Pacto Colonial
garantiria os lucros para a metrópole.
Para desenvolver as atividades agrícolas que vão trazer dividendos para a metrópole, é
necessário morar no território, o que resolve em parte o problema de proteger as terras
conquistadas. Fortificações em locais estratégicos também são fundamentais. Os fortes
construídos pelos portugueses em várias partes do país são, atualmente, atrações turísticas.
Para todas estas realizações, era necessário dispor de capital. Que política você iria adotar
para acumular o capital necessário?
O mercantilismo, apoio econômico do regime absolutista, deve ter sido a resposta
que você encontrou para a pergunta anterior. Por meio de acumulação de capitais,
protecionismo alfandegário e a busca por uma balança de comércio favorável em um
primeiro momento, e pela procura de metais preciosos – principalmente ouro e prata
– em uma segunda etapa, era possível conseguir os recursos necessários para expandir
sua nação. A burguesia desempenharia um papel fundamental, fornecendo o apoio
financeiro para sua empreitada.
26
CEDERJ
1
AULA
RESUMO
A ocupação do Brasil colonial foi uma das conseqüências da expansão
marítima portuguesa. O sentido da colonização brasileira foi produzir
especiarias e produtos tropicais (como a cana-de-açúcar) para comercialização
na Europa.
Os principais elementos da formação econômica colonial são o latifúndio,
a monocultura e o trabalho escravo. Alicerçada nesses três pilares, surgiu,
no Nordeste brasileiro, a economia canavieira, que teve seu auge entre os
séculos XVI e XVII. Esse modelo econômico entrou em crise após a invasão
holandesa, que terminou em 1654. Expulsos do Nordeste, os holandeses
utilizaram, em suas colônias nas Antilhas, os conhecimentos que haviam
adquirido na produção de açúcar, provocando a quebra do monopólio
brasileiro na oferta do açúcar no mercado mundial.
INFORMAÇÕES SOBRE AS PRÓXIMAS AULAS
Nas aulas seguintes, você vai conhecer os setores e as regiões da economia
colonial em que as atividades predominantes foram voltadas para o incipiente
mercado interno, com pouca importância em termos de participação na
geração de renda quando comparados à economia canavieira, porém
resultaram muito importantes na ocupação do interior da Colônia.
Você vai ver também que o enfraquecimento econômico causado pela
crise na economia açucareira levou a Coroa portuguesa a assinar acordos
com a Inglaterra, com conseqüências negativas duradouras para Portugal
e também para a Colônia brasileira.
Na terceira e última aula deste bloco, discutiremos as razões da crise da
economia colonial, bem como a incapacidade da metrópole de sustentar o
modelo de desenvolvimento vigente.
CEDERJ
27
Formação Econômica do Brasil | Formação econômica do Brasil colonial
INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES
Você pode ainda ampliar seus conhecimentos sobre o período colonial lendo
obras importantes, como Casa grande e senzala, de Gilberto Freyre. Uma
importante fonte adicional de consulta sobre a economia colonial pode ser
encontrada no Dicionário do Brasil Colonial, organizado pelo historiador
Ronaldo Vainfas e publicado pela Editora Objetiva.
Além disso, você poderá consultar os sites de História do Brasil disponíveis
na internet, bastando para isso acessar um site de busca (Google ou Cadê),
digitar o nome da pessoa ou do evento a ser pesquisado para que, em
segundos, você receba indicações sobre onde a informação está disponível.
Uma boa sugestão é a entrevista do historiador Fernando Novais (lembra-se
dele? Lemos um trecho de um de seus livros nesta aula) ao jornal Folha de
S.Paulo em http://www1.uol.com.br/fol/brasil500/entre_16.htm
28
CEDERJ
2
AULA
Atividades econômicas de
subsistência e mineração
auxiliam o povoamento
do interior
Meta da aula
objetivos
Descrever a ocupação do interior do Brasil, dos séculos
XVI a XVIII, mostrando que houve transformações na
economia colonial que não se identificam apenas com
a empresa colonial agrícola.
Esperamos que, ao final desta aula, você seja
capaz de:
1
2
3
Reconhecer outras atividades econômicas da
colônia portuguesa, além das voltadas para
a exportação.
Identificar as regiões do interior do Brasil
ocupadas durante a colonização, bem como
as atividades econômicas realizadas nestas
localidades.
Reconhecer a contribuição da economia
mineira para a ocupação da terra e a produção
de riqueza no interior da colônia.
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
INTRODUÇÃO
Você vai aprofundar ainda mais seu conhecimento sobre a dinâmica da
economia colonial brasileira, com ênfase em aspectos diferentes dos que já
vimos na Aula 1. Se, na aula passada, o objetivo foi apresentar o sentido da
colonização para a coroa portuguesa, situando-a no contexto da expansão
mercantil proporcionada pelas grandes navegações, nesta segunda aula, você
verá que, a partir do século XVII, o interior da colônia foi ocupado pelos colonos
que não exploraram a monocultura para exportação, mas atividades destinadas
à própria subsistência ou ao mercado interno.
Sugerimos, para complemento de sua leitura, a introdução do trabalho A Lei de
Terras de 1850, de Carlos Ignacio Pinto, estudante de História da Universidade
de São Paulo (USP), no site http://www.klepsidra.net/klepsidra5/lei1850.html.
Carlos Ignacio faz um histórico da ocupação portuguesa no Brasil, dos séculos XVI
a XVIII. Vale a pena dar uma olhada, para relembrar o conteúdo da Aula 1.
A Lei de Terras de 1850
Carlos Ignacio Pinto [email protected] Segundo Ano – História/USP
lei1850.doc - 60KB
Todas as terras produtivas estão
tomadas em um país que é quase
deserto
(Relatório de Gonçalves Chaves do ano de 1822)
Introdução
O primeiro critério de distribuição do solo da colônia portuguesa na
América foi o regime de concessão de sesmarias. Este ordenamento
jurídico do território foi, antes de mais nada, uma transposição da
norma reguladora do processo de distribuição de terras em Portugal
para os solos coloniais. Sob este ponto, é preciso ressaltar que o
interesse primordial do processo de colonização portuguesa estava
aliado à extensiva exploração do território, com o intuito de campear
recursos minerais, principalmente o ouro. Em um primeiro momento,
esse propósito da coroa foi completamente frustrado, pois durante todo
o século XVI não houve a ocorrência de descoberta de metais preciosos
nos solos coloniais americanos de possessão portuguesa.
Desde o princípio, a empresa colonial percebeu que a colônia poderia
produzir outros tipos de riquezas que não a exploração mineral. Data
do ano de 1557 a instalação do primeiro engenho de produção de
açúcar no Brasil; os portugueses, que dominavam plenamente a técnica
30
CEDERJ
2
de plantio da cana e fabrico do açúcar, devido às suas possessões nas
AULA
ilhas do Atlântico, introduziram e incentivaram a produção da cana, que
possuía grande valor comercial.
Na colônia portuguesa, os séculos XVI e XVII marcaram o que a
professora Vera Lúcia Amaral Ferlini denomina de “a civilização do
açúcar”, uma economia baseada plenamente no cultivo da cana-deaçúcar e no trabalho artesanal de produção do próprio açúcar por
meio dos engenhos. Nesse período, o incentivo agrícola foi dado à
produção em larga escala para abastecer o mercado europeu. Não havia
o interesse de construir na colônia uma produção agrícola de pequeno
porte e caráter diversificado, pois o elemento norteador das políticas
européias era o mercado europeu. Assim, a colonização do século XVI
foi fiel ao seu sentido original de “colonização de caráter absolutamente
mercantilista”, sem incentivo à pequena propriedade.
A partir do século XVIII, ocorre uma mudança nessa política econômica,
com um enorme crescimento da colônia: junto a um grande ciclo
migratório, verificou-se uma ampliação da economia devido,
principalmente, à descoberta das Minas Gerais. O ciclo do ouro foi
capaz de dinamizar novos setores da economia, como o de produção
de alimentos e do tráfico interno de mão-de-obra. A reivindicação pela
terra tornou-se mais difusa, e a política de doação por meio de sesmarias
fazia-se insuficiente às novas necessidades sociais. A confusa situação
de ocupação de território ditada pela debilidade da Lei de Sesmarias
aumentou ainda mais no final do século XVIII, quando ocorreu a
decadência da mineração e houve o que alguns autores denominaram
como um renascimento da atividade agrícola.
Nesse contexto, vamos incluir também a mineração, importante para a ocupação
do interior do país, além de ter sido uma atividade de grande relevância para
gerar excedentes – apropriados por Portugal.
Segundo Roberto Simonsen (apud SILVA, 1990), os instrumentos econômicos
que serviram como base para a expansão para o interior foram a busca por
metais preciosos e especiarias, a caça aos indígenas – para suprir a falta de
mão-de-obra africana – e a criação de gado.
Nesta aula, analisaremos como cada uma dessas estratégias contribuiu para o
povoamento do interior da colônia.
CEDERJ
31
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
BUSCA POR METAIS PRECIOSOS E APRESAMENTO DE
ÍNDIOS: OS BANDEIRANTES AMPLIARAM OS DOMÍNIOS
PORTUGUESES NA AMÉRICA
Antes de falarmos de expansão territorial, vale a pena retomar
alguns tópicos vistos na Aula 1. Um deles é o Tratado de Tordesilhas
que, em 1494, determinou que o recém-descoberto continente
B
BANDEIRAS
ANDEIRAS
Constituíam
Constituíam uma
uma espécie
espécie
de
de expedição
expedição armada
armada que
que
desbravava
desbravava os
os sertões
sertões
aa fim
fim de
de escravizar
escravizar
indígenas
indígenas ou
ou descobrir
descobrir
ouro,
ouro, oo que
que intensificou
intensificou
aa ocupação
ocupação do
do interior
interior
do
do continente
continente sulsulamericano.
americano. O
O principal
principal
ponto
ponto de
de partida
partida
dessas
dessas expedições
expedições era
era
aa Capitania
Capitania de
de São
São
Vicente
Vicente (atual
(atual estado
estado de
de
São
São Paulo),
Paulo), ponto
ponto da
da
costa
costa mais
mais avançado
avançado na
na
direção
direção do
do interior.
interior. Pelos
Pelos
rios,
rios, principalmente
principalmente
os
os da
da bacia
bacia do
do Tietê,
Tietê,
as
as bandeiras
bandeiras chegaram
chegaram
aos
aos atuais
atuais estados
estados de
de
Minas
Minas Gerais,
Gerais, Goiás,
Goiás,
Mato
Mato Grosso
Grosso do
do Sul
Sul
ee às
às regiões
regiões onde
onde se
se
localizavam
localizavam as
as aldeias
aldeias
jesuíticas.
jesuíticas.
As
As primeiras
primeiras bandeiras
bandeiras
foram
foram comandadas
comandadas
por
por Diogo
Diogo Quadros
Quadros ee
Manuel
Manuel Preto,
Preto, em
em 1606,
1606,
ee Belchior
Belchior Dias
Dias Carneiro,
Carneiro,
em
em 1607.
1607. Compostas
Compostas
por
por integrantes
integrantes das
das
mais
mais diversas
diversas etnias
etnias
–– portugueses,
portugueses, índios,
índios,
caboclos
caboclos ee mamelucos
mamelucos
–– e,
e, às
às vezes,
vezes, formadas
formadas
por
por milhares
milhares de
de
homens,
homens, duravam
duravam
de
de meses
meses aa anos,
anos,
pois
pois os
os bandeirantes
bandeirantes
fixavam
fixavam acampamentos
acampamentos
temporários
temporários para
para
explorar
explorar uma
uma região,
região,
verificando
verificando aa existência
existência
de
de ouro,
ouro, prata
prata ou
ou pedras
pedras
preciosas,
preciosas, ou
ou para
para
preparar
preparar oo ataque
ataque às
às
tribos
tribos indígenas.
indígenas.
32
CEDERJ
americano fosse dividido entre Portugal e Espanha. Segundo Dias
(1990, p. 25),
Conforme a cláusula fundamental do diploma (o Tratado de
Tordesilhas), as duas monarquias estabeleciam uma linha de
demarcação – o meridiano traçado a 370 léguas a oeste das
ilhas de Cabo Verde – dividindo o Mar Oceano (o Oceano
Atlântico) em duas zonas de influência: as ilhas e terras firmes
já descobertas ou que viessem a descobrir-se no hemisfério
oriental pertenceriam a Portugal; as do hemisfério ocidental
caberiam à Espanha.
Essa raia de demarcação corta o litoral brasileiro através do
meridiano que passa por Belém, ao norte, e Laguna, ao sul,
dando a Portugal o domínio de quase todo o Atlântico Sul e a
parte de terra firme que fica a leste dessa linha – o Brasil – cuja
existência genialmente se suspeitava.
Esses limites, entretanto, não foram
respeitados. Em primeiro lugar, porque
as potências européias excluídas daquela
divisão nunca deixaram de lutar pela
conquista de territórios, como comprova a
invasão francesa ao Rio de Janeiro, repelida
pelos portugueses comandados por Estácio de
Sá, ainda no século XVI. No século seguinte,
franceses, ingleses e holandeses conseguiram se
estabelecer ao norte da América do Sul, onde
fundaram a Guiana Francesa, a Guiana (exGuiana Inglesa) e o Suriname (antiga Guiana
Holandesa).
Em segundo lugar, as fronteiras entre a América portuguesa e a
espanhola foram modificadas devido ao movimento de BANDEIRAS.
2
AULA
!
Para
o apresamento de
índios, os alvos principais dos
bandeirantes foram os aldeamentos
jesuíticos. Estima-se que 300 mil
índios foram escravizados entre
1614 e 1639.
Você se lembra da minissérie A muralha, veiculada pela Rede Globo em 2000? Era justamente
sobre o período da história econômica brasileira que você está estudando nesta aula. A
minissérie teve como base o livro homônimo de Dinah Silveira de Queiroz. Ambos valem a
pena ser vistos. Lembre-se, ler o romance ou ver o filme pode ser uma excelente maneira
de estudar. Que tal aproveitar para aprender e se divertir ao mesmo tempo?
Atividade 1
Recuperando as origens do bandeirantismo
Jorge Nassyrios Anhembi_COMTUR
Figura 2.1: Localizado no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, o Monumento aos
Bandeirantes, de Victor Brecheret, começou
a ser construído em 1936. Nele, estão representados índios, negros, portugueses e
mamelucos que parecem ir em direção ao
Pico do Jaraguá, um dos pontos de partida
do movimento de bandeiras. A estrutura,
toda em granito, tem 43m de comprimento
por 8m de largura e 5m de altura.
Em sua opinião, por que os paulistas decidiram homenagear os bandeirantes construindo
esse monumento? Qual a importância do movimento das bandeiras para o Brasil? Que
características do bandeirantismo estão representadas no monumento?
_______________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Antiga Capitania de São Vicente, São Paulo não teve, nos primeiros tempos da
colonização, a importância que tem na economia brasileira atual. No entanto,
por sua localização mais próxima ao sertão, de lá partiram os bandeirantes,
como você já viu. Você já se deu conta de como esse movimento foi importante
para o que nós conhecemos hoje como Brasil? Entre as conseqüências mais
relevantes do bandeirantismo, está a expansão da fronteira da América
portuguesa em direção à América espanhola, rompendo o acordo assinado
em Tordesilhas em 1494.
CEDERJ
33
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
Além de terem encontrado metais preciosos, os bandeirantes conquistaram
mais territórios para o país, como a atual Região Centro-Oeste.
Em termos populacionais, é bem interessante observar, no monumento,
portugueses, índios e mestiços (mamelucos e caboclos). O interesse por metais
preciosos unia esses grupos populacionais tão distintos e os levava em direção
ao interior do país.
Se você estiver em São Paulo ou for visitar a cidade, vá ao Parque do Ibirapuera
e veja o monumento aos bandeirantes. Sem dúvida, você vai perceber outros
significados nele.
O deslocamento da fronteira entre as Américas portuguesa e
espanhola acentuou-se entre 1580 e 1640, durante a União Ibérica,
quando Portugal foi anexado à Espanha, como você viu na aula passada.
Durante esse período, o movimento das bandeiras tomou grande impulso,
dadas as dificuldades de obtenção de mão-de-obra africana: no início do
século XVII, a Holanda investiu no comércio de escravos, desorganizando
o tráfico português.
OCUPAÇÃO DO SUDESTE
Na região Sudeste, as condições de produção da cana-deaçúcar não eram favoráveis. O solo era menos fértil, o que diminuía a
produtividade em relação ao açúcar nordestino, e os custos de transporte,
mais elevados, por causa da maior distância até os mercados europeus
(lembra-se das correntes marítimas favoráveis que você viu na Aula 1?).
Os colonos logo perceberam, todavia, que a existência de índios em
grande número poderia dar origem a outra atividade econômica: a
escravização do trabalhador indígena. Os jesuítas também se fixaram no
interior, porém estavam mais interessados em catequizar os índios. Você
vai ter mais informações sobre os jesuítas ainda nesta aula, aguarde!
A OCUPAÇÃO DO VALE AMAZÔNICO
Durante a União Ibérica, era grande a preocupação dos espanhóis
com a incursão holandesa pela região amazônica. Eles temiam que os
holandeses pudessem ocupar o vale amazônico navegando pelo rio
Amazonas, o que poderia colocar em risco as minas de prata do Peru,
então colônia espanhola, pelo Tratado de Tordesilhas. O grande número
de rios e afluentes era outro facilitador das incursões pela região.
34
CEDERJ
2
Além de espanhóis, holandeses e ingleses conseguiram se
AULA
estabelecer no norte do continente, a partir de 1596. Naquela região,
desenvolveu-se o comércio com a produção extraída da floresta – como
as madeiras e o o urucum utilizado para tingir tecidos – e o pescado.
Portugal também passou a sofrer tentativas de invasão dos
tradicionais inimigos do império espanhol. Os portugueses conseguiram
expulsar franceses, ingleses e holandeses das margens do rio Amazonas
e fundaram, com objetivos de defesa, a cidade portuária de Belém, em
1616, a partir da construção do forte do Presépio, atualmente forte do
Castelo. Localizado na confluência do rio Guamá com a baía de Guarajá,
o forte estava situado em local estratégico, dificultando a entrada dos
invasores. O “fechamento” dessa porta de entrada da região conseguiu
mantê-la protegida.
Figura 2.2: Construído pelos portugueses no século XVII para defender a região
de invasões estrangeiras, o forte do Presépio foi um dos primeiros edifícios de
Belém (PA). A fortificação, atualmente chamada forte do Castelo, foi tombada
pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1962 e é
um dos pontos turísticos da cidade.
Segundo Prado Jr. (1970), outra fonte de infiltração no vale do
Amazonas foram “as ordens religiosas, em particular jesuítas e carmelitas.
(...) Os padres realizaram uma grande tarefa no vale amazônico. A eles cabe
a iniciativa do desbravamento de todo esse território imenso, semeando suas
missões num raio de milhares de quilômetros. Estas missões (...) constituem
importantes empresas comerciais. Reunidos os índios em aldeias (...), eram
eles submetidos a um regime disciplinado e rigoroso de trabalho e de vida
em geral” (apud MENDONÇA; PIRES, 2002, p. 69-71).
CEDERJ
35
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
Desfeita a União Ibérica, em 1640, Portugal tentou fazer de Belém
do Pará a base para a reconstituição do comércio de especiarias, perdido
pelos portugueses na Ásia (com a tomada de Constantinopla, lembra-se
M
MARQUÊS
ARQUÊS DE
DE
PPOMBAL
OMBAL
(1699-1782)
(1699-1782)
Célebre
Célebre primeiroprimeiroministro
ministro do
do rei
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português
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D. José
José
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Sebastião José
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marquês
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Pombal,
foi
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executou
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as obras
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de
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reconstrução
de
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Lisboa, após
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destruiu
destruiu aa cidade
cidade
em
em 1755.
1755. Após
Após esse
esse
evento,
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consolidou
seu
seu poder
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de
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absoluto
em
em detrimento
detrimento da
da
nobreza
nobreza ee do
do clero.
clero.
Um
Um exemplo
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claro
desse
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poder foi
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submissão
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da até
até
então
então poderosa
poderosa
Ordem
Ordem dos
dos
Jesuítas
Jesuítas ao
ao estado
estado
português.
português. Pombal
Pombal
fez
fez importantes
importantes
reformas
reformas no
no estado,
estado,
com
com destaque
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para
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grande impulso
impulso
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concedido àà
instrução
instrução popular
popular
com
com aa reforma
reforma do
do
ensino,
ensino, instituída
instituída por
por
lei
lei em
em 1722.
1722.
36
CEDERJ
do que você viu na Aula 1?). Mais tarde, durante o governo do MARQUÊS
DE
POMBAL (meados do século XVIII), foi constituída uma companhia de
navegação para explorar as riquezas da região amazônica. O extrativismo
seria, assim, estimulado, e contribuiu fortemente para o avanço das
fronteiras coloniais brasileiras. As especiarias – cravo, canela, castanha
e salsaparrilha – assim como o cacau, a madeira e a pesca sustentaram
uma exploração econômica que tinha como base o trabalho indígena.
SUL: AS MISSÕES JESUÍTICAS
Os jesuítas desempenharam um papel fundamental na ocupação
de outras partes do território, além da Amazônia. Um exemplo foi o
que aconteceu no sul do país, com a chegada dos jesuítas portugueses,
particularmente na área de fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai.
Em regiões de difícil acesso, mas com forte presença indígena, eles
estabeleceram as missões jesuíticas, visando à catequese de guaranis e
demais tribos indígenas.
As missões jesuíticas eram núcleos de povoação indígena que
visavam a defender os índios do aprisionamento pelos colonizadores
brancos. Tratava-se de emprendimentos comerciais, porém seus métodos
de cooptação não se baseavam na escravização do nativo, como faziam
os colonizadores, e sim na catequese. Sua presença era maior em regiões
de menor interesse dos colonos, o que, entretanto, não significou a
inexistência de conflitos entre religiosos e colonos, resultando na expulsão
dos jesuítas pela Coroa portuguesa em 1759, durante o governo do
Marquês de Pombal.
2
Jesuítas:
instrumentos de ocupação e
empreendimentos comerciais
AULA
?
Tabela
Diferentemente dos holandeses e ingleses, os
portugueses justificavam a colonização não somente
como instrumento de expansão comercial, mas também de
disseminação da fé cristã. Esse foi o propósito que moveu a
Companhia de Jesus, ordem religiosa responsável pela implantação
de missões na colônia.
Os primeiros jesuítas chegaram ao Brasil em 1549. Ao longo do tempo,
a ordem foi responsável por missões no interior, catequizando indígenas,
e pela criação de colégios, entre outras realizações.
Em meados do século XVIII, o sucesso da empresa comercial organizada
pelos jesuítas feriu interesses de colonos espanhóis e portugueses em
uma região situada na fronteira entre Brasil e Paraguai. Interessados
em apropriarem-se daquele empreendimento, os colonos de
ambos os países conseguiram o apoio não só dos governos
espanhol e português, mas também da Igreja Católica,
chamada para arbitrar a disputa, o que resultou na
decisão do governo português de expulsar os
jesuítas da colônia em 1759.
A
A missão,
missão, filme
filme estrelado
estrelado por
por Robert
Robert de
de Niro
Niro ee Jeremy
Jeremy Irons,
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contraste entre
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Dirigido por
por Rolland
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1986.
Anote
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divirta-se!
Filme:
Filme: A
A missão
missão (The
(The Mission)
Mission)
Inglaterra,
Inglaterra, 1986
1986
Direção:
Direção: Rolland
Rolland Joffé
Joffé
Roteiro:
Roteiro: Robert
Robert Bolt
Bolt
Duração:
Duração: 125
125 min.
min.
Disponível
Disponível em
em vídeo
vídeo ee DVD
DVD
Quer
Quer saber
saber mais
mais sobre
sobre os
os jesuítas
jesuítas ee aa ocupação
ocupação do
do sul
sul do
do Brasil?
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Dê uma
uma olhada
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em http:
http:
//www.riogrande.com.br/historia/couro/couro1.htm
//www.riogrande.com.br/historia/couro/couro1.htm ee em
em http://www.riogrande.com.br/
http://www.riogrande.com.br/
historia/missoes.htm
historia/missoes.htm
CEDERJ
37
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
A RETAGUARDA DA EXPANSÃO AGRÍCOLA: O GRANDE
SERTÃO DA PECUÁRIA
Segundo o historiador Teixeira da Silva (1990, p. 58),
Os principais pontos de irradiação para o interior foram: de São
Vicente em direção aos campos de Curitiba; da Bahia, já desde
os tempos de Tomé de Souza, penetrando os currais no Piauí,
Maranhão, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, corrigindo os
traços iniciais da ocupação portuguesa, por demais ligada ao litoral;
outros grupos se embrenharam pelos sertões do São Francisco até
atingir os Rios Tocantins e Araguaia; de Pernambuco, partiu-se para
a ocupação do agreste e sertão, até o Piauí.
Como você já viu, a ocupação do Nordeste, Sudeste e CentroOeste ocorreu a partir do século XVII. O gado foi o instrumento principal
desta ocupação, principalmente por atender às necessidades das fazendas
produtoras de monocultura visando ao mercado externo. Inicialmente, era
utilizado somente como força motriz dos engenhos, instrumento de tração de
carretas que transportavam lenha e açúcar nas fazendas de cana-de-açúcar.
No âmbito do consumo interno, a carne era destinada à alimentação, e o
couro, à fabricação de selas, casacos, calçados, correias e cantis.
A partir do início do século XVII, a criação de gado torna-se
mais independente, ocupa terras cada vez mais para o interior, pois o
desenvolvimento dos rebanhos requeria grandes extensões de terras para as
pastagens. Tratava-se, assim, de uma atividade que respondia aos estímulos
de outra atividade mais dinâmica, principalmente da economia canavieira e
da mineira. Por ser uma atividade móvel pela própria natureza, a pecuária
contribuiu decisivamente para a ocupação do território.
Como na economia canavieira, a pecuária também era explorada de
forma extensiva, baseada na ocupação do território. Mas, diferentemente
da primeira, a maioria da mão-de-obra na pecuária era constituída por
trabalhadores livres que, sem acesso às terras mais férteis do litoral,
buscavam o trabalho como vaqueiros ou condutores de rebanho.
Entretanto, a expansão da cana-de-açúcar gerou conflitos entre
criadores de gado e proprietários de engenho na disputa de terras. De
acordo com Mendonça e Pires (2002):
isto se deve ao fato de que a plantação de cana era feita de
maneira extensiva, ou seja, não havia qualquer preocupação com
a preservação do solo, uma vez que o imenso território da colônia
38
CEDERJ
2
permitia que as culturas fossem transferidas de local. O conflito
AULA
acabou por empurrar a criação de gado cada vez mais para o
interior do Nordeste, e as fazendas fixaram-se na zona semi-árida
e no sertão, impróprios para o cultivo (p. 99).
O conflito entre criadores de gado e proprietários de engenho
cresceu quando surgiu a economia mineira, aumentando a demanda por
couro e animais para corte e tração e, portanto, intensificando a disputa
por terras. Com o aumento da procura, os preços dessas mercadorias logo
subiram, provocando protesto dos senhores de engenho do Nordeste.
Atividade 2
1
Modos de produção na colônia
Compare os tipos de atividades econômicas realizadas no Brasil do século XVII,
considerando o tamanho do terreno (latifúndio ou minifúndio), a mão-de-obra (escrava
ou livre) e o destino da produção (mercado interno ou externo).
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
Resposta
Na produção canavieira, voltada para o mercado externo, o sentido da atividade
econômica era produzir lucros mercantis, o que envolvia a necessidade de rebaixar
o máximo possível o custo de produção, daí a opção pelo trabalho escravo. Na
pecuária, voltada para o mercado interno, ao contrário, o sentido da atividade
era mais complementar ou alternativa à agroexportação, sendo muitas vezes
uma atividade de subsistência, em que não se justificava o “investimento” em
manutenção de escravos.
CEDERJ
39
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
M
ARQUÊS DE
DE
TRATADO
PM
OMBAL
ETHUEN
(1699-1782)
Acordo comercial
assinadoprimeiroentre
Célebre
Portugaldo
e Inglaterra
ministro
rei
em 1703 eD.
revogado
português
José
1842. Articulado
I,em
Sebastião
José de
pelo diplomata
inglês
Carvalho
e Melo,
o
John Methuen,
marquês
de Pombal,
estabelecia
que
foi
o mais notável
Portugal de
passava
estadista
seu
a importar
“parae
tempo.
Planejou
sempre” os
produtos
executou
as obras
têxteis
ingleses, com
de
reconstrução
taxas
privilegiadas,
de
Lisboa,
após
a Inglaterra
oenquanto
terremoto
que
se comprometia
destruiu
a cidade a
importar
vinhosesse
em
1755. Após
portugueses
taxandoevento,
consolidou
os apenas
em dois
seu
poder de
terços dos tributos
governante
absoluto
de importação
em
detrimento da
pagos pelos
nobreza
e dovinhos
clero.
franceses.
Além
Um
exemplo
claro
da ampliação
desse
poder foi a
descontrolada
da
submissão
da até
cultura
de vinhos
então
poderosa
em Portugal
Ordem
dos em
detrimento
dos
Jesuítas
ao estado
demais cultivos,
o
português.
Pombal
Tratado
de Methuen
fez
importantes
provocouno
a ruína
da
reformas
estado,
incipiente
indústria
com
destaque
para
daquele
país,
otêxtil
grande
impulso
que passouà a não
concedido
ter condições
de
instrução
popular
concorrer
com do
a
com
a reforma
produção
inglesa.por
ensino,
instituída
Aoem
mesmo
lei
1722.tempo,
acentuou-se um
vultoso desequilíbrio
na balança comercial
portuguesa,
compensado pelo
ouro proveniente do
Brasil (Minas Gerais)
que, transferido
para a Inglaterra,
contribuiria para
formar os meios de
financiamento da
revolução industrial
(SANDRONI,
Paulo – Novíssimo
Dicionário de
Economia).
O QUE MUDOU COM A MINERAÇÃO?
Entre meados do século XVII e início do século XVIII, a economia
colonial enfrentou uma longa crise, da qual somente iria sair com a
descoberta de ouro no interior da colônia, onde hoje se localiza o Estado
de Minas Gerais.
A crise da economia açucareira, a partir de meados do século
XVII, levou os colonos portugueses a intensificar a busca por metais
preciosos. As bandeiras que exploravam o sertão brasileiro finalmente
encontraram ouro e pedras preciosas nos atuais Estados de Minas Gerais,
Bahia, Goiás e Mato Grosso, no final daquele século.
Com a descoberta de ouro, iniciou-se um novo ciclo na economia
colonial, intensificando as relações entre metrópole e colônia. A mineração
do ouro tornou-se o centro das atenções de Portugal, de onde partiram
fluxos emigratórios importantes para a colônia. As demais atividades
econômicas entraram em declínio, ocorrendo o empobrecimento e o
despovoamento das regiões onde se localizavam.
A produção aurífera cresceu rapidamente, alimentando a
expectativa de grande durabilidade de suas reservas. Tais expectativas,
entretanto, não se concretizaram. O ouro era prospectado em rio, não era
ouro de mina, havendo sempre a possibilidade de se encontrarem novas
reservas, sem que fosse possível prever seu volume. Após atingir o auge da
produção na década de 1750, houve um rápido declínio, comprometendo
as possibilidades de desenvolvimento da economia colonial.
Furtado (1971) afirma que a economia mineira permitiu que o
TRATADO
DE
METHUEN, entre Inglaterra e Portugal, pudesse ser cumprido,
já que proporcionou os recursos necessários a Portugal para enfrentar o
comércio deficitário com a Inglaterra, país que se valeu de condições especiais
no comércio com os portugueses. Aquele acordo significou para Portugal a
renúncia a todo desenvolvimento manufatureiro e implicou a transferência,
para a Inglaterra, do impulso econômico gerado pela economia mineira
do Brasil. Mas, graças a ele, Portugal conseguiu apoio militar e político da
Inglaterra para manter o que restava do seu império colonial, em particular
a sua posição como metrópole da colônia brasileira.
Muitas cidades surgiram devido ao dinamismo econômico da
mineração, como Vila Rica (atual Ouro Preto) e Diamantina, a primeira
considerada patrimônio da humanidade pela Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), responsável pela
40
CEDERJ
2
defesa do patrimônio histórico e cultural. Essas cidades fazem parte hoje
AULA
das chamadas cidades históricas, destino de grandes fluxos de visitação
turística, e ícone do Estado de Minas Gerais.
Figura 2.3: Na Casa dos Contos, em Ouro
Preto, funcionou, entre outras instituições,
a Casa da Moeda. O casarão, residência de
um rico coletor de impostos, foi também
casa de fundição e prisão de inconfidentes,
como Cláudio Manoel da Costa.
Atividade 3
2
500 anos de ocupação do Brasil
3
Observe o quadro a seguir. Ele contém informações do mais recente censo demográfico,
realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2000:
Distribuição da população segundo regiões e grau de urbanização
População total – 2000
Território (%)
Brasil
169.799.170 – 100%
8,5 milhões km2 – 100%
Norte
7,6%
45,3
Nordeste
28,1%
18,3
Centro-Oeste
6,9%
18,9
Sudeste
42,6%
10,9
Sul
14,8%
6,8
Fonte: IBGE. Censos Demográficos (2000)
Em sua opinião, por que as regiões Norte e Centro-Oeste são as menos povoadas, apesar
de constituírem quase 65% do território brasileiro? Você identifica alguma razão histórica
para este fato? Qual a diferença entre estas regiões e o Estado de Minas Gerais, também
localizado no interior?
CEDERJ
41
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Distantes do litoral, as duas regiões, historicamente, tiveram um acesso difícil. Em
uma época em que o transporte interno era baseado no uso da tração animal, foi
difícil povoar essas regiões, especialmente porque era a atividade agroexportadora
que dava o sentido da colonização e esta, como se sabe, localizava-se na costa.
No caso amazônico, outro fator importante foi a construção de fortificações como
o forte do Presépio para proteger a região de invasões estrangeiras, como você já
viu nesta aula. No caso específico de Minas Gerais, apesar de situada no interior,
a região foi ocupada depois da descoberta de ouro, em 1680.
A economia mineira estava situada longe da costa, no interior do
país, em regiões de difícil acesso. A necessidade da metrópole de controlar
a produção e a exportação do metal levou à mudança da capital colonial,
deslocando-se de Salvador para o Rio de Janeiro, cidade mais próxima da
região mineira. A mineração foi, portanto, responsável pelo deslocamento
do centro econômico colonial do Nordeste para o Centro-Sul.
A circulação da renda na economia mineira diferia em muito
daquela observada na economia açucareira, estudada na Aula 1.
A economia mineira estimulou o surgimento de cidades para o
abastecimento da população do interior, desenvolvendo melhores
condições para as atividades comerciais internas. Isso trouxe uma
mudança da organização social – até então baseada na vida rural –, que
passou a ter caráter urbano.
A economia mineira foi responsável também pela articulação de
distintas regiões econômicas, em função da necessidade de abastecimento
de sua população com animais e alimentos. Atraiu fornecedores do sertão
nordestino e do sul do país, viabilizando a expansão de atividades até então
exploradas de modo pouco eficiente. Pela primeira vez, o país começava a
ser percebido como uma nação, uma entidade com unidade política, fato
de grande relevância para a emancipação política da colônia.
42
CEDERJ
2
A riqueza do ouro suscitou o crescente controle sobre a exportação
AULA
do metal, mas coincidiu com o declínio da mineração. Após atingir o
auge na década de 1750, houve um rápido declínio na produção do
ouro, comprometendo as possibilidades de desenvolvimento da economia
colonial. Tal declínio não foi percebido, já que o ouro brasileiro era de
aluvião e não de mina, o que dificultava a estimativa de suas reservas.
Você vai conhecer as medidas econômicas tomadas por Portugal para
tentar sanar este problema na próxima aula.
Se você quiser mais informações sobre esse tema, pode consultar
sites como www.pesquisaescolar.com.br. Outra fonte importante é o
Dicionário do Brasil Colonial, organizado pelo historiador Ronaldo
Vainfas.
Quer saber mais sobre a mineração no Brasil? Visite o site: http://
paginas.terra.com.br/educacao/br_recursosminerais/1494_1803.html
Segundo Teixeira da Silva (1990), o impacto da mineração sobre
o conjunto da economia colonial teve muitas conseqüências. Entre elas,
destacam-se o aumento da faixa de ocupação do território brasileiro,
a integração das “ilhas” de povoamento no Nordeste e no Sudeste.
A mudança nas bases políticas e administrativas da colônia, em que
o Rio de Janeiro, capital colonial depois de 1763, ganhou destaque,
incentivando a vida urbana.
CONCLUSÃO
As atividades pecuárias e mineiras, assim como as missões
dos jesuítas, levaram à ocupação do interior do País, povoando-o e
promovendo uma dinâmica social, política e econômica que não se
esgotava com o fim de um ciclo expansivo. Esse povoamento teve por
protagonistas os trabalhadores livres, não-identificados com grandes
proprietários de terras nem com escravos, os dois principais agentes da
empresa colonial agrícola.
Essa ocupação dos “sertões” é muito valorizada na cultura
paulista, pela importância dos bandeirantes paulistas, os principais
agentes dessa ocupação entre os séculos XVI e XVIII.
CEDERJ
43
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
Mais recentemente, os “currais” de gado também vêm sendo mais
valorizados culturalmente, a exemplo do livro de Raquel de Queiroz,
Memorial de Maria Moura, transformado em minissérie pela TV Globo
em 1994.
Se você quiser ter mais informações sobre a economia colonial
agrícola brasileira, pode buscá-las em sites, entre os quais sugerimos o
do Centro de Pesquisas e Documentação da Fundação Getúlio Vargas
CPDOC/FGV: http://www.cpdoc.fgv.br/comum/htm/index.htm.
Atividade Final
Observe estes mapas. No primeiro, você pode ver as atividades econômicas realizadas no
Brasil durante a primeira fase da colonização. Veja, agora, o segundo mapa, referente
ao século XVIII. Que diferenças você pode notar entre eles, e a que você as atribui?
Lembre-se de considerar o tamanho do território brasileiro, a quantidade e o tipo de
atividades econômicas, bem como o local onde ocorrem. Registre a sua resposta e, se
puder, compare com as de seus colegas.
Natal
TI C
ÂN
TL
NO
A
São Cristóvão
São Paulo
•
Cananéia
OCE
A
MERIDIANO DE TORDESILHAS
BRASIL
Pau-brasil
Pecuária
Cana-de-açúcar
Entradas
44
CEDERJ
O
2
AULA
Macapá
Óbidos
Santarém
Belém
Fortaleza
MERIDIANO DE TORDESILHAS
Natal
A
João Pessoa
Olinda
Recife
Salvador
Vila Boa
Cuiabá
Diamantina Porto Seguro
Cáceres
Ribeirão
do Carmo
TI C
ÂN
L
T
O
NO
Borba
Vila Bela
São Luís
OCE
A
Barcelos
Sabará
Vitória
S. J.Del Rei
Vila Rica
São Paulo
Sorocaba
Rio de Janeiro
Santos
Curitiba
Laguna
Cana-de-açúcar
Pecuária
Mineração
Drogas do Sertão
Resposta Comentada
Como bom observador que é, você deve ter notado, logo de início, que o território brasileiro
cresceu, indo além do Tratado de Tordesilhas. Por que isso aconteceu? Lembra-se dos
bandeirantes e dos jesuítas? A participação deles foi fundamental para o aumento de
população no interior e para a expansão das fronteiras do país (bandeiras e missões
jesuíticas, respectivamente). Veja como aumentou o número de cidades!
As atividades econômicas se diversificaram. Diminuiu a extração de pau-brasil, cresceu a
cultura de cana-de-açúcar. A pecuária expandiu-se em direção ao interior, principalmente
no Nordeste, devido aos engenhos. Outra diferença importante é o surgimento da
mineração. Você vai ver como o descobrimento de ouro no Brasil afetou até a vida
política do país. Mas isto é uma outra história... Não perca a Aula 3.
CEDERJ
45
Formação Econômica do Brasil | Atividades econômicas de subsistência e mineração auxiliam o
povoamento do interior
RESUMO
A economia colonial não se resume aos ciclos de monocultura para
exportação. A ocupação do interior da colônia foi resultado da pecuária
extensiva, do aprisionamento do índio, da implantação das missões
jesuíticas, e da atividade mineradora.
A articulação espacial dessas atividades gerou alterações significativas na
organização social e política do Brasil, favorecendo sua independência de
Portugal.
INFORMAÇÕES SOBRE A PRÓXIMA AULA
Na próxima aula, você irá completar o estudo sobre o Brasil colônia,
analisando a crise da economia colonial e identificando as causas da
sua insustentabilidade diante das mudanças na dinâmica do capitalismo
mundial.
46
CEDERJ
3
AULA
A crise da economia
colonial no Brasil
Meta da aula
objetivos
Analisar os fatores externos e internos que
determinaram a ruptura das bases da economia colonial agrícola, nos séculos XVIII e
XIX, bem como a independência do Brasil.
Espera-se que, ao final desta aula, você seja capaz de:
1
Relacionar a crise da economia colonial no Brasil
à expansão das atividades produtivas e comerciais
na colônia.
2
Identificar as limitações do monopólio comercial
imposto pela metrópole.
3
4
Associar estas limitações aos movimentos de
revoltas internas e de independência na colônia.
Reconhecer as transformações políticas, sociais
e econômicas por que passava o mundo (como
as revoluções Industrial e Francesa).
Pré-requisitos
Para acompanhar melhor os conceitos trabalhados nesta aula, você deve reler o verbete sobre
pacto colonial, na Aula 1, bem como as explicações sobre a dinâmica colonial brasileira, na
Introdução da Aula 2.
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
INTRODUÇÃO
Na aula passada, você estudou que, no período colonial, as atividades produtivas
e comerciais na economia brasileira não se esgotavam na empresa colonial
agrícola. A ocupação do Sul, do vale amazônico e o movimento de bandeiras
foram importantes para o desenvolvimento de atividades econômicas no interior
do país, assim como a pecuária e a mineração.
As colônias na América foram constituídas no momento de formação dos
estados nacionais europeus (absolutistas), em que predominavam as práticas
mercantilistas. Naquele período, os grandes mercadores (burgueses) e armadores associavam-se diretamente ao poder central desses Estados absolutistas.
Você viu também que a empresa colonial nasceu exatamente dessa associação,
em que os interesses da burguesia mercantil estavam absolutamente relacionados aos da Coroa. Juntos, burgueses e monarcas buscavam novas fontes de
renda por meio de conquistas coloniais.
Conquistados os novos territórios, a classe burguesa mercantil, com o apoio da
Coroa, garantiu para si o monopólio comercial. Formava-se, assim, a base da
política mercantilista, bem como um sistema de comércio fundado no pacto
colonial (exclusivo comercial), garantindo à metrópole total intermediação nas
operações de comércio. Assim, os interesses metropolitanos convergiam estreitamente com os da classe exportadora e importadora que atuava na colônia.
Como a produção e o mercado interno eram bastante reduzidos, o pacto
colonial impedia a concorrência e permitia os ganhos extraordinários da classe
burguesa e da metrópole.
Nesta aula, vamos analisar as conseqüências do aumento da produção e do
crescimento do mercado interno para essa estrutura de relações comerciais e
de poder político e econômico. Além disso, você irá perceber como o avanço
do capitalismo industrial e das idéias liberais na Europa serviu de anteparo para
a configuração da crise do sistema colonial.
O SENTIDO DA CRISE
A crise da economia colonial agrícola decorreu de dois aspectos
complementares, um de caráter interno, e outro, externo. O primeiro foi
a expansão dos mercados na colônia, resultado direto do aumento da
população e do incremento da produção. Surgiram, em conseqüência,
conflitos de interesses entre colonos e metrópole. Até então, os colonos
sentiam-se portugueses em terras brasileiras, tendo, em um mercado
pouco expressivo, privilégios garantidos pelo monopólio (exclusivo)
48
CEDERJ
da produção e o crescimento do mercado interno – sobretudo após o
início do ciclo do ouro –, os interesses particulares da colônia foram
aumentando de maneira significativa. O pacto colonial passou a ser,
então, um empecilho à expansão dos negócios e, portanto, ao potencial
de ganhos dos colonos.
O segundo aspecto, referente ao plano externo, eram os efeitos da
R E V O L U Ç Ã O I N D U S T R I A L cada vez mais visíveis na Europa. O processo
de acumulação de capital, naquele contexto, centrava-se fortemente
na esfera de produção da indústria, com uma rápida incorporação de
novas técnicas produtivas que ampliavam largamente seu horizonte
de crescimento. O aumento da produtividade na atividade industrial
era absolutamente fantástico. Para que você tenha uma idéia, segundo
dados disponíveis na home page da Escola Técnica de Bergen, em
Nova Jérsei (Estados Unidos), de 1790 a 1830, mais de cem mil teares
movidos a eletricidade foram postos em funcionamento, na Inglaterra
e na Escócia.
Assim, a necessidade de busca e incorporação de novos mercados
pelas unidades industriais em formação tornou-se um traço típico da
dinâmica capitalista.
Figura 3.1: Iniciada na
Inglaterra, a Revolução
Industrial expandiu-se
pela Europa. Nesta foto,
você pode ver a fábrica
construída pelo engenheiro
Julius Bruch em 1873 na
Alemanha (então Império
Germânico). Esta fábrica
foi uma das maiores
produtoras de vigas de
aço no país e, em 1994,
foi tombada pela Unesco
como patrimônio cultural
da humanidade.
“Conjunto das transformações tecnológicas,
econômicas e sociais ocorridas na Europa e particularmente na Inglaterra
nos séculos XVIII e XIX
e que resultaram na instalação do sistema fabril
e na difusão do modo de
produção capitalista. O
processo foi impulsionado, numa primeira fase,
pelo aperfeiçoamento
de maquinas de fiação e
tecelagem e pela invenção
da máquina a vapor, da
locomotiva e de numerosas máquinas – ferramentas (...). Da conjunção
desses fatores, resultou a
indústria capitalista mecanizada tal como a conhecemos. A aceleração do
processo produtivo teve
início na Inglaterra, entre
1750 e 1830, a partir de
inovações tecnológicas
na atividade têxtil (...).
Apesar dessas profundas
transformações econômico-sociais, a Revolução
Industrial foi um processo
contraditório. Ao lado da
elevação da produtividade
e do desenvolvimento da
divisão social do trabalho,
manifestava-se a miséria
de milhares de trabalhadores desempregados e de
homens, mulheres e crianças obrigados a trabalhar
até 16 horas por dia, privados de direitos políticos
e sociais. Essa situação
de classe operária levou à
formação dos primeiros
sindicatos, à elaboração
do pensamento socialista
e à irrupção de inúmeros
movimentos, levantes e
revoltas de trabalhadores
que marcaram toda vida
européia ao longo do
século XIX”
(SANDRONI, 2004:
528/529).
CEDERJ
49
3
REVOLUÇÃO
INDUSTRIAL
AULA
comercial e suas restrições à concorrência externa. Com o aumento
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
ILUMINISMO
O Iluminismo representou um movimento cultural originado
no Renascimento,
sobretudo a partir
do século XVII. Do
ponto de vista econômico, seu principal foco era a definição de uma política
econômica mais livre
das restrições típicas
do mercantilismo,
idéia defendida fortemente pela burguesia
emergente. Um dos
nomes importantes
para o desenvolvimento desta corrente
é o de René Descartes (1596-1650),
matemático francês
considerado o pai do
racionalismo. Além
dele, destacam-se
os franceses Voltaire (1694-1770)
e Montesquieu
(1698-1755), além
dos ingleses Isaac
Newton (1642-1727)
e John Locke (16321704), entre outros
importantes pensadores.
“A Revolução
Industrial desenvolveu
também uma nova sociedade: a (...)
capitalista, baseada na divisão dos indivíduos em duas classes: os capitalistas, detentores dos meios de produção, e os trabalhadores,
homens livres que vendem sua força de trabalho em
troca de um salário. O capitalismo, consolidado com a
Revolução Industrial, gerou muita riqueza e um enorme progresso material, mas criou também uma massa
de trabalhadores pobres, no campo e na cidade. Os
economistas liberais, defensores da sociedade capitalista sustentavam a idéia de que o Estado não
precisa interferir na economia, que deve ser
regulada apenas pelo mercado”
(FONSECA; PEDRO, 1995).
!
É fácil entender, então, que o monopólio comercial e produtivo
formalizado no pacto colonial era uma barreira para o capital industrial
e para a produção em grande escala. Isto explica o grande interesse da
Inglaterra pelos movimentos de independência das Américas hispânica
e portuguesa. Em termos práticos, essas duas barreiras representavam
o antagonismo entre os interesses ainda existentes no mercantilismo
português e os novos acontecimentos políticos, sociais e econômicos
associados à Revolução Industrial.
Essas transformações também estavam representadas no campo
institucional e das idéias pela crescente contestação às instituições
absolutistas e o avanço do I L U M I N I S M O . Naquele momento, o
SAMENTO LIBERAL
PEN-
se rebelou contra as instituições do antigo regime.
LIBERALISMO
“Doutrina que serviu de substrato ideológico às revoluções antiabsolutistas que ocorreram na Europa (Inglaterra e França,
basicamente) ao longo dos séculos XVII e XVIII, e à luta pela independência dos Estados Unidos. Correspondendo aos
anseios de poder da burguesia, que consolidava sua força econômica ante uma aristocracia em decadência, amparada no
absolutismo monárquico, o liberalismo defendia: 1) a mais ampla liberdade individual; 2) a democracia representativa com
separação e independência entre três poderes (executivo, legislativo e judiciário); 3) o direito inalienável à propriedade;
4) a livre iniciativa e a concorrência como princípios básicos capazes de harmonizar os interesses individuais e coletivos,
e gerar o progresso social. Segundo o princípio do laissez-faire, não há lugar para a ação econômica do Estado, que deve
apenas garantir a livre concorrência entre as empresas e o direito à propriedade privada, quando esta for ameaçada por
convulsões sociais. O pensamento econômico liberal constitui-se, a partir do século XVIII, no processo da Revolução
Industrial, com autores como François Quesnay, estruturando-se como doutrina definitiva nos trabalhos de John Stuart
Mill, Adam Smith, David Ricardo, Thomas Malthus, J.B. Say e F. Bastiat. Eles consideravam que a economia, tal como
a natureza física, é regida por leis universais e imutáveis, cabendo ao indivíduo apenas descobri-las para melhor atuar
segundo os mecanismos dessa ordem natural” (SANDRONI, 2004, p. 347).
50
CEDERJ
3
Vale citar, em particular, o novo ideário difundido a partir da Revolução
AULA
Francesa e os princípios de liberdade e igualdade – considerados, pela
metrópole, como “os abomináveis princípios franceses”!
Nesse caso, um elemento-chave foi a contestação do conceito do
rei como um enviado divino: a nova visão determinava que seu poder
lhe era legado pelos homens e não por Deus, idéia que se disseminou
rapidamente na colônia por intermédio dos estudantes brasileiros, filhos
de famílias ricas, que iam cursar a universidade na Europa.
Quer
Quer saber
saber mais
mais sobre
sobre oo Iluminismo
Iluminismo ee os
os principais
principais nomes
nomes desta
desta
corrente
os sites
sites http://www.saberhistoria.hpg.ig.c
http://www.saberhistoria.hpg.ig.
corrente ideológica? Veja os
com.br/nova_pagina_31.htm
http://www.conhecimentosgerais.co
om.br/nova_pagina_31.htm eehttp://www.conhecimentosgerais.com
m.br/historia-geral/iluminismo.html.
Neste
mesmo
site,
você
pode
.br/historia-geral/iluminismo.html. Neste
mesmo
site,
você
pode
ler
ler
textos
pensadores
iluministras.
textos
dosdos
pensadores
iluministras.
Atividade 1
2
Pacto colonial x capital industrial
Leia as definições a seguir:
a. “Laissez-faire é uma expressão francesa laissez faire, laissez passer, que significa
“deixem fazer, deixem passar”, e se refere a uma filosofia econômica que surgiu
no século XVIII, que defendia a existência de mercado livre nas trocas comerciais
internacionais, ao contrário do forte protecionismo baseado em elevadas tarifas
alfandegárias (...). (...) esta teoria (...) teve em Adam Smith um dos seus principais
defensores (...). O ‘laissez faire’ tornou-se o chavão do liberalismo na versão mais pura
de capitalismo de que o mercado deve funcionar livremente, sem interferência. Esta
filosofia tornou-se dominante nos Estados Unidos e nos países ricos da Europa, durante
o fim do século XIX e no início do século XX” (WIKIPEDIA, 2005).
b. “A colonização portuguesa do Brasil, como outras colonizações européias na América
no mesmo período, tem caráter essencialmente mercantilista: ocupar a terra e produzir
riquezas para proporcionar renda ao Estado e lucros à burguesia. Isso é garantido pelo
monopólio comercial e pelo pacto colonial, que legitima o direito exclusivo de comprar
e vender na colônia por meio de seus comerciantes e de suas companhias.”
(http://geocities.yahoo.com.br/vinicrashbr/historia/brasil/colonizacaodobrasil.html)
A partir destas definições, responda:
De que forma o avanço do capital industrial,
CEDERJ
51
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
sobretudo inglês, poderia esbarrar no pacto colonial?
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Resposta Comentada
O processo produtivo industrial caracterizava-se por uma grande capacidade de
ampliação da oferta de produtos, considerando a recorrente incorporação de
progresso técnico na atividade. A necessidade de encontrar mercados para escoar
a produção poderia ser inviabilizada pelas restrições do pacto colonial.
52
CEDERJ
AULA
3
Atividade 2
4
Liberdade, liberdade
Observe este selo, lançado em comemoração aos 200 anos da Revolução Francesa. Nele,
você pode observar a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada
pela Assembléia Nacional em 1789. Aqui seguem alguns trechos deste documento que
foi um marco na história das sociedades ocidentais.
Em que partes do texto você pode identificar traços ideológicos do liberalismo?
I – O objetivo de toda associação política é a conservação dos direitos naturais e
imprescritíveis do homem; esses direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança
e a resistência à opressão.
III – O princípio de toda a soberania reside essencialmente na razão; nenhum corpo,
nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane diretamente.
IV – A liberdade consiste em poder fazer tudo que não prejudique a outrem. Assim, o
exercício dos direitos naturais do homem não tem limites senão aqueles que asseguram
aos outros membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos; seus limites não
podem ser determinados senão pela lei.
(...)
VI – A lei é a expressão da vontade geral; todos os cidadãos têm o direito de concorrer,
pessoalmente ou por seus representantes, à sua formação; ela deve ser a mesma para
todos, seja protegendo, seja punindo. Todos os cidadãos, sendo iguais a seus olhos, são
igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo sua
capacidade e sem outras distinções que as de suas virtudes e de seus talentos.
(...)
VIII – A lei não deve estabelecer senão penas estritamente necessárias, e ninguém
pode ser punido senão em virtude de uma lei estabelecida e promulgada ao
delito e legalmente aplicada.
CEDERJ
53
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
(...)
XI – A livre comunicação dos pensamentos e opiniões é um dos direitos mais preciosos
do homem; todo o cidadão pode, pois, falar, escrever e imprimir livremente; salvo a
responsabilidade do abuso dessa liberdade nos casos determinados pela lei.
(...)
XVII – A propriedade, sendo um direito inviolável, e sagrado, ninguém pode ser
dela privado senão quando a necessidade pública, legalmente constatada, o exija
evidentemente, e sob a condição de uma justa e prévia indenização.
Resposta Comentada
Os ideais de liberdade permeiam todo o texto da Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão, porém estão mais evidentes em alguns trechos. No item
1, por exemplo, você deve ter selecionado: “esses direitos são a liberdade, a
propriedade, a segurança e a resistência à opressão”. As liberdades individuais
e sociais estão contidas nos itens IV, VI e XI. No artigo XVII, a defesa ao direito
de propriedade está claramente enunciada em “A propriedade, sendo um direito
inviolável, e sagrado (...)”.
De todo modo, cabe uma observação importante. Apesar do caráter supostamente
libertário e igualitário desse processo, o movimento de rebeldia interno à colônia
dificilmente (quase nunca, na verdade) associava as revoltas à desumanidade da
escravidão. Assumia puramente um caráter rural, em que a escravidão não era
contestada – ao contrário, representava a única forma de relação de produção
praticada.
A aplicação das idéias liberais no Brasil apresentava, desta forma, limites importantes.
Primeiro, um limite físico, determinado pela proibição de sua propagação através da
censura a vários livros e publicações. Segundo, pela restrição das relações sociais,
pois as idéias liberais, no Brasil, eram usadas apenas no sentido de contestação às
relações metrópole/colônia. Na Europa, essas idéias representavam um escopo
mais amplo de apoio aos interesses da burguesia industrial emergente. Essa
mudança, de fato, inexistia no Brasil.
54
CEDERJ
AULA
3
AS MUDANÇAS NA METRÓPOLE E SUAS CONSEQÜÊNCIAS
PARA O BRASIL
O final do século XVIII foi um período de acirramento das contradições de interesses colônia/metrópole. Em Portugal, o absolutismo seguia
firme, em particular durante o reinado de Dom José I – conhecido pelo
“D E S P O T I S M O
ESCLARECIDO”
representado por seu primeiro-ministro,
o Marquês de Pombal, que cumpria um papel-chave na definição das
diretrizes políticas e econômicas. No Brasil, o período foi marcado por
dificuldades econômicas graves, resultantes da queda das exportações.
A exceção, nesse contexto, foi o Maranhão, em virtude dos incentivos
do Marquês de Pombal ao criar uma companhia de comércio altamente
capitalizada para explorar e ampliar a produção e exportação de algodão,
produto em alta substantiva no mercado internacional.
O acirramento das crises internas e nas colônias, todavia, obrigou
o ministro a demitir-se em 4 de março de 1777. Neste mesmo ano o rei
DESPOTISMO
ESCLARECIDO
Forma de manutenção
das práticas absolutistas sem a associação
do rei ao poder divino
– dá um tom de racionalidade ao absolutismo, incorporando as
idéias iluministas da
razão. Em Portugal,
D. José I encarnou este
espírito e teve como
principal articulador o
Marquês de Pombal,
primeiro-ministro
responsável pelas
medidas e articulações
políticas.
faleceu, e o trono passou a ser ocupado por Dona Maria (sua filha, mãe
de D. João VI e conhecida na História como “a louca”), iniciando a
V I R A D E I R A . Na verdade, esse conjunto de mudanças não trouxe transformações importantes, pois de maneira geral a
POLÍTICA POMBALINA
ainda prevalecia, graças à tentativa de preservar as estruturas do exclusivo
comercial. A diferença fundamental foi a redefinição de alguns laços
formais que substanciavam sua existência, realizando ações como:
(a) acabar com as companhias de comércio, permitindo uma maior
VIRADEIRA
Desmonte das políticas pombalinas iniciadas por D. Maria
I em 1877, incluindo
uma intensa perseguição ao Marquês
de Pombal até sua
morte em 1782.
liberdade aos comerciantes;
(b) combate ao contrabando;
(c) permissão para o comércio intercolonial com a África e o Oriente;
(d) liberação do comércio e exploração do sal e da pesca da baleia, terminando o monopólio metropolitano nesse setor;
(e) proibição da manufatura têxtil no Brasil.
Essas mudanças refletiam, em realidade, a crescente dependência
econômica, por parte de Portugal, da colônia brasileira (essa exploração
era condição básica para o desenvolvimento português) e, portanto, era
POLÍTICA
POMBALINA
Conjunto de medidas
visando ao fortalecimento do poder real
em Portugal, como
a reforma do exército e da burocracia
estatal. Tais medidas
subjugaram os interesses da nobreza e
reduziram fortemente o poder do clero.
vantajoso, para a metrópole, fazer concessões. Refletiam, também, no
nível das relações internacionais, as condições impostas pela proteção
CEDERJ
55
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
inglesa. O caso da proibição das manufaturas é exemplar. A justificativa
dada por Portugal era de que a ênfase produtiva deveria estar na agricultura, atividade principal da colônia. Uma diversificação em direção à
produção industrial necessitaria da transferência de recursos (principalmente mão-de-obra) da agricultura para a produção têxtil, reduzindo a
capacidade de expansão agrícola.
Havia, no entanto, a intenção de preservar a manufatura têxtil
da metrópole da concorrência colonial, objetivando criar uma espécie
de complementaridade entre a produção da colônia e da metrópole.
O impacto real da medida era praticamente nulo, pois quase não havia
produção têxtil no Brasil. A grande fonte de concorrência estava no
contrabando inglês.
Apesar da flexibilização das relações expostas, as bases do exclusivo comercial estavam mantidas, e as reações no Brasil começavam a
ganhar um contorno mais decisivo. Exemplos históricos importantes
foram a Inconfidência Mineira e a Conjuração Baiana (conhecida como
a Revolta dos Alfaiates), entre outros. Vamos ver estas duas revoltas
com mais detalhes?
Inconfidência mineira
Os inconfidentes queriam a independência do Brasil e instaurar a
República. Pretendiam incentivar as manufaturas, proibidas desde 1785,
e fundar uma universidade em Vila Rica, atual Ouro Preto. Integrado
por membros da elite intelectual e econômica da região – fazendeiros
e grandes comerciantes –, o movimento reflete as contradições desses
segmentos: sua bandeira traz o lema libertas quae sera tamem (Liberdade
ainda que tardia), mas não se propõe a abolir a escravidão.
Conspiradores: entre os conspiradores estão Inácio José de Alvarenga Peixoto, ex-ouvidor de São João del Rey; Cláudio Manoel da Costa,
poeta e jurista; tenente-coronel Francisco Freire de Andrada; Tomás Antônio Gonzaga, português, poeta, jurista e ouvidor de Vila Rica; José Álvares Maciel, estudante de Química em Coimbra que, junto com Joaquim
José Maia, procura o apoio do presidente americano Thomas Jefferson;
Francisco Antônio de Oliveira, José Lopes de Oliveira, Domingos Vidal
Barbosa, Salvador Amaral Gurgel, o cônego Luís Vieira da Silva; os
padres Manoel Rodrigues da Costa, José de Oliveira Rolim e Carlos
Toledo; e o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.
56
CEDERJ
3
Derrama: o momento escolhido para a eclosão da revolta é o
AULA
da cobrança da derrama, imposto adotado por Portugal no período de
declínio da mineração do ouro. A Coroa fixa um teto mínimo de 100
arrobas para o valor do quinto. Se ele não é atingido, os mineradores
ficam em dívida com o fisco. Na época, essa dívida coletiva chega a 500
arrobas de ouro, ou 7.500 quilos. Na derrama, a população das minas
é obrigada a entregar seus bens para integralizar o valor da dívida.
Devassa: o movimento é denunciado pelos portugueses Joaquim
Silvério dos Reis, Brito Malheiros e Correia Pamplona, em 5 de março
de 1789. Devedores de grandes somas ao tesouro real, eles entregam os
parceiros em troca do perdão de suas dívidas. Em 10 de maio de 1789,
Tiradentes é preso. Instaura-se a devassa – processo para estabelecer
a culpa dos conspiradores –, que dura três anos. Em 18 de abril de
1792, são lavradas as sentenças: 11 são condenados à forca, os demais
à prisão perpétua em degredo na África e ao açoite em praça pública.
As sentenças dos sacerdotes envolvidos na conspiração permanecem
secretas. Cláudio Manoel da Costa morre em sua cela. Tiradentes tem
execução pública: enforcado no Rio de Janeiro em 21 de abril de 1792,
seu corpo é levado para Vila Rica, onde é esquartejado e os pedaços
expostos em vias públicas. Os demais conspiradores são degredados.
Quer saber mais sobre a Inconfidência Mineira? Acesse o
site http://educaterra.terra.com.br/almanaque/inconfidencia/
inconfidencia_1.htm
Conjuração baiana
De caráter social e popular, a conjuração baiana, ou revolta dos
alfaiates, como também é conhecida, explode em Salvador em 1798.
Inspira-se nas idéias da revolução francesa e da inconfidência mineira,
divulgadas na cidade pelos integrantes da loja maçônica Cavaleiros da
Luz, todos da elite local – Bento de Aragão, professor; Cipriano Barata, médico e jornalista; o padre Agostinho Gomes e o tenente Aguilar
Pantoja. O movimento é radical e dirigido por pessoas do povo, como
os alfaiates João de Deus e Manoel dos Santos Lira, os soldados Lucas
Dantas e Luís Gonzaga das Virgens. Propõe a independência, a igualdade
racial, o fim da escravidão e o livre comércio entre os povos.
CEDERJ
57
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
Em
Emhttp://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo02/conj_baiana.html,
http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo02/conj_
você
pode encontrar
Conjuração Baiana.
baiana.html,
você mais
podeinformações
encontrar sobre
mais ainformações
sobre a
Atividade 3
Uns mais iguais do que outros?
3
Leia a definição a seguir:
Prevalece na literatura de formação econômica do Brasil a interpretação de que as
idéias de liberdade e igualdade serviriam exclusivamente para os brancos (!) da colônia,
cujos interesses vinham sendo contrapostos aos da metrópole. Como explicar esta
visão à luz dos argumentos expostos?
(WKIPEDIA, 2005)
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Resposta Comentada
O principal foco de descontentamento associava-se ao conflito de interesses de
elites provocado pelo pacto colonial. As restrições do pacto à atividade econômica
da metrópole impediam a ampliação dos negócios da elite colonial. Não havia,
portanto, uma proposta de mudança das relações sociais e econômicas em
curso no Brasil.
58
CEDERJ
AULA
3
O ACIRRAMENTO DOS CONFLITOS DE INTERESSES E O
PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA
Apesar das revoltas internas de cunho pseudoliberal, nada parecia
determinar o rompimento das antigas formas de relacionamento BrasilPortugal. As revoltas foram sufocadas na origem, implicando severas
punições aos rebeldes. Além disso, eram estritamente organizadas pelas
elites, com ignorância quase completa das camadas populares. O processo
de separação colônia/metrópole só viria a ser precipitado pela invasão
francesa a Portugal e a vinda da corte para o Brasil em 1808, na medida
em que determinou uma séria de mudanças institucionais de relevo para
que a colônia servisse de sede do governo no Rio de Janeiro, como a
abertura dos portos e a criação do Banco do Brasil. A situação portuguesa
de lucros extraordinários no comércio com a colônia foi então rompida,
especialmente após a formalização dos tratados com a Inglaterra.
A vinda da corte
portuguesa para o Brasil
A conjuntura européia no período
napoleônico teve reflexos significativos na história
portuguesa. Neste contexto, no início do século XIX,
observou-se uma importante deterioração das relações
diplomáticas entre França e Inglaterra, com quem Portugal
mantinha laços estreitos de aliança.
Em novembro de 1807, as tropas francesas invadiram o território
português, impondo uma transferência às pressas da corte portuguesa para
o Brasil, sua principal colônia, com apoio da esquadra britânica. Esse processo
determinou um aprofundamento ainda maior dos laços políticos e econômicos
de Portugal e Inglaterra.
As primeiras medidas tomadas com a chegada da corte ao Brasil foram:
(a) abertura dos portos (1808), já que Portugal estava ocupado e não poderia
exercer a função de entreposto comercial para as mercadorias brasileiras,
condição definida no pacto colonial;
(b) fomento à agricultura e fundação do Horto Real (Jardim Botânico) no Rio
de Janeiro;
(c) incentivo ao desenvolvimento das manufaturas, concedendo isenção
de impostos a matérias-primas importadas;
(d) permissão de acesso de estrangeiros às sesmarias, com
o objetivo de garantir fronteiras com a expansão do
povoamento;
(e) criação do Banco do Brasil, com objetivo
primordial de financiar os gastos
da Coroa.
?
CEDERJ
59
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
No campo externo, dois aspectos sobressaíam. O primeiro era
uma política direcionada a contrariar os interesses napoleônicos na América do Sul, caracterizando uma estratégia expansionista na invasão da
Guiana Francesa, em 1809. Outro aspecto foi que, com o objetivo de
tornar-se regente do império espanhol na América, no período de ocupação da Espanha pelas tropas francesas, D. João VI envia navios para
sitiar e ocupar a Banda Oriental (Uruguai). Esse processo culminou com
a anexação da Banda Oriental, em 1821, como Província Cisplatina,
após o período de desagregação do Vice-Reinado do Prata, que seguiu
a independência da Argentina em 1816.
Dirigido por Carla Camuratti, o filme Carlota Joaquina, princesa do
Brasil traça, de maneira cômica, um perfil da história do país no
período da permanência da Família Real portuguesa, com base na
história desta imperatriz, esposa de D. João VI.
Carlota Joaquina e D. João viveram 13 anos no Brasil, deixando,
como legados, a fundação do Banco do Brasil, a criação da Biblioteca
Nacional, da Escola de Medicina e do Jardim Botânico.
Da próxima vez que você for à locadora, que tal alugar esse filme?
Direção: Carla Camuratti
Ano: 1995
Duração: 101 minutos
?
Os tratados com
a Inglaterra
O aumento da dependência de Portugal em relação
à Inglaterra, decorrente da invasão napoleônica de 1807,
trouxe conseqüências relevantes para o Brasil. No intuito de
garantir vantagens sobre outros países nas relações econômicas a partir
do Brasil, a Inglaterra impôs a assinatura de tratados que lhe afiançaram
uma posição extremamente favorável nas relações econômicas – em troca
de proteção e apoio na estratégia expansionista de D. João VI nas colônias
ultramarinas. Para a Inglaterra, essa era uma questão fundamental, pois o
Bloqueio Continental (fechamento dos portos europeus para a Inglaterra) lhe
impunha a necessidade de buscar novos mercados. Para Portugal, apesar de
saber das desvantagens para os comerciantes portugueses, os interesses no
aprofundamento da aliança pesaram mais. Os principais tratados foram:
60
CEDERJ
1) Tratado de Aliança e Amizade: definia as condições de defesa
mútua e apoio ao ataque português à Guiana Francesa. Em
contrapartida, acordou-se o comprometimento de
Portugal com a redução do tráfico de escravos,
circunscrito à região abaixo da linha
do equador.
3
?
AULA
2) Tratado de Comércio
e Navegação: definia vantagens
tarifárias para a Inglaterra, até mesmo sobre
Portugal, no comércio com o Brasil. A tarifa alfandegária
aplicada sobre os produtos ingleses seria de 15%, contra 16% para
os portugueses e 24% para os demais países. Além disso, os cidadãos de
origem inglesa no Brasil obtiveram o privilégio da extraterritorialidade, de
maneira que os atos cometidos por ingleses no país seriam julgados por juízes
da Inglaterra. No que se refere à questão religiosa, os cultos protestantes
foram liberados no Brasil. Finalmente, este tratado deu liberdade aos ingleses
para criar casas de comércio e negociar livremente tanto os produtos
brasileiros no exterior, quanto as vendas de importados para o Brasil.
Como será visto nas próximas aulas, este foi um fator-chave para
o processo de acumulação de capital na cultura cafeeira,
principal produto de exportação do Brasil a partir
do início do século XIX.
Do ponto de vista dos colonos brasileiros, a liberalização da economia e a dinamização do comércio (resultado da vinda da Corte e da abertura dos portos) modificaram fundamentalmente o cenário. A manutenção
estrutural do pacto colonial funcionava como um entrave à expansão da
economia doméstica, e os grandes agricultores – classe dominante – enxergavam Portugal como um entreposto desnecessário e caro.
O descontentamento aumentava internamente, e as medidas associadas ao pacto colonial eram cada vez mais repelidas, como a proibição
do comércio entre as províncias, o monopólio de portugueses nos cargos
públicos e, sobretudo, os impostos abusivos cobrados pela Coroa. Estes elementos conjugavam-se na intensificação do processo de independência.
Atividade 4
Repensando a abertura dos portos
1
2
Diante do quadro vivenciado pela colônia no início do século XIX, é possível afirmar
que a abertura dos portos representou a efetivação da independência econômica do
Brasil em relação a Portugal?
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CEDERJ
61
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
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Resposta Comentada
Sim, pois o fim do exclusivo comercial intensificou as relações de comércio entre
o Brasil e a Inglaterra, redundando nos tratados de 1810, em que a Inglaterra
garantia vantagens absolutas sobre o resto do mundo, inclusive Portugal.
É importante que você entenda, entretanto, que o processo de
independência não era marcado por um forte sentimento nacionalista,
notadamente do ponto de vista econômico, uma vez que a economia era
claramente voltada para o exterior, com um mercado interno extremamente restrito e um sistema econômico doméstico desintegrado (o Brasil
era formado por ilhas de produção cujo elo básico de ligação eram os
pecuários). Dessa forma, os movimentos de revolta sempre
HINTERLANDS
HINTERLANDS
Regiões mais afastadas da costa.
foram localizados regionalmente, sem qualquer unidade nacional – prevalecia, portanto, uma espécie de “antiportuguesismo” caricaturado na
figura dos “branquinhos do reino”.
62
CEDERJ
3
AULA
Características do processo de independência
3
Atividade 5
4
Apesar do crescente descontentamento interno na colônia, ocasionando até o surgimento de revoltas internas, o processo de independência sofreu importante influência
externa. Como explicar essa característica?
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Resposta comentada
Os acontecimentos históricos na Europa, em especial o Bloqueio Continental, determinando a vinda da corte para o Brasil, além dos interesses econômicos da Inglaterra, tiveram um peso relevante e precipitaram o processo de independência do
Brasil. Assim, o exclusivo colonial perdia totalmente o sentido de permanência.
Figura 3.2: O Grito do Ipiranga, de Pedro Américo (1888).
A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL
Em 7 de setembro de 1822, D. Pedro I proclamou a independência do
Brasil em relação a Portugal, tornando-se nosso primeiro imperador. Estava
conquistada, então, a autonomia política, mas não a econômica: Portugal
exigiu 2 milhões de libras para reconhecer a independência do Brasil. Como o
recém-formado império não dispunha de capital suficiente, D. Pedro decidiu
pedir um empréstimo à Inglaterra.
Em relação aos demais países, México e Estados Unidos foram os primeiros países a reconhecer nossa independência. Transformavam-se também
as relações comerciais, com maior autonomia para o Brasil.
CEDERJ
63
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
No plano interno, porém, a independência não provocou grandes
mudanças. A estrutura agrária permaneceu inalterada, com base na escravidão, na monocultura e no latifúndio, e a distribuição de renda continuava
desigual, beneficiando, principalmente, a elite agrária. O povo permaneceu
à margem deste processo. E em nossos dias, será diferente?
A História a ser
aprendida
Por Alexandre Barbosa*
!
É preciso ficar claro que, mais que a roupa usada por
D. Pedro ou a circunstância em que aconteceu a proclamação, o importante é a ausência do povo deste processo histórico. A independência do Brasil, ao contrário de outras nações, foi
um pacto de elite: o poder passou da Coroa Portuguesa para a aristocracia criada por ela no Brasil. Não houve uma guerra de independência. O processo não se rompeu. A escravidão não acabou, o Brasil
continuou dependente de Londres e tecnologicamente atrasado. A
historiografia não deve apenas criticar o quadro de Pedro Américo
como um embuste, mas deve apontar o processo de independência formal política de Portugal passando para dependência do
capital inglês, e também evidenciar que a Proclamação da
República, a queda de Vargas, o fim da Ditadura, tudo
não passou de pactos de elite.
(BARBOSA, 2005)
CONCLUSÃO
A crise do sistema colonial brasileiro resultou do conflito de
interesses entre a metrópole e a classe produtiva e comercial atuante na
colônia. O crescimento das relações de produção e comércio no interior
da economia brasileira, especialmente a partir do avanço da exploração do ouro, determinou uma maior preocupação da metrópole com o
controle das atividades econômicas da colônia e a tentativa de preservar
seus ganhos extraordinários. Dessa forma, a interferência da metrópole
nas atividades internas desenvolvidas na colônia foi o estopim da crise.
A vinda da corte portuguesa para o Brasil – e a formalização dos tratados com a Inglaterra – precipitou o fim das bases do pacto colonial,
na medida em que as elites coloniais perceberam que poderiam obter
maiores vantagens com a bandeira do livre comércio.
64
CEDERJ
AULA
3
Atividades Finais
1. “A economia mineira foi a mais propícia à formação de um mercado interno (...) De
fato, longe da costa, em alguns casos, compensava à atividade local suprir necessidades
antes satisfeitas pela importação” (LACERDA et al., 2001, p. 24).
“A queda do ‘exclusivo metropolitano’ e, em seguida, a formação do Estado Nacional
criaram a possibilidade de que se nacionalizasse a apropriação do excedente e de que se
internalizassem as decisões de investir” (MELLO, 1982, p. 58).
Relacione estas citações à crise nas bases do antigo sistema colonial.
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Resposta Comentada
A criação de um mercado interno mais significativo e, portanto, da formação de uma
elite econômica cujos interesses estavam mais focados na colônia, minou as bases
fundamentais do pacto colonial; as decisões de investir passaram a estar mais
focadas nos interesses internos da colônia.
CEDERJ
65
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
2. Imagine que você é o editor do jornal Trem da História, que relata os principais
acontecimentos dos períodos estudados no seu curso de Administração. Neste primeiro
número, você tem uma tarefa muito importante: organizar a primeira página do jornal.
O título principal é: As causas da independência do Brasil.
Você deve organizar as matérias de maneira que as mais importantes fiquem na parte
superior do jornal. Os temas que estiverem relacionados podem ficar próximos, para
facilitar a compreensão do leitor. Mãos à obra!
Trem da História – uma publicação do curso de Administração do Cederj
66
CEDERJ
Notícia 1
Notícia 2
Notícia 3
Notícia 4
Notícia 5
Notícia 6
3
AULA
Triunfo do povo em Paris
No dia 14 de julho de 1789, em Paris, os cidadãos franceses rebelaram-se contra o rei
Luís XVI. Os manifestantes tomaram a prisão política da Bastilha, símbolo da monarquia
francesa, reivindicando “liberdade, igualdade e fraternidade”. A família real foi capturada
enquanto tentava escapar do país, sofrendo julgamento público.
Outros baluartes da monarquia estão sendo perseguidos. Muitos nobres preparam sua
fuga para a Inglaterra ou outros países em que a monarquia subsiste.
Em agosto, a Assembléia Nacional promulgará a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão, contendo as orientações do novo governo.
Revolução Industrial: máquinas fazem o trabalho do homem
Utilização de máquinas na indústria. Produção em maior quantidade, a menores preços.
Iniciada na Inglaterra a partir do século XVIII, esta mudança nos meios de produção
– denominada, a partir deste momento, Revolução Industrial – provocou a migração
dos camponeses para as cidades. Estes trabalhadores, sem moradia e sem meios para
sustentar-se, vão engrossar as fileiras de desempregados nas fábricas. Crescimento
populacional desenfreado, êxodo rural e desemprego são as conseqüências deste
processo para a população.
Brasil luta por independência
Os gritos de liberdade e igualdade ouvidos na França começaram a ecoar no Brasil. Em
Minas Gerais, o movimento que defendeu a independência do Brasil em relação a Portugal
foi denominado Conjuração ou Inconfidência Mineira. Os participantes, pertencentes à
classe que tinha acesso à cultura e às idéias do Iluminismo, foram presos, condenados ao
exílio perpétuo e o líder, o alferes Joaquim José da Silva Xavier, esquartejado.
Já na Bahia, a Conjuração Baiana ou Revolta dos Alfaiates, também inspirada pelos ideais
franceses, contou a participação popular. Este movimento defendia a liberdade para os
escravos e a República, outro diferencial em relação à Inconfidência Mineira.
Igualmente sufocada pela Coroa, a Conjuração Baiana também teve seus mártires: quatro
participantes foram enforcados.
Chegada da Família Real ao Brasil e abertura dos portos
Em 7 de março de 1808, chega, ao Rio de Janeiro, a corte portuguesa. Ameaçados por
Napoleão, que intencionava invadir Portugal, a família real e os principais integrantes da
corte vieram ao Brasil para ficar. Uma das primeiras medidas tomadas foi a abertura dos
portos brasileiros às nações amigas – principalmente a Inglaterra, com quem Portugal
mantém acordos comerciais. O Rio de Janeiro torna-se, então, o centro das
decisões econômicas e políticas da colônia.
CEDERJ
67
Formação Econômica do Brasil | A crise da economia colonial no Brasil
Produção interna aumenta e mercado cresce na colônia
Temos a alegria de dar, por meio desta publicação, notícias muito alvissareiras. As atividades
de subsistência crescem e se diversificam na Terra de Santa Cruz. Pecuária, cotonicultura,
entre outras, ajudaram a interiorização do país. Com a ocupação do interior da colônia,
aumentam a produção e o mercado interno.
Independência dos Estados Unidos
As colônias inglesas na América do Norte proclamam sua independência. Em 4 de julho de
1776, reunidos no Congresso, representantes dos 13 estados assinaram uma declaração,
afirmando que “que estas colônias unidas são e de direito têm de ser Estados livres
e independentes, que estão desoneradas de qualquer vassalagem para com a Coroa
Britânica, e que todo vínculo político entre elas e a Grã-Bretanha está e deve ficar
totalmente dissolvido”.
Com a independência dos agora denominados Estados Unidos da América, estão abalados
os alicerces do sistema colonial no continente.
Resposta Comentada
Como bom editor, você deve ter colocado lado a lado, fatores internos e externos. No
alto da sua primeira página, logo após o título, a revolução francesa pode ser uma boa
matéria, principalmente se colocada ao lado das revoltas internas na colônia. Afinal, a partir
dela surgiram os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade defendidos nas revoltas e
que, mais tarde, seriam os alicerces para justificar a independência. A independência dos
Estados Unidos e a chegada da família real ao Rio de Janeiro podem ficar logo abaixo,
já que foram importantes, respectivamente, para provar que libertar-se da metrópole
era possível, e para fazer crescer o desejo por autonomia comercial da colônia. Esta é a
base do conflito entre as elites locais – os portugueses que moravam no Brasil – e as da
metrópole, que buscavam o máximo de lucro para si.
A revolução industrial pode vir para “fechar” a página, já que teve como conseqüências,
entre outras, o aumento da produção e o desenvolvimento do capitalismo industrial,
origens do liberalismo econômico.
Com todos estes elementos, estava configurada a crise no sistema colonial e,
posteriormente, a independência política do Brasil em relação a Portugal.
68
CEDERJ
3
AULA
RESUMO
O crescimento da atividade econômica no interior da colônia brasileira
determinou o surgimento de um intenso conflito entre as elites locais e
a metrópole. O foco central deste embate era o pacto colonial. O esforço
de manutenção das bases do pacto através da política pombalina piorou
significativamente o quadro. A vinda da corte portuguesa e a maior dependência
da tutela inglesa causaram o rompimento definitivo do pacto colonial, situação
formalizada com a assinatura dos tratados com a Inglaterra.
CEDERJ
69
4
AULA
Economia cafeeira escravista
Meta da aula
objetivos
Analisar as origens da economia cafeeira,
sua importância para a recuperação
econômica brasileira na primeira metade do
século XIX, bem como os limites do uso da
mão-de-obra escrava na produção.
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:
1
2
Reconhecer o papel fundamental do café na
recuperação da economia brasileira no início
do século XIX.
Conceituar bases iniciais de produção ao longo
do século XIX.
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira escravista
INTRODUÇÃO
O século XIX marcou um importante processo de estagnação da economia
brasileira, particularmente no período que se seguiu ao processo de
independência do país. No campo externo, crescia o déficit comercial
GUERRAS
– resultante, sobretudo, de dois fatores. Primeiro, a extensão de vantagens
CISPLATINAS
comerciais dadas a outros países além da Inglaterra – como vimos na aula
“A Banda Oriental,
disputada por
brasileiros e
castelhanos, é
incorporada ao
Império em 1821
como Província
Cisplatina. Em 1825,
líderes separatistas
locais, comandados
por Fructuoso
Rivera, proclamam
a independência
da região. O Brasil
declara guerra à
Argentina, que
também reivindica a
posse da Província,
em 10 de outubro de
1825. É derrotado
na batalha de Passo
do Rosário em 20/2/
1827. A diplomacia
britânica intervém
e os dois países
desistem da região.
Um tratado de paz
cria a República
Independente do
Uruguai, em 27 de
agosto de 1828.” –
In: http://www.conhe
cimentosgerais.com.
br/historia-do-brasil/
unidade-nacional-eresistencia.html
passada, esse país teve grandes privilégios com os tratados comerciais firmados
a partir da abertura dos portos. Segundo, as culturas da cana-de-açúcar e do
algodão, principais fontes de recursos externos (moeda estrangeira), sofriam
crescente concorrência no mercado internacional.
No caso da cana, o aumento da produção de açúcar, na Europa, a partir da
beterraba, e a pesada entrada no mercado de países como Cuba aumentaram
sobremaneira a oferta internacional. Como conseqüências, temos a queda
do preço no mercado externo e a redução da receita de exportação brasileira
(reveja, na Aula 1, a crise da cultura da cana-de-açúcar).
A cultura do algodão passou por problemas semelhantes. Apesar do quadro
favorável para a produção no Brasil nos últimos 25 anos do século XVIII – em
especial no Maranhão –, o panorama mudou radicalmente no início do século
seguinte. O fim da guerra pela independência nos Estados Unidos (1776)
propiciou um grande aumento da produção de algodão em regiões da Flórida,
o que também fez despencar os preços internacionais e reduzir drasticamente
a receita de exportação brasileira do produto.
No plano interno, agravava-se rapidamente o déficit público. Isso ocorreu em
função do aumento das despesas militares. Os conflitos regionais multiplicaramse, e houve também disputas territoriais, como as GUERRAS CISPLATINAS. Além disso,
como você viu na aula passada, o Brasil se viu obrigado a pagar uma indenização
a Portugal para ter sua independência reconhecida.
Durante esse período, houve uma queda importante das receitas alfandegárias,
resultado direto da adoção de medidas direcionadas à prática do
LIVRE
CAMBISMO
Conjunto de medidas
direcionadas
para a liberação
do comércio
internacional – a
redução das tarifas
alfandegárias,
por exemplo.
72
CEDERJ
CAMBISMO,
LIVRE
que estendeu a outros países as vantagens comerciais concedidas
à Inglaterra quando da assinatura dos tratados comerciais – que você viu com
mais detalhes na Aula 3.
4
AULA
Você já ouviu falar na cidade de Colônia do Sacramento? Situada à margem direita do Rio da
Prata, em frente a Buenos Aires, foi fundada por portugueses e ingleses em 1680 por ordem de D.
Pedro I. Os objetivos do monarca eram estender seus domínios até o estuário do Prata e continuar
captando a prata peruana. A cidade, inicialmente domínio português, acabou ficando em poder
dos espanhóis a partir de 1750. Em http://www.seol.com.br/mneme/ed12/119.pdf, você pode obter
mais informações sobre a importância estratégica de Colônia do Sacramento.
Nesse cenário de estagnação e dificuldades de crédito, o único fator abundante
na economia brasileira era a terra. Era essencial encontrar um produto exportável
que aproveitasse essa vantagem, pois o capital disponível era praticamente
inexistente, e a mão-de-obra estava entrando em um claro processo de escassez,
já que a queda de receita das principais culturas reduzia a capacidade de
aquisição de escravos.
O INÍCIO DA CAFEICULTURA PARA EXPORTAÇÃO NO
BRASIL
Cultivado no Brasil desde o início do século XVIII, o café era, até
então, um produto direcionado à subsistência e com difusão bastante
limitada no país. Apenas no século XIX passou a ser incentivada
sua produção para o mercado externo. Alguns fatores contribuíram
decisivamente para isto.
Pelo lado da demanda, o crescimento dos mercados europeu e
norte-americano, em função do avanço da indústria e da urbanização, foi
fundamental. Ao mesmo tempo, do lado da oferta, o colapso da produção
haitiana (colônia francesa em processo de independência) determinou um
importante aumento dos preços internacionais, estimulando a entrada
do Brasil nesse mercado.
Contava ainda, a favor do produto, uma característica crucial para o
momento: a baixa capitalização requerida para o processo produtivo, bem
mais reduzida que na economia açucareira – o maquinário utilizado para a
produção de açúcar tinha um custo bem superior. Concorriam para isso a
utilização extensiva da terra, com técnicas rudimentares e de fácil acesso, e
as menores necessidades de reposição de maquinário, pois os equipamentos
eram bem simples e, em grande parte, de fabricação local.
CEDERJ
73
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira escravista
Como resultado, na década de 1830 o café já era o principal
produto de exportação do Brasil, superando as receitas das culturas
tradicionais de açúcar e algodão. Vamos ver isto com mais detalhes?
Atividade 1
As contas do café
1
Observe, na Tabela 4.1, o crescimento da participação relativa do café ao longo do
século XIX. De 1821 a 1840, por exemplo, a porcentagem aumentou de 18,4% a 43,4%.
Impressionante, não acha?
Tabela 4.1: participação relativa dos principais produtos de exportação no Brasil (%)
Produtos
1821/30
1831/40
1841/50
1851/60
1861/70
1871/80
1881/90
Café
18,4
43,4
41,4
48,8
45,5
56,6
61,5
Açúcar
30,1
24
26,7
21,2
12,3
11,8
9,9
Algodão
20,6
10,8
7,5
6,2
18,3
9,5
4,2
Fumo
2,5
1,9
1,8
2,6
3
3,4
2,7
Cacau
0,5
0,6
1
1
0,9
1,2
1,6
Total
72,1
81,1
78,4
79,8
80
82,5
79,9
Fonte: CANABRAVA (1997)
Repare, agora, nas taxas relacionadas ao açúcar e ao algodão, vistos nas aulas anteriores,
e compare-as ao que aconteceu com o café. O que você pode verificar? Lembre-se de
incluir, nas suas observações, o contexto histórico do século XIX.
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Resposta Comentada
Em apenas 70 anos (de 1821 a 1890), o café passou a representar 61,5% das
exportações brasileiras – uma participação de peso, você não acha? Enquanto
a cultura cafeeira não parava de crescer, as do algodão e da cana-de-açúcar
atravessavam uma grande crise, causada pela redução dos preços de revenda
no mercado internacional. Você consegue perceber a dupla importância do
café nesse contexto?
74
CEDERJ
4
O início da produção de café para exportação no Brasil se deu
AULA
no Vale do Paraíba. Tratava-se de uma região de condições climáticas
propícias para o cultivo desse produto, com terras abundantes para o
plantio (você vai ver este assunto com mais detalhes na Aula 7, fique
atento!). Ao mesmo tempo, havia recursos ociosos da área da mineração
(em franca decadência em Minas Gerais), tanto de capitais como de
mão-de-obra escrava.
É importante ressaltar que o Vale do Paraíba já vinha sendo
ocupado, por ser caminho natural da área de mineração para o Rio
de Janeiro, que era a capital e principal porto de escoamento das
exportações.
Desta forma, havia um claro interesse na ocupação e plantio
dessa área para abastecer a capital, principalmente após a vinda da
corte portuguesa para o país em 1808. Veja, na Figura 4.1, a região do
Vale do Paraíba e a proximidade entre o Rio de Janeiro, Minas Gerais
e São Paulo. Na próxima aula, você verá a importância dessa trajetória
natural de expansão da cultura de café.
Além disso, havia uma razão favorável para esta localização,
em função da ausência de meios de transporte capazes de garantir o
escoamento da produção a ser exportada a partir do porto do Rio de
Janeiro. O café era então transportado por mulas, disponíveis em grande
quantidade e bastante resistentes para a atividade.
Figura 4.1: O Vale do Paraíba. Observando este mapa, é possível constatar que a
proximidade de Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo é notável.
CEDERJ
75
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira escravista
O sistema de ocupação, como em geral ocorria à época, foi
realizado por meio do sistema de SESMARIAS: as terras eram distribuídas
e entregues aos fazendeiros de acordo com o número de escravos
possuídos por eles. Este é um ponto importante; você pode perceber
nele um dos determinantes do processo de concentração fundiária
no Brasil.
SESMARIAS
“Grandes extensões de terras devolutas pertencentes à Coroa portuguesa e que
eram doadas pelo monarca, ficando os beneficiados na obrigação de cultivá-las
num prazo de três anos, sob pena de revogação da doação, e de pagar a sesma
(daí o nome de sesmarias) ou um sexto do que nela viessem a produzir para a
Coroa. A instituição das sesmarias deveu-se a uma lei promulgada em 1375 por
D. Fernando I de Portugal e serviu para beneficiar a burguesia comercial nascente
que não possuía terras. Inicialmente, o beneficiário se obrigava de uma sexta parte
dos lucros obtidos nas terras das sesmaria. A instituição foi transferida para o
Brasil, onde assumiu forma mais abrangente com o estabelecimento da Capitanias
Hereditárias: as doações de sesmarias eram feitas aos colonos pelos donatários e
pelos governadores – gerais. O sistema, só extinto em julho de 1822, deu origem à
grande propriedade rural (latifúndio) no Brasil, beneficiando apenas uma pequena
parte dos habitantes da Colônia, e contribuiu para a concentração da propriedade
fundiária no Brasil” (SANDRONI, 2004, p. 555).
Neste caso, quando a produção de café começou a ganhar peso
e importância, elevando substancialmente a capacidade de geração
de renda e lucros no setor, os grandes fazendeiros expulsaram os
pequenos proprietários – sobretudo por meio da falsificação dos
registros. Isso obrigava os minifundiários a migrar para as cidades
ou a partir para regiões periféricas, formando cordões agregados aos
grandes latifúndios.
A história do café no Brasil está estreitamente ligada
a Francisco de Mello Palheta, oficial que trouxe clandestinamente, da Guiana Francesa para o Brasil, a primeira
muda da planta em 1727.
Quer saber mais? Consulte http://www.abic.com.br/scafe_
historia.html. Veja, também, http://enetovix.tripod.com/
cafe-final.pdf
76
CEDERJ
Café e ouro: atividades interdependentes?
AULA
4
Atividade 2
2
Em sua opinião, a expansão da atividade cafeeira no Brasil e o processo de decadência
econômico-financeira da mineração estão relacionados? Justifique sua resposta.
_____________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Apesar da elevação dos preços internacionais do café e da abundância de
terras no Vale do Paraíba, a produção de café na região não seria viável sem
os recursos ociosos da decadente atividade mineradora, com destaque para
a oferta de mão-de-obra escrava e de capitais. Afinal, o ouro encontrado no
país parecia estar se esgotando rapidamente, e toda a infra-estrutura montada
para encontrá-lo, purificá-lo e vendê-lo estava disponível.
BASES E CARACTERÍSTICAS DA PRODUÇÃO DE CAFÉ
A produção de café no Vale do Paraíba seguiu as mesmas
características básicas das demais culturas para exportação anteriormente
assentadas no Brasil. O café era cultivado em latifúndios monocultores
de base escravista, utilizando-se técnicas absolutamente precárias para a
plantação, o que destacava a forma extensiva do processo produtivo.
Tradicionalmente, o “preparo” da terra para o plantio baseavase na derrubada e queimada da Mata Atlântica que cobria a região,
utilizando o método vertical de plantação nas encostas, quando o
recomendado para solos montanhosos seria a plantação das mudas
em platôs ao longo da encosta. Não havia, entretanto, qualquer
cuidado adicional com a terra, já bastante desgastada pelas queimadas
CEDERJ
77
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira escravista
e exposta à ação erosiva das chuvas – uma constante naquela região.
A intenção explícita dos cafeicultores era facilitar o trabalho dos escravos,
desprovidos de qualquer experiência com o plantio do café – oriundos,
em sua maioria, da atividade de mineração.
É importante perceber que essa forma de utilização da terra
impôs uma produção que ocupava áreas cada vez mais extensas, pois a
deterioração do solo tornava-se acelerada. A necessidade recorrente de
utilização de novas terras é um ponto-chave na dinâmica produtiva do
Vale do Paraíba, explicando diretamente sua expansão na direção do Oeste
paulista. De todo modo, como essas terras eram fartas e sem valor comercial
à época, este não foi um problema fundamental no início da produção.
Ao mesmo tempo, o emprego da mão-de-obra escrava não
causou maiores problemas para os produtores – havia escravos ociosos
da mineração e, posteriormente, outros foram trazidos de outras regiões
decadentes, em particular do Nordeste. Os problemas decorrentes dessa
forma de mão-de-obra, todavia, eram iminentes, pois o tráfico negreiro
vinha sendo cada vez mais combatido, o que determinava uma elevação
substancial dos preços dos escravos.
!
A Lei Eusébio
de Queiroz, de 1850,
determinando o fim do
tráfico, reduziu drasticamente
a oferta de escravos. Nem isso,
entretanto, causou uma mudança
de postura dos cafeicultores do
Vale do Paraíba, que mantiveram
a prática de trazer negros
de outras regiões
brasileiras.
Os últimos 209 escravos trazidos para o Brasil
desembarcam em Serinhaém (PE), em 1855.
78
CEDERJ
4
O resultado foi que, ao final de 1877, cerca da metade dos escravos
AULA
do país estava nessa região. Observe, na Tabela 4.2, o crescimento do
número de escravos no Rio de Janeiro. Esse comportamento tinha
uma raiz claramente cultural, pois já vinham ocorrendo, desde 1845,
experiências com mão-de-obra imigrante (esse assunto será tratado com
mais detalhe na próxima aula). Na verdade, os produtores não foram
capazes de vislumbrar, até por questões ideológicas, a necessidade de
uma forma alternativa de trabalho, considerando a iminente escassez
de escravos após a extinção do tráfico.
Tabela 4.2: Escravos no Rio de Janeiro
Ano
Número
1844
119.000
1877
370.000
Fonte: COSTA, 1989.
O crédito e a comercialização do café seguiam um esquema
semelhante ao apresentado na cultura do açúcar. Destacava-se, assim,
a figura do comissário intermediando as transações entre fazendeiros,
exportadores e importadores. A maior parte do lucro resultante do café
girava em torno da comercialização do produto, a cargo dos exportadores
e dos intermediários (como as CASAS COMISSÁRIAS).
Entre as mais importantes Casas Comissárias, destacam-se a Prado Chaves, que
era também exportadora – e, em 1910, exportou 1,5 milhão de sacas de café
–, a Whitalter & Brotero, a Companhia Intermediária de Café de Santos e a
Companhia Paulista de Armazéns de Santos, controlada por ingleses.
As vendas para o mercado externo eram muito lucrativas, já que, em virtude
de a comunicação entre os continentes ser precária, os comissários podiam
manipular a cotação do café.
CASAS
COMISSÁRIAS
Eram os pontos de
venda do café nas
cidades. Nestas
localidades, os
comissários – que
intermediavam o
comércio entre os
meios rural e urbano
– compravam o café
dos fazendeiros e
revendiam o produto
para compradores
na cidade ou
no exterior. Os
comissários vendiam,
também, produtos
industrializados
aos fazendeiros.
Muitos deles tinham
procuração dos
fazendeiros para
comercializar
em seu nome.
CEDERJ
79
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira escravista
Além disso, no que se refere ao crédito, os bancos nunca forneciam
empréstimos diretamente aos fazendeiros, que ficavam dependentes
dos comissários para auferir os recursos necessários para a produção.
Os comissários, por sua vez, seriam responsáveis pela venda do café,
recebendo uma comissão remuneradora. Isso ocorria em função das
próprias características do crédito, algo eminentemente pessoal até 1930
– o conhecimento direto e pessoal assumia uma importância muito grande
para a concessão do crédito. Os fazendeiros, residentes na área rural,
tinham poucas oportunidades para esse contato mais próximo com os
banqueiros, o que criava um mecanismo que perpetuava a intermediação
dos comissários, pois a garantia do dinheiro emprestado aos produtores
era, exatamente, a sua produção.
Inicialmente, o café era transportado por mulas, em estradas
precárias, causando perdas importantes de café e de escravos. Essa
prática era possível em função da proximidade entre as áreas iniciais de
plantio no Vale e o porto do Rio de Janeiro, como você pôde verificar
na Figura 4.1. À medida que a produção se expandia, e considerando sua
natureza extensiva, outra forma de transporte tornava-se necessária. A
Estrada de Ferro D. Pedro II foi um exemplo: foi financiada com capitais
antes empregados no tráfico de escravos e que ficaram sem aplicação
após a Lei Eusébio de Queiroz.
Atividade 3
Vendo e aprendendo: café também é cultura
Observe esta tela, de autoria de Cândido Portinari (1903-1962). Nela, o pintor
brasileiro retrata a maneira de produção e armazenagem do café. A partir dela,
como você descreveria a produção do café no Brasil? Na sua resposta, lembre-se
de considerar:
a) o tipo de mão-de-obra;
b) a extensão do terreno;
c) o perfil dos trabalhadores.
80
CEDERJ
2
4
AULA
Café, de Candido Portinari, 1935
1,30m x 1,95m. Óleo sobre tela.
Exposta no Museu Virtual da Administração
Resposta Comentada
Resposta comentada: Você reparou a quantidade de pessoas trabalhando? São
tantas que Portinari nos faz ter a impressão de que não cabem na tela. E o
tamanho do terreno? Parece não ter fim, não é mesmo? Assim era a produção
cafeeira no Brasil: em grandes extensões de terra (latifúndios), utilizando a
mão-de-bra escrava. Repare nas feições dos trabalhadores. Homens e mulheres
têm características físicas dos negros. Eram ainda os escravos, remanejados
de várias partes do país.
Viu que não existem outros tipos de plantação ao redor? A monocultura
também era outro traço marcante da produção cafeeira da época.
O DECLÍNIO DA PRODUÇÃO DE CAFÉ NO VALE DO PARAÍBA
A decadência da cultura do café no Vale é explicada diretamente
pelas bases assumidas no seu processo de produção, sobretudo no que diz
respeito à utilização das terras e à mão-de-obra escrava insistentemente
empregada ao longo da segunda metade do século XIX, quando sua
oferta tornou-se definitivamente escassa.
Ao mesmo tempo, a decadência da cafeicultura implicou
a inadimplência crescente dos produtores junto aos comissários,
levando-os também a uma situação financeira complicada. A quebra
de casas comissárias, por sua vez, atingiu também bancos em que os
CEDERJ
81
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira escravista
comissários descontavam títulos para obter recursos. Esse processo
foi responsável por uma importante redução da disponibilidade de
crédito para a produção, o que dificultou ainda mais a continuidade
do negócio.
Apesar de algumas tentativas de diversificação produtiva com
o algodão e o açúcar, no intuito de fugir da grande dependência da
plantação de café, a maior parte das fazendas do Vale do Paraíba mais
próximas da capital entrou em um processo irreversível de falência. Como
resultado, a produção de café passou a se concentrar, definitivamente, na
região conhecida como Oeste Paulista, assunto da próxima aula.
CONCLUSÃO
O café tornou-se rapidamente o principal produto de exportação
do Brasil no século XIX, expandindo sua cultura de maneira acelerada.
Encontrou condições excepcionalmente propícias para esse crescimento,
reunindo vantagens associadas à facilidade para sua plantação em larga
escala (pela pouca exigência de capital inicial e pela oferta abundante de
terras próximas ao porto do Rio de Janeiro). A possibilidade de utilização
de mão-de-obra escrava ociosa em outras culturas foi também um fator
altamente favorável no início da produção no Vale do Paraíba.
Em um período relativamente curto de tempo, todavia, essas
mesmas condições determinaram o fim da produção nessa região.
As terras, apesar de fartas, não eram as mais adequadas para o plantio,
tanto pela sua qualidade, quanto pela situação geográfica em encostas – a
erosão era extremamente veloz. Por seu turno, a manutenção do trabalho
escravo nas lavouras logo viria a se apresentar como um problema crucial
para a continuidade da produção, especialmente a partir do fim definitivo
do tráfico negreiro, o que reduziu substancialmente a oferta deste tipo
de mão-de-obra.
Atualmente, o Brasil é o maior produtor de café do mundo, sendo responsável
por 30% do volume total de produção. É, também, o segundo maior consumidor,
antecedido apenas pelos Estados Unidos, segundo informações do Instituto
Brasileiro do Café (IBC).
82
CEDERJ
Contradições da economia cafeeira
1
2
Imagine que você está arrumando sua prateleira para colocar seus livros de
Administração. Você tem de tirar do lugar materiais antigos, álbuns, coisas de que
você nem se lembrava...
De repente, cai no chão um álbum antigo. Quando você vai olhar, descobre que ele
pertencia aos seus bisavós. Ao pegá-lo, cai um recorte de jornal. Ele está envelhecido,
mal se pode ler o que ele contém. A data? 18... Tomado pela curiosidade, você começa
a ler. O único trecho legível é:
“A existência do braço escravo relativamente abundante, no Vale do Paraíba, tornou-se
um fator diretamente contrário ao progresso da cultura cafeeira na região.”
Que coincidência, não? Justo o que você estudou nesta aula. Já que você acabou de
ver este assunto em detalhes, é uma hora propícia para perguntar se você concorda
com essa afirmação.
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Refeito do susto provocado pela grande coincidência – há quem diga que o acaso não
existe, principalmente nas suas aulas de FEB –, você deve ter concordado com o que se
disse no texto que você encontrou. Dois motivos contribuem, fundamentalmente, para
esse raciocínio. Primeiro, de maneira mais direta, a pouca especialização do escravo
para a lavoura cafeeira determinava o uso de técnicas precárias. Segundo, a reduzida
necessidade de buscar uma alternativa de mão-de-obra aos escravos, pois havia a
possibilidade de trazê-la de regiões onde se encontrava ociosa – mesmo após o
fim do tráfico negreiro – primeiro de Minas e depois do Nordeste.
CEDERJ
83
AULA
4
Atividade Final
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira escravista
RESUMO
Nesta aula, vimos que a produção de café para exportação no Brasil
encontrou uma situação especialmente favorável no início do século XIX.
Vimos também que a decadência de culturas tradicionais (veja na Tabela 4.1)
e a disponibilidade de recursos ociosos, em um contexto de elevação dos
preços internacionais do produto, permitiram um rápido crescimento de sua
cultura no País. Todavia, as condições propícias do Vale do Paraíba para seu
deslanche inicial, sobretudo a fartura de terras e a oferta de mão-de-obra
escrava, foram também responsáveis diretas para seu rápido declínio, pelo
uso inadequado dessa terra e o fim do tráfico de escravos.
84
CEDERJ
5
AULA
Economia cafeeira
com trabalho livre
Meta da aula
objetivos
Descrever o início da utilização de mão-de-obra livre na
lavoura cafeeira do Brasil no final do século XIX.
Ao final desta aula, você deverá ser capaz de:
1
Identificar a importância da utilização dos
imigrantes como alternativa de mão-de-obra
na lavoura do café.
2
Diferenciar o sistema de parceria do sistema
de colonato.
3
Reconhecer as limitações do sistema
de parceria.
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira com trabalho livre
INTRODUÇÃO
A segunda metade do século XIX marcou o assentamento definitivo do café
como principal produto de exportação do Brasil. As condições precárias do
uso da terra caracterizaram a produção no Vale do Paraíba, causando rápida
destruição do solo da região. Porém, o principal obstáculo para a continuidade
do processo produtivo estava na mão-de-obra.
A tentativa de intensificar a transferência interna de escravos, base do trabalho
no Vale do Paraíba, se fazia cada vez mais difícil. A grande dispersão dos
escravos era decorrente da própria estrutura sociopolítica brasileira, ou seja,
de uma estrutura na qual não havia integração entre as várias regiões do país.
Esta falta de integração acontecia tanto em aspectos físicos (dificuldade de
trânsito entre as regiões) quanto sociais e políticos, tornando o recrutamento
dos escravos uma tarefa bastante complicada. A utilização desse tipo de mãode-obra disponível nas áreas urbanas, por outro lado, encontrava obstáculos
na reduzida capacidade de adaptação dos escravos aos métodos e à disciplina
exigidos pela lavoura agrícola. Essas dificuldades poderiam reduzir de maneira
significativa sua expectativa de vida útil.
A utilização da mão-de-obra imigrante foi a solução adotada por alguns
fazendeiros do oeste paulista como forma alternativa de superar o problema
da mão-de-obra.
A imigração anterior ao processo de independência havia sido realizada sem
qualquer objetivo econômico, basicamente associada à ocupação de áreas
importantes para a demarcação de fronteiras.
A lavoura paulista do café inaugurou a inserção do imigrante na monocultura
de exportação, permitindo a continuidade do forte ritmo de crescimento da
cafeicultura no Brasil e importantes desdobramentos econômicos no decorrer
do século XIX. É o que você verá a seguir.
O CAFÉ NO OESTE PAULISTA
Alguns fatores importantes contribuíram para o deslanche da
produção de café no oeste paulista, com destaque para:
(a) a existência de solos de melhor qualidade que os do Vale
BENEFICIAMENTO
do Paraíba e a possibilidade de utilização de técnicas mais
DO CAFÉ
modernas e adequadas para o plantio e o BENEFICIAMENTO
Processo em que
o café é colhido,
seco, armazenado
e embalado para
negociação.
DO CAFÉ;
(b) o início de uma época em que as restrições ao uso da
mão-de-obra escrava estavam cada vez mais evidentes,
permitindo uma percepção mais clara do problema
86
CEDERJ
5
associado à inevitável escassez de escravos – e da
AULA
necessidade de uma alternativa. Alguns eventos (veja na
Atividade 1) prenunciavam a Abolição da Escravatura;
(c) a coincidência de sua expansão com um forte crescimento
dos investimentos britânicos na América Latina, em
particular na construção de ferrovias. Esses investimentos
permitiram uma sensível redução dos custos de transporte
dos produtos para exportação (veja na Tabela 5.1 a
enorme expansão da malha ferroviária no Brasil a partir
da segunda metade do século XIX);
(d) o aumento da população dos Estados Unidos, provocado pela grande imigração que houve para esse país.
Os norte-americanos passaram a importar muito,
incrementando significativamente o mercado para as
exportações brasileiras. Os Estados Unidos chegaram
a ser responsáveis por cerca de 60% das compras
internacionais do café brasileiro;
(e) a garantia, por parte do empreendimento cafeeiro
concentrado nessa região, das condições básicas para o
nascimento de uma nova classe, assentada em relações de
produção tipicamente capitalistas e capazes de organizar
com maior desembaraço seus interesses políticos e
econômicos, cujo papel consolidou-se na República
Velha, como você verá na próxima aula.
!
Abolição da Escravatura
Em 1888, foi abolida a escravidão no Brasil. As
conseqüências econômicas deste ato logo se fizeram sentir
na economia e na política nacional. No texto a seguir, você terá mais
detalhes sobre o tema.
“Dois conceitos históricos são entendidos por abolição da escravatura: o conjunto de
manobras sociais e políticas empreendidas entre o período de 1870 a 1888 em prol da
libertação dos escravos e a própria promulgação da Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel
em 13 de maio de 1888, promovendo a oficialização da abolição do regime escravista.
(...) a mão-de-obra proveniente das novas correntes imigratórias passou a ser empregada.
Os negros, por um lado libertos, não possuíam instrução educacional ou a especialização
profissional que passou a ser exigida, decorrendo desses aspectos a permanência dos
negros à margem da sociedade frente à falta de oportunidades a eles oferecidas.
A liberdade dada aos negros anteriormente escravizados é relativa: embora
não mais escravizados, nenhuma estrutura que garantisse a ascensão
social ou a cidadania dos negros foi oferecida.”
Fonte: http://www.historiaonline.pro.br/
historia/abolicao.htm
CEDERJ
87
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira com trabalho livre
Tabela 5.1: Expansão da malha ferroviária no Brasil
Anos
Ferrovias (em km)
1864
475
1867
601
1870
1.000
1875
1.801
1883
4.865
1887
8.846
1888
9.200
1889
9.583
Fonte: Barbeiro, H. (1978, p. 127).
Observe na Tabela 5.2 o fluxo de imigrantes para o Brasil e de
onde estes vieram. Naquela época (final do século XIX e início do século
XX), os italianos emigraram em enorme quantidade para o Brasil.
Não à toa, há inúmeras novelas de televisão que se
remetem a este período da história, no qual as personagens principais são italianos imigrantes. Terra Nostra
e Esperança, produzidas e exibidas pela Rede Globo em
1999 e 2002, respectivamente, são exemplos disso.
Tabela 5.2: Vinda de imigrantes para o Brasil por nacionalidade e períodos selecionados
Nacionalidade/períodos
Alemães
1884-1893 1894-1903
22.778
6.698
1904-1913 1914-1923 1924-1933
33.859
29.339
61.723
Espanhóis
113.116
102.142
224.672
94.779
52.405
Italianos
510.533
537.784
196.521
86.320
70.177
-
-
11.868
20.398
110.191
170.621
155.542
384.672
201.252
233.650
96
7.124
45.803
20.400
20.400
66.524
42.820
109.222
51.493
164.586
883.668
852.110
1.006.617
503.981
717.223
Japoneses
Portugueses
Sírios e turcos
Outros
Total
Fonte: IBGE (2000).
88
CEDERJ
Tabela 1
1
Escravidão e imigração no Brasil
Analise os dois fragmentos a seguir:
1. Alguns eventos muito anteriores
a 13 de maio de 1888 evidenciavam
que a escravidão seria abolida.
Em 1810, dom João VI promete à
Inglaterra acabar com o comércio
de escravos. Anos depois, em 1850,
o tráfico de negros para o Brasil é
extinto pela Lei Eusébio de Queiroz.
Em 1871, é promulgada a Lei do
Ventre Livre (que alforriava todos
os filhos de escravos nascidos a
partir daí) e, em 1885, a Lei dos
Sexagenários (que libertava todos
os escravos com mais de sessenta
anos).
AULA
5
Atividade 1
2. A partir da segunda metade do século
XIX, a economia brasileira começou a
experimentar um período de prosperidade
e de diversificação de atividades. Alguns
produtos agrícolas ganharam espaço no
mercado internacional e a indústria começou,
aos poucos, a se desenvolver. No entanto,
é na exportação do café – agricultura de
latifúndio – que o Brasil calçou os alicerces
da base econômica do país. Inicialmente no
Vale do Paraíba e, depois, no oeste paulista,
o café se propagou. O solo de terra roxa,
mais propício para o cultivo, fez com que o
oeste paulista superasse em pouco tempo
a produção das áreas tradicionais do Vale
do Paraíba. O aumento da malha ferroviária
facilitou o processo de transporte da
produção. Além disso, na década de 1860,
o porto de Santos torna-se o primeiro centro
portuário de exportação do país. O café só
mostrava desenvolvimento nessa época!
De acordo com estes dois fragmentos, o que você pode concluir sobre as razões que
motivaram a política brasileira de estímulo à imigração? Aborde em sua resposta:
a. as condições favoráveis ao processo (proporcionadas pelo governo);
b. a necessidade que seria sanada pela vinda dos estrangeiros;
c. o porquê da existência desta necessidade.
_______________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Contexto: No Brasil do século XIX, pressionado pelo poderio do governo inglês,
a escravatura se tornou uma situação insustentável. O mundo precisava a cada dia
mais de novos mercados consumidores, em decorrência do sucesso da Revolução
Industrial. A mão-de-obra assalariada, nesse contexto, se tornava muito
mais interessante do que a escrava.
CEDERJ
89
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira com trabalho livre
Você deve ter escrito em sua resposta que havia muitos indícios para o
final da escravidão e, ao mesmo tempo, “pistas” de que haveria uma crise
econômica gerada pela falta de mão-de-obra para o trabalho nas lavouras.
O café, base da economia brasileira a partir da segunda metade do século
XIX, mostrava franca expansão em decorrência da qualidade do solo de terra
roxa para o plantio deste grão.
A Europa, passava nesse período por uma série de crises que amedrontavam
a população de seus países. Foi neste contexto que o Brasil começou não só a
acolher, mas a estimular a vinda de estrangeiros para nossas terras, para que
eles trabalhassem como empregados dos grandes latifúndios cafeeiros.
Isso aumentou ainda mais a produção cafeeira, que tinha à sua disposição formas
eficientes de escoamento: a malha ferroviária, que permitia maior acesso a zonas
portuárias, principalmente a santista.
Figura 5.1: O café, produto de exportação em que se baseava a economia brasileira
a partir da segunda metade do século XIX até início do século XX.
A produção do café no oeste paulista apresentou duas formas bem
marcadas de utilização da mão-de-obra imigrante. Primeiro aconteceu
o sistema de parceria, marcando o chamado oeste velho paulista,
momento inicial de inserção dos imigrantes. A segunda forma, o sistema
de colonato, no oeste novo paulista, inaugurou a formação das bases
de relações capitalistas de produção, de acordo com a interpretação de
importantes autores na historiografia brasileira.
90
CEDERJ
AULA
5
O OESTE VELHO PAULISTA: O SISTEMA DE PARCERIA
O ano de 1845 marca a primeira experiência de utilização da
mão-de-obra de imigrantes na monocultura exportadora do café, na
fazenda Ibicaba, do SENADOR NICOLAU VERGUEIRO, sob a forma de parceria.
A princípio, o Senador Vergueiro exaltava as qualidades físicas e técnicas
dos imigrantes como um fator-chave para sua “importação” da Europa,
em um momento de crescentes dificuldades para a compra e utilização
de escravos.
O sistema consistia de uma proposta divulgada na Europa por
agentes contratados por Vergueiro visando contratar trabalhadores
dispostos ao serviço na lavoura, recebendo em troca lotes de pés de
café adultos – preparados, portanto, para a produção. Metade do valor
da colheita (cotas de pagamento) seria dos imigrantes, logicamente
após a dedução dos custos de transporte, impostos e comissões – daí a
definição de parceria. Ao trabalhador caberia ainda a exploração de lotes
de subsistência – e, se houvesse excedentes, seriam também repartidos
com o proprietário. Apesar do conceito de parceria, todo o processo de
comercialização e contabilidade ficava a cargo do proprietário.
No entanto, o que acontecia era uma situação completamente
distinta daquela apregoada pelos agentes de Vergueiro no recrutamento
dos imigrantes na Europa. Começava pelas péssimas condições do traslado.
Muitos imigrantes morreram antes de chegar ao Brasil, devido à falta de
higiene, que proporcionava o desenvolvimento de uma série de doenças.
SSEENNAADDOORR
NIICCOOLLAAUU
N
V
E
V E RRGGUUEEIIRROO
(1778-1859)
(1778-1859)
Nasceu em
em Portugal
Portugal
Nasceu
veio para
para oo Brasil
Brasil
ee veio
com 25
25 anos,
anos, época
época
com
em que
que começou
começou
em
trabalhar como
como
aa trabalhar
advogado.
Tornou-se
advogado. Tornou-se
político ee latifundiário
latifundiário
político
alguns anos
anos depois,
depois,
alguns
dono de
de uma
uma empresa
empresa
dono
chamada “Vergueiro
“Vergueiro
chamada
Cia”. Essa
Esta empresa
empresa
e eCia.”.
firmava
contratos
firmava
contratos
com
com
estrangeiros
estrangeiros
para para
que
que
eles
viessem
para
eles
viessem
para
o
o Brasil
trabalhar
Brasil
trabalhar
na
Os
lavoura.na
Oslavoura.
imigrantes
eram
eram imigrantes
convencidos
de
convencidos
que
que
teriam terradepara
teriam terra
para
cultivar
produtos
produtos
que cultivar
lhes retornariam
que
lhes retornariam
subsistência
e lucro.
e lucro.
Osubsistência
Senador Vergueiro
O senador
foi o Vergueiro
principal
foi o principal
personagem
do
personagem
do
sistema
de parceria,
sistema
de parceria,
realizado
na sua
que executava
na sua
fazenda
(Ibicaba),
em
fazenda (Ibicaba),
em
Limeira, SP.
Ao chegar, a primeira novidade para os “colonos” (como o
Senador denominava esses imigrantes) era a obrigação de pagamento
de todo o custo de seu transporte, além do pagamento de juros de 6% ao
ano pelo adiantamento oferecido para a manutenção dos trabalhadores
durante o primeiro ano de sua chegada. Os imigrantes eram obrigados,
por contrato, a permanecer pelo menos quatro anos na fazenda. Além
disso, a família imigrante era a responsável legal por cada um de seus
membros, de maneira que, se algum morresse, os outros deveriam arcar
com o pagamento de sua dívida.
Apesar dessas condições extremamente desfavoráveis, incluindo
as mortes e doenças decorrentes dos maus-tratos e da longa e contínua
jornada de trabalho, as safras foram abundantes e os termos do contrato
estavam sendo cumpridos. Ademais, como nem todos os imigrantes
CEDERJ
91
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira com trabalho livre
estavam integrados ao sistema agrícola em seus países de origem (não
havia uma seleção prévia na Europa pelos agentes de Vergueiro), a solução
vislumbrada foi a importação desse tipo de mão-de-obra em maior escala
– considerando sua baixa produtividade média. Outros fazendeiros
vizinhos começaram a se interessar pelo método, principalmente com
a proibição do tráfico, ratificada em 1850 – e Vergueiro atuava como
agente desses novos empreendedores.
Não é difícil perceber, portanto, que esse sistema não apresentava
condições de sobrevivência em longo prazo. As raízes do fim estavam
fincadas nas próprias bases do processo.
A atividade a seguir o auxiliará a perceber como o sistema de
parceria, inicialmente criado para solucionar a enorme demanda de mãode-obra que se apresentava como um fator limitante para a expansão do
café, mostrava características insustentáveis desde o seu início.
Atividade 2
Imigrantes
3
Aqueles que estão bem na Itália, como vocês meus filhos, não devem deixá-la,
digo-lhes isto como pai (...). Não acreditem naqueles que falam bem da América (...).
É preferível estar numa prisão na Itália do que numa fazenda aqui.
Zuleika Alvim, Brava Gente
De acordo com o que você leu até agora nesta aula, liste três razões que contribuíram
para o fracasso do sistema de parceria:
_______________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Você pode ter mencionado em sua resposta que as péssimas condições de
transporte foram um fator de descontentamento para os imigrantes. Além deste,
os estrangeiros não encontraram, por ocasião de sua chegada, nada do que lhes
havia sido prometido: não havia terras para que eles cultivassem seu próprio café,
e sim muito trabalho na lavoura do fazendeiro. Estes imigrantes nunca alcançariam
suas expectativas, pois deviam enormes somas em dinheiro ao proprietário da
fazenda, devido aos altos custos da viagem. Some-se a isso o fato de que os
imigrantes precisavam fazer compras no armazém da fazenda, onde os produtos
tinham preços a sabor da vontade do latifundiário, as dívidas só aumentavam
e o trabalho passava a ser um regime de semi-escravidão, como você verá
a seguir nesta aula.
92
CEDERJ
AULA
5
SISTEMA DE PARCERIA: A ESCRAVIDÃO DISFARÇADA E
SEUS LIMITES
O grande problema do sistema de parceria dizia respeito à
relação fazendeiros/colonos, que era na verdade uma continuação das
condições de escravidão nas bases do trabalho e do nível de vida. Não
houve uma mudança ideológica por parte dos fazendeiros no que se
refere ao trabalho: consideravam e tratavam os imigrantes realmente
como escravos. Para isso, utilizavam má-fé nos contratos, já altamente
desvantajosos para os imigrantes, de maneira que a insatisfação tornava-se
crescente tanto para os colonos quanto para os fazendeiros.
Da parte dos colonos, a insatisfação era óbvia. Do sonho de uma vida
melhor, com novas perspectivas de realizações, idéia fartamente divulgada
na Europa no momento de seu recrutamento, passavam a uma realidade
absolutamente distinta. As cláusulas contratuais, em realidade, prendiam os
imigrantes à fazenda eternamente, sob rigoroso controle e supervisão dos
fazendeiros – como era a função dos capatazes para os escravos africanos.
Diversos direitos do colono, mesmo previstos em contrato, eram suprimidos
sem qualquer pudor. Como exemplo, sair da fazenda e receber visitas
eram atividades proibidas. A moradia dos imigrantes era, em geral, uma
“adaptação” das antigas instalações das senzalas.
Os fazendeiros impunham ainda rigorosas punições aos colonos, sob
a argumentação de vadiagem, embriaguez e outras situações semelhantes.
Tudo isso apoiado em uma situação de endividamento eterno dos imigrantes
junto aos patrões fazendeiros – à custa de manipulação desonesta dos livros
de contabilidade da fazenda, práticas de subfaturamento da produção e
até aumento indiscriminado da dívida registrada.
Pelo lado dos fazendeiros, havia uma insatisfação cultural e
ideológica. Acostumados com o trabalho escravo, que lhes caracterizava
uma propriedade, não toleravam o aparecimento de questões trabalhistas,
que causavam deserções e greves organizadas por camadas de imigrantes
mais esclarecidos, em particular os italianos. Somava-se a isso o início da
queda de receita de exportação, determinada, sobretudo, pelo substancial
aumento da produção no Brasil – maior exportador mundial do produto.
Para os fazendeiros, os colonos representavam a ralé da população dos
países de origem, gente desordeira e pouco afeita ao trabalho – como os
escravos, mas agora disfarçados na pele branca. Tratava-se, portanto,
de uma situação insustentável.
CEDERJ
93
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira com trabalho livre
?
O preço de um produto
é baseado na relação entre disponibilidade e procura deste produto (lei da oferta e
demanda). Se há muita procura de um determinado produto
escasso, este normalmente se torna mais caro. Ao contrário, se um
produto está disponível em grandes quantidades, em geral seu preço
cai, pois há mais mercadoria à venda do que consumidores para ela.
Houve um momento da história da comercialização do café como base
da economia brasileira (como você verá mais à frente) em que isso
aconteceu. A eficiência na produção e a dificuldade de venda do
produto fizeram com que enormes quantidades de café
tivessem que ser incineradas, na tentativa de manter
o preço da mercadoria em alta.
O OESTE NOVO PAULISTA E O SISTEMA DE COLONATO
Apesar dos conflitos internos do sistema de parceria e da
impossibilidade de continuação daquele processo de recrutamento da
mão-de-obra imigrante, a “falta de braços” para a expansão da lavoura
agrícola cafeeira persistia. O problema residia no fato de que a imagem
do Brasil como um possível espaço para a realização de homens pobres
europeus vinha sendo desfeita a passos largos. A divulgação na Europa
dos maus-tratos conferidos aos imigrantes em São Paulo repercutia de
maneira bastante negativa. Um caso famoso ocorreu com um imigrante
suíço, Thomas Davatz, que em 1856 liderou uma revolta contra a
escravidão por dívida do sistema de parceria na fazenda do Senador
Vergueiro. A publicação de seu livro de memórias em 1858, na Suíça,
teve efeitos devastadores para a vinda de imigrantes.
Ao mesmo tempo, a empresa cafeeira ascendente começava a dar
mais corpo político aos fazendeiros (os barões do café), cuja participação
no processo de decisões tornava-se cada vez mais decisiva. A capacidade
de vislumbrar com clareza o problema da escassez de mão-de-obra em
um ambiente hostil para a imigração exigiu a definição de novas formas
de atração dos estrangeiros.
No entorno de 1870, o colonato aparecia como o novo formato
encontrado para garantir os fluxos de imigração para a cafeicultura,
trazendo mudanças significativas em relação ao sistema de parceria.
94
CEDERJ
5
Além da criação de uma forma de pagamento direto ao colono, pelo
AULA
menos em parte do total que era devido pelo seu trabalho na lavoura, o
fazendeiro foi obrigado a arcar com despesas de viagens e do primeiro
ano de trabalho. Também era concedida ao imigrante uma fatia de terra
para o plantio de artigos para subsistência.
Um passo fundamental para a dinamização do sistema de
colonato foi a utilização do governo da província de São Paulo para
custear o transporte para o Brasil, além da instalação dos estrangeiros. O
governo paulista participava diretamente na contratação de imigrantes,
principalmente através da Sociedade Promotora de Imigração, em 1886,
por iniciativa de ANTÔNIO DE QUEIROZ TELLES, o conde de Parnaíba. Nesse
período, o contingente mais importante da imigração era de italianos
(cerca de 510.000, entre 1884 e 1893), vindos principalmente devido
ao violento processo de unificação da Itália.
Foram gastas pelo governo, a título de subsídios para a vinda
destes imigrantes, aproximadamente 1.600.000 libras esterlinas. Os
resultados foram altamente satisfatórios. No último quartel do século
XIX, algo em torno de 800 mil imigrantes entraram no Brasil para a
produção de café, garantindo definitivamente as condições básicas do
crescimento de sua produção.
A atividade a seguir vai auxiliá-lo a diferenciar o sistema de
colonato do sistema de parceria.
ANNTTÔÔNNIIOO DDEE
A
QUUEEIIRROOZZ TTEELLLLEESS
Q
(1831-1888)
(1831-1888)
Bacharel
Bacharelem
emdireito
Direitoe
cafeicultor. Presidiu
Presidiu
e cafeicultor.
Província de
de São
São
aa província
Paulo, onde
onde teve
teve
Paulo,
especial importância
importância
especial
na época
época do
do sistema
sistema
na
de colonato.
colonato. Ficou
Ficou
de
conhecido também
também
conhecido
como Apóstolo
Apóstolo
como
da Imigração
Imigração
da
Italiana. Trabalhou
Trabalhou
Italiana.
arduamente para
para aa
arduamente
implantação de
de uma
uma
implantação
ferrovia que
que ligasse
ligasse
ferrovia
Jundiaí –– grande
grande
Jundiaí
pólo de
de produção
produção de
de
pólo
café da
da época
época –– ao
ao
café
Porto de
de Santos.
Santos.
porto
Atividade 3
2
Sistema de colonato: favorecendo a imigração no Brasil
Leia os trechos a seguir:
(...) Os gastos com transporte e as demais despesas não
SISTEMA
DE
REMUNERAÇÃO
constituíam dívida da família imigrante e o sistema de
MISTO
remuneração era misto. Além disso, as famílias podiam
Era aquele no
qual os imigrantes
recebiam uma parte
do pagamento
sobre participação
na venda do café
e outra parte em
salário fixo anual.
produzir parte dos gêneros de subsistência que consumiam
e vender o excedente em mercados próximos.
(...) tanto os custos com o transporte do imigrante da Europa
para o Brasil como as despesas com a fixação e a sobrevivência
das famílias nas fazendas corriam por conta do fazendeiro e
constituíam uma dívida dos imigrantes.
Trechos retirados do artigo de Roberson de Oliveira – Folha de
S. Paulo on-line – Educação.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ult305u9385.shtml
CEDERJ
95
Formação Econômica do Brasil | Economia cafeeira com trabalho livre
O colonato permitiu uma forte aceleração na vinda de imigrantes para o Brasil.
Quais foram as duas principais diferenças em relação ao sistema de parceria que
contribuíram para isso?
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
_________________________________________________________________
Resposta Comentada
Ao contrário do sistema de parceria, o colonato não impunha condições de vida
tão degradantes aos imigrantes para a atividade produtiva. O financiamento
de sua vinda pelo Estado e a possibilidade de manter aceso o sonho de
progredir em uma terra nova favoreceram fortemente o aumento do fluxo de
imigrantes para o país.
No sistema de parceria, o imigrante arcava com todos os custos da viagem e
estadia, acumulando uma dívida praticamente impagável, e sofria com condições
de vida extremamente precárias, o que determinou um fim muito rápido para
sua utilização.
No colonato, com a participação do Estado no financiamento do fluxo migratório,
aliada a um processo mais geral de imigração européia para o resto do mundo, a
imigração encontrou condições bem mais favoráveis para deslanchar.
CONCLUSÃO
O problema mais importante para a continuidade da cultura
cafeeira voltada para a exportação era, certamente, a escassez de
mão-de-obra – como você viu na aula passada, esse foi um dos
elementos fundamentais para a decadência do café no Vale do Paraíba.
A possibilidade de substituição do escravo pelo imigrante, vislumbrada
por fazendeiros do oeste paulista, foi o fator mais importante para a
liderança de São Paulo nas exportações de café ao final do século XIX.
Essa substituição só foi viável de fato com a implementação do sistema
de colonato. Percebe a importância deste sistema para a cultura do café
no Brasil daquela época?
96
CEDERJ
AULA
5
Atividade Final
A atividade final é um pouco diferente das atividades que você realizou até então
na disciplina Formação Econômica do Brasil. Você não precisará de papel e nem de
caneta para executá-la, mas tenha em mente sua relevância: fazê-lo reconhecer a
importância da entrada dos imigrantes como mão-de-obra para a lavoura, o que foi
nossa meta para esta aula. Gaste com esta atividade, ao menos, dois minutos. Pare e
pense antes de passar à leitura do comentário!
Propomos que, neste momento, você reflita sobre o que teria acontecido à economia
nacional daquela época se não tivesse ocorrido a entrada de um enorme contingente
de imigrantes para trabalhar na lavoura de café. Mais ainda, propomos que você
pense em que conseqüências poderíamos vivenciar atualmente se o café não tivesse
sustentado nosso país durante mais de meio século.
Lembre-se de pensar em como se sustentou a economia do país durante todo o período
de colônia e também no início da fase independente. Pense, ainda, na política brasileira
do início do século XX, que você aprenderá mais à frente nesta disciplina, mas da qual
você deve ter algumas informações ainda da época do colégio.
Comentário
Desde que o Brasil foi descoberto, parte expressiva de seus recursos (quer para a metrópole
portuguesa, quer para a pátria independente) foi gerada a partir da exportação de
produtos do setor primário. Houve exploração do pau-brasil, cana-de-açúcar, ouro, café.
O esgotamento de um determinado produto levava à busca de um novo que rendesse
o sustento da economia (metropolitana ou nacional).
A impossibilidade de produzir o café por falta de mão-de-obra numa época em que esta
mercadoria era tão valorizada no mercado internacional decerto promoveria uma
alteração muito grande nas trilhas seguidas pela nossa economia.
RESUMO
A introdução do imigrante na produção de café no oeste paulista propiciou aos
fazendeiros da região uma solução viável para o problema da escassez de mão-deobra. A ampliação dos investimentos em ferrovias (e o uso de técnicas mais racionais
de plantio) garantiu uma rápida expansão do processo produtivo. A utilização
dos imigrantes no sistema de parceria tinha características que inviabilizaram sua
permanência em longo prazo. A causa central e definitiva para o forte influxo de
europeus e orientais em direção à lavoura do café foi a mudança para o sistema de
colonato, contando com importante ajuda do governo da província de São Paulo.
CEDERJ
97
6
AULA
Políticas de sustentação
da renda da cafeicultura
na República Velha
Meta da aula
objetivos
Apresentar a evolução da política econômica
brasileira no período da República Velha,
destacando sua estreita associação com os
interesses da cafeicultura.
Esperamos que, ao final desta aula, você seja
capaz de:
1
2
3
• Descrever as razões da recorrente
desvalorização da taxa de câmbio no Brasil
no início da República Velha.
• Identificar as mudanças da política econômica
do governo Campos Sales.
• Relacionar essas mudanças com as pressões
dos cafeicultores para que o governo
assumisse as medidas adotadas no Convênio
de Taubaté.
Pré-requisitos
A Aula 5 trata da organização e
implantação da cafeicultura na Província
de São Paulo. Os fatores envolvidos nesse
processo são essenciais para esta aula.
Por isso, você deve relembrá-los
antes de iniciar o seu estudo.
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
INTRODUÇÃO
A REPÚBLICA VELHA (ou Primeira República, 1889-1930) começou com a
proclamação da República e teve fim na Revolução de 1930, que você
verá daqui a algumas aulas. No novo regime, duas mudanças foram muito
PRIMEIRA
REPÚBLICA
OU REPÚBLICA
VE L H A
(1889-1930)
Período marcado
pelo domínio das
elites agrárias
mineiras, paulistas e
cariocas.
Ao longo destes
anos, o Brasil
firmou-se como um
país exportador de
café, e a indústria
começou a se
desenvolver em
São Paulo, como
discutiremos na
próxima aula.
Na área social, várias
revoltas e problemas
sociais aconteceram
em todo o território
brasileiro. No plano
político, a República
Velha caracterizou-se
pela alternância de
governantes paulistas
e mineiros no poder,
a política do cafécom-leite.
A República Velha
teve dois períodos
distintos:
a República da
Espada (1889-1894),
assim denominada
pelo fato de o poder
estar durante o
período nas mãos
dos militares;
e a República
Oligárquica
(1894-1930),
quando o poder
ficou centralizado
e dirigido pelas
oligarquias cafeeiras
de São Paulo e pelas
oligarquias de
Minas Gerais.
expressivas: o povo passou a escolher os governantes, ainda que sujeito a
grandes restrições, e a Igreja foi legalmente separada do Estado, por meio de
uma nova Constituição.
No entanto, a República Velha não mudou o fato de o Brasil ser o país do café
e dos grandes latifúndios. Os donos destas propriedades, chamados coronéis,
impunham seu poder sobre os empregados, submetendo-os ao voto de cabresto.
Isto fazia com que o poder político da região também estivesse sob seu domínio.
Este período da História ficou conhecido como República do Café-com-leite, pois
o poder político se concentrou nas mãos das oligarquias paulista (responsável por
produzir o café) e mineira (responsável pela produção de leite).
Para saber mais sobre este período da nossa
história, visite a página http://www.ceap.g12.br/
pagina/republicavelha.htm.
O início da República Velha foi caracterizado por condições altamente favoráveis
para a acumulação de capital na cafeicultura.
Como você viu na aula passada, o final do século XIX marcou um importante
fluxo de imigrantes europeus para o país, atraídos particularmente pela cultura
cafeeira desenvolvida em São Paulo. Isso aconteceu porque o governo brasileiro
criou uma série de estímulos para a vinda desses estrangeiros (em sua maioria
europeus) e porque a Argentina, concorrente de peso para o Brasil no abrigo
aos imigrantes, passou por um período de estagnação econômica durante
toda a década de 1890.
Além desses motivos, os chamados fatores de expulsão na Europa (como o
violento processo de unificação na Itália e na Alemanha), bem como a crise
econômica que se iniciou nos Estados Unidos a partir de 1893, contribuíram
para o processo de imigração. Nesse período, cerca de 1.400.000 imigrantes
aportaram no Brasil. Destes, aproximadamente 890 mil vieram para a região
paulista do café.
A cafeicultura encontrou uma situação especial de ampliação das terras
disponíveis para o cultivo, decorrente da importante expansão da malha
ferroviária no espaço paulista. Esses fatores conjugados (espaço e mão-deobra) permitiram um relevante aumento da capacidade produtiva do café.
100 C E D E R J
6
A grande entrada de mão-de-obra imigrante garantiu a manutenção de taxas
AULA
salariais em um nível bastante reduzido. Como mão-de-obra é um dos principais
determinantes do preço de um produto, foi possível haver aumento da produção
sem aumento associado dos custos médios. Dessa forma, a cafeicultura
experimentou grande aumento na acumulação de capital, persistindo, em
conseqüência, o aumento sistemático da produção.
!
Quando falamos de mãode-obra, se há muitos funcionários
disponíveis, eles competem pelo emprego. Os
contratadores podem, então, oferecer salários mais
baixos, que serão certamente aceitos por alguns dos candidatos
ao posto. Por esse motivo, o grande número de imigrantes
(que chegavam ao Brasil sem ter onde morar e em que
trabalhar) teve, como conseqüência, a redução dos
salários pagos pelo cultivo do café.
1889/1898: DESVALORIZAÇÃO CAMBIAL E SUSTENTAÇÃO
DA RENDA DA CAFEICULTURA
No final da década de 80 do século XIX, os preços internacionais
do café seguiram uma trajetória sistemática de alta, ampliando as margens
de lucro do setor. Isso era resultado do crescimento da demanda norteamericana, responsável por cerca de 60% das compras de café no mercado
internacional e pela quebra da safra brasileira em 1887/88 e 1889/90,
o que reduziu significativamente a oferta. É importante salientar que a
produção brasileira representava, naquele momento, algo em torno de
3⁄4 da oferta total de exportações de café no mundo. Você pode imaginar,
então, que qualquer mudança no patamar produtivo brasileiro afetava
substancialmente a oferta internacional do produto.
C E D E R J 101
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
Taxa de câmbio e
mercado cambial
Antes de entender o que significam estes
dois conceitos, você precisa ter em mente que
as transações financeiras e comerciais entre países
diferentes sempre acontecem usando uma moeda como
referência.
Nos dias de hoje, o dólar é esta moeda, por ser o dinheiro do país
economicamente mais forte do mundo, os EUA. Na época da Primeira
República, as negociações aconteciam em libras, pois estas eram (e ainda
são) a moeda da Inglaterra.
Taxa de câmbio é o valor da moeda nacional em relação a uma moeda estrangeira
(quantos reais custa um dólar, por exemplo). Ela é determinada, fundamentalmente,
pelas transações de compra e venda de moeda estrangeira, que acontecem em um
“ambiente virtual”, o mercado de câmbio. Os agentes envolvidos neste mercado são,
em geral, demandantes e ofertantes de moeda estrangeira. As fontes de demanda por
moeda estrangeira são:
• gastos com importações de bens e serviços;
• pagamentos de dívidas contraídas anteriormente com outros países;
• remessas de lucros para matriz de empresa multinacional;
• aplicações financeiras no exterior.
Já a oferta de moeda estrangeira caracteriza-se por:
• receitas de exportação de bens e serviços;
• dívidas contraídas;
• rendas recebidas;
• aplicações financeiras de estrangeiros no Brasil.
Mas o maior e mais importante ator desse mercado é o Banco Central (suas origens e atribuições
serão vistas na Aula 14). O Banco Central é o gestor da política cambial, pois aumenta ou diminui
a oferta de moeda estrangeira, podendo controlar, por esse mecanismo de oferta e procura, as
taxas de câmbio. Suas principais atribuições no mercado de câmbio são:
• a regulamentação do mercado cambial;
• a aplicação de medidas relativas ao regime cambial (fixo ou flutuante) definidas pela
política governamental.
Uma desvalorização da taxa de câmbio representa o aumento do preço da moeda
estrangeira, encarecendo os produtos importados e aumentando as receitas de
exportações em moeda nacional. Ao contrário, uma valorização cambial reduz o preço
da moeda estrangeira e, conseqüentemente, o preço pago por produtos importados
– ao mesmo tempo que diminui as receitas de exportações em moeda nacional.
O principal instrumento de análise dos efeitos das operações no mercado cambial
para o país é o Balanço de Pagamentos. Nesse balanço, são registradas todas
as operações realizadas entre empresas ou pessoas residentes em um país
e aquelas não residentes. É uma razão entre as operações de bens e
serviços (transações correntes) e as de natureza financeira (conta
de capital e conta financeira). Tem importância fundamental
para a organização das transações de um país com o
resto do mundo, permitindo a análise da situação
externa do país e um controle maior dessas
transações.
!
102 C E D E R J
6
A partir de 1891, no entanto, o contínuo avanço da produção
AULA
entrou em descompasso com o crescimento do mercado externo,
principalmente após o início da prolongada crise econômica que passou
a assolar a economia norte-americana em 1893 (sentida, pelo menos,
até meados de 1897).
Nosso país produzia mais café (aumentava a oferta) e não havia
resposta da economia mundial na mesma medida. Houve uma queda
sensível do preço internacional do café, revertendo a tendência de alta
dos preços até então registrada, determinando uma redução da receita
das exportações. Cabe destacar que o Brasil, àquela altura, dependia
fortemente das receitas em moeda estrangeira oriundas das vendas
externas do café, nosso principal produto de exportação desde a metade
do século XIX.
Em decorrência da queda de preços do café, o Balanço de
Pagamentos sofreu um impacto importante, promovendo mudanças na
condução da política econômica do Brasil. Esse movimento provocou o
início de um ciclo de desvalorização da taxa de câmbio que marcou de
!
maneira expressiva os primeiros anos da República Velha.
A queda do preço do
café representou um grande
impacto na economia brasileira do século
XIX. Um dos problemas associados a essa queda
do preço é o que chamamos inelasticidade-preço da
demanda por café. Uma queda de preço não implica
aumento proporcional da demanda pelo produto. Ou
seja, estar mais barato não fará com que as vendas do
café aumentem de forma a manter a receita constante,
independentemente da quantidade de produto
negociada. Do mesmo modo, o aumento
do preço não reduz seu mercado na
mesma proporção.
O CÍRCULO VICIOSO DA DESVALORIZAÇÃO CAMBIAL
E SUAS PRINCIPAIS CONSEQÜÊNCIAS
A desvalorização cambial era uma realidade decorrente de dois
fatores: (1) redução da entrada de moeda estrangeira no país, devido à
queda do preço internacional do café, e (2) pressão política exercida pelos
cafeicultores, visando preservar seus ganhos em moeda nacional.
C E D E R J 103
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
O quadro econômico interno da primeira década da República
RUI BARBOSA
(1849-1923)
Velha já estava bastante complicado. Além de ter sofrido os efeitos de uma
seca prolongada para as principais culturas agrícolas do país, esse período
Rui Barbosa foi,
sem dúvida, um dos
mais importantes
personagens da história
do Brasil por ter
participado de todas
as grandes questões
político-sociais de
sua época. Nasceu
em Salvador (BA) e
faleceu em Petrópolis
(RJ). Era advogado e
foi deputado, senador,
ministro e candidato
à presidência de
República em duas
ocasiões, mas nunca
venceu a eleição.
Conhecia a fundo o
pensamento político
constitucional angloamericano, que pregava
o liberalismo. Era
adepto desta linha
de pensamento que,
por seu intermédio,
influenciou a nossa
primeira Constituição
republicana.
Foi membro fundador
da Academia Brasileira
de Letras, onde, depois,
substituiu Machado de
Assis na presidência. Se
você quiser saber mais
a respeito, visite o site
http://www.casaruibarb
osa.gov.br/
foi marcado por uma forte estagnação econômica, dada a desorganização
da produção de culturas tradicionais (como a açucareira e a do algodão)
em decorrência da abolição da escravatura, em 1888.
O uso do imigrante substituindo o trabalho escravo estava
cristalizado apenas na produção de café, de maneira que as demais
atividades produtivas necessitavam de recursos para sua recuperação.
Nessa direção, foi implementada uma política de emissão monetária
na gestão de RUI BARBOSA como ministro da
Fazenda do governo provisório de Deodoro
da Fonseca que ficou conhecida como
ENCILHAMENTO.
Essa política, entretanto, causou uma
profunda desordem financeira na economia
brasileira. O encilhamento teve efeitos diretos
sobre a taxa de câmbio e contribuiu fortemente
para uma desvalorização cambial mais
intensa.
Este processo, todavia, determinava a
formação de um círculo vicioso, na medida em
que, apesar da queda do preço internacional
do café, a sustentação das receitas em mil-réis
para os produtores e exportadores de café os
ENCILHAMENTO
"Política financeira de
estímulo à indústria,
adotada por Rui Barbosa
quando ministro da
Fazenda (novembro de
1889 a janeiro de 1891),
após a proclamação da
República. Baseava-se
no incremento do meio
circulante com a criação
de bancos emissores (...).
Por isso, incentivou-se
intensamente a criação
de sociedades anônimas,
concitando-se o público
a investir em capital na
indústria e no comércio.
(...) O resultado foi uma
espiral inflacionária
e de falências (...)"
(SANDRONI, 2004, pp.
205-206).
estimulava a aumentar ainda mais a produção
– veja a Figura 6.1.
Elevação da oferta
internacional do café
(com demanda
estagnada)
p
p
Aumento
da produção
brasileira
de café
p
Redução da
oferta de moeda
estrangeira
no Brasil
p
Desvalorização
cambial
p
p
p
Aumento dos
preços internos e da
receita em moeda
nacional
Redução do preço
internacional
do café
Queda da receita
de exportações
do café
Figura 6.1: O processo de manutenção das receitas dos produtores e exportadores de café.
104 C E D E R J
6
Observe a Tabela 6.1. O que está acontecendo com os preços
AULA
externos em relação aos preços internos?
Tabela 6.1: Índice de preços internacionais (externos)
e internos do café (1889 =100)
Anos
Preços externos*
Preços internos**
1889
100
100
1890
113
120
1891
90
171
1892
87
201
1893
103
276
1894
92
290
1895
91
262
1896
69
252
1897
47
180
1898
41
163
Fonte: Delfim Netto (1981, p. 29).
*Preços em moeda estrangeira.
** Preços em mil-réis.
Como você deve ter percebido na Tabela 6.1, a depreciação do
câmbio invertia a trajetória dos preços internacionais quando convertidos
para os preços em mil-réis: enquanto os preços internacionais do café
caíam expressivamente, os cafeicultores recebiam mais, em mil-réis, pela
venda do produto.
Atividade 1
Crise de superprodução do café
1
Analise as informações a seguir:
a. A exportação do café sustentou a economia brasileira durante o final do Segundo
Reinado e início da Primeira República. A alta mundial dos preços estimulou o aumento
da produção. A alta mundial da oferta reduziu os preços internacionais do café (veja
novamente a Tabela 6.1).
b. A redução dos preços do café no cenário econômico internacional demandou, do
governo brasileiro, medidas que protegessem os cafeicultores da falência, que envolveram
o ajuste das taxas de câmbio.
Com base nessas duas afirmações e no que você leu até agora nesta aula, como você
explicaria a frase: “A desvalorização cambial sustentou a renda dos cafeicultores no final
do século XIX.”
C E D E R J 105
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
Resposta Comentada
O café experimentou uma crise de superprodução no final do século XIX. Isso fez
com que os preços despencassem no cenário internacional. Para conter a onda de
falências que aconteceria caso essa queda fosse repassada para os cafeicultores,
o governo brasileiro adotou uma política de desvalorização cambial. Isso significou
reduzir o valor da nossa moeda em relação à libra, a fim de manter elevada a renda
dos cafeicultores em moeda local.
A desvalorização do câmbio fazia os preços do café aumentarem em moeda nacional,
embora estivesse ocorrendo uma rápida queda dos preços internacionais. Dessa
forma, os cafeicultores recebiam uma remuneração maior em mil-réis, mesmo com
a redução do preço no mercado internacional.
A longo prazo, manter essas condições mostrava-se inviável.
A desvalorização cambial determinava uma elevação dos preços dos
produtos importados – base da cesta de consumo brasileira, uma vez
que pouco era produzido para o mercado interno. Assim, a subsistência
tornava-se mais cara em moeda nacional, forçando o aumento dos
salários, base dos custos de produção da cultura cafeeira.
Queda dos preços do café
em moeda estrangeira
Seguindo esta tendência, o aumento dos custos seria responsável
p
Desvalorização cambial
– aumento do preço do café
em moeda nacional
reduzindo seu espaço para acumulação de capital
em longo prazo (Figura 6.2).
p
Perda do poder de compra
de produtos importados
com moeda nacional
p
Necessidade de
aumento dos salários
p
Aumento nos custos
da produção do café
p
Figura 6.2: As conseqüências da desvalorização
cambial em longo prazo.
106 C E D E R J
pela redução da margem de lucro da cafeicultura,
Redução dos lucros
dos cafeicultores
Tabela
6
De maneira mais dramática em curto e médio prazos, a
AULA
desvalorização cambial afetava também as finanças públicas. A redução
nas importações diminuía sistematicamente a receita do governo, que
tinha nas arrecadações de impostos sobre os produtos importados sua
maior fonte.
O fim da
TARIFA-OURO
aplicada sobre as importações em 1891
agravava esse quadro, corroendo a capacidade de arrecadação do
Estado. Ao mesmo tempo, a maior fonte de financiamento público
era o endividamento externo, cujo pagamento é efetivado em moeda
estrangeira – a desvalorização cambial implicava, portanto, aumento
das necessidades de gasto do governo.
Sustentar por muito tempo essa situação poderia levar as finanças
públicas à bancarrota, pois a possibilidade de obter novos empréstimos
externos reduzia-se à medida que as receitas de exportações caíam. Quanto
menor a entrada de moeda estrangeira no país, maior o risco de não pagar
as dívidas e, obviamente, menor a oferta de novos empréstimos.
O GOVERNO CAMPOS SALES (1898-1902) E O
“SANEAMENTO MONETÁRIO” DE JOAQUIM MURTINHO
Quando a República foi proclamada, instaurou-se um governo
provisório, comandado pelo marechal Deodoro da Fonseca. Deodoro se
manteve no poder até novembro de 1891, quando tentou dar um golpe
de Estado e dissolver o Congresso. A campanha legalista de Floriano
TA R I F A - O U R O
Imposto cobrado pelo
governo em ouro.
Este procedimento
evitava que o governo
perdesse dinheiro
na troca de moeda,
aumentando as
reservas do Estado.
Além disso, por
se manter à parte
do mercado de
câmbio, minimizava
a especulação em
cima das trocas de
moedas, evitando,
por conseqüência, o
aumento do preço de
moeda estrangeira
no país. No governo
de Campos Sales,
esta tarifa foi
instituída (1901)
por seu ministro da
Fazenda, Joaquim
Murtinho, e começou
representando
10% do valor da
mercadoria. Pouco
tempo depois, já
significava 25%.
Peixoto, outro militar, derrotou as pretensões de Deodoro colocando
Floriano Peixoto no poder, o que prolongou até 1894 a República da
Espada.
Figura 6.3: Marechal Manoel Deodoro da Fonseca,
presidente do Brasil no período
de 15/11/1889 a 23/11/1891.
Figura 6.4: Marechal Floriano Vieira Peixoto,
presidente do Brasil no período
de 23/11/1891 a 15/11/1894.
C E D E R J 107
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
Se você quiser saber um pouco mais sobre cada presidente
que o Brasil já teve, visite a Galeria dos Presidentes na página
da Presidência da República (http://www.planalto.gov.br/).
O presidente seguinte foi Prudente de Moraes, civil e paulista, que
foi eleito pelo povo. Prudente de Moraes deu início ao período que ficou
conhecido como República do Café-com-Leite e consolida a presença dos
civis no governo do país. Foi substituído, ao final de seu mandato, por
Campos Sales, também representante da oligarquia cafeeira paulista.
Figura 6.5: Prudente José de Moraes e Barros,
presidente do Brasil no período
de 15/11/1894 a 15/11/1898.
Figura 6.6: Manoel Ferraz de Campos Sales,
presidente do Brasil no período
de 15/11/1898 a 15/11/1902.
Apoiada em um discurso de base liberal, que valorizava o papel do
mercado e os efeitos negativos da intervenção governamental, a política
FUNDING LOAN
"Moratória concedida pelos
credores a um Estado
devedor. Em troca, são
emitidos novos títulos
correspondentes aos encargos
da dívida e das operações
com excedentes comerciais.
O termo incorporou-se à
história brasileira, pois esse
recurso foi utilizado várias
vezes pelos credores do Brasil
no exterior, a partir da
Independência"
(SANDRONI, 2004, p. 256).
econômica do governo Campos Sales citava a ineficiência produtiva no
Brasil (tanto no campo quanto na indústria nascente) como justificativa
para uma mudança radical nos rumos do país. O principal mentor desse
governo era o ministro da Fazenda, Joaquim Murtinho.
Na verdade, a meta primordial do presidente era a obtenção de
novos recursos externos para resolver o problema de solvência das finanças
públicas. Logo ao tomar posse, o novo presidente foi à Europa em busca
desses recursos. Campos Sales assinou o II FUNDING LOAN, negociando
uma consolidação da dívida externa brasileira com novas condições
(mais favoráveis) de pagamento. Em contrapartida, firmou uma série de
compromissos para a condução da política econômica do país.
108 C E D E R J
6
O objetivo principal da nova política econômica era bastante
AULA
claro: definir uma trajetória de saneamento monetário capaz de impor
uma inversão dos movimentos da taxa cambial, permitindo a valorização
da moeda nacional. Por trás disso estava o firme propósito de garantir
condições para o pagamento da dívida externa consolidada no início
do governo.
Para isso, o governo empreendeu esforços significativos buscando
a redução do déficit e a retirada de circulação de moeda no valor
equivalente à dívida a ser paga (de acordo com a taxa cambial definida na
época). Havia ainda a necessidade de depositar esse montante em bancos
estrangeiros predeterminados no acordo firmado com os credores.
Do ponto de vista fiscal, foi novamente aplicada a tarifa-ouro
para as compras de importados, o que garantia para o governo uma
receita em moeda estrangeira. Esta tarifa sofreu aumentos importantes
a partir de 1900.
Os efeitos dessa política foram bastante sentidos pela população,
com destaque para uma pesada diminuição do nível de atividade
econômica decorrente de uma forte retração da oferta de moeda e crédito
e da DEFLAÇÃO associada a essa retração (cerca de 30%).
Em conseqüência, o câmbio foi efetivamente valorizado e mantido
sob controle durante a vigência dessas medidas de política econômica.
Em contrapartida, a economia brasileira acabou sofrendo os efeitos dessa
política com o PÂNICO BANCÁRIO NO RIO DE JANEIRO EM 1900 (dada a retração
da oferta de moeda) e uma importante recessão – afetando os negócios
em geral e, particularmente, os cafeicultores, que pressionavam para
DEFLAÇÃO
Ao contrário da
inflação, uma
deflação significa
uma queda do índice
geral de preços de
um país, geralmente
associada a uma
retração do nível de
atividade econômica.
uma mudança nos rumos da política adotada.
PÂNICO
BANCÁRIO NO
RIO
DE
JANEIRO
EM
1900
Quando o Brasil assinou o Funding Loan, houve a retirada de muito papel-moeda de
circulação. Isto aconteceu devido às condições do contrato assinado, que solicitava
que parte da dívida fosse depositada em bancos internacionais como garantia.
A retirada de dinheiro de circulação causou uma enorme crise econômica. Diante
da impossibilidade de uma nova política de emissão (considerando a perturbação
econômica gerada pelo Encilhamento), o governo resolveu utilizar o dinheiro do
principal banco brasileiro dessa época, o Banco Republicano Brasileiro (BRB).
Este fato gerou muita preocupação na sociedade.
O BRB foi liquidado e reestruturado, agora sob controle do governo, que se
responsabilizou pelas dívidas e gerou títulos que poderiam ser resgatados no
futuro. Isso, de certa forma, apaziguou a eminente crise da sociedade.
C E D E R J 109
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
Atividade 2
Até aqui tudo bem?
1
Analise as afirmativas a seguir. Qual (quais) dela(s) é (são) verdadeira(s)?
I – No final do século XIX, os altos preços atingidos pelo café no mercado internacional
estimularam o crescimento das lavouras deste produto. A superprodução teve como
conseqüência a queda dos preços nos mercados consumidores.
II – Em resposta à desvalorização do café, o governo valorizou seguidamente a moeda
brasileira: embora o café rendesse menos em moeda estrangeira, a moeda nacional
passou a valer mais, e os cafeicultores tiveram seu poder de compra de produtos
internacionais aumentado.
III – O aumento no poder de compra de produtos internacionais por parte dos
cafeicultores fez com que estes consumissem mais produtos importados. Essa atitude
diminuiu o ritmo da economia nacional que, para ser novamente movimentada, recebeu
uma injeção de fundos do governo Campos Sales. Este presidente obteve recursos através
do Funding Loan, um empréstimo feito com credores internacionais. Além disso, Campos
Sales aumentou as tarifas sobre os produtos importados a fim de reduzir o consumo
destes e privilegiar a produção (ainda pequena) nacional.
IV – A desvalorização do café no cenário internacional exigiu uma desvalorização cambial, a
fim de manter alta a renda dos cafeicultores em moeda nacional. Por causa dessa medida
econômica, o poder de compra de produtos importados ficou prejudicado, gerando uma
crise econômica. Na tentativa de resolver este problema, o então presidente Campos Sales
assinou o Funding Loan, um empréstimo feito com credores internacionais. Além disso,
ele aumentou as tarifas sobre os produtos importados com o objetivo de aumentar a
receita do governo em moeda estrangeira e arcar com os custos da dívida externa e dos
juros gerados por ela.
V – O alto poder de compra dos cafeicultores no cenário internacional promoveu uma
baixa de moeda nacional (que era trocada por moeda estrangeira para a compra de
produtos). Esta diminuição na quantidade de dinheiro circulante teve, como conseqüência,
a estabilização da taxa de câmbio.
VI – Campos Sales retirou moeda nacional de circulação, com o intuito de cumprir os
termos do pacto assinado com credores internacionais e numa tentativa de estabilizar as
taxas de câmbio.
Marque aqui as respostas que você considera verdadeiras:
( )I
( ) II
( ) III
( ) IV
( )V
( ) VI
110 C E D E R J
6
AULA
Resposta Comentada
As opções corretas são I, IV e VI.
As opções erradas estão listadas a seguir, com os trechos que as tornam
falsas em negrito:
II – Em resposta à desvalorização do café, o governo valorizou seguidamente
a moeda brasileira: embora o café rendesse menos em moeda estrangeira,
a moeda nacional passou a valer mais, e os cafeicultores tiveram seu poder
de compra de produtos internacionais aumentado.
III – O aumento no poder de compra de produtos internacionais por parte dos
cafeicultores fez com que estes consumissem mais produtos importados. Essa
atitude diminuiu o ritmo da economia nacional que, para ser novamente
movimentada, recebeu uma injeção de fundos do governo Campos Sales.
Este presidente obteve recursos através do Funding Loan, um empréstimo feito
com credores internacionais. Além disso, Campos Sales aumentou as tarifas sobre
os produtos importados a fim de reduzir o consumo destes e privilegiar a
produção (ainda pequena) nacional.
V – O alto poder de compra dos cafeicultores no cenário internacional promoveu
uma baixa de moeda nacional (que era trocada por moeda estrangeira para
compra de produtos). Esta diminuição na quantidade de dinheiro circulante teve,
como conseqüência, a estabilização da taxa de câmbio.
A NOVA FORMA DE VALORIZAÇÃO DO CAFÉ
– O CONVÊNIO DE TAUBATÉ
A política econômica levada a cabo a partir do governo Campos
Sales seguiu, de modo geral, a preocupação com a estabilidade monetária
e cambial. Nesse período, em contrapartida, cresciam as demandas,
sobretudo dos cafeicultores, para um direcionamento mais flexível que
permitisse a retomada do crescimento econômico. De certa forma, o
aumento da população urbana e a necessidade de investimentos em
infra-estrutura – principalmente nas áreas de saneamento, urbanização,
portos e estradas de ferro – garantiram uma importante retomada do
nível de atividade da economia brasileira.
A estabilidade monetária e a constante pressão para valorização
cambial deixavam insatisfeitos os cafeicultores, que viam suas receitas
recorrentemente reduzidas ou ameaçadas. A situação agravava-se toda
vez que havia uma previsão de safra excedente na produção de café.
C E D E R J 111
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
Afinal, como você já viu, a participação da produção brasileira na
oferta mundial era altamente significativa, com impactos imediatos na
determinação do preço internacional.
O cenário da virada de 1905 para 1906 caminhava exatamente
nessa direção. Além de uma valorização cambial em torno de 25%, havia
uma perspectiva de grande produção para 1906/7 – em 1906, a safra de
café passava de 20 milhões de sacas para uma demanda internacional
de aproximadamente 16 milhões.
Havia, portanto, a ameaça de mais uma crise de superprodução.
Exercendo sua enorme capacidade de interferência no poder, especialmente através do governo da província de São Paulo, os cafeicultores
conseguiram negociar uma vantajosa solução para o problema.
Conhecida como Convênio de Taubaté, esta solução foi firmada em
1906 pelos presidentes das províncias de São Paulo (Jorge Tibiriçá),
Minas Gerais (Francisco Salles) e Rio de Janeiro (Nilo Peçanha), – os
três maiores produtores de café –, mesmo contando com a oposição de
Rodrigues Alves, o então presidente da República.
O Convênio estabeleceu que:
(a) haveria a compra de excedentes de produção pelos governos
estaduais envolvidos;
(b) a compra seria viabilizada por meio de um financiamento de
15 milhões de libras esterlinas;
C AIXA
DE
(c) o gasto com a compra do excedente de café seria coberto pela
CONVERSÃO
criação de um imposto em ouro aplicado a cada saca exportada
Instrumento utilizado
para a estabilização
da taxa cambial.
Funcionava emitindo
bilhetes que eram
garantidos por
lastro (reserva de
garantia) em moedas
de ouro nacionais ou
estrangeiras, como o
dólar e a libra, por
exemplo. Essa conversão
tinha uma paridade
fixa e predeterminada,
impedindo valorização
ou desvalorização
cambial. Foi criada no
governo Campos Sales
exatamente para impedir
uma maior valorização
do mil-réis.
de café;
(d) um fundo seria criado para estabilizar a taxa de câmbio,
impedindo sua constante valorização – que funcionaria na
forma de uma CAIXA DE CONVERSÃO;
(e) seriam tomadas medidas para desencorajar a expansão
das lavouras no longo prazo, como a definição de taxas
proibitivas.
Essas medidas mudariam significativamente a orientação da
política econômica do país no que diz respeito às exportações de café.
O Convênio de Taubaté determinou, nesse sentido, a institucionalização
da prática de controle de estoques para regular o preço internacional,
artifício permitido pela enorme parcela do mercado internacional
ocupada pela produção brasileira.
112 C E D E R J
6
Todavia, apesar do sucesso alcançado na estabilização dos preços
AULA
internacionais, a prática acabou induzindo uma forte concentração na
atividade cafeeira. Os maiores lucros acabaram direcionados para os
operadores do mercado financeiro, com destaque para os banqueiros
internacionais e as casas comissárias, que compravam o produto na
baixa e vendiam na alta.
Os banqueiros internacionais, inclusive, passaram a dominar
o comércio do café, credenciados pela dívida externa crescente, e
adquiriram grandes fazendas dos produtores nacionais.
Além disso, a manutenção de altos preços e da receita de exportação inviabilizava qualquer tentativa de desestimular o crescimento das
lavouras, tornando o problema insolúvel no longo prazo.
Atividade 3
1
Medidas para valorização do café
Liste as duas principais causas da preocupação dos cafeicultores em estabelecer
medidas de valorização do café no início de 1906. Em seguida, assinale aquela que
tem relação direta com o saneamento financeiro de Campos Sales, justificando sua
resposta.
_________________________________________________________________________ ( )
_________________________________________________________________________ ( )
Justificativa
_______________________________________________________________________________
________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Resposta Comentada
A previsão de uma grande safra de café e a conseqüente expectativa de queda
significativa dos preços internacionais, em um cenário de câmbio estável, fariam
despencar os rendimentos da atividade cafeeira.
A manutenção das taxas de câmbio estáveis, parte do processo chamado de
saneamento financeiro de Campos Sales, preocupava os cafeicultores, pois,
naquele momento de nossa economia, nada asseguraria a renda que os grandes
senhores do café estavam acostumados a manter.
Com as medidas defendidas no Convênio de Taubaté, a oferta de café seria
reduzida, mantendo estável o preço internacional do produto.
C E D E R J 113
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
CONCLUSÃO
A política econômica da República Velha viveu dois momentos
bem distintos, cujo marco divisório foi o governo Campos Sales,
iniciado em 1898. O momento inicial foi marcado por uma recorrente
desvalorização da taxa de câmbio, o que garantia aos cafeicultores a
manutenção de sua renda em moeda nacional.
Esse quadro implicava a continuidade da expansão das lavouras
e, conseqüentemente, da oferta de café no mercado internacional,
determinando uma grande queda dos preços do produto.
A mudança na economia, promovida por Murtinho a partir de
1898 e definida pela necessidade de renegociação da dívida externa,
permitiu uma estabilização monetária da economia brasileira.
Ao mesmo tempo, o novo cenário de política econômica desfavorecia a receita de exportações dos produtores de café. Os produtores,
então, passaram a pressionar o governo a implementar medidas
protecionistas para garantir o lucro. Essas medidas, baseadas no controle
da exportação brasileira do café, foram consolidadas no Convênio de
Taubaté em 1906.
114 C E D E R J
O preço do café experimentou, ao longo da última década do século XIX, uma queda
brusca no cenário internacional. Observe novamente a Tabela 6.1 (já apresentada
nesta aula):
Tabela 6.1: Produção e Índice de preços internacionais (externos)
e internos do café (1889 =100)
Anos
Preços Externos*
Preços Internos**
1889
Produção
4.260
100
100
1890
5.358
113
120
1891
7.397
90
171
1892
6.202
87
201
1893
4.309
103
276
1894
6.695
92
290
1895
5.476
91
262
1896
8.680
69
252
1897
10.462
47
180
1898
8.771
41
163
Fonte: Delfim Netto (1981, p. 29).
*Preços em moeda estrangeira.
** Preços em mil-réis.
A crise dos preços do café se manteve também nos primeiros anos do século XX,
promovendo quedas expressivas do preço desta mercadoria. Esta alteração no valor do
produto apresentava relação direta com a sua oferta. Assim, quanto maior a produção,
menor o valor do café.
Observe agora a Tabela 6.2:
Tabela 6.2: Produção (em mil sacas) e preço
internacional do café
Anos
Produção
Preço
1904/5
11.159
7,55
1905/6
11.652
8,35
1906/7
20.607
8,25
Fonte: Gremaud et al. (1997).
C E D E R J 115
AULA
6
Atividade Final
Formação Econômica do Brasil | Políticas de sustentação da renda da cafeicultura
na República Velha
Essas duas tabelas se remetem a duas estratégias distintas de manutenção da renda
dos cafeicultores. De acordo com tudo o que você aprendeu nesta aula, quais são essas
estratégias? Não esqueça de mencionar em sua resposta a correlação entre os cenários
financeiros nacional e o internacional.
_______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Na Tabela 6.2, você pôde observar como a política de desvalorização cambial favorecia
a receita das exportações de café, pois o preço interno da saca de café aumentou
significativamente, apesar da queda do preço internacional, como está na Figura 6.1.
Nessa tabela, você viu, também, a manutenção do preço internacional do café
apesar do enorme aumento da produção. Isso só foi possível através da compra dos
excedentes de produção pelo governo, o que foi acordado no Convênio de Taubaté.
Por meio dessa atitude, o Brasil reduzia a oferta de café no mercado internacional
e mantinha, assim, os preços constantes em vez de em queda.
RESUMO
No início da República Velha, a moeda nacional sofreu uma forte desvalorização.
Esta desvalorização serviu, até 1898, para valorizar as receitas das exportações
de café, apesar da queda do preço internacional do produto. Este círculo vicioso
não pôde ser mantido por muito tempo, o que determinou, a partir de 1898,
no governo Campos Sales, a tomada de medidas de ajustamento e saneamento
monetário. No entanto, a estabilização monetária contrariava os interesses dos
cafeicultores. O Convênio de Taubaté, firmado em 1906, formalizou uma nova
prática de proteção da renda da cafeicultura.
116 C E D E R J
FUNDAÇÃO CASA RUI BARBOSA. Disponível em: <http://www.casaruibarbosa.gov.br>. Acesso
em: 15 set. 2005.
REPÚBLICA Velha. Disponível em: <http://www.ceap.g12.br/pagina/republicavelha.htm>. Acesso
em: 15 set. 2005.
RUI Barbosa. Disponível em : <http://www.biblio.com.br/Templates/RuiBarbosa/RuiBarbosa.htm>.
Acesso em: 15 set. 2005.
C E D E R J 117
AULA
6
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7
AULA
Origens dos desequilíbrios
regionais no Brasil
Meta da aula
objetivos
Descrever os determinantes históricos dos
desequilíbrios regionais no Brasil.
Esperamos que, ao final desta aula, você seja
capaz de:
1
2
3
Reconhecer as desigualdades econômicas
e regionais no Brasil como conseqüência de
seu modo de ocupação.
Conhecer as razões históricas do desequilíbrio
econômico das regiões brasileiras.
Interpretar dados atuais sobre a situação
socioeconômica das regiões brasileiras,
considerando os fatos históricos que
a provocaram.
Pré-requisito
Para acompanhar esta aula, é importante reler os
boxes “O sentido da colonização” e “Economia
de subsistência x economia mercantil”, da Aula 1,
bem como as Aulas de 4 a 6.
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
Você se lembra da canção A Novidade, de Herbert Vianna, Bi Ribeiro e
Gilberto Gil? Nela, os compositores criticam a desigualdade social do
país. Confira: “Oh, mundo tão desigual/Tudo é tão desigual/(...) De um
lado este carnaval/Do outro a fome total”. A música foi feita em 1986.
Depois de 20 anos, você acha que a desigualdade no país aumentou
ou diminuiu? Por quê?
INTRODUÇÃO
O Brasil faz parte do grupo das 15 maiores
economias mundiais, além de já ter representado,
na década de 1980, o oitavo maior PRODUTO INTERNO
BRUTO (PIB) do mundo. Apesar de resultados tão
animadores, é um dos campeões de desigualdade
econômica. Segundo matéria publicada no jornal
Folha de S. Paulo, em 2004, nosso país era o 109º
na lista das nações com maior índice de exclusão
social (IES). Como isto é possível? Quais as origens
PRODUTO INTERNO
BRUTO (PIB)
É o valor agregado
de todos os bens
e serviços finais
produzidos dentro
de um país. É uma
medida da riqueza
do país em um
período de tempo
determinado (em
geral, calculado para
cada ano).
desta desigualdade? Para descobrir isto, devemos
retroceder no tempo até a época colonial, quando a
economia brasileira começou a se formar. Você está pronto para a viagem?
Nesta aula, portanto, você vai rever algumas questões tratadas até o momento,
mas com um objetivo diferente. Esperamos que você possa entender o
fenômeno dos desequilíbrios regionais, ao analisar as atividades canavieira,
pecuária, da cotonicultura, mineira, da borracha e cafeeira. Os conhecimentos
de que você dispõe agora podem ajudá-lo bastante neste trabalho.
OS DESEQUILÍBRIOS REGIONAIS SÃO UMA MARCA DA
ECONOMIA BRASILEIRA
O equilíbrio econômico entre as regiões distingue os países mais
desenvolvidos dos menos desenvolvidos. Canadá e Estados Unidos,
por exemplo, são países onde há pouca discrepância em relação ao
desenvolvimento entre os estados e menos desequilíbrios internos. Em
nenhum deles, entretanto, um estado tem peso econômico expressivamente
superior aos demais, como acontece no Brasil, onde São Paulo participa
com um terço do PIB brasileiro.
120 C E D E R J
é um indicador dos desequilíbrios regionais do país. Observe com atenção
a Tabela 7.1, que contém as informações mais recentes sobre o tema,
obtidas durante o CENSO DEMOGRÁFICO de 2000. Nela, você pode verificar
que 42,6% da população brasileira vivem na Região Sudeste. Nas regiões
Norte e Centro-Oeste, correspondentes a duas terças partes do território,
!
residem apenas 14,5% da população.
No Brasil, o próximo
censo demográfico vai ser
realizado em 2010. Fique atento
aos resultados. Você estará terminando o
curso de Administração, e estas informações
podem ser úteis em sua profissão. Enquanto isso,
se você quiser ter mais informações sobre o Censo
Demográfico mais recente do Brasil (2000), acesse
o site do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), responsável pela
pesquisa em nosso país: http:
//www.ibge.gov.br
Realizado em média
a cada dez anos, o
censo demográfico
é uma ferramenta
muito importante
para acompanhar
a evolução de
uma sociedade.
Com os dados
que essa pesquisa
disponibiliza,
podemos traçar um
retrato da situação
do país, em relação
a população,
concentração de
renda, desemprego,
fecundidade,
migrações internas,
entre outros temas.
A partir dos
resultados do censo,
podem-se elaborar
políticas públicas
mais adequadas à
realidade do país.
Tabela 7.1: Distribuição da população brasileira por regiões – 2000
Regiões
População absoluta/
relativa (%)
Distribuição regional
do território (%)
Norte
12.904.737 - 7,6
45,3
Nordeste
47.713.567 - 28,1
18,3
CentroOeste
11.716.143 - 6,9
18,9
Sudeste
72.334.446 - 42,6
10,9
Sul
25.130.277 - 14,8
6,8
Brasil
169.799.170 - 100,0
100,0
Fonte: IBGE, 2000.
Outro indicador dos desequilíbrios regionais é a distribuição do
PIB por regiões. Veja só a Tabela 7.2. Observe que, em 2001, a região
mais desenvolvida, o Sudeste, concentrava 57,12% do PIB brasileiro,
percentual superior à sua participação na população (42,6%). Já a Região
Nordeste participava com apenas 13,12% do PIB, percentual inferior à
metade de sua participação na população (28,1%).
C E D E R J 121
7
CENSO
DEMOGRÁFICO
AULA
A maneira como a população está distribuída no território também
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
Tabela 7.2: Distribuição do Produto Interno Bruto (PIB) por regiões – 2001
Regiões
PIB (em milhões de
dólares)
Participação no PIB Brasil (%)
Norte
24.293
4,76
Nordeste
66.959
13,12
Centro-Oeste
36.746
7,20
Sudeste
291.518
57,12
Sul
90.844
17,80
Brasil
510,260
100,00
Fonte: IBGE. Departamento de Contas Nacionais (2001)
Se você se interessa pela comparação da economia brasileira com a de
outros países, consulte os relatórios anuais sobre o desenvolvimento
econômico mundial, disponíveis no site do Banco Mundial
(www.worldbank.com). Nos sites do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, IBGE (www.ibge.gov.br) e do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada, IPEA (www.ipeadata.gov.br), você pode encontrar indicadores
sobre desigualdades regionais no Brasil.
Atividade 1
Em busca do emprego ideal
Imagine que um amigo seu lhe pede ajuda. Ele vive em uma cidade pequena e tem
um emprego razoável, mas, para ele, isto não é o bastante: ele quer mudar de vida,
ganhar mais, morar em uma cidade maior, com mais oportunidades. Para ajudá-lo, você
conseguiu os dados a seguir:
• Os valores do rendimento médio dos responsáveis pelos domicílios (em reais,
no ano de 2000), residentes nas cidades com mais de 100 mil habitantes (cidades
médias) localizadas em regiões metropolitanas ou no interior estadual das cinco
macrorregiões.
Região Centro-Oeste
Região Norte
Região Nordeste
Região Sudeste
Região Sul
Média
Cidades médias
metropolitanas
Cidades médias nãometropolitanas
488,16
554,22
533,68
804,68
808,57
761,71
661,81
531,08
476,57
888,84
812,51
767,17
Fonte: IBGE. Indicadores Sociais Municipais (2003)
122 C E D E R J
7
Brasil
Até 5.000 habitantes
De 5 a 10.000 habitantes
De 10.000 a 20.000 habitantes
De 20.000 a 50.000 habitantes
De 50.000 a 100.000 habitantes
De 100.000 a 500.000 habitantes
Mais de 500.000 habitantes
768,83
424,08
409,66
416,32
479,55
612,80
810,48
1.190,00
Fonte: IBGE.Indicadores Sociais Municipais (2003)
• A distribuição das cidades com mais de 100 mil habitantes segundo localização nas
macrorregiões.
Norte
Centro-Oeste
Nordeste
Sudeste
Sul
6,3%
5,4%
20,2%
50,7%
17,4%
Fonte: IBGE. Censo Demográfico (2000)
Em sua opinião, em qual tipo de cidade e região seu amigo pode encontrar mais facilmente
um emprego com rendimento mais elevado? Por quê?
________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________
Resposta Comentada
Os municípios com mais de 500 mil habitantes situados na Região Sudeste são os
melhores lugares para o seu amigo encontrar o que procura. As cidades localizadas
fora das regiões metropolitanas também são uma boa alternativa para ele. O
motivo é que o rendimento cresce à medida que aumenta a população, e é mais
elevado nas cidades do Sudeste, onde, além disso, existe um número bem
maior de cidades com mais de 100 mil habitantes.
C E D E R J 123
AULA
• A distribuição do valor do rendimento médio dos responsáveis pelos domicílios (em
reais) segundo classes de tamanho dos municípios.
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
Os desequilíbrios regionais sempre fizeram parte de nossa
realidade. Como e por que as regiões brasileiras têm indicadores tão
diferentes? Para responder a esta pergunta, vamos buscar as raízes
históricas deste processo.
Em nosso país, até meados do século XIX, as regiões eram
caracterizadas como ilhas regionais, sem guardar relações econômicas
entre si. De 1850 a 1930, a expansão cafeeira e a industrialização
romperam este isolamento regional, fazendo surgir uma economia
centrada em São Paulo. Isso tornou as demais regiões dependentes
do dinamismo paulista. Para começar, vamos ver o que aconteceu no
Nordeste, na região das Minas, no Sul e no Norte do país?
NORDESTE: DO AUGE AÇUCAREIRO À ESTAGNAÇÃO
O Nordeste atravessou um processo secular de estagnação,
tornando-se uma área de emigração. No entanto, foi nessa região que
se desenvolveu a primeira atividade econômica importante do País: a
agroexportação canavieira, como você estudou nas Aulas 1 e 2. Além
da cana-de-açúcar, foram importantes a pecuária (Aula 2) e a cultura
do algodão, cotonicultura (Aula 3). Nenhuma dessas, todavia, trouxe
as condições para a superação da crise.
Na primeira aula, você conheceu as principais características da
economia canavieira. Tratava-se de uma atividade iniciada no Brasil pelos
colonos portugueses para proporcionar lucros mercantis, transferidos em
sua maior parte para a metrópole. Em função disso, era caracterizada pela
ocupação extensiva da terra e pela utilização da mão-de-obra escrava.
A monocultura açucareira contava com mercado consumidor europeu
(se você quiser relembrar esse assunto, volte ao boxe explicativo da Aula
1 “O sentido da colonização”).
O engenho de açúcar, unidade de produção típica, apresentava
elevado grau de auto-subsistência, o que implicava baixa circulação
interna de dinheiro, tornando a economia local pouco afetada pelas
oscilações observadas na renda das exportações da cana-de-açúcar. No
entanto, a partir de meados do século XVII, a renda das exportações caiu
devido ao declínio dos preços internacionais do açúcar, como vimos na
Aula 1, e a agroexportação mergulhou em uma crise que impediu o seu
processo de desenvolvimento. Repare, na Tabela 7.3, como diminuiu o
preço pago por tonelada de açúcar no período que vai do início do século
XVII, quando a cana de açúcar começou a ser cultivada no Brasil, e o
princípio do século XX.
124 C E D E R J
AULA
Período
Início do século XVII
Início do século XVIII
Início do século XIX
Metade do século XIX
Início do século XX
7
Tabela 7.3: Preços do açúcar por tonelada (em libras)
Preço por tonelada (libras)
120
72
30
16
9
Fonte: REGO; MARQUES (2003)
Segundo Celso Furtado (1971), as necessidades de abastecimento
interno no âmbito da economia canavieira referiam-se apenas a fontes
de energia: madeira para lenha e animais como meio de transporte.
A ocupação extensiva da cana diminuía a disponibilidade desses recursos
nos engenhos, levando os grandes proprietários a comprá-los dos
pequenos produtores locais (releia o boxe “O conceito de produtividade
e o uso extensivo de recursos”, na Aula 1).
A pecuária e a cultura do algodão (cotonicultura) foram
importantes instrumentos de ocupação do interior nordestino.
Entretanto, ao se manterem como atividades de baixa produtividade,
não contribuíram para a formação de um mercado interno que sustentasse
o desenvolvimento industrial da região. Vamos ver estas atividades de
maneira mais detalhada?
Pecuária
Em função das relações mercantis, inicialmente no Nordeste,
desenvolveu-se uma atividade pecuária, que foi a projeção da economia
canavieira. A pecuária foi, portanto, mais importante como atividade de
ocupação do território do que por sua contribuição à economia colonial.
Por meio dela, foi possível ocupar o interior do país. Esta atividade
serviu também como “amortecedor” das crises da cana-de-açúcar, ao
abrigar trabalhadores que se tornaram desnecessários para a economia
canavieira, durante a crise.
Outra vantagem da pecuária em relação às demais atividades
voltadas para o mercado externo era não demandar investimento inicial
elevado. Tampouco eram necessários gastos operacionais, tratando-se,
assim, de uma atividade muito resistente às crises.
Como a atividade canavieira, a pecuária teve um papel fundamental
para a formação do que Furtado chamou “reservatório de mão-de-obra”.
C E D E R J 125
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
Isso explica por que, mesmo com a economia nordestina estagnada, a
região participava com 40% da população brasileira ainda em 1900,
tendo se tornado a maior região de emigração ao longo do século XX.
Algodão: uma alternativa para a cana-de-açúcar
Outra importante cultura nordestina foi a do algodão
(cotonicultura), considerada como uma alternativa à crise da economia
canavieira no século XVIII, dada a identificação da Revolução Industrial
com a indústria têxtil.
Importante matéria-prima industrial, o algodão nordestino
somente conheceu desenvolvimento nos momentos em que os produtores
tradicionais experimentaram crises, como na Guerra Civil norteamericana. Terminado o conflito, as exportações de algodão caíram.
No entanto, essa cultura proporcionou o aparecimento de
atividades industriais têxteis no início do século XX, sendo abortada na
crise de 1929. Passada a crise, a cotonicultura paulista, tecnologicamente
mais moderna, limitou o crescimento dessa atividade e, conseqüentemente,
seu dinamismo como fonte de renda da economia nordestina.
Os efeitos de todos esses acontecimentos ainda se fazem sentir na
região. Vamos ver, na Atividade 2, como evoluiu a situação no Nordeste na
última década do século XX? Será que houve alguma melhora no período?
126 C E D E R J
7
Tabela
O Nordeste nosso de hoje em dia
Observe, no quadro a seguir, a evolução do ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (IDH) do Brasil e
suas macrorregiões em 1991 e 2000.
Norte
Nordeste
CentroOeste
Sudeste
Sul
IDH
1991
IDH
2000
IDH
Educação
1991
IDH
Educação
2000
0,656
0,580
0,725
0,676
0,705
0,600
0,827
0,754
Pessoas
com renda
per capita
inferior a
1⁄2 salário
mínimo em
1991 (%)
48,792
67,092
Pessoas
com renda
per capita
inferior a
1⁄2 salário
mínimo em
2000 ( %)
45,359
57,153
0,725
0,793
0,786
0,881
31,398
24,792
0,730
0,737
0,791
0,808
0,797
0,804
0,877
0,896
30,837
30,243
33,851
19,875
Fonte: www.ipeadata.gov.br – IPEA/PNUD/Fundação João Pinheiro –
Desenvolvimento Humano e Condições de Vida: Indicadores Brasileiros.
Com base nesta tabela, analise a situação atual da Região Nordeste, considerando o IDH. Compare-a
com a das demais regiões, tomando por referência a dificuldade da região em superar a crise da
economia canavieira.
_______________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________________
Resposta Comentada
O IDH da Região Nordeste melhorou ao longo da década de 1990, mas ainda continua
sendo o mais baixo entre todas as regiões, refletindo a incapacidade da região para superar
a crise na economia canavieira e encontrar alternativas economicamente mais dinâmicas
para a sua economia, o que iria refletir-se em melhores índices de desenvolvimento humano.
O elevadíssimo percentual de residentes com renda inferior a meio salário mínimo é um
indicador da fraca circulação de renda na região, dificultando o surgimento de novas
atividades econômicas.
IDH
Criado pela Organização das Nações Unidas (ONU), o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é composto
da conjugação de três indicadores: a renda per capita; o número de anos de escolaridade e a taxa de expectativa
de vida. Trata-se de um índice criado para comparar o desenvolvimento entre países, introduzindo indicadores
de condições de vida ao tradicional cálculo do PIB e da renda per capita.
No Brasil, este indicador foi calculado nos anos em que houve Censo Demográfico a partir de 1970. Estes
dados estão disponíveis no site www.ipeadata.gov.br.
C E D E R J 127
AULA
Atividade 2
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
A REGIÃO DAS MINAS: A ILUSÃO DO OURO
Outra região brasileira em que se sentiram intensamente os efeitos
da atividade econômica realizada pela colônia foi a região das minas,
localizada principalmente no Estado de Minas Gerais, no Sudeste. No
século XVIII, a descoberta de ouro na região gerou um grande movimento
migratório para o interior, inclusive de portugueses.
Por tratar-se de uma atividade que não dependia da propriedade
de terras, o garimpo atraiu todo tipo de trabalhadores, até mesmo os
ex-escravos que conseguiram comprar sua liberdade. Diferente da fazenda
de açúcar, onde havia produção de subsistência, a atividade garimpeira era
totalmente voltada para a produção mercantil (releia o boxe “Economia
de subsistência versus Economia mercantil”, da Aula 1).
Devido à inexistência de agricultura nas áreas de garimpo, o
abastecimento da população garimpeira gerou um comércio de longa
distância, incluindo desde os produtores primários do Sul do país até os
criadores do Nordeste. Outra característica que distinguia a mineração
da cultura canavieira era a concentração da população em cidades,
necessitando de abastecimento alimentar, o que impulsionou a economia
do interior da Colônia.
O isolamento geográfico, conjugado ao curto período do chamado
“ciclo do ouro”, fez com que as atividades manufatureiras voltadas
para o mercado interno não se mostrassem sustentáveis. Segundo Castro
(1971) “a crise da economia do ouro, ao contrário dos demais casos
na história brasileira, teve origem na incapacidade de sustentação da
oferta” (p. 28).
O SUL: LATIFÚNDIO E INDÚSTRIA REGIONAL
A ocupação do que é atualmente o Rio Grande do Sul foi movida
pela colonização de povoamento, a partir dos século XVIII, com o
imigrante europeu estabelecendo-se como pequeno proprietário, não
estando aí presente o trabalhador escravo.
128 C E D E R J
7
Naquela região, a principal atividade econômica era a pecuária
– que exerceu papel fundamental no abastecimento da região mineira (na
época do ouro) – além da produção agrícola, voltadas para o mercado
interno.
No Rio Grande do Sul, o território foi dividido segundo a
utilização em distintas atividades. Ao sul, predominava a pecuária,
baseada no latifúndio e empregando pequeno número de trabalhadores.
Ao norte, predominava a agricultura, com base no trabalho extensivo
que a imigração européia propiciou.
No site do Memorial do Imigrante, você encontra depoimentos dos trabalhadores de
31 países que vieram trabalhar no Brasil.
Acesse http://www.memorialdoimigrante.sp.gov.br/Oral/
Ao sul, pela baixa geração de emprego, uma das características
da pecuária, o mercado consumidor não se desenvolveu. Ao norte,
no entanto, devido à agricultura, produziu-se um amplo mercado
consumidor, ainda que de baixa renda. Nestas condições, surgiram
cidades que geravam mercado para a agricultura mercantil, cuja renda
estimulava as atividades manufatureiras urbanas. Produziu-se, assim,
um círculo virtuoso que sustentou o dinamismo da economia local,
articulando agricultura, pecuária e indústria.
O alcance desse mercado industrial era, entretanto, pequeno:
cobria apenas a região do extremo-sul. No século XX, quando a indústria
regional defrontou-se com a competição da indústria paulista, perdeu
fôlego e a economia estadual diminuiu sua participação no produto
industrial do país.
Diferentemente das economias cafeeira e mineira, a economia
do extremo sul encontrou, no mercado interno, sua estratégia de
desenvolvimento. Inseriu-se na economia brasileira pela oferta de alimentos,
tornando-se o primeiro celeiro do país (grande produtor de alimentos).
C E D E R J 129
AULA
O povoamento da Região Sul é o pano de fundo no filme brasileiro O quatrilho,
indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, no ano de 1996. Nesse filme, os quatro
personagens principais formam dois casais, todos imigrantes italianos ou portugueses,
tendo um deles conseguido ultrapassar a condição de pequeno proprietário agrícola,
tornar-se comerciante e depois transformar-se em banqueiro.
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
Figura 7.1: O desenvolvimento do Rio Grande do Sul reflete
as distintas formas de ocupação da terra: na parte sul,
dominada pelo latifúndio, explora-se a pecuária, ao passo
que, ao norte do estado, predomina a pequena propriedade, onde desenvolveram-se as indústrias e as principais
cidades gaúchas, fora da região metropolitana de Porto
Alegre, como é o caso de Caxias do Sul.
AMAZÔNIA: O “CICLO” DA BORRACHA
É sempre bom lembrar que falar de ciclos na economia colonial
não significa que, ao final do período de predomínio daquele produto,
há um retrocesso às condições econômicas anteriores. A experiência
dessas atividades quase sempre tem impacto favorável na economia
local. Houve, entretanto, um caso de regressão à situação vigente antes
do início do ciclo: a do Amazonas, após o ciclo da borracha.
De 1870 a 1920, as exportações de látex da Amazônia atingiram
tamanha proporção que a região conheceu a prosperidade de que é
testemunha o Teatro Amazonas, de Manaus. Em alguns momentos, o
valor das exportações de látex atingiu aproximadamente 75% do valor
das exportações de café, como você pode observar na Tabela 7.4.
130 C E D E R J
7
AULA
Figura 7.2: A riqueza gerada pela
economia da borracha permitiu a
construção do monumental Teatro
Amazonas, um símbolo daquele
período ainda preservado pelo
Patrimônio Histórico.
Figura 7.3: Apesar da riqueza que
gerou, o ciclo da borracha não
proporcionou o surgimento de
outras atividades que poderiam
superar a crise na produção. A
economia regional regrediu e,
até os nossos dias, as condições
de vida de parte significativa da
população são conseqüências
deste retrocesso.
C E D E R J 131
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
Tabela 7.4: Exportações de café e borracha (em 1000 contos)
Ano
Borracha (AM)
Café (SP)
AM/SP (%)
1871-1880
107,9
221,8
48,6
1881-1890
185,5
490,7
37,8
1891-1900
1.163.3
2.860,0
40,7
1901-1910
2.268,8
2.899,2
78,3
1911-1920
1.406,8
4.942,0
28,5
Fonte: REGO ; MARQUES (2003)
Tamanho dinamismo está relacionado à expansão da indústria
que demandava borracha, atividade explorada em regime extrativista,
somente encontrada na Amazônia. Mesmo desfrutando de condições de
monopolista, a economia da borracha não propiciou o desenvolvimento
regional em bases sustentáveis, como ocorreu na região do café naquele
mesmo período.
A atividade extrativista atraiu grande contingente migratório, em
grande parte proveniente do Nordeste, onde a estagnação econômica
associada às periódicas secas expulsava trabalhadores, que se submetiam
a relações de trabalho caracterizadas por grande vulnerabilidade.
A economia da borracha era uma atividade nômade, que pouco
fixava o trabalhador à terra. Pelo seu caráter extrativista, o trabalhador
era contratado sob o esquema do aviamento, recebendo em espécie, com
pequena parcela em dinheiro, e levado a adentrar o território em busca
de novas seringueiras, árvores de onde o látex era extraído. Tratava-se,
assim, de uma economia em que havia muito pouca circulação de dinheiro,
não favorecendo o surgimento de cidades – com exceção das aquelas
portuárias, para onde a borracha era transportada, com fins de exportação.
O desenvolvimento de uma agricultura mercantil não era estimulado.
Outro fator que limitou o impacto do ciclo econômico da borracha foi
o fato de que sua infra-estrutura de transportes era constituída por rios e canais
fluviais, abundantes na Região Norte. Não houve, portanto, investimento em
malha ferroviária, ao contrário do ocorrido na região cafeeira.
A conjugação desses fatores – atividade extrativista, relações de
trabalho baseadas no aviamento e inexistência de investimento no sistema
de transporte – não permitiu que a crise do ciclo da borracha pudesse ser
superada com o desenvolvimento de outra atividade de maior dinamismo,
como aconteceu com a indústria, na região do café.
132 C E D E R J
7
Com a entrada de outros países produtores de borracha, nas
AULA
primeiras décadas do século XX, veio a crise, sem que o dinamismo tivesse
se instalado em bases sustentáveis. A economia amazônica voltou a se
isolar: sua participação na produção industrial, que em 1907 atingira
4,3% do total nacional, seria de apenas 1,3%, em 1919.
Veja mais curiosidades sobre esta época em http://veja.abril.com.br/idade/
exclusivo/amazonia/curiosidades.html
Atividade 3
Tamanho não é documento
Segundo o IBGE, a participação percentual do estado do Amazonas no PIB do país era
equivalente a 1,7%, em 2000. Quando se considera que o estado ocupa uma grande
parte do território nacional, sua participação no PIB brasileiro parece insignificante. Já
Minas Gerais, com um território muito menor, tem uma participação de 7,7% no PIB do
Brasil. Como você explicaria estes resultados? Para responder a esta pergunta, lembre-se
de como foi a ocupação destas áreas e em que época. O tipo de atividade desenvolvida
em cada região também é um fator muito importante.
Resposta Comentada
A economia amazônica teve seu auge durante o ciclo da borracha, entre fins
do século XIX e início do século XX. Neste período, por ser o principal produtor,
o Amazonas foi beneficiado com elevados preços internacionais. A situação
se modificou com a entrada de produtores concorrentes, o que fez declinar o
preço da borracha e levou à crise da economia estadual. As características dessa
atividade extrativista não concorreram para a fixação da população nem para que
surgissem cidades – e o mercado consumidor que poderia viabilizar o surgimento
de atividades manufatureiras.
No Estado de Minas Gerais, o ciclo do ouro levou à intensificação da ocupação
do território, à criação de cidades e ao estímulo à atividade manufatureira. Esta,
contudo, foi bloqueada pela Coroa Portuguesa. Após a independência de Portugal,
a região pôde experimentar maior desenvolvimento.
C E D E R J 133
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
SÃO PAULO: DO CAFÉ À INDUSTRIALIZAÇÃO
No 450º aniversário da cidade de São Paulo, em 2005, os paulistanos receberam uma
homenagem: a minissérie da TV Globo chamada Um só coração. Nela, estavam presentes
todos os referenciais econômicos e culturais que marcaram a ocupação da região desde
a instalação da Capitania de São Vicente (São Paulo). O destaque, entretanto, foi
dado para o período compreendido entre 1920 e 1954, quando a capital estadual, a
cidade de São Paulo, comemorava seu quarto centenário. Trata-se de um período de
intensas mudanças da cidade e do estado, em função do processo de industrialização
que transformava a elite econômica local em empresários industriais.
Muitos dos personagens da minissérie são reais ou foram baseados em personalidades
representativas da sociedade paulista: o fazendeiro descendente das famílias dos
bandeirantes; o fazendeiro de café que enfrenta a crise tentando reconverter o uso
de sua terra para outros cultivos; e, sobretudo, a emergente burguesia industrial,
constituída de imigrantes europeus. Esses personagens referiam-se a São Paulo como
“a locomotiva do Brasil”, em uma referência à condição da economia paulista como
a que alavancava a economia brasileira.
A cultura do café transformou a economia paulista, proporcionando-lhe as bases para que sua crise fosse superada pela transferência de
recursos para a atividade industrial. Esse fenômeno, ocorrido por volta da
metade do século XIX em São Paulo, não se manifestou em outras regiões
onde se desenvolveram ciclos de monocultura.
A transformação da cidade de São Paulo de um burgo, de apenas
15 mil habitantes em 1790, para a metrópole que em 2000 contava
com aproximadamente 11 milhões de habitantes pode ser mais bem
entendida ao estudarmos os determinantes históricos de nossa atual
estrutura geoeconômica.
Figura 7.4: São Paulo: um pequeno burgo, em fins do século XIX, transforma-se,
aproximadamente cem anos depois, na maior cidade da América Latina.
134 C E D E R J
7
São Paulo foi a única região em que uma atividade agroexportadora
AULA
teve sua crise superada pelo surgimento de uma atividade mais dinâmica: a
indústria. Esta, por sua vez, transformou São Paulo na “locomotiva” do PIB
brasileiro, atingindo um percentual equivalente a 39,4%, em 1970. Tamanha
polarização econômica transformou a capital estadual – que, no século XIX,
não passava de uma pequena cidade, se comparada com as maiores cidades
brasileiras da época – na maior metrópole sul-americana.
Observe, na Tabela 7.5, os números que confirmam essa tendência.
O Rio de Janeiro, então capital do país, tinha aproximadamente 43
mil habitantes em 1790, ao passo que São Paulo contava com apenas
15 mil. Salvador e Recife, na mesma época, tinham por volta de 40
mil e 25 mil habitantes, respectivamente. A população de São Paulo
aumentou quase 40 vezes deste período até 1920, ao passo que a de
Salvador cresceu apenas sete vezes, a de Recife, quase 10, e a do Rio de
Janeiro, 27 vezes.
Tabela 7. 5: População de cidades brasileiras selecionadas no período 1790-1930
Ano
Salvador
Recife
1790
40.000
25.000
1872
129.000
117.000
1890
174.000
112.000
1900
206.000
113.000
1920
280.000
240.000
Fonte: REGO; MARQUES (2003)
Rio de Janeiro
43.000
275.000
523.000
811.000
1.158.000
São Paulo
15.000
32.000
65.000
240.000
579.000
Conforme você estudou nas aulas anteriores, a economia cafeeira
passou a sustentar a economia brasileira, a partir de 1840, introduzindo
grande dinamismo quando o país atingia sua independência política.
Inicialmente instalada no Rio de Janeiro, a cultura cafeeira foi explorada
de maneira extensiva: em grandes extensões, em monocultura e utilizando
mão-de-obra escrava. Este tipo de uso do solo esgotou rapidamente os
terrenos, o que levou os fazendeiros a buscar terrenos mais férteis como
os do oeste paulista (TERRA ROXA).
TERRA ROXA
Localizada nos
terrenos entre o
Planalto Meridional
e o Planalto Atlântico
(sul de São Paulo e
norte do Paraná),
a terra roxa foi um
dos diferenciais da
região na cultura
do café. Altamente
fértil e resultante da
decomposição de
rochas basálticas, o
solo de terra roxa
contém areia, argila,
calcário e húmus
em quantidades
equilibradas. Não
é muito seco, nem
úmido demais,
permitindo boa
circulação do ar.
C E D E R J 135
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
!
Iniciada a partir da
década de 1870, a expansão da
cafeicultura no Oeste Paulista provocou
o deslocamento do eixo econômico do Rio de
Janeiro e do Vale do Paraíba para esta região. Por
este motivo, o Oeste paulista passou a desempenhar um
papel central na economia brasileira. Entre as condições
favoráveis, estavam as condições geoclimáticas adequadas
(terra roxa, relevo predominantemente plano, temperatura
e distribuição de chuvas adequadas para o cultivo do café),
utilização de técnicas mais modernas, além de utilização
de mão-de-obra assalariada, incluindo os imigrantes
europeus. A produção era escoada pelo porto de
Santos e, com isto, surge a necessidade de um
transporte mais moderno entre ele e as
áreas produtoras: o trem.
!
Quer saber mais sobre
a importância das ferrovias na
expansão da cultura cafeeira? Consulte o site
http://www.spsitecity.com.br/formacao/
cafe.htm
História da cafeicultura no Brasil
Quer saber mais sobre a história da cultura de café no Brasil? Consulte o site
da Associação Brasileira da Indústria de Café – Abic (http://www.abic.com.br/
scafe_historia.html#cafe_brasil), principalmente o item O Trajeto do Cultivo do
Café no Brasil.
!
Floresta da Tijuca, um
antigo cafezal
Uma das maiores florestas urbanas do
mundo, a Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro,
já foi uma área de plantio de café e cana-deaçúcar. O desgaste causado pelo uso irracional do
solo com estas atividades fez com que, em 1861, o
imperador D. Pedro II ordenasse o reflorestamento
da região, em iniciativa pioneira na América
Latina. Atualmente, a floresta é uma das
atrações turísticas da cidade.
136 C E D E R J
7
A partir de 1880, São Paulo tornou-se o maior produtor do país.
AULA
Esse desempenho está associado a quatro fatores principais: técnicas de
produção que sustentavam a fertilidade do solo por mais tempo do que
no cultivo da província fluminense; disponibilidade de terras, implantação
da malha ferroviária e mão-de-obra livre.
Segundo Gala (2003):
desde o plantio e colheita, até o beneficiamento – com a utilização
de despolpadores, ventiladores, separadores, classificadores, dentre
outras máquinas – a cafeicultura paulista apresentava um produto
mais barato e de qualidade igual ou superior ao fluminense (p.
240).
Por ser uma cultura que se instalara inicialmente em terras
fluminenses, a economia cafeeira na nova área de expansão da produção
pôde ultrapassar o conhecimento técnico acumulado e desfrutar de maior
produtividade e, portanto, de maior lucratividade.
A disponibilidade de terras planas e de maior fertilidade era
outro fator que distinguia a cafeicultura do oeste paulista da fluminense.
Ademais, os cafezais paulistas eram mais novos, mais produtivos.
A oferta de terras ampliou-se com a expansão da malha
ferroviária, permitindo o aproveitamento de território mais distante do
litoral. Além de proporcionar essa maior disponibilidade de recursos
naturais e deslocamento a custos decrescentes, a expansão ferroviária
transformou-se em infra-estrutura de apoio à atividade industrial que
ia se instalando, sucedendo a cultura do café.
Finalmente, o fator mais importante a favor da cultura cafeeira
paulista, em relação à fluminense, estava nas relações de trabalho, livre
no oeste paulista e escravo no Estado do Rio de Janeiro. A proibição
do tráfico negreiro, em 1850, elevou os preços dos escravos, o que
estimulou a emigração de trabalhadores europeus, interessados em se
tornar pequenos proprietários. A necessidade de poupar fez do emigrante
um trabalhador muito mais produtivo do que o escravo. Além disso, o
trabalhador livre era consumidor, e o escravo não era, o que impactava
significativamente a formação do mercado consumidor, necessário para
estimular o surgimento de indústrias.
C E D E R J 137
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
A CULTURA DO CAFÉ E O SURGIMENTO DE CIDADES
Por ser uma atividade muito dependente de mão-de-obra (agora
constituída de trabalhadores livres), houve estímulo ao surgimento de
muitas cidades: ao deslocar-se o plantio de novos cafezais, a terra era
reconvertida para outros usos agrícolas, intensificando uma agricultura
mercantil iniciada pelos trabalhadores em regime de colonato. Ao receber
permissão para cultivar alimentos paralelamente ao café, os trabalhadores
produziram uma agricultura mercantil que permitiu o abastecimento das
cidades, contribuindo para sua consolidação, e conseqüente não-reversão,
!
como no caso da Amazônia.
As relações entre expansão
cafeeira e origens da indústria estão
descritas nas Aulas de 4 a 6. Se você compreendeu bem
os conceitos desenvolvidos nelas, não terá dificuldade em
acompanhar o restante desta aula e ainda poderá
reforçar o seu conhecimento.
Quando a economia cafeeira passou a enfrentar crises de
superprodução, a partir de 1894, a reação foi o estabelecimento de
política de sustentação da renda dos cafeicultores, inicialmente através
das desvalorizações cambiais, que permitiam a manutenção da receita
das exportações, sustentando-lhe a lucratividade ao mesmo tempo
que encarecia as importações. Isso criava estímulo à industrialização
substitutiva de importações.
A partir de 1906, a política de sustentação da renda da cafeicultura
passou a ter como base a compra dos excedentes de produção, o que
continuava a assegurar a renda do negócio e, portanto, o nível de emprego
nessa atividade. A manutenção do nível de emprego e o encarecimento
das importações levaram à migração dos lucros da atividade cafeeira
para financiar os empreendimentos industriais.
Portanto, a expansão cafeeira para o oeste paulista criou as
bases para a emergência da indústria. Segundo Gala (2003), havia forte
complementaridade entre o capital cafeeiro e o industrial.
138 C E D E R J
7
Isso significa que a atividade cafeeira, apesar de liderar o processo
AULA
de acumulação, contribuiu fortemente também para a ampliação
industrial. Nos momentos de bonança, as indústrias se beneficiavam
da renda gerada pelas exportações de café – aumento de demanda
por alimentos, por máquinas de beneficiamento, sacarias, transporte
etc. –; nos momentos de crise, a atividade industrial surgia como
um refúgio para a aplicação do capital, principalmente nos setores
urbanos (p. 243).
A superação da crise cafeeira pela indústria – uma atividade mais
dinâmica, geradora de maior produtividade – transformou não só a
economia paulista, mas a do país. As indústrias das demais economias
regionais tornaram-se zonas de complementação da indústria paulista,
especializando-se em fornecer insumos a serem processados por ela (como
no caso da zona metalúrgica de Minas Gerais). Foram poucos os casos em
que uma economia voltada para o mercado regional conseguiu ampliar
seu alcance para o mercado nacional. A indústria têxtil e a de cerâmica,
ambas catarinenses, são exemplos disso.
A indústria paulista chegou a ter uma participação de 58,1% no
PIB industrial brasileiro, ao passo que outras antigas economias estaduais
perderam participação na indústria brasileira. Entre essas, o destaque é
o declínio da economia fluminense, cuja indústria foi ultrapassada pela
paulista desde a década de 1920.
Atividade 4
Industrialização: quem ganha e quem perde?
Observe este quadro com a distribuição, em termos percentuais, do Produto Industrial
Brasileiro em alguns estados.
Estados
1930
1940
1950
1960
1970
1980
PE
5,0
5,3
4,5
2,6
2,1
2,1
BA
-
1,3
1,3
1,7
2,5
4,0
MG
7,5
7,9
6,5
5,7
6,4
8,9
RJ
28,0
25,0
20,3
17,5
15,6
11,8
SP
35,0
39,4
48,9
55,5
58,1
47,0
PR
-
2,4
2,8
3,2
3,0
4,9
SC
-
2,2
2,4
2,2
2,6
4,0
RS
8,0
9,6
7,9
6,9
6,3
7,3
1985
2,0
5,2
8,7
11,8
44,0
5,2
3,6
6,9
Fonte: IBGE. Diretoria de Pesquisas, Departamento de Contas Nacionais (2001)
Em sua opinião, que estados foram os principais beneficiários e quais os que mais
perderam com o processo de industrialização no país. Por que isto aconteceu? Na
sua resposta, lembre-se de considerar a história econômica de cada estado.
C E D E R J 139
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
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Resposta Comentada
O principal beneficiário foi, sem dúvida, o estado de São Paulo, que em 1970
atingiu quase 60% do PIB industrial brasileiro. O maior perdedor foi o estado
do Rio de Janeiro. Um dos principais motivos desse resultado relaciona-se à
economia cafeeira: enquanto no Rio a cafeicultura foi realizada com utilização de
trabalho escravo, em São Paulo teve sua produtividade melhorada com a utilização
de mão-de-obra livre (imigrantes europeus) e aumentando o investimento em
infra-estrutura de apoio, como a malha ferroviária. O aumento da rentabilidade
do negócio permitiu o financiamento das atividades manufatureiras que, ao se
estabelecerem em São Paulo, atraíram mais investimentos industriais, ampliando
o mercado e consolidando esse estado como locus preferencial da indústria
no País.
CONCLUSÃO
Nesta aula, você estudou as raízes históricas dos desequilíbrios
regionais no País. A análise da experiência de ocupação econômica
do território, no contexto histórico em que ela ocorreu, demonstrou
uma forte polarização espacial a partir do processo de industrialização
brasileiro, muito identificado com a industrialização paulista.
Em seguida, você irá estudar uma nova etapa da formação
econômica do Brasil, quando a indústria se transformou no seu eixo
econômico, deslocando daí as atividades agroexportadoras.
140 C E D E R J
As regiões Sudeste e Nordeste são aquelas de ocupação mais antiga no Brasil e
constituem as regiões de maior percentual na população do País. No caso do PIB,
entretanto, estas regiões têm indicadores extremamente diferentes. A participação
do Sudeste é maior no PIB (57,12%) do que na população brasileira (42,6%). Já a do
Nordeste é de 13,12% e corresponde à metade da participação na população (28,1%).
Qual a origem deste desequilíbrio?
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_______________________________________________________________________________
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______________________________________________________________________________
Resposta comentada
Durante o período colonial, o Nordeste foi a principal região econômica do País, pois lá
desenvolveu-se a economia canavieira. Pela condição de economia colonial dependente
dos interesses metropolitanos (Coroa Portuguesa), introduziu o trabalho escravo para
baixar custos de produção e permitir lucros mercantis com a exportação. Após o declínio
dos preços internacionais da cana-de-açúcar no século XVII, a região enfrentou uma
crise que não foi superada pelo dinamismo interno pois a frágil ligação entre o setor
externo (a agroexportação canavieira) e o setor de economia interna (abastecimento de
animais e madeira) não permitiu a formação de um mercado interno que estimulasse
o surgimento de novas atividades voltadas para a economia interna.
Na economia cafeeira foi diferente, especialmente após o fim do tráfico escravo e o
abastecimento de trabalhadores por meio da imigração européia. Foi constituído um
mercado de trabalho que favoreceu o surgimento do mercado consumidor, em numa
época em que o Brasil já deixara de ser colônia portuguesa (livre, portanto, do
Pacto Colonial) e a industrialização já se tornara na principal estratégia de
desenvolvimento econômico.
C E D E R J 141
AULA
7
Atividade Final
Formação Econômica do Brasil | Origens dos desequilíbrios regionais no Brasil
INFORMAÇÕES SOBRE A PRÓXIMA AULA
Na próxima aula, você estudará um evento político que marca a ruptura
entre o modelo de desenvolvimento agroexportador, analisado nas Aulas de
1 a 6, e o modelo de industrialização substitutiva de importações, tratado
nas Aulas de 9 a 14: a Revolução de 1930.
RESUMO
A economia brasileira é espacialmente muito desequilibrada. São Paulo é
o estado onde atualmente se concentra a maior parcela do PIB nacional.
Outros estados e regiões experimentaram dinamismo em alguma etapa do
desenvolvimento de atividades agroexportadoras, mas não conseguiram
superar as crises que surgiram. A economia cafeeira, com base na mãode-obra livre, foi a única que conseguiu transformar-se, fazendo surgir
atividade mais dinâmica: a indústria.
142 C E D E R J
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