EDITORIAL Um desafio para 2025: reduzir a mortalidade precoce por doenças crônicas em todo o mundo Paulo Andrade LotufoI Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) A preocupação tradicional com as doenças infectocontagiosas e materno-infantis continua presente, mas a carga das doenças cardiovasculares, respiratórias, hepáticas e dos cânceres se torna ano a ano maior em países de economia média e baixa. Em 2011, Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) discutiu e deliberou sobre o importante tema das doenças crônicas em todo o planeta. A presidente da República Federativa do Brasil, Dilma Roussef, esteve presente e assinou o compromisso denominado “25 x 25”, que significa reduzir em 25% a mortalidade precoce (por definição abaixo dos 70 anos) em decorrência de doenças crônicas (ou não transmissíveis) no ano de 2025 em comparação ao ano de 2010. Detalhe de todo esse processo poderá ser encontrado em no site da NCD Alliance (http://www.ncdalliance.org). O desafio é grande, mas poderá ser cumprido se todos os diversos setores envolvidos atuarem de forma conjunta e decidida nos dois componentes da mortalidade: a incidência, ou seja, os casos novos de uma doença, e a letalidade, ou a proporção de mortes decorrente de uma determinada doença. A Associação Paulista de Medicina está lançando a proposta de unificação das sociedades científicas médicas para ações conjuntas e, para isso, torna-se importante conhecer quais são as principais causas da mortalidade precoce no Brasil. A proposta aprovada engloba quatro categorias de doenças: cardiovascular, câncer, diabetes e doença pulmonar obstrutiva crônica. No entanto, no caso brasileiro, teremos que incluir outras causas relevantes de morte em homens: a cirrose e a doença hepática, como serão provadas a seguir. Antes disso, é necessária a compreensão da dimensão desse conjunto na mortalidade no Brasil. Elas representaram, em 2012, 62% da mortalidade por todas as causas, mas, excluindo causas externas (homicídio e acidente automobilístico, principalmente), a proporção chega a 78% de todas as mortes. A Figura 11 mostra o número de óbitos entre 30 e 69 anos ocorridos no ano de 2012 em todo o país pelo conjunto das cinco causas principais: cardiovascular, câncer, diabetes, doenças hepáticas e doença pulmonar obstrutiva crônica. Nas Tabelas 1 e 21 se apresenta de forma mais detalhadas as 15 principais causas para homens e mulheres. O excesso de mortalidade entre os homens é de 38% basicamente pela doença hepática (258%), doença cardiovascular (60%) e doença pulmonar obstrutiva crônica (34%). Óbitos em decorrência de câncer e diabetes atingem ambos os sexos. A análise preliminar das 15 principais causas tanto em homens como mulheres indica determinantes subjacentes, como aterosclerose e dislipidemia (doença coronariana e infarto cerebral), hipertensão (hemorragia parenquimatosa cerebral e miocardiopatias), obesidade (diabetes) e tabagismo (câncer aerodigestivo alto, câncer de pulmão, doença pulmonar obstrutiva crônica e doença I Professor titular de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Presidente da Câmara de Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo. Diretor Científico da Associação Paulista de Medicina 2014-17. Editor das revistas São Paulo Medical Journal e Diagnóstico & Tratamento. Endereço para correspondência: Paulo Andrade Lotufo Centro de Pesquisa Clínica e Epidemiológica, Hospital Universitário, Universidade de São Paulo Av. Prof. Lineu Prestes, 2.565 Butantã — São Paulo (SP) — Brasil Tel. (+55 11) 3091-9300 E-mail: [email protected] Diagn Tratamento. 2015;20(2):51-2. 51 Um desafio para 2025: reduzir a mortalidade precoce por doenças crônicas em todo o mundo coronariana). Outro fator muito importante é prevalência alta, com consumo individual alto de bebidas alcoólicas: cirrose e os cânceres aerodigestivos altos. Adicione-se ao impacto do uso exagerado de bebidas alcóolicas outras causas de mortes, como homicídios e acidentes de uma forma geral. As ações para reduzir a mortalidade precoce por essas doenças é tarefa de toda sociedade, mas deverá contar com a liderança decidida de toda a categoria médica. Tabela 1. As 15 principais causas de óbito no Brasil em 2012 por doenças não transmissíveis entre homens com idade entre 30 e 69 anos1 Doença Número absoluto Doença coronariana 157.552 Cirrose e outras doenças hepáticas 81.196 Infarto cerebral 58.287 Diabetes 57.641 Câncer aerodigestivo alto (orofaringe, laringe e esôfago) 52.059 Miocardiopatias 50.454 Hipertensão 43.573 Câncer de pulmão 37.059 Doença pulmonar obstrutiva crônica 33.629 Hemorragia do parênquima cerebral 25.662 Câncer de estômago 24.703 Câncer de cólon e reto 17.445 Linfomas e leucemias 16.829 Câncer do fígado e vias biliares 15.722 Câncer de próstata 13.860 Tabela 2. As 15 principais causas de óbito no Brasil em 2012 por doenças não transmissíveis entre mulheres com idade entre 30 e 69 anos1 Doença Número absoluto Doença coronariana 79.853 Diabetes 56.417 Câncer de mama 44.218 Infarto cerebral 43.172 Hipertensão 35.518 Miocardiopatias 29.671 Doença pulmonar obstrutiva crônica 25.084 Câncer de pulmão 23.595 Hemorragia do parênquima cerebral 19.526 Câncer de colo uterino 18.689 Cirrose e outras doenças hepáticas 17.890 Câncer de cólon e reto 17.243 Linfomas e leucemias 13.948 Câncer do fígado e vias biliares 13.224 Câncer de estômago 12.480 Cardiovascular 583.516 Câncer Diabetes Fígado DPOC 391.843 114.058 76.177 58.713 DPOC = doença pulmonar obstrutiva crônica. Figura 1. Número de óbitos por doenças não transmissíveis no Brasil em 2012 em pessoas entre 30 e 69 anos de idade.1 REFERÊNCIAS 1. Brasil. Ministério da Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília: Ministério da Saúde; 52 Diagn Tratamento. 2015;20(2):51-2. 2011. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ publicacoes/plano_acoes_enfrent_dcnt_2011.pdf. Acessado em 2015 (Mar 19).