embriologia da coluna vertebral

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EMBRIOLOGIA DA COLUNA VERTEBRAL
Erasmo Zardo
Joel Abramczuk
Marcus S. Ziegler
O
estudo da gênese embriológica da coluna vertebral possibilita a compreensão de muitas doenças e auxilia no diagnóstico e no tratamento destas.
Amnios
Cavidade
amniótica
Ectoblasto
Endoblasto
Saco vitelino
primitivo
Membrana
de Heuser
Mesoderme
embrionária
PERÍODO PRÉ-EMBRIONÁRIO
(0 A 3 SEMANAS)
Na primeira semana gestacional, temos a fecundação seguida pelo processo de clivagem,
que origina uma estrutura chamada blastocisto.
Através da tuba uterina, o embrião é transportado e implantado no endométrio.
Já a segunda semana é marcada pelo processo de diferenciação e formação da cavidade
amniótica e do saco coriônico, estruturas que
participarão da formação dos futuros anexos
embrionários. Ao final desse período, o embrioblasto se diferencia em um disco bilaminar composto pelo epiblasto ou ectoblasto (voltado para
a cavidade amniótica) e hipoblasto ou endoblasto (adjacente à cavidade blastocística) (Fig. 1.1).
PERÍODO EMBRIONÁRIO
(3 A 8 SEMANAS)
Os primórdios da coluna vertebral surgem na terceira semana gestacional que começa com o processo de gastrulação e finaliza com a neurulação.
A gastrulação inicia com a migração de
células a partir do epiblasto para a região mediana do disco bilaminar, formando a linha primitiva que se alonga no sentido cranial formando o nó primitivo (nó de Hensen). Após, a linha
primitiva começa a se invaginar e formar o sulco primitivo que tem continuidade até uma de-
Figura 1.1
Embrião humano de 9 dias.
pressão chamada fosseta primitiva. No final da
gastrulação, o disco bilaminar torna-se trilaminar, composto de ectoderme, mesoderme e endoderme (Fig. 1.2A-C)
A partir do nó primitivo e da fosseta primitiva, migram células mesenquimais que formam o processo notocordal entre a ectoderma
e a endoderma. A fosseta primitiva se estende
para dentro do processo notocordal formando
o duto notocordal, que é um tubo celular que
se estende do nó primitivo até a placa pré cordal (Fig. 1.3A-C).
O assoalho do processo notocordal se une
ao endoderma intraembrionário e se degenera
fazendo uma comunicação do canal noto­cordal
com o saco vitelino. O assoalho notocordal desaparece e o restante do processo notocordal forma
a placa notocordal achatada (Fig. 1.4A-C).
A seguir, as células da placa notocordal
proliferam e começam a se dobrar até formarem
a notocorda que, gradualmente, se separa do endoderma e do saco vitelino e se torna uma camada contínua (Fig. 1.5).
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Pudles & Defino (Orgs.)
Aspecto macroscópico
Corte longitudinal
(vista dorsal)
Área
Borda do
cardiogênica
âmnio cortado
Fosseta
Lâmina
procordal primitiva
Nódulo de
Hensen
Linha
primitiva
Corte transversal
Saco
primitivo
Ectoderme
Mesoderme
Alantoide
Membrana
cloacal
Mesoderme
A
Endoderme
B
C
Figura 1.2A-C
Embrião humano de 16 dias.
Aspecto macroscópico
(vista dorsal)
Borda
do âmnio
cortado
Corte longitudinal
Ectoderme
Mesoderme
Placa
procordal
Nódulo de
Hensen
Corte transversal
Duto
notocordal
Duto notocordal
Membrana
cloacal
A
Placa
neural
Ectoderme
B
C
Figura 1.3A-C
Embrião humano de 18 dias.
Aspecto macroscópico
Corte longitudinal
Corte transversal
(vista dorsal)
Duto
Sulco neural
Borda
Mesoderme paraxial
neuroentérico
Placa notocordal
do âmnio
cortado
Espaços
Sulco neural
celômicos
Saco vitelino
secundário
Nódulo
de Hensen
Ilhotas
sanguíneas
A
Figura 1.4A-C
Embrião humano de 19 dias.
B
Mesoderme
lateral
Placa
Mesoderme
Vasos sanguí­ notocordal
intermediária
neos primitivos
Mesoderme
embrionária
C
Coluna vertebral: conceitos básicos
Corte transversal
Pregas
neurais
Celoma
intraembrionário
Notocorda
Figura 1.5
Corte transversal do embrião.
Após a diferenciação dessas estruturas, temos o início da formação da placa neural, da
prega e do tubo neural, chamado de processo de
neurulação. A notocorda induz a formação da
placa neural a partir de células epiteliais do ectoderma embrionário. O ectoderma da placa neural (neuroectoderma) dará origem ao encéfalo e
à medula espinal.
Então, ocorre invaginação da placa neural
e formação do sulco neural mediano junto com
as pregas neurais. No final da terceira semana, as
pregas neurais se fundem e dão origem ao tubo
neural (Fig. 1.6A-C).
Como consequência da separação entre
tubo neural e ectoderma superficial, temos o
surgimento das células da crista neural que darão origem a gânglios sensitivos dos nervos cranianos e espinhais. Além da notocorda, as células do nó primitivo induzem a formação do
mesoderma paraxial que tem continuidade com
o mesoderma intermediário e lateral.
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Ao final da terceira semana, o mesoderma
paraxial se diferencia e começa a formação dos
somitos. Estes se dispõem em pares ao lado do
tubo neural em desenvolvimento e formam elevações na superfície do embrião, o que os torna
úteis para determinar a idade embrionária.
O primeiro par de somitos surge ao final
da terceira semana na futura região ociptal do
embrião. Ao final da quinta semana, de 42 a 44
pares de somitos estão presentes e se diferenciam em duas porções: a parte ventromedial é o
esclerótomo, que formará as vértebras e as costelas. A parte dorsolateral é o dermomiótomo.
As células da região do miótomo formarão os
mioblastos e as células do dermátomo formarão
os fibroblastos (Fig 1.7A-C).
O miótomo tem uma divisão epiaxial dorsal e uma hipoaxial ventral com uma ramificação de nervo espinal para cada divisão: o ramo
dorsal para a porção epiaxial e o ventral para a
hipoaxial. Os mioblastos da porção epiaxial darão origem aos músculos extensores do pescoço e da coluna vertebral. Os mioblastos da porção hipoaxial gerarão os músculos escaleno,
pré-vertebral, gênio-hiode, infra-hioide, flexores lateral e ventral da coluna vertebral e quadrado lombar.
FORMAÇÃO DA COLUNA
VERTEBRAL NO PERÍODO
MESENQUIMAL
Durante esse período, as células dos esclerótomos encontram-se em três áreas principais: na
parede do corpo, em torno da notocorda e envolvendo o tubo neural (Fig. 1.8A). Cada escle-
Corte transversal
Pregas
neurais
Celoma
intraembrionário
Notocorda
Figura 1.6A
Inicio da invaginação das pregas neurais e formação do
sulco neural mediano.
Somatopleura
Somitos
Esplâncnopleura
Figura 1.6B
Final do processo de invaginação e formação do tubo neural.
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Pudles & Defino (Orgs.)
Aspecto macroscópico
(vista dorsal)
Corte transversal
Corte longitudinal
Túbulo
neural
Pedículo
de fixação
Cristas
Túbulo neurais
neural
Mesoderme
intermediária
Cavidade amniótica
Somitos
Saco vitelino
secundários
Coração
primitivo
A
Celoma
intraembrionário
B
C
Figura 1.7A-C
Embrião com 22 dias.
rótomo tem uma região com células organizadas frouxamente (cranial) e outra com células
organizadas densamente (caudal) (Fig. 1.8B). A
partir de células da região densamente agrupadas, ocorre um processo de migração cranial até
o centro do miótomo onde ocorre a formação
do disco intervertebral. Paralelamente, ocorre
Notocorda
Músculo
Nervo
Esclerótomo
a fusão das regiões densamente agrupadas com
as frouxamente agrupadas para formar o centrum mesenquimal, que é o primórdio do corpo vertebral (Fig. 1.8C). Cada centrum surge a
partir de dois esclerótomos tornando-se intersegmentar. A notocorda inicia o seu processo de
degeneração, que resulta na formação do núcleo
Zona
cranial do
esclerótomo
Mesênquima
intersegmentar
Futura
vértebra
Zona
caudal do
esclerótomo
Artéria
intersegmentar
A
Músculo (em
posição segmentar)
Artéria
intersegmentar
C
Figura 1.8A-C
B
Futuro espaço entre duas vértebras
(corresponderá ao annufus fibrosis)
Vértebra (metade caudal de um esclerótomo com
metade encefálica do esclerótomo seguinte)
Nucleus
pulposus
Annulus
fibrosis
Disco
invertebral
Esquema ilustrando a formação da coluna vertebral. Uma vértebra forma-se a partir das metades cranial e caudal de
dois esclerótomos sucessivos. Os miótomos e os nervos espinais conservam sua disposição segmentar inicial, enquanto
as artérias intersegmentares atravessam os corpos das vértebras. A notocorda degenera, exceto na região do disco intervertebral, onde formará o nucleus pulposus.
Coluna vertebral: conceitos básicos
21
pulposo. As células mesenquimais em torno do
tubo neural darão origem ao arco vertebral.
ses anulares na borda superior e inferior do corpo vertebral.
ESTÁGIO CARTILAGINOSO
DESENVOLVIMENTO
DA MEDULA ESPINAL
Esse período se inicia na sexta semana, quando
há o surgimento de centros formadores de cartilagem nas vértebras mesenquimais. Ao final
do período embrionário, os centrum se fundem
para formarem um centrum cartilaginoso único. Paralelamente, temos a formação dos arcos
vertebrais que se unem com o centrum. Os processos espinhoso e transverso também surgem a
partir dos centros de formação de cartilagem do
arco vertebral (Fig. 1.9A-B).
ESTÁGIO ÓSSEO
Os três centros de ossificação primários estão
presentes nas vértebras ao final do período embrionário; um no centro e os outros dois em
cada metade do arco. O processo de ossificação da vértebra se inicia no período embrionário, mas finaliza somente aos 25 anos. No momento do nascimento, cada vértebra tem três
partes ósseas conectadas por cartilagem. A ossificação dos arcos neurais começa na oitava semana e os arcos vertebrais se ­fundem entre 3 e
5 anos de idade, iniciando-se na região lombar e
progredindo para a cranial. Na puberdade, existem quatro centros secundários de ossificação:
um em cada ponta do processo transverso, outro na ponta do processo espinhoso e duas epífi-
Forame
vertebral
Região
central
A
Figura 1.9A-C
A medula espinal preenche todo o canal vertebral no período embrionário. A coluna vertebral
e as meninges crescem mais rápido que a medula, que vai assumindo uma posição mais cranial à
medida que o crescimento ocorre. Aos 6 meses de
vida, a medula está ao nível da primeira vértebra
sacral. No recém-nascido, está ao nível de L2-L3 e
assume a sua posição final ao nível de L1 no indivíduo adulto. Os nervos espinhais têm a sua posição próxima ao forame no início da vida embrionária. Como resultado das diferentes velocidades
de crescimento, as raízes lombossacrais vão se
distanciando dos forames de origem e assumindo uma posição oblíqua dentro do canal medular até o seu foramen correspondente. À medida
que o crescimento vai ocorrendo, forma-se o filamento terminal (filum terminale) que é o remanescente da linha de regressão da porção caudal
da medula espinal embrionária e se estende do
cone medular até a primeira vértebra coccígea.
A medula espinal é originada a partir dos
somitos caudais ao quarto somito. O canal neural tem o seu tamanho reduzido devido ao espessamento das paredes laterais do tubo neural.
Em torno da décima semana, o canal neural involuiu para formar o canal central.
No início, as paredes do tubo neural têm
um neuroepitélio pseudoestratificado colunar e
Centros de
condrificação
Processo
costal
Centros de
ossificação
primária
Notocorda
B
C
Esquema ilustrando o desenvolvimento das vértebras.. (A) Cinco semanas depois surgem vértebras pré-cartilaginosas.
(B) Após seis semanas, centros de condrificação de uma vértebra mesenquimatosa. (C) Em sete semanas, centros de
ossificação primária de uma vértebra cartilaginosa.
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Pudles & Defino (Orgs.)
formam a zona ventricular, também chamada
de camada ependimária, que dá origem aos neurônios e células macrogliais. Com a diferenciação, surge a zona marginal, formada pela porção externa das células neuroepiteliais, que vai
dar origem à substância branca da medula, com
o crescimento dos axônios das células nervosas.
Forma-se, também, a zona intermediária constituída de neurônios primordiais (neuroblastos)
que se dividem da zona ventricular e se tornam
neurônios por meio de prolongamentos citoplasmáticos.
A partir do mesênquima, que está ao redor do tubo neural, surge a meninge primitiva. Sua camada externa forma a dura máter.­ A
camada interna forma a pia-aracnoide, formada
pela pia-máter e aracnoide, e são derivadas de células da crista neural. A pia-aracnoide começa a
ser preenchida por um líquido que faz a separação entre pia-máter e aracnoide permanecendo
apenas as trabéculas aracnoideas. Com o crescimento, o espaço preenchido pelo líquido desaparece e dá lugar à formação do espaço subarac-
noideo. O liquor tem sua formação iniciada na
quinta semana.
LEITURAS RECOMENDADAS
Balinski BI. An introduction to embryology. 4th ed.
Philadelphia: Saunders; 1975.
Eynard R, Valentich MA, Rovasio RA. Histologia e
embriologia humanas: bases celulares e moleculares.
4. ed. Porto Alegre: Artmed; 2010.
Garcia SML, Fernández CG, organizadores. Embriologia. 3. ed. Porto Alegre: Artmed; 2012.
Gilbert SF. Developmental biology. 4th ed. Sanderland: Sinauer; 1994.
Moore KL, Persuad TVN. Embriologia clínica. 8. ed.
Rio de Janeiro: Elsevier; 2008.
Schoenwolf GC, Bleyl SB, Brauer PR, Francis-West
PH. Larsen embriologia humana. 4. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2009.
Wolpert L, Jessel T, Lawrence P, Meyerowitz E, Robertson E, Smith J. Princípios de biologia do desenvolvimento. 3. ed. Porto Alegre: Artmed; 2008.
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