ANTIBIÓTICOS EM CIRURGIA. QUANDO USÁ-LOS? ANTIBIOTICS IN SURGERY. WHEN USE THEM? 1 WOHLGEMUTH, Felipe Barbieri; 2ABDALLA, Stella Crescenti - MD; 3ACCIOLI VASCONCELLOS, Zulmar Antonio - MD - PhD; 4ACCIOLI VASCONCELLOS, João Justino - MD; 5VIEIRA, Vilberto José - MD; 6BINS-ELY, Jorge - MSc PhD; 7d’ÉÇA NEVES, Rodrigo - MD 1 Medico Residente do 1º ano de Cirurgia Plástica do NCP-HU-UFSC; 2Cirurgiã Plástica, Staff do NCP-HU; 3Professor Adjunto, Staff do NCP-HU-UFSC; 4Cirurgião Plástico, Staff do NCP-HU-UFSC; 5Cirurgião Plástico, Staff do NCP-HU-UFSC; 6Professor Adjunto, ViceRegente NCP-HU-UFSC; 7Professor Titular, Regente do NCP-HU-UFSC FELIPE BARBIERI WOHLGEMUTH Rua General Bittencourt, 338 - Centro - Florianópolis-SC - CEP 88020-100 [email protected] DESCRITORES infecção, antibióticos, cirurgia, assepsia e contaminação KEYWORDS infection, antibiotics, surgery, asepsis, contamination RESUMO Introdução: a prevenção e o controle das infecções cirúrgicas mais difíceis podem ser realizados com antibióticos. Porém, ainda persistem as infecções graves. Objetivo: realizar uma revisão sobre o uso adequado de antibióticos em cirurgia. Métodos: foram selecionados trabalhos a partir do banco de dados Medline, sendo incluídos apenas “clinical trials” randomizados dos últimos 10 anos. Foram também revisados os dados publicados pela National Nosocomial Infections Surveillance System (US). Conclusões: concluímos que o uso de antibióticos não substitui a boa técnica cirúrgica. A adequada avaliação do paciente é importante para a programação da profilaxia antimicrobiana. O uso inadequado dos antibióticos não diminui a incidência de infecção. ABSTRACT OBJETIVO Realizar uma revisão sobre o uso adequado de antibióticos em cirurgia. Background: the prevention and control of the most difficult surgical infections can be done by antibiotics. However, severe infections still occur. Objective: to review the appropriate use of antibiotics in surgery. Methods: the studies were selected from Medline, including only randomized clinical trials of the last 10 years. Data published by the National Nosocomial Infections Surveillance System (US) were also reviewed. Conclusions: we concluded that the use of antibiotics do not replace the good surgical techniques. The appropriate patient evaluation is important to plan the antibiotic prophylaxis. The inappropriate use of antibiotics does not decrease the incidence of infections. INTRODUÇÃO Após a introdução da anestesia por Morton, em 1846, muitas técnicas operatórias foram desenvolvidas(1). Entretanto, muitas foram as limitações em razão das 180 elevadas taxas de infecção e mortalidade. Foram notadas reduções significativas nas taxas de infecção e mortalidade, após os trabalhos de Semelweiss em 1861, de Lister em 1867, e de Pasteur em 1878.(2, 3 e 4) A introdução dos antibióticos foi possível a partir dos trabalhos de Fleming, Chain e Florey. Então, a prevenção e o controle das infecções cirúrgicas mais difíceis tornaram-se factíveis. Entretanto, ainda persistem as infecções graves. Atualmente, o número crescente de alguns fatores contribuem para isso: (a) operações prolongadas; (b) maior número de pacientes geriátricos ou com doenças debilitantes; (c) implantes de material aloplástico; (d) agentes imunossupressores; (e) resistência bacteriana. MÉTODOS Foram selecionados trabalhos a partir do banco de dados Medline, utilizando-se as palavras-chaves: “wound”, “infection” e “antibiotic”. Foram incluídos apenas “clinical trials” randomizados dos últimos 10 anos. Foram também revisados os dados publicados pela National Nosocomial Infections Surveillance System (US). REVISÃO Os fatores de risco para infecções cirúrgicas podem ser agrupados em relação aos microorganismos, ferida cirúrgica e paciente (Tabela 1). A maioria desses fatores é observada em infecções cirúrgicas. Porém tem sido difícil demonstrar uma associação independente de cada um deles com infecção cirúrgica. A contaminação bacteriana com menos de 105 Arquivos Catarinenses de Medicina - Volume 36 - Suplemento 01 - 2007 organismos, em indivíduos hígidos, raramente causa infecção. Porém, um inóculo amplo pode causar infecção apesar dos mecanismos de defesa normais. Assim, as feridas cirúrgicas podem ser classificadas de acordo com o grau de contaminação (Tabela 2). A freqüência esperada de infecção da ferida cirúrgica de acordo com o grau de contaminação pode ser observada na Tabela 3. TABELA 1. FATORES DE RISCO PARA INFECÇÕES CIRÚRGICAS4 Arquivos Catarinenses de Medicina - Volume 36 - Suplemento 01 - 2007 181 PROFILAXIA ANTIMICROBIANA Antibioticoterapia é outro aspecto relevante, mas é uma terapia adjuvante. A antibioticoprofilaxia não substitui a técnica cirúrgica cuidadosa baseada em princípios de assepsia e antissepsia. As feridas limpas de baixo risco, ou seja, aquelas com incidência de infecção inferior a 1% não justificam a profilaxia antimicrobiana. Algumas das indicações de antibioticoprofilaxia são as operações na orofaringe, a implantação de material protético, as feridas acidentais com contaminação grave e dano tecidual e as lesões propensas à infecção clostridiana.(4) O início da profilaxia deve ser realizado no préoperatório. Após a ferida ser fechada é completamente sem valor.(4, 6) O uso de antibióticos tópicos diminui a incidência de infecção em feridas contaminadas. Porém, a combinação de medicações tópicas e sistêmicas não é mais eficaz do que o uso isolado de cada um.(5) A profilaxia com antibióticos torna-se ineficaz se a ferida possuir contaminação continuada, como em traqueostomias e queimaduras, a exemplo. FERIDA: CUIDADOS LOCAIS4 As medidas preventivas para diminuição dos fatores de risco relacionados à ferida local são determinadas pela técnica cirúgica. A manipulação apropriada do tecido, a garantia de suprimento sanguíneo, a hemostasia rigorosa e o desbridamento de tecidos necrosados são recomendados. Os fios monofilamentares apresentam taxa menor de infecção cirúrgica. O fechamento de espaços mortos com sutura não tem demonstrado diminuição na incidência de infecção cirúrgica, apesar de reduzir a formação de seroma. Os espaços mortos podem ser tratados com o uso de sistemas de sucção fechada por curto período. A drenagem aberta aumenta a taxa de infecção. Por isso, são indicadas apenas em feridas infectadas. INFECÇÃO CIRÚRGICA4 Os patógenos que causam infecção cirúrgica envolvem, freqüentemente, aeróbios e anaeróbios. Normalmente, são patógenos oportunistas que causam infecção através de um defeito epitelial. O aspecto primordial no tratamento da infecção cirúrgica é o controle do foco infeccioso. A drenagem de abscesso, ressecção ou desbridamento de tecido morto são maneiras de realizar o controle. 182 INFECÇÃO & MATERIAIS PROTÉTICOS A presença de material protético prejudica as defesas do hospedeiro, diminuindo a função polimorfonuclear leucocitária. Algumas bactérias com fatores virulentos específicos como o Staphylococcus epidermidis, assim como, outras cepas de baixa virulência e alta resistência conseguem expandir-se em superfícies estranhas e causar infecção. Na maioria dos casos, impõe-se a remoção do material sob cobertura antibiótica. CONCLUSÕES Concluímos que o uso de antibióticos não substitui a rigorosa técnica cirúrgica. A adequada avaliação do paciente é importante para a programação da profilaxia antimicrobiana. O uso inadequado dos antibióticos não diminui a incidência de infecção e seleciona a flora bacteriana. REFERÊNCIAS 1 - Semmelweiss IP: Die Ätiologie, der Begriff und die Prophylaxis des Kindbettfiebers. Pest, Wien und Leipzig: CA Hartleben, 1861. 2 - Lister J. On the antiseptic principle in the practice of surgery. Lancet. 1867;2:353-356, 668-669. 3 - Pasteur, Joubert et Chamberland: La théorie des germes et ses applications à la Médicine et à la Chirurgie. Comptes Rendus de l’ Academie des Sciences. 1878 Juillet;87(1): 1037-43 4 - Culver DH, Horan TC, Gaynes RP, et al: Surgical wound infection rates by wound class, operative procedure, and patient risk index: National Nosocomial Infections Surveillance System. Am J Med 91: 152S-157S, 1991. 5 - Huether MJ, Griego RD, Brodland DG, Zitelli JA: Clindamycin for intraincisional antibiotic prophylaxis in dermatologic surgery. Arch Dermatol. 2002 Sep;138(9):1145-8. 6 - Carrol WR, Rosenstiel D, Fix JR, de la Torre J, Solomon JS, Brodish B, Rosenthal EL, Heinz T, Niwas S, Peters GE: Three-dose vs extended-course clindamycin prophylaxis for free-flap reconstruction of the head and neck. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2003 Jul;129(7):771-4. 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