e-Terra http://e-terra.geopor.pt ISSN 1645-0388 Volume 11 – nº 12 2010 Revista Electrónica de Ciências da Terra Geosciences On-line Journal GEOTIC – Sociedade Geológica de Portugal VIII Congresso Nacional de Geologia _________________________________________________________ Deformação sin- e pós-rifting oceânico nos sedimentos CretácicoPlistocénicos da Planície Abissal da Madeira Syn- and post rifting deformation on the Cretacic-Pleistocene sediments of the Madeira Abyssal Plain A. BRANCO – [email protected] (LNEG, EMEPC) C. ROQUE – [email protected] (EMEPC, LNEG) G. CARRARA – [email protected] (LNEG) H. DUARTE – [email protected] (LNEG) N. LOURENÇO – [email protected] (EMEPC) M.P. ABREU – [email protected] (EMEPC) P. TERRINHA – [email protected] (LNEG, IDL) RESUMO: Descreve-se a tectónica da Planície Abissal da Madeira com base em três linhas sísmicas multicanal localizadas na Cretaceous Quiet Zone. Reconhecem-se quatro unidades sismostratigráficas e três tipos de estruturas e eventos tectónicos. O evento de distensão tectónica (rifting) terá cessado no Miocénico inferior, seguindo-se uma fase compressiva que terá cessado antes do Plistocénico. Os movimentos verticais de soerguimento são o último acontecimento tectónico de relevância, parecendo estar associados a movimentos isostáticos. PALAVRAS-CHAVE: Planície Abissal da Madeira, deformação, rifting, reflexão sísmica multi-canal ABSTRACT: We describe the tectonics of the Madeira Abyssal Plain based on three multi-channel seismic profiles located in the Cretaceous Quiet Zone. Four seismostratigraphic units separated by major discontinuities and three types of structures and tectonic events were recognized. The rifting phase ended at the lower Miocene, followed by a compressive phase which ended before the Pleistocene. The vertical movements of uplift are the last tectonic event of relevance which seems to be associated with isostatic movements. KEYWORDS: Madeira Abyssal Plain, deformation, rifting, multi-channel seismic reflection 1. INTRODUÇÃO O objectivo deste trabalho é descrever a tectónica observada na Planície Abissal da Madeira (PAM) através da interpretação de três linhas de reflexão sísmica multi-canal adquiridas pela Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental (EMEPC). 2. ENQUADRAMENTO GEOLÓGICO A área objecto deste estudo enquadra as três linhas de reflexão sísmica multi-canal na PAM, entre o grupo de montes submarinos do Great Meteor e o arquipélago da Madeira (figuras 1a e 1b). 1(4) e-Terra Volume 11 – nº 12 | 2010 VIII Congresso Nacional de Geologia Figura 1a - Enquadramento e localização das linhas MCS WM01, WM02 e WM03 representadas sobre a batimetria da área de estudo (batimetria Gebco). Idades do vulcanismo nas cristas submarinas e arquipélago da Madeira de acordo com Geldmacher e Hoernle (2000). Figura 1b - Anomalias magnéticas da Planície Abissal da Madeira, zonas de fractura inactivas referidas no texto (a partir de Alibés et al. (1999)) e sites de sondagens ODP 950, 951 e 952. Linhas a negrito – perfis sísmicos; Informação batimétrica Gebco. Notar a sobreposição da linha sísmica mais a sul com a zona de fractura Hayes. A PAM localiza-se na parte central e mais profunda da Bacia das Canárias, que inclui as ilhas vulcânicas da Madeira e das Canárias (Alibés et al., 1999). A Bacia das Canárias é limitada a Oeste pelo flanco leste da MAR (Mid-Atlantic Ridge), a Norte pela Crista Açores-Gibraltar, a nordeste pela Crista Madeira-Tore (CMT), a Este pelas zonas inferiores da crista insular das Canárias e pela crista continental do Sahara, e a Sul pela crista de Cabo Verde (figura 1a; Searle, 1987). A maior parte da PAM encontra-se na zona de quietude magnética cretácica - Cretaceous Magnetic Quiet Zone (Searle, 1987; figura 1b) e a crosta oceânica subjacente da área de estudo está cortada por três zonas de fracturas inactivas, designadas por Hayes, Charis e Cruiser (Alibés 2(4) e-Terra Volume 11 – nº 12 | 2010 VIII Congresso Nacional de Geologia et al., 1999), representadas na figura 1b onde também se indicam as idades do vulcanismo eventualmente associado ao hotspot da Madeira segundo Geldmacher & Hoernle (2000). Do ponto de vista litostratigráfico, as sondagens ODP 950, 951 e 952 (Schmincke et al., 1995) revelaram que na PAM, o preenchimento sedimentar até cerca de 400 m de profundidade abaixo do fundo do mar consiste principalmente em unidades turbidíticas separadas por finas camadas pelágicas com debris-flows. Os turbiditos dividem-se em três grupos distintos: turbiditos ricos em elementos vulcânicos, turbiditos ricos em matéria orgânica e turbiditos ricos em carbonato de cálcio (Lebreiro et al., 1998). A composição da sedimentação pelágica varia entre vasa carbonatada quase pura e argila pelágica (Alibés et al., 1999). 3. RESULTADOS Foram interpretadas quatro unidades sismostratigráficas principais, separadas por três horizontes que se encontram assinaladas na figura 2 como H0, H1 e H2. Do ponto de vista geológico, H0 representa o topo da crosta oceânica; H1constitui um horizonte próximo do fim da fase de rifting, e H2 um horizonte pós fase de fracturação. A unidade sedimentar basal, limitada por H0 na base e H1 a topo, apresenta uma série de corpos sedimentares ou vulcanosedimentares de geometrias internas e externas irregulares que testemunham processos de colmatação de uma superfície irregular, processos tectónicos e erosivos importantes. A calibração cronostratigráfica dos horizontes sísmicos foi realizada por comparação com as unidades sedimentares apresentadas por Alibés et al. (1999) cruzada com o sismograma sintético, também retirado de Alibés et al. (1999). Deste modo atribuiu-se à base da unidade sísmica superior (H2) uma idade plistocénica, à base da unidade intermédia (H1) uma idade miocénica inferior e a base dos sedimentos que cobrem o soco oceânico (H0) será do Cretácico inferior de acordo com a idade da crosta oceânica nesta região do Atlântico. Reconhecem-se três tipos de estruturas e eventos tectónicos nas linhas sísmicas interpretadas, a saber: tectónica de rifting oceânico, tectónica de fracturação provavelmente em regime compressivo e movimentos verticais de soerguimento (figura 2). De acordo com a calibração referida anteriormente, o evento de distensão tectónica, ou rifting, terá cessado cerca do Miocénico inferior, altura em que se terá iniciado a fase compressiva que terá cessado antes do Plistocénico. A fase distensiva estaria associada ao mecanismo de distensão da crosta oceânica associado à formação de litosfera oceânica e a fase compressiva coincide, nesta região, com as idades do vulcanismo do Arquipélago da Madeira (~14Ma), donde poderá associar-se à instalação do hot spot da Madeira, de acordo com o modelo de idades apresentado por Geldmacher & Hoernle (2000) (ver figura 1a). Não se deve descartar ainda a possibilidade de instauração dum campo compressivo durante os estádios iniciais da subsidência térmica. Os movimentos verticais de soerguimento são o último acontecimento tectónico de relevância observado e que não estão significativamente associados à reactivação de falhas, parecendo antes estarem associados a movimentos isostáticos. 4. CONCLUSÕES Deste trabalho preliminar de interpretação dos perfis de reflexão sísmica da PAM pode concluir-se o seguinte: (1) corrobora-se a existência duma fase de compressão tectónica já descrita por Roque et al (2009); (2) que esta fase de compressão tectónica se encontra essencialmente concentrada sobre relevos positivos de crosta oceânica e as estruturas de acomodação desta deformação são falhas de elevada inclinação, o que sugere deformação transpressiva ou associada a processos metassomáticos no soco; (3) que a idade do evento compressivo terá ocorrido durante a maior parte do Neogénico; (4) descreve-se a existência dum 3(4) e-Terra Volume 11 – nº 12 | 2010 VIII Congresso Nacional de Geologia evento de soerguimento tectónico que não se encontra associado a falhas, mas sim de maior amplitude horizontal, podendo estar associado a fenómenos de isostasia; (5) A fase de rifting oceânico ocorreu durante o Cretácico e o Paleogénico, embora um trabalho de calibração com linhas tie-line que transportem os dados estratigráficos das sondagens ODP para a área de estudo seja imprescindível para assegurar esta afirmação. Figura 2 - Interpretação sismostratigráfica de um segmento do perfil WM03; Significado geológico dos horizontes descrito no texto. Assinalam-se as estruturas tectónicas de rifting e soerguimento. Note-se a estrutura triangular de crescimento das unidades sin-rift denotando dois episódios de rifting. Referências Alibés, B., Rothwell, R.G., Canals, M., Weaver, P. P. E., Alonso, B. (1999) – Determination of sediment volumes, accumulation rates and turbidite emplacement frequencies on the Madeira Abyssal Plain (NE Atlantic): a correlation between seismic and borehole data. Mar. Geol., V. 160, Issues 3-4, pp. 225-250. Geldmacher, J., and Hoernle, K. (2000) – The 72 Ma geochemical evolution of the Madeira hotspot (eastern North Atlantic): Recycling of Palaeozoic (500 Ma) oceanic crust. Earth Planet. Sci. Lett., 183, pp. 73-92. (Corrigendum,Earth Planet. Sci. Lett., 186, 333, 2001). Lebreiro, S.M., Weaver, P.P.E., Howe. R.W. (1998) – Sedimentation on the Madeira Abyssal Plain: EocenePleistocene history of turbidite infill. In Weaver, P.P.E., Schmincke, H.-U., Firth, J.V., and Duffield, W. (Eds.) 1998. Proc. ODP, Sci. Results, 157, College Station, TX (Ocean Drilling Program). Roque, C., Simões, M., Lourenço, N., Abreu, M.P. (2009) – Evidences of intraplate deformation in the West Madeira Abyssal Plain (eastern North Atlantic) from seismic reflection and multibeam swath bathymetry data. Geophysical Research Abstracts, vol. 11, EGU. Schmincke, H.-U., Weaver, P.P.E., Firth, J.V., et al., (1995) – Proc. ODP, Init. Repts., 157: College Station, TX (Ocean Drilling Program). Searle, R.C., (1987) – Regional setting and geophysical characterization of the Great Meteor East area in the Madeira Abyssal Plain. In: Weaver, P.P.E., Thomson, J. _Eds., Geology and Geochemistry of Abyssal Plains. Geol. Soc. Spec. Publ. No.31, pp. 49-70. 4(4)