O TEATRO CIENTÍFICO E O ENSINO DE FÍSICA – ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA DIDÁTICA Scientific theater and physics education – Analysis of a didactical experience Daniel de Andrade Moura1 Ricardo Roberto Plaza Teixeira2 Resumo: Este trabalho apresenta uma discussão a respeito do uso da História da ciência no ensino de Física. Ele discute também as possibilidades que o denominado teatro científico apresenta como um fator motivador para a aprendizagem de temas relacionados à ciência. Finalmente, são relatados, a partir da experiência de uma oficina de teatro científico, os resultados de apresentações da peça “Meu céu de estrelas” para diversos públicos. O roteiro desta peça é apresentado no final deste trabalho como apêndice. Palavras chave: teatro científico; história da ciência; física; educação. Abstract: This paper presents a discussion about the use of history of science in physics education. It also discusses the possibilities that the so-called scientific theater presents as a motivating factor to learn about subjects related to science. Finally, it is reported, from the experience of a scientific theater workshop, the results of presentations of the play "My sky of stars" for different audiences. The text of this play is shown at the end of this work as an appendix. Key-words: scientific theater; history of science; physics; education. 1 Licenciado em Física pelo CEFET-SP e aluno de mestrado na Universidade Federal do ABC. E-mail: [email protected]. 2 Doutor em Física pela USP e professor do CEFET-SP e da PUC-SP E-mail: [email protected]. 1 1- INTRODUÇÃO A Física é uma ciência muito presente no cotidiano das pessoas, estando diretamente ligada ao desenvolvimento tecnológico. Infelizmente, muitos alunos não conseguem associar os conteúdos aprendidos na escola com o que presenciam no seu dia-adia, desmotivando-os intensamente. Sem motivação, o aluno não consegue um bom rendimento na escola. Há diversas pesquisas que visam dar ferramentas a educadores, de modo a facilitar o processo de ensino de Física: o teatro cientifico pode ser uma alternativa interessante neste cenário. Neste trabalho é apresentada uma breve discussão a respeito do uso da História da ciência no ensino de Física, enfocada pela ótica da linguagem teatral. São relatados também os resultados obtidos com a realização de uma oficina de teatro cientifico que se mostram relevantes para a compreensão desta ferramenta no aprendizado da ciência. O grande objetivo deste trabalho é dar ao educador mais uma ferramenta para facilitar o árduo trabalho em ensinar, principalmente quando a disciplina lecionada é na área das ciências exatas. 2- A PROBLEMATICA DO ENSINO DE FÍSICA A Física é uma ciência experimental que analisa os fenômenos que ocorrem na Natureza, tais como os movimentos dos astros, as trocas de calor, a propagação das ondas e a eletricidade (Biscuola, 2002). Portanto, esta ciência está presente em tudo o que fazemos, pois em todas as atividades que executamos em nosso cotidiano há pelo menos um fenômeno natural envolvido. A Física está intimamente ligada ao cotidiano do aluno, e pela natureza dos conhecimentos envolvidos, pode despertar o interesse dos alunos (Moraes, 2005). Mas na prática, o que se observa é uma falta de motivação em aprender conteúdos desta ciência, e uma grande dificuldade em relacioná-la com o dia-a-dia. Há muitos motivos para isso, e entre eles podemos destacar alguns: professores de outras áreas dando aula de Física; más condições de trabalho; falta de capacitação; falta de infra-estrutura adequada. Os educandos têm dificuldade em vincular o que vêem na Física com o seu cotidiano, fazendo parecer que 2 o aprendizado desta ciência não tem nenhum sentido para a sua vida e nenhuma utilidade prática. Um aluno desmotivado obviamente não irá ter um bom rendimento em sala de aula. É necessário incentivar o educando, sendo preciso evidenciar o valor e a utilidade da Física, para convencer os alunos a se engajarem no processo de aprendizagem (Silva, 2004). Cabe ao professor o papel de motivar, mas para que isso seja possível, é necessário que existam o ambiente e as condições de trabalho propícios ao processo de ensino-aprendizagem, para que o próprio professor também esteja motivado. Na realidade, o que se observa na maioria das escolas públicas são baixos salários, além de ambientes que ajudam a desestimular o educador e o educando. É necessário portanto que o professor seja valorizado para que o trabalho educacional seja realizado com a qualidade necessária. Outro problema para o ensino de disciplinas das ciências exatas, principalmente na rede estadual paulista, é a dificuldade do aluno em entender a linguagem matemática. Segundo os dados do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo de 2007, cerca de 96 % dos alunos que concluem o ensino médio têm um nível de conhecimento abaixo do esperado. A Matemática é uma importante ferramenta para a Física, pois por meio dela, diversas teorias físicas são expressas, permitindo uma melhor compreensão dos fenômenos estudados. Infelizmente, esta compreensão matemática está reservada a um pequeno público que consegue entender a linguagem e a metodologia usadas pela física (Pagliarini, 2007). Uma forma de dar sentido ao conteúdo ensinado pelas diversas disciplinas abordadas no ensino médio é promovendo uma relação entre elas, de modo a cultivar a interdisciplinaridade desde cedo na escola. A humanidade está passando por grandes mudanças devido ao avanço tecnológico, tornando o mundo cada vez mais complexo e interdisciplinar. Deste modo, existe inadequação profunda quando os saberes são apresentados desunidos, pois a realidade é cada vez mais multidisciplinar (Morin, 2007). A física ensinada nas escolas precisa estar atrelada às outras disciplinas, dialogando e se relacionando com elas e com a realidade e o contexto da vida do estudante, de forma que ele perceba as relações existentes entre o seu dia-a-dia e aquilo que aprende na escola. Para auxiliar o árduo trabalho do professor de física e facilitar o aprendizado dos seus conteúdos, diversos pesquisadores vem propondo uma série de atividades que podem 3 ser utilizadas para motivar o interesse do aluno, para que ele se dedique efetivamente ao próprio processo de ensino-aprendizagem. Os educandos alcançam um rendimento muito melhor quando se interessam pelos conhecimentos propostos que para isto devem corresponder às suas necessidades, anseios e expectativas. Algumas dessas atividades trabalham com experiências em laboratório, dando enfoque ao lado experimental da Física. Outras enfocam novas maneiras de trabalhar com alunos em sala de aula, mostrando novas ferramentas pedagógicas para o ensino de ciências, como o teatro cientifico e o RPG (Role Playing Game). Outras ainda propõem o uso da história da ciência no ensino de física, como ferramenta para o seu aprendizado. 3- A HISTÓRIA DA CIÊNCIA NO ENSINO DE FÍSICA A história da ciência ajuda a compreender como as teorias cientificas chegaram ao seu estado atual. Uma das melhores formas de compreender a ciência e seus métodos é por meio de um estudo histórico sobre o seu desenvolvimento (Martins, 1990). Sendo assim, é de fundamental importância que a história da ciência deve esteja presente no ensino escolar, de forma a tornar a educação científica mais plena. A Física é uma ciência experimental e com muitas teorias relacionadas com a sociedade e a natureza em que vivemos. Os seus conteúdos foram desenvolvidos por meio de diferentes métodos experimentais e matemáticos que se modificaram de acordo com a realidade de cada época. O conhecimento científico envolve não apenas suas leis e teorias, mas, também, o conhecimento dos processos de como a ciência se estrutura e se desenvolve (Vannucchi, 1996). Por meio da história da ciência, o professor consegue abordar o desenvolvimento cientifico e apresentar aos alunos as diversas teorias e os diferentes métodos científicos utilizados ao longo dos anos. Muitos alunos têm a falsa ilusão de que os cientistas famosos, como Newton e Einstein, eram verdadeiros semi-deuses, intocáveis, com inteligência sobre-humana e infalíveis. Alguns chegam a imaginar que nunca poderão aprender as teorias produzidas por estes cientistas. É necessário superar esta imagem, mostrando ao educando que a ciência está em constante mutação e que se desenvolve de acordo com o contexto histórico que a influencia. Desta forma, o aluno se sentirá mais capaz de aprender e estará mais aberto para 4 o aprendizado da física. Todos os homens que por um motivo qualquer se sentem proibidos de atuar ou que se descobrem incapazes de usar suas faculdades, sofrem (Freire, 1987): por isso o aluno tem que se sentir um ator fundamental no processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos de física que devem ter um sentido histórico e uma utilidade no contexto da vida de cada aluno. O teatro cientifico, no qual a história da ciência é abordada por meio da linguagem teatral, é uma boa forma de apresentar aos alunos o processo de desenvolvimento histórico da ciência. Tornar a história da ciência parte de uma peça permite que os alunos participem da recriação de um momento histórico e facilitando o aprendizado das ciências. 4- TEATRO CIENTÍFICO A arte e a ciência possuem estreitas ligações, apesar do enganoso antagonismo entre elas, pois ambas são formas de interpretar o mundo (Ferreira, 2004). A arte busca ilustrar o mundo de diversos modos, sempre procurando passar mensagens para aqueles que a assistem. A ciência busca explicar os fenômenos da natureza, tentando compreender e prever os seus segredos. Uma interfere diretamente no desenvolvimento da outra. O teatro dentro da educação teve início no século V a.C., na Grécia. Platão e Aristóteles, entre outros filósofos, já o defendiam. Para os gregos, a arte era parte fundamental na educação. Eles achavam que o ensino deveria ter início de maneira lúdica, para que as crianças pudessem desenvolver a tendência natural de seu caráter (Reverbel, 1997). Atualmente, o teatro ainda é muito pouco utilizado no ensino médio, o que é uma grande perda para a escola. Quando o teatro é utilizado para a divulgação cientifica, está se promovendo o denominado o Teatro Cientifico. Por meio deste teatro, a história da ciência é narrada e analisada, levando o espectador a refletir sobre a criação de diversas teorias e fazendo-o viajar por diversos contextos históricos que colaboraram para a evolução da ciência e para as descobertas de alguns fenômenos. O conhecimento científico necessita de uma linguagem adequada para que seja compreendido pelos alunos (Lupetti, 2008) e, neste contexto, o teatro pode ser uma ferramenta importante para a sua divulgação. 5 Duas importantes formas de utilizar o teatro científico na educação são: 1- Fazendo os alunos participarem de peças de teor científico; 2-Tornando os alunos espectadores de peças com teor científico. O presente trabalho analisa uma experiência realizada com uma oficina de teatro cientifico, na qual foi apresentada a peça “Meu Céu de Estrelas” (em anexo) que foi escrita por um dos autores deste trabalho (D. A. Moura). 5- A OFICINA DE TEATRO CIENTÍFICO A oficina descrita aqui foi montada na Biblioteca Municipal Álvares de Azevedo e na Escola Técnica Estadual Professor Horácio Augusto da Silveira, ambas localizadas no município de São Paulo. Ela teve a duração de 2 anos (2005-2006) e contou com a participação média de 11 participantes, que tinham idades e níveis escolares diversos. No decorrer dela ocorreram diversas apresentações e, entre elas, a apresentação da peça “Meu Céu de Estrelas”. As apresentações ocorreram na unidade sede do CEFET-SP (Centro Federal de Educação Tecnológica de São Paulo) no município de São Paulo e na Biblioteca onde os ensaios eram realizados. Ao final de cada apresentação foram realizadas breves entrevistas qualitativas com alguns espectadores, visando obter algumas informações importantes para compreender a influência do teatro cientifico no processo educativo. O objetivo da peça “Meu céu de estrelas” é facilitar o ensino de noções básicas sobre a astronomia, com a apresentação de temas que possam motivar o aluno. Para isso foi utilizada a figura de Kepler, o cientista que, com o apoio de Tycho Brahe, formulou três leis importantes, conhecidas como as Leis de Kepler: 1- Os planetas descrevem órbitas elípticas, com o Sol num dos focos; 2- O raio que liga um planeta ao Sol descreve áreas iguais em tempos iguais (lei das áreas); 3- Os quadrados dos períodos (tempos) de revolução ou seja de volta completa em torno do Sol são proporcionais aos cubos das distâncias médias dos planetas ao Sol. Somando o público das apresentações realizadas, cerca de 600 pessoas tiveram a oportunidade de assistir a peça. Primeiro, a peça foi apresentada para alunos do curso de licenciatura em física do CEFET-SP, que majoritariamente gostaram da idéia de divulgar a ciência por meio do teatro, sobretudo de ele incentivar o educando para o aprendizado. A apresentação realizada para alunos de cursos técnicos do CEFET-SP permitiu identificar 6 muitos que ficarem curiosos em saber mais sobre Kepler e suas descobertas astronômicas. As apresentações realizadas na Biblioteca atingiram um público diversificado mais diversificado: muitos ficaram admirados em perceber que a ciência que aprenderam na escola tinha a ver com a peça, visto que não imaginavam que uma peça de teatro podia vir a discutir uma ciência como a física considerada por muitos tão hermética e difícil de compreender. Houve uma mudança na visão da ciência por parte dos integrantes da oficina. Eles se envolveram com a peça, estudando e procurando saber mais sobre os assuntos que ela retratava. Alguns dos integrantes do grupo, que estavam no ensino médio, relataram que se sentiram mais interessados em aprender Física, por perceberem que a história da ciência ajuda a entender melhor muitos conteúdos no contexto da sociedade em que vivemos. A oficina foi uma experiência muito produtiva, pois conseguiu motivar muitas pessoas a aprenderem mais sobre ciência, fazendo-as perceber que a Física não constitui-se apenas fórmulas e que ela é uma ciência que se desenvolveu devido a múltiplos e interessantes fatores. Além disso, muitos adquiriram conhecimentos físicos que antes não detinham. Também propiciou a todos que participaram do processo – inclusive os atores – importantes reflexões a respeito da prática pedagógica. 6- CONCLUSÕES O ensino de Física é um trabalho difícil para muitos professores, devido a diversos fatores, mas sobretudo devido à falta de interesse por parte dos alunos. Se não há interesse, fica muito complicado conseguir um processo de ensino-aprendizagem eficaz, no qual o aluno seja ativo. O teatro cientifico é uma importante ferramenta para motivar os educandos a aprenderem tópicos da ciência, pois por meio dele a história da ciência é trabalhada e desmistificada, de modo a fazer com que os espectadores e os atores percebam os reais processos pelos quais a ciência evolui. Assim, o aluno começa a perceber que a ciência faz parte do seu mundo, sendo possível aprender muito sobre ela e ajudando no seu desenvolvimento. 7 Os participantes de oficinas de teatro com teor científico, em geral adquirem um real interesse pela a ciência e são incentivados a realizarem estudos e pesquisas de modo a aprofundar seus conhecimentos científicos. Nós aprendemos melhor aquilo que queremos (Brockman, 1997): portanto os educadores devem sempre avaliar com carinho todas as ferramentas pedagógicas que de fato motivem os alunos a adquirirem uma curiosidade genuína pelas coisas e pela história das coisas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BISCUOLA, Gualter Jose; MAIALI, André Cury. Física. São Paulo: Saraiva, 2002. BROCKMAN, John e MATSON, Katinka. As coisas são assim. São Paulo: Companhia das letras, 1997. FERREIRA, Fernando César. Diálogos sobre o tempo: arte e ciência, educação. São Paulo: Tese de Doutorado apresentada à Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 2004. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. LUPETTI, Karina O. et al. Ciência em cena: teatro e divulgação cientifica. Curitiba: XIV Encontro nacional de ensino de Química, 2008. MARTINS, R. A. Sobre o papel da história da Ciência no ensino. Boletim da Sociedade Brasileira de História da Ciência, v. 9, 1990. MORAES, Maria Beatriz dos Santos Almeida. Uma proposta para o ensino da eletrodinâmica no nível médio. Porto Alegre: Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2005. MORIN, Edgar. Os setes saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2007. PAGLIARINI, Cassiano Rezende. Uma análise da história e filosofia da ciência presentes em livros didáticos de física para o ensino médio. São Carlos: Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo, 2007. REVERBEL, Olga Garcia. Um caminho do teatro na escola. São Paulo: Scipione, 1997. 8 SILVA, Elifas Levi da. Aspectos motivacionais em operação nas aulas de Física do Ensino Médio, nas escolas estaduais de São Paulo. São Paulo: Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Educação e ao Instituto de Física da Universidade de São Paulo, 2004. VANNUCCHI, Andréa Infantosi. História e Filosofia da Ciência: da teoria para a sala de aula. São Paulo: Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Educação e ao Instituto de Física da Universidade de São Paulo, 1996. 9 ANEXO MEU CÉU DE ESTRELAS Estamos num quarto/sala, com uma cama, um telescópio, livros e cadernos bagunçados. Na cama está dormindo Flávio Lopes, um astrônomo muito excêntrico. Flávio Lopes: Ai que sono.....o que a gente não faz pela ciência.....deixa eu levantar antes que eles cheguem.....EITA, vocês já chegaram !!! Eu nem me arrumei ainda !!! A gente tinha combinado para as 2, não foi ??? E agora ainda são (ele olha o relógio)...é....são 2:30...acho que dormi demais....não vai dar tempo de me trocar, mas vou passar uma água no rosto e já volto. Flávio Lopes: Bom dia, jovens aspirantes a cientistas. Fico feliz que todos tenham aceitado o meu convite, já que os cientistas famosos não quiseram aceitar. Vou falar um pouco sobre o mundo em que estão prestes a entrar e se fascinar. Música “Tudo fascina na ciência” Tudo fascina na Ciência! Pois é uma grande experiência! A Ciência tem os seus mistérios! Ela tem os seus dilemas! A Ciência é um desafio! Ela possui muitos modelos! Tudo fascina na Ciência! Flávio Lopes: Sou um pesquisador, e em breve, serei um dos mais famosos cientistas. Meu nome é Flávio Lopes. Guardem muito bem este nome, FLÁVIO LOPES. Fiz uma descoberta que irá mudar o mun.... Entra em cena, interrompendo o doutor, Ermelinda toda apressada. Ermelinda: Doutor, você enlouqueceu??? Cantando a esta hora da madrugada!!! A dona Frasncislene já veio reclamar. Evite cantar por favor (ela sai após dar o recado). Flávio Lopes: (enquanto Ermelinda sai, ele vai atrás) Ermelinda, volte aqui.....eu não tô nem aí para o que aquela velha chata vai falar....Ermelinda....ERMELINDA, eu preciso falar com você...não vai voltar???...está bem, desta vez eu te perdôo...(após tomar com a porta na cara, volta a atenção para o público)..eu dizia que fiz uma descoberta que irá mudar o mundo: o Sol irá explodir em 10 apenas 10 anos, com uma margem de erro de apenas 1 ano para mais ou para menos. Vocês acreditam em mim??? Pois acreditando ou não é verdade e tenho como provar. Mas antes de explicar aquilo que descobri, tenho que explicar como ocorre a extinção das estrelas. O que são estrelas??? .....se meu amigo Kepler estivesse aqui ele diria que são astros que regem nossas vidas, mas deixemos os misticismos para lá, e falemos sobre o que é realidade: as estrelas são astros que iluminam o universo. Algumas possuem uma luz branca, outras são azuis, e há estrelas com uma luz amarelada. Existem estrelas de diversas magnitudes, e fiz até uma maquete para representá-las melhor, vejam....hum...onde está minha maquete....juro que tinha deixado em cima desta mesa....hm...ERMELINDA....com certeza ela deve ter escondido enquanto limpava o meu quarto, ela adora mexer nas minhas coisas...ERMELINDA...bom, deixa pra lá....o que importa mesmo é que as estrelas possuem um tempo de vida ut..... Ele novamente é interrompido pela entrada de Ermelinda. Ermelinda: Você está falando sozinho de novo.... Flávio Lopes: Finalmente, achei que você não ia atender ao meu chamado nunca!!! Onde está a maquete que eu deixei ao lado do telescópio??? Ermelinda: Maquete??? Hum...por acaso o senhor está falando daquelas bolinhas espetadas com palitos, está???? Flávio Lopes: Isto, esta maquete mesmo, onde ela está??? Ermelinda: Eu joguei fora. Flávio Lopes: Jogou fora!!! Eu levei 2 semanas para fazer aquela maquete!!! Ermelinda: Você sabe que é proibido isto aqui. Flávio Lopes: Desde quando é proibido ??? Ermelinda: Desde sempre, você conhece as regras. Flávio Lopes: (ele olha para o público) Vou ficar devendo a maquete desta vez, mas prometo fazer outra e esconder da Ermelinda, ai eu mostro para vocês. Ermelinda: Com quem o senhor está falando??? Flávio Lopes: Com estes jovens alunos. Ermelinda: Eu não vejo ninguém. Flávio Lopes: De novo surtando... Ermelinda: Eu surtando??? Já vi que o senhor não tomou os seus remédios. Flávio Lopes: Não tomei ainda, pois não quero dormir nesta noite tão importante para mim. 11 Ermelinda: Vou buscar seus remédios, já volto. Flávio Lopes: Ei, espere, ainda não te puni por ter jogado fora minha maquete...Ermelinda...ERMELINDA (novamente bate a porta na sua cara)....estão vendo como ela me trata???(falando com o público)...só não a despeço por que ainda hei de um dia me casar com ela.....onde paramos....já sei, falávamos do tempo de vida útil das estrelas. No centro das estrelas ocorrem diversas fusões nucleares. Mas o que é fusão nuclear??? Bom, basta lembrar da equação de Einsten: E= m.c2, pela qual concluímos que é possível transformarmos energia em massa, e massa em energia, e é exatamente isto que ocorre na fusão nuclear: ocorre um processo em que há diminuição de massa e geração de muita energia. É esta energia que é responsável pela luz produzida pela estrela, e também pelo calor que ela emana. O problema é que esta fonte de energia é finita e...... Ermelinda retorna a sala, interrompendo novamente o cientista. Ermelinda: Aqui estão os seus remédios. Flávio Lopes: Pode deixar ali que depois eu tomo. Ermelinda: Eu sei que se eu deixar aqui você não vai tomá-los. Beba logo o remédio. Flávio Lopes: Não vou tomar os remédios nesta noite. As 3:00 da manhã irei provar a minha teoria. Por isso todos estes jovens estão aqui. Até meu amigo Kepler virá. Ermelinda: Aquele seu amigo que nasceu no século XVI??? Flávio Lopes: Isso é o que ele diz, mas não podemos esquecer uma coisa: todo físico tem um parafuso a menos, e com certeza eu não sou exceção. Ermelinda: Tenho coisas mais importantes para fazer. Seja bonzinho e tome os remédios. Flávio Lopes: Não, não e não!!! Estes remédios me dão sono. Já são 2:45...já podemos ver algumas estrelas...vou deixar você ver primeiro. Ermelinda: Eu não quero ver estrelas. Flávio Lopes: E eu não quero tomar os remédios. Entramos num acordo. Ermelinda: Tá, eu já entendi....vou ver as estrelas, mas depois você vai tomar os remédios. Flávio Lopes: Ok. Ária “Veja as estrelas” Veja as estrelas, pelo meu telescópio, Que está direcionado para elas. Veja os planetas formando epiciclos, Enquanto os observamos, por ele. Que invenção maravilhosa, 12 Pois podemos ver agora. Ver as estrelas, pelo meu telescópio, Que está direcionado para elas. Ermelinda: Doutor, pra lá só tem parede. Flávio Lopes: Como só parede??? Ermelinda: Doutor, pra lá só tem parede mesmo. Não tem como ver estrelas com este telescópio direcionado para lá. Não há janelas. Flávio Lopes: Definitivamente você não está lúcida hoje. Você esqueceu que com este telescópio, que eu inventei, podemos ver através das paredes??? Ermelinda: Eu já devia imaginar que esta era outra de suas loucuras. Flávio Lopes: De novo surtando...... Ermelinda: Ah, deixa pra lá.....eu já usei o telescópio, agora tome os remédios. Flávio Lopes: Prometi que tomaria os remédios, só não disse quando....as 10:00 da manhã eu tomo. Ermelinda: Eu tô ficando nervosa. Flávio Lopes: Tá bom, eu tomo os remédios agora. Mas antes quero cantar a música do passarinho. Ermelinda: Mas doutor, já são quase 3 horas da madrugada, a dona Francislene vai reclamar. Flávio Lopes: Se eu não cantar não tomo os remédios. Ermelinda: Está bem. Mas cante baixinho para não acordar os seus colegas. Ária “Passarinho” Lindo passarinho vai voando para o céu, Voa entre as nuvens, alcançando um alto céu. Voa entre as nuvens, o meu belo passarinho, Até que no seu ninho vem pousar. Pousa de tal forma que não cai dentro do ninho, corro para salvar aquele pobre passarinho. Cai na minha mão com sua asa quebrantada. Desse passarinho vou cuidar. Durante o canto Ermelinda cai no sono e dorme. 13 Flávio Lopes: Isto sempre funciona!!! Também não é fácil trabalhar em 3 empregos e se manter acordada a esta hora. Vou tomar um copo d´água e já retorno. Entram em cena, em lugares opostos no palco, Kepler e o doutor Flávio. Kepler: Boa noite doutor. Flávio Lopes: Boa noite Kepler. Kepler: O que faremos esta noite??? Flávio Lopes: O que fazemos todas as noites: desvendar o universo que nos cerca. Kepler: E qual é o assunto de hoje??? Flávio Lopes: Fiz uma descoberta fantástica: descobri que o Sol vai explodir em 10 anos. Kepler: EUREKA!!!! Você possui alguma prova??? Flávio Lopes: Sim. Observei o espaço durante estas últimas semanas, e descobri que há alguns corpos realizando movimentos periódicos em nosso sistema solar. Kepler: O fato de haver corpos realizando movimentos repetitivos no sistema solar não é nenhuma novidade, senão as minhas leis não teriam sentido. Flávio: Suas leis??? Kepler: Sim, minhas leis, as leis de Kepler. Você nunca ouviu falar??? Flávio: Claro que não. Kepler: E você ainda se auto-denomina astrônomo. Vou enunciá-las para que você não as esqueça. A minha 1º lei: a órbita de cada planeta é uma elipse, com o Sol em um dos seus focos. Como conseqüência da órbita ser elíptica, a distância do Sol ao planeta varia ao longo de sua órbita. A 2º lei: A reta unindo o planeta ao Sol varre áreas iguais em tempos iguais. O significado físico desta lei é que a velocidade orbital não é uniforme, mas varia de forma regular: quanto mais distante o planeta está do Sol, mas devagar ele se move. A minha 3º e última lei: O quadrado do período orbital dos planetas é diretamente proporcional ao cubo de sua distância média ao Sol. Esta lei estabelece que planetas com órbitas maiores se movem mais lentamente em torno do Sol e, portanto, isso implica que a força entre o Sol e o planeta decresce com a distância ao Sol. Flávio: Hum....segundo sua primeira lei os planetas possuem órbitas elípticas e não circulares...e sua segunda lei diz que quanto mais perto do Sol mais rápido o planeta se move....e sua última lei é simplesmente uma equação para calcularmos a distância do planeta ao Sol.....tudo isto que você acabou de falar é obvio, Newton já descobriu isto há muito tempo. Kepler: Pode parecer óbvio agora, mas na minha época não era. Flávio: De novo com esta estória de que você viveu no século XVI..... 14 Kepler: E vivi mesmo. Para sua informação: Newton se apoiou em diversas coisas que eu pesquisei para elaborar a sua teoria da gravitação. Você não entende nada de história da ciência. Flávio: (olhando para o público) O médico disse para não contrariar..... Kepler: (se aproximando de Flávio) Vejo que você reuniu um público numeroso.... Flávio: Por favor, Kepler, se sente. Preciso voltar para a minha palestra. Kepler: Tudo bem. Ah, antes que eu esqueça: tem alguém do signo de XXXX??? (signo correspondente a data da apresentação). Saibam que hoje o planeta Vênus está em cruzamento com Marte, o que propicia novas uniões e a formação de novas alianças. Hoje é o dia pra você botar em prática o que planeja fazer a alguns meses. Flávio: Kepler, este não é um bom momento para falarmos de astrologia. Kepler: Pois eu digo que é um ótimo momento para falarmos de astrologia, pois as constelações de estrelas têm tudo a ver com ela. Foram dezenas, centenas, milhares de anos de estudo para entendermos como os astros influenciam as nossas vidas aqui na Terra. Flávio: Eu governo minha vida, não os astros. Kepler: Isto é verdade, mas que eles te influenciam, influenciam. Flávio: Sente-se, antes que eu desista de falar sobre minha descoberta. Kepler: Está bem, eu me sento. Flavio: Onde foi que eu parei....já sei: falávamos das fusões nucleares. Como eu dizia, as estrelas tem como fonte de energia as fusões, que para a infelicidade de cada estrela tem um fim. Quando a reação nuclear cessa, a estrela se extingue. Agora só falta explicar para vocês como a estrela “morre”. Kepler: Deixa que eu explico. Elas tendem a cres.... Flavio: Não Kepler, sente-se. Com certeza você vai acabar misturando astronomia com astrologia...(Kepler se senta)...algumas estrelas, com massa até 10 vezes a massa do Sol, se expandem formando uma gigante vermelha, e continuam expandindo ate formar uma supergigante vermelha. No fim do processo, surge uma nebulosa planetária, e o que resta da estrela é uma anã branca. As maiores estrelas, muitas vezes maiores do que o Sol, provocam no final do seu ciclo estrelar uma supernova, que é uma grande explosão, e após esta é formado o misterioso buraco negro. Kepler: Finalmente. E as provas??? Flavio: Já que você tocou no assunto, vou te pedir um favor. Você pode pegar as minhas anotações no banheiro??? Kepler: No banheiro??? O que elas fazem lá??? Flávio: Tive que esconder da Ermelinda. Ela vive mexendo nas minhas coisas e escondendo-as. Kepler: Eu não gosto da Ermelinda. 15 Flávio: Só porque ela mexe onde não deve??? Kepler: Não é isso. Não gosto dela porque ela sempre me despreza. Flávio: Também com estas roupas e com este argolão não é pra menos. Kepler: Mas no meu século eram a última moda. Flávio: Lá vem você de novo dizendo que viveu no século XVI....por favor Kepler, pegue minhas anotações. Kepler: Tô indo. Flávio: Agora faltam poucos minutos...(ele olha o relógio)....3 da manhã, chegou a hora...(ele observa pelo telescópio)...Kepler, vem ver.... Kepler: Já vou. Ermelinda acorda. Ermelinda: Doutor, você já tomou os remédios??? Flávio: Não, fiz muito mais que isso: provei minha teoria. Logo Kepler voltará com minhas anotações. Ermelinda: Flávio, este seu amigo Kepler é fruto da sua imaginação, ele não existe. Flávio: Não diga besteira Ermelinda. Eu e todos os aqui presentes o vimos. Ermelinda: Já chega, vou chamar o doutor (se retira da sala). Flávio: Pode chamar, assim ele participa desta importante reunião...(ele volta a observar pelo telescópio)...o universo está cheio de estrelas e mistérios... Enquanto Flávio ainda esta usando o telescópio entra na sala um médico com Ermelinda. Dr Pereira: Tudo em ordem com o senhor??? Flávio: Tudo ótimo. Eu acho que quem não está muito bem é a Ermelinda. Ermelinda: Agora eu sou a louca (o doutor olha para ela pedindo silêncio). Dr Pereira: Fiquei sabendo da sua reunião e vejo que está bem cheia (o doutor olha para o público). Flávio: Está mesmo. Veja (incentivando o doutor a usar o telescópio)...e então??? Dr Pereira: Super interessante!!! Isto prova que o Sol realmente irá explodir antes do que todo mundo imagina. Flávio: É, agora só preciso explicar minha descoberta para esta platéia. Dr Pereira: Pode deixar que eu explico. 16 Flávio: Mas doutor, quero muito fazer isto. Dr Pereira: Olhe como você está vestido: ainda está de pijama, sem falar na sua cara de sono. Pode ficar tranqüilo que eu explico. Flávio: O senhor promete??? Dr Pereira: Sim, e vou pedir pra Kepler me auxiliar. Agora tome os seus remédios. Flávio: Está bem doutor. Ermelinda: E não é que o senhor (doutor) conseguiu!!! Música “A hora de dormir” (durante o canto Flávio adormece) Tomar os meus remédios vou, pois o doutor recomendou. O meu remédio vou tomar, com ele eu posso melhorar. A hora de dormir chegou, pois o doutor já me falou. Agora eu vou descansar, na minha cama vou deitar. Ermelinda: Como o senhor consegue??? Dr Pereira: Não é feitiçaria, é psicologia. Todo maluco pensa que é normal. Temos que entrar no mundo dele para conseguirmos a sua confiança.....O mundo da ciência é um mundo fascinante, mas temos que tomar cuidado para não perdermos a cabeça e acabarmos em maus lençóis...vamos embora e apague a luz. Ermelinda e Dr Pereira se retiram e as luzes ficam mais fracas. De repente entra em cena Kepler. Kepler: ELE NÃO É LOUCO!!! É APENAS ALGUÉM MUITO A FRENTE DA SUA ÉPOCA. FIM 17